Acórdão nº 739/13.0TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Julho de 2019
Magistrado Responsável | ROSA RIBEIRO COELHO |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I - O Condomínio do Empreendimento AA, em …, representado pela sua Administração, propôs contra BB - Fundo de Investimento Fechado e CC - Construções, S.A., hoje DD - Engenharia, S.A., a presente ação declarativa, pedindo a condenação dos réus: - a reparar os defeitos identificados na petição inicial e, caso não procedam a tais reparações no prazo máximo de 90 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, a pagar uma indemnização de montante igual ao que o A. razoavelmente tenha de despender com terceiros para proceder a tais reparações, em montante a liquidar; - a pagarem-lhe as despesas em que o autor já incorreu, no valor de € 27.212,67, e nas que virá a incorrer com a eliminação dos defeitos que necessitam de reparação urgente e não possam aguardar pelo decurso do pleito, no montante que se vier a apurar na pendência da causa.
Alegou, em resumo, que, tendo o 1º réu promovido a construção do empreendimento AA, em …, e a 2ª ré procedido à sua construção, a pedido do primeiro, nele se revelaram anomalias resultantes da não conclusão das obras, da sua conclusão defeituosa e até de vícios ocultos, entretanto detetados, não tendo o empreendimento as qualidades asseguradas pelo 1º réu, e tendo-se registado ainda a necessidade de proceder a reparação urgente, no que despendeu € 27.212,67.
Contestaram os réus defendendo a improcedência da ação, quer por falta de fundamento do direito invocado, quer por caducidade do mesmo.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, julgando improcedente a exceção da caducidade arguida, condenou os réus a: a) procederem à reparação dos defeitos identificados nas partes comuns dos edifícios e elencados nos factos provados, com exceção relativamente à 2ª ré dos descritos nos factos nºs 855 e 856 dos factos provados; b) caso não procedam às reparações no prazo máximo de 90 (noventa) dias a contar do trânsito em julgado da sentença, pagar uma indemnização ao autor de montante igual ao que este razoavelmente tenha de despender com terceiros para proceder a tais reparações, em montante a liquidar em incidente de liquidação; c) pagarem as despesas em que o autor já incorreu, no valor a liquidar em incidente relativamente ao sinistro com a válvula referido nos factos nºs 835 a 837), e aquelas em que virá a incorrer com a eliminação dos defeitos que necessitam de reparação urgente e não possam aguardar pelo decurso do pleito, em montante que vier a ser apurado em incidente de liquidação.
Do mais que era pedido foram as rés absolvidas.
Apelaram ambos os réus, tendo a Relação de Lisboa proferido acórdão que julgou improcedente a apelação do réu BB e parcialmente procedente a da ré DD, excetuando ainda, quanto a esta, na condenação referida em a), todos os demais defeitos que respeitem a trabalhos não previstos a seu cargo no “Contrato de Empreitada - Acabamentos dos AA em …” celebrado em 18.1.2007 entre a 1ª a 2ª Ré e fazendo constar, na condenação referida em c), a seguinte restrição: “(…) sem prejuízo, quanto à 2ª Ré DD, do referido na alínea a)”.
Desta decisão vem interposto por esta ré recurso de revista excecional fundado na contradição entre o acórdão recorrido e um acórdão deste STJ proferido em 29.5.2012 quanto ao regime das responsabilidades do promotor/vendedor de imóvel e do empreiteiro perante o terceiro comprador.
Nas alegações que apresentou, pedindo a revogação do acórdão recorrido e a sua absolvição do pedido, formula as conclusões que seguidamente se transcrevem: 1 - A questão de direito no acórdão recorrido e no acórdão-fundamento (acórdão do S.TJ. de 29-05-2012, proferido no processo 392/2002.P1.S1 e publicado em www.dgsi.pt) é exatamente a mesma: o regime da responsabilidade do promotor/vendedor do imóvel e do empreiteiro perante o terceiro comprador do imóvel.
2 - O acórdão recorrido decide esta questão de direito nos seguintes termos: as obrigações do promotor/vendedor e do empreiteiro perante o terceiro são solidárias; processualmente, entre ambos há solidariedade.
3 - Por sua vez, o acórdão-fundamento decide-a nos seguintes termos: as obrigações do promotor/vendedor e do empreiteiro perante o terceiro não são solidárias; processualmente, entre ambos há coligação.
4 - Destas diferentes soluções decorre que, para o acórdão recorrido, as questões relativas às relações entre o dono da obra/vendedor e o empreiteiro são irrelevantes para a sua responsabilização perante o terceiro comprador do imóvel - a sua responsabilidade é solidária (com a única ressalva de que o empreiteiro só responde pelas obras que tenha executado).
5 - Contrariamente, para o acórdão-fundamento, as obrigações do empreiteiro e do dono da obra/vendedor perante o comprador não são solidárias, pelo que respondem em termos diferentes, de onde decorre que, se não se verificarem relativamente ao empreiteiro os pressupostos de responsabilidade, este não será responsável perante o terceiro.
6 - Está assim verificada a contradição de julgados, devendo a presente revista ser admitida.
