Acórdão nº 50/17.8T8LRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ABREU
Data da Resolução12 de Setembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO AA - Viagens e Turismo, Lda. instaurou contra BB - Transportes Terrestres de Passageiros, Lda., acção declarativa, de condenação, com processo comum, formulando o seguinte pedido: - A resolução do contrato de compra e venda referente à viatura pesada de passageiros matricula ...-...-RA, e a favor da A., sendo assim o mesmo considerado totalmente sem qualquer efeito, devendo a Ré ser condenada à entrega da mesma viatura à Autora no estado em que se encontra; - A condenação da Ré no pagamento da indemnização de €97.369,49 (noventa e sete mil trezentos e sessenta e nove euros e quarenta e nove cêntimos), por perdas e danos sofridos pela Autora, acrescido de juros legais vencidos contados a partir da citação; - Condenação da Ré a consentir na venda da viatura matrícula ...-...-RA, para pagamento da referida indemnização, ou outra fixada nos autos, e no mais que for devido, tudo nos termos do art.º 18º n.º 1 do Decreto-Lei 54/75, uma vez que a Autora é a titular do registo de reserva de propriedade; Subsidiariamente, caso tal não se entenda: - A condenação da Ré no reconhecimento da resolução do contrato, na entrega do veículo, e no consentimento da venda do mesmo acrescido do pagamento da restante parte do preço em dívida, referente ao preço do contrato no montante total de €27.668,12 (vinte e sete mil seiscentos e sessenta e oito euros e doze cêntimos) sendo €22.134,50 de capital e €5.533,62 (cinco mil quinhentos e trinta e três euros e sessenta e dois cêntimos) de juros vencidos até 05/01/2017, desde Setembro de 2010, acrescido dos vincendos a partir da mesma data, calculados à taxa de juros legais (4%) até integral pagamento.

Articulou, com utilidade: Em 20-05-2006, vendeu à Ré o veículo automóvel com a matrícula ...-...-RA, pelo preço de €96.800,00, a que acresceu o valor de €10.000,00 a título de encargos, tendo ambas acordado que após a entrada inicial de €35.000,00 e descontado o valor dos serviços de transporte da Requerente para a Requerida, no valor de €2.900,50, o remanescente do preço seria pago em 35 prestações mensais de €2.000,00.

Ambas as partes acordaram a constituição de reserva de propriedade a favor da Requerente, devidamente registada.

Em 24-01-2008, a Requerida devia à Requerente o montante de 48.974,51€, sendo que após essa data apenas pagou à Requerente a importância de 23.000,00€, tendo-lhe igualmente pago em serviços de transporte o valor de €3.840,01.

A Autora interpelou a Ré em 11-10-2011, para que a mesma pagasse o valor do débito atrás referido em oito dias, ou seja até ao dia 19-10-2011, e a mesma apesar do referido prazo nada fez, e nada mais pagou ou quis pagar.

Regularmente citada, contestou a Ré, outrossim deduziu reconvenção.

Pediu a improcedência da acção, e a condenação da Autora no pagamento de €22.533,56 por prejuízo decorrente da apreensão do veículo e como litigante de má-fé em multa e indemnização.

A Autora replicou pedindo a improcedência da reconvenção, formulando pedido de condenação da Ré por má-fé.

Calendarizada e realizada a audiência final, foi proferida sentença, em cujo dispositivo se consignou: “Julgar a presente ação totalmente improcedente, por não provada, e em consequência, mais decide: 3.1. Absolver a Ré BB - Transportes Terrestres de Passageiros, Lda, da totalidade dos pedidos formulados pela Autora AA - Viagens e Turismo, Lda.; 3.2. Julgar improcedentes ambos os pedidos de condenação das partes como litigante de má-fé e consequentemente: 3.2.1. Absolver a Autora do pedido de condenação, em multa e indemnização, como litigante de má-fé, a esse título formulado pela Ré; e 3.2.2. Absolver a Ré do pedido de condenação, em multa e indemnização, como litigante de má-fé, a esse título formulado pela Autora.” Inconformada, a Autora/AA - Viagens e Turismo, Lda. recorreu de apelação, tendo o Tribunal a quo conhecido do interposto recurso, proferindo acórdão em cujo dispositivo foi consignado: “Termos em que se julga o recurso parcialmente procedente e, consequentemente, se condena a ré a apagar à autora a quantia de 22.134,50€, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, já vencidos, desde 11.10.2011, bem como o valor de €569.49 acrescida dos juros de mora vencidos desde a citação; e, sobre ambas as quantias, os juros de mora vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Custas na proporção da presente sucumbência.” É contra esta decisão que a Ré/BB - Transportes Terrestres de Passageiros, Lda., se insurge, interpondo recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: “1 - Inconformada com a decisão da primeira Instância que absolveu a Ré dos pedidos, a A. recorreu para a Veneranda Relação de Coimbra, requerendo a alteração da decisão sobre a matéria de facto e a procedência da acção; 2 - Vindo a Veneranda Relação de Coimbra, inverter a decisão da Primeira Instância, e a condenar a ora Recorrente parcialmente no pedido.

