Acórdão nº 260/03.5TBPTS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 02 de Maio de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) intentou, em 07/02/2002, ação declarativa, sob a forma de processo sumário, que depois prosseguiu sob a forma ordinária, contra BB e cônjuge CC (1.º R.R.) e contra DD e cônjuge EE (2.º R.R.), alegando, no essencial, que: .
A A. e suas irmãs são comproprietárias de um prédio rústico no Sítio do …, que adquiriram por herança, o qual confronta a oeste com um prédio rústico pertencente em comum e partes iguais aos R.R.; .
A confrontação oeste do referido prédio da A. e de suas irmãs é feita com a levada de …, que tem sido utilizada, desde tempos ime-moriais, para levar águas aos prédios existentes no sítio; .
Os terrenos localizados a oeste da levada de …, que ali passa, fazem parte do prédio da A. e suas irmãs.
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Os R.R. construíram, naqueles terrenos, um muro em blocos dentro do prédio da A. e suas irmãs, ocupando assim uma área de 150 m2.
Concluíram a pedir que: a) – Fosse declarado que a A. é comproprietária, juntamente com as suas irmãs FF, GG e HH, do prédio em referência; b) – Fosse declarado que a parcela de 150 m2 ocupada pelos R.R. pertence à A. e a suas irmãs, por fazer parte integrante daquele prédio; c) – Fossem os R.R. condenados a demolir as construções que ali fizeram e a restituir à A. a parcela assim ocupada no estado anterior à implantação das referidas construções e que fica para além da levada de ….
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Os 1.ºs R.R. contestaram, invocando a exceção de caso julgado e impugnando a generalidade dos factos alegados pela A., concluindo, em primeira linha, pela absolvição da instância e, subsidiariamente, pela improcedência da ação.
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Por sua vez, os 2.ºs R.R. também apresentaram contestação, em que, além de impugnarem a generalidade dos factos alegados pela A., deduziram reconvenção, sustentando, no essencial, que: .
As construções cuja demolição a A. pretende estão implantadas aquém da levada por ela referida e, portanto, dentro do prédio dos R.R.; .
Essa levada é apenas um ramal que bifurca da levada existente na confrontação oeste do prédio dos R.R., paralela ao Caminho Municipal. Concluíram aqueles R.R. pela improcedência da ação e pediram, em reconvenção, o reconhecimento de que são comproprietários do prédio rústico indicado no art.º 6.º da petição inicial com a área de 1.285 m2 medidos a partir da levada que corre paralelamente ao Caminho Municipal, na sua confrontação a oeste, dentro do qual foram feitas as construções, cuja demolição vem peticionada pela A..
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Findos os articulados, foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual foi julgada improcedente a exceção de caso julgado deduzida, sendo, seguidamente, selecionada a matéria de facto tida por relevante com a organização da base instrutória. 5.
Realizada a audiência final, foi julgada a matéria de facto controvertida conforme despacho de fls. 432-433, de 18/01/2012, e proferida sentença a fls. 435-441, datada de 16/03/2012, a julgar a ação totalmente improcedente com a consequente absolvição dos R.R. do pedido e parcialmente procedente a reconvenção, reconhecendo-se os R.R. DD e EE comproprietários do prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial da … sob o n.º 01000/170691 com a área de 1.285 m2, cuja confrontação a oeste é a mencionada no parágrafo 36 [rectius 37] daquela sentença, absolvendo-se a A. no mais.
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Inconformada, a A. interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo sido anulada a sentença recorrida e determinada a repetição do julgamento com vista a ampliar a matéria de facto por forma a esclarecer o ponto 24 dado por provado, correspondente à resposta dada ao art.º 23.º da base instrutória, atendendo ao alegado no art.º 28.º da contestação dos 2.ºs R.R. e ainda a apreciar outros pontos de facto a fim e evitar contradições, conforme o acordão proferido a fls. 602-618, de 02/05/2013.
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Repetido o julgamento, foi proferida nova sentença a fls. 745-748, datada de 13/06/2016, nos termos da qual foi decidido julgar a ação improcedente e a reconvenção parcialmente procedente com teor idêntico ao da primeira sentença.
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Veio então a A. interpor novo recurso para a Relação que, através do acórdão de fls. 951-969, datado de 19/10/2017, julgou parcialmente procedente a apelação, decidindo: a) - Declarar que a A. e seus irmãos herdaram por morte dos seus pais um prédio rústico sito no Sítio do …, freguesia da …, inicialmente inscrito na matriz sob o artigo 11.362 e não descrito na Conservatória do Registo Predial, com a área de 22.445 m2; b) - Declarar que os R.R. ocuparam uma parcela desse prédio com uma área não exatamente apurada; c) - Condenar os R.R. a demolir todas as construções que realizaram nessa parcela de terreno que se situa para além do limite do prédio a eles pertencente, definido pela antiga levada de …, restituindo à A. a parcela de terreno na situação anterior à implantação das referidas construções.
d) - Julgar a reconvenção deduzida pelos 2.ºs R.R. DD e EE parcialmente procedente e, em conformidade, “condenar a A. a reconhecer” que aqueles são comproprietários do prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o artigo 01000/170691, com a área de 1.285 m2, cuja estrema a oeste é a antiga levada de …. ou ….