7 - Contra a Recorrente, na qualidade de empreiteira, o Recorrido, na qualidade de terceiro adquirente do imóvel, exerce na presente ação os alegados direitos que têm fonte no art. 1225°, n.° 1, do C.C.; 8 - Perante o credor terceiro adquirente, os deveres do vendedor do imóvel com defeitos e os deveres do empreiteiro que construiu esse imóvel com esses defeitos são uma pluralidade de obrigações independentes, representando uma mera coincidência de fins das prestações fundadas em direitos de origem e fundamento diversos, não sendo as duas responsabilidades solidárias; 9 - Assim, ao terceiro adquirente podem assistir direitos sobre o dono da obra que lhe não assistem sobre o empreiteiro; e os direitos que não assistem ao dono da obra sobre o empreiteiro também não poderão assistir ao terceiro adquirente; 10 - Ao entender que a lei concede ao terceiro adquirente o direito de poder peticionar a reparação dos defeitos também contra o empreiteiro/construtor, sendo alheio aos litígios que possam existir entre o promotor e construtor, o acórdão recorrido incorre em erro de direito; 11 - In casu, provou-se que: 850) O 1º réu procedeu à retirada do “deck" da piscina para proceder a reparações na piscina e procedeu à sua recolocação após as reparações na piscina.
851) O 1º réu procedeu a reparações nos pilares existentes no pátio interior do piso 0.
852) O 1º réu procedeu à remoção e substituição de uma faixa do pavimento em ardósia correspondente a cerca de 5 a 10% da totalidade da área do pátio.
12 - Consequentemente, a respeito destas obras, o dono da obra perdeu todos os seus direitos sobre o empreiteiro, pelo que o Recorrido não goza de quaisquer direitos sobre a Recorrente relativamente a estes trabalhos, a qual deveria ter sido absolvida dos pedidos relativamente a eles; 13 - É facto constitutivo dos direitos do comprador sobre o empreiteiro, como os que o Recorrido invoca na presente ação sobre a Recorrente, que o comprador tenha denunciado os defeitos e exigido ao empreiteiro a sua eliminação; 14 - No caso, o Recorrido não alegou nem provou nem provou essa denúncia, pelo que os pedidos que formulou contra a Recorrente deveriam ter sido julgados improcedentes; 15 - Em face do exposto, o Tribunal a quo violou, além das disposições legais anteriormente citadas, o disposto nos arts. 1225°, 1220, 1221°, 1223°, 1224°, 236°, 238° e 798° do C.C.
Contra-alegaram o condomínio autor e o réu BB a defender o acerto da decisão impugnada.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
Na crítica que dirige ao acórdão impugnado a recorrente suscita, em resumo nosso, as seguintes questões: - Apesar de coincidentes no seu conteúdo, os direitos sobre o vendedor/dono da obra e sobre o empreiteiro concedidos ao adquirente pelo art. 1225º, nº 1 do CC têm fundamentos diversos, pelo que as correlativas obrigações não são solidárias – conclusões 7ª e 8ª; - O adquirente não detém sobre o empreiteiro direitos que o dono da obra haja perdido sobre este no tocante a trabalhos pelo mesmo levados a cabo – conclusões 9ª a 12ª; - Sendo elemento constitutivo desses direitos do adquirente sobre o empreiteiro a denúncia dos defeitos e o pedido da sua eliminação, e não sendo alegada nem provada essa denúncia, os pedidos deviam ter sido julgados improcedentes – conclusões 13ª e 14ª.
II – Vem julgada como provada a seguinte factualidade: 1) O “Condomínio do Empreendimento AA” constituiu-se formalmente em 22.04.2010, conforme consta da “Ata” cuja cópia consta a fls. 123 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
2) O condomínio do empreendimento “AA” abrange vários edifícios cuja construção foi promovida pelo 1º réu.
3) Com data de 18.01.2007, a sociedade gestora do 1º réu, como representante do dono da obra, e a 2ª ré, na qualidade de empreiteiro, subscreveram o instrumento particular denominado “Contrato de Empreitada. “Acabamentos dos AA em …”, cuja cópia consta a fls. 1050/1076 (vol. V), cujo teor se dá por reproduzido, onde consta, para além do mais, “(…). É, livremente e de boa fé, celebrado e reciprocamente aceite o presente contrato de empreitada, o qual se regula pelos considerandos e cláusulas seguintes e demais documentação anexa, supra e a seguir referenciada, e que deste contrato faz parte integrante. Cláusula 1ª (Objeto da Empreitada): 1. O dono da obra adjudica ao empreiteiro, que aceita, a empreitada designada por “Acabamentos dos AA”, de acordo com a proposta do empreiteiro e constante do Anexo II ao presente contrato, definida e especificada de acordo com os documentos a seguir listados, (…). 3. O dono da obra indicará e suportará o custo perante a CC dos subempreiteiros que irão efetuar na obra os trabalhos e/ou fornecimentos a seguir indicados: a) Fornecimento e montagem de caixilharias e vidros exteriores pela EE (…), que inclui a responsabilização da CC nos termos contratuais e legais pelos trabalhos e prazo deste subempreiteiro; b) Fornecimento dos...
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Acórdão nº 1451/16.4T8MTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2022
...[15] Cf. acórdãos do STJ de de 31 de Maio de 2016 — processo n.º 721/12.5TCFUN.L1.S1 — e de 11 de Julho de 2019 — processo n.º 739/13.0TVLSB.L1.S1. [16] Cf. acórdão do STJ de 11 de Julho de 2019 — processo n.º 739/13.0TVLSB.L1.S1: “os danos a ressarcir são resultantes apenas da actuação do ......
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Acórdão nº 1451/16.4T8MTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2022
...[15] Cf. acórdãos do STJ de de 31 de Maio de 2016 — processo n.º 721/12.5TCFUN.L1.S1 — e de 11 de Julho de 2019 — processo n.º 739/13.0TVLSB.L1.S1. [16] Cf. acórdão do STJ de 11 de Julho de 2019 — processo n.º 739/13.0TVLSB.L1.S1: “os danos a ressarcir são resultantes apenas da actuação do ......