3 - Quanto à decisão sobre a matéria de facto, a Recorrida veio invocar existir contradição entre os factos 4 e 7 provados, estando bem a Relação de Coimbra ao confirmar a decisão da Primeira Instância, fundamentando a decisão com o Doc. 3 junto com a Contestação 4 - Atendendo ao ponto 13 dos factos provados a Veneranda Relação de Coimbra substitui “Por algumas vezes” por “ bastas vezes”, não podendo a Relação com esta alteração e atendendo aos documentos juntos - folhas 116 a 145 - alterar totalmente a decisão da Primeira Instância, como constataremos quando tratado o direito á resolução do contrato.

5 - Tendo sido aditado aos factos provados o facto 19, esclarecesse que este sempre foi assumido pela R., e conclui-se dos demais factos provados.

6 - Relativamente ao aditamento do ponto 20 dos factos provados, mal decidiu a Veneranda Relação, pois a providência decretada foi revogada, determinando o levantamento da apreensão do veículo pesado de passageiros - circunstância que deu origem ao valor descrito naquele novo facto aditado - com custas pela Requerente, sendo essa despesa imputada à mesma.

7 - Já no âmbito do direito à resolução a Veneranda Relação de Coimbra afasta o argumento da Primeira Instância que entendeu que a disponibilidade da R. para prestar os serviços anuídos no contrato estaria dependente de “prévio acordo das partes quanto á disponibilidade por parte da R. e quanto ao preço acordado entre ambos...”, e entende existir incumprimento definitivo por parte da Ré.

8 - Ora, contrariamente ao decidido pela Relação de Coimbra, a R. alega e prova exaustivamente o argumento da Primeira Instância, como acontece com os seguintes documentos nunca impugnados: 9 - Cláusula I) do Contrato junto como Doc 1 da PI - “obrigando-se a primeira a fazer um planeamento antecipado de pelo mesmo quinze dias”; 10 - Fax da A. para a R. de 30.01.2008 - junto como Doc 3 da Contestação - “ o restante do montante de €.25.974,51, que será efectivado em serviços, a fornecer da V. empresa á nossa mediante requisição prévia.”; 11 - Solicitação de Serviços por fax de 10.09.2007 e 13.09.2007 para iniciar a realização de serviços 1 dia depois - conforme fls. 4, 5, 8 do requerimento junto com data certificada do citius de 13.03.2018 e a referência 4752229; 12 - Solicitação de Serviços por fax de 09.10.2007 para iniciar a realização de serviço 2 dias depois (para todo o ano lectivo de 2007/2008) - conforme fls. 18 do mesmo requerimento.

13 - A Ré com vista ao cumprimento do contrato e para poder realizar os serviços, exigiu que constasse da Cláusula I) do contrato junto como Doc 1 da PI “obrigando-se a Primeira a fazer um planeamento antecipado de pelo menos quinze dias”, o que a A. Acedeu.

14 - Contrariamente, a atitude da A. sempre foi no sentido de falsear um incumprimento por parte da Ré, e em 12/09/2011, vem requer a Notificação judicial Avulsa da Ré, para esta devolver a viatura e pagar o montante em falta de €.22.134,50.

15 - E, 6 anos depois requer a apreensão do veículo através de procedimento cautelar.

16 - Mas, ignora e omite a carta remetida pela Ré em resposta à Notificação judicial Avulsa - junta como Doc. 7 da PI, onde esta interpela a A. para requisitar serviços nos próximos 6 meses e assim pagar Ré cumprir com o que estava obrigada.

17 - Sendo que, a A. nunca respondeu à mesma nem solicitou serviços.

18 - Assim decidiu bem a primeira Instância concluindo pela inexistência de uma recusa de cumprimento por parte da R., pois as partes contratualmente fizeram depender o cumprimento da prestação pela R. em prestação de serviços de transportes, solicitados pela A., dependendo os mesmos de um prévio acordo das partes, quanto à disponibilidade por parte da R. e quanto ao preço acordado entre ambos, de acordo com os ditames da boa-fé.

19 - A Veneranda Relação de Coimbra ao justificar o direito á resolução face à destruição do vínculo, assenta em erro sobre a prova produzida e a realidade dos factos.

20 - A alegada mora da Recorrente não se traduz em incumprimento definitivo, a mesma não se recusou absoluta, peremptória e definitivamente a cumprir a prestação, e até interpelou a A., fixando-lhe o prazo razoável de 6 meses para a solicitação dos serviços e o cumprimento final do contrato.

21 - A existir perda de interesse na prestação por parte da A., ser-lhe-ia imputável, pois não cumpriu o contrato, não solicitando com a antecedência necessária e acordada, e quando interpelada para o fazer, nada fez.

22 - Contrariamente a A. nunca interpelou admonitoriamente a R. para a cumprimento da prestação de serviços, nem da cominação da mora.

23 - Pois o que fez, foi a Notificação Judicial Avulsa, interpelando a Ré para em 8 dias pagar €22.134,50.

24 - Estando assente (4 e 7 factos provados) que o