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Desta feita, os R.R. interpuseram revista, pedindo que, no respeitante à fixação da estrema oeste do prédio sub judice, se confirmasse parcialmente a decisão da 1.ª instância e, dessa forma, se julgasse a reconvenção parcialmente procedente e se reconhecesse que aqueles são comproprietários do prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.º 01000/170691, com a área de 1.285 m2, cuja estrema noroeste é o Caminho Municipal de …. e a estrema a sudoeste é a linha assinalada a preto, ligeiramente oblíqua em relação às linhas que assinalam aquele Caminho constantes do levantamento topográfico de fls. 417 e 418.
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A revista foi parcialmente concedida, anulando-se o acórdão recorrido, na parte impugnada, com fundamento na existência de contradição entre o facto extraído pela Relação em sede da resposta conjunta aos artigos 23.º e 24.º da base instrutória e os factos mantidos como não provados constantes dos artigos 11.º, 12.º, 15.º, 17.º e 19.º, ordenando-se a baixa do processo àquele Tribunal para suprimento dessa contradição e subsequente decisão de direito, conforme acórdão de fls. 1059-1078, de 12/07/2018.
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Na sequência disso, o Tribunal da Relação proferiu o acórdão de fls. 1091-1111, datado de 15/11/2018, em que, no respeitante ao suprimento da contradição em referência, se limitou a “alterar” a decisão de facto, quanto à matéria constante dos pontos 11.º, 12.º, 15.º, 17.º e 19.º da base instrutória, no sentido de considerar “provado o que consta da resposta conjunta aos pontos 23.º e 24.º”, mantendo tudo quanto dantes fora apreciado e decidido no acórdão de fls. 951-969, datado de 19/10/2017.
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Novamente inconformados, vêm os R.R. pedir revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - O acórdão recorrido foi proferido na sequência da decisão proferida pelo STJ que anulou o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 19/10/2017, e determinou a baixa do processo, a fim deste suprir a contradição factual entre a matéria por este dada como provada e a matéria dada como não provada na 1.ª instância e, na decorrência disso, decidir, novamente de direito, as questões suscitadas na apelação sobre as pretensões em causa; 2.ª - Porém, a Relação manteve a decisão anulada pelo STJ, na medida em que fixou a estrema a oeste do prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.º 01000/ 170691, com a área de 1.285 m2, na antiga Levada de … ou …; 3.ª - Ao fazê-lo, o acórdão recorrido padece do vício de violação da disciplina processual no respeitante aos parâmetros formais de reapreciação da decisão de facto; 4.ª - Desde logo, reapreciou matéria de facto sem que a A. tivesse cumprido com o ónus que lhe impendia no que à impugnação da mesma respeita; 5.ª – A A. não indicou na apelação quais os pontos da matéria de facto que entendia dever ser alterados/modificados nem, por sua vez, indicou quais os concretos meios de prova que sustentavam a sua pretensão, e consequentemente, qual a decisão que em conformidade deveria ter sido proferida; 6.ª - Ademais, o Tribunal da Relação escudado na contradição factual indicada pelo STJ, não deixou de, oficiosa, escamoteada e obscuramente, mantê-la, na medida em que manteve a conclusão dada à resposta conjunta aos artigos 23.º e 24.º da base instrutória – «A levada que hoje delimita os dois prédios terá de ser necessariamente aquela que sempre os delimitou, ou seja, a referida levada de … ou … assinalada a azul-escuro na planta de localização de fls. 706» - e, em conformidade alterou o segmento decisório da sentença da 1.ª instância – ocupação pelos R.R. de uma parcela do prédio da A. e condenação daqueles a demolir todas as construções que realizaram nessa parcela, situadas para além da referida levada restituindo à A. a parcela de terreno na situação anterior à implantação das referidas construções;- sem que, porém, desse como provada – o que não o poderia fazer é certo – a matéria que havia sido dada como não provada pela 1.ª instância, vertida nos pontos 11.º, 12.º, 15.º, 17.º e 19.º da base instrutória; 7.ª- Na verdade, o que a Relação parece não ter percebido ou não quis perceber é que a contradição factual a que faz menção o acórdão do STJ não é entre a matéria vertida nos quesitos 11.º, 12.º, 15.º, 17.º e 19.º da base instrutória, então dados como não provados e a resposta conjunta aos pontos 23.º e 24.º dada pelo tribunal da 1.
a instância, mas antes entre aquela matéria dada como não provada e a matéria de facto alterada pela Relação no acórdão proferido em 19.10.2017 - e por este mantida no acórdão recorrido proferido em 15.11.2018 - «A levada que hoje delimita os dois prédios terá de ser necessariamente aquela que sempre os delimitou, ou seja, a referida levada de …...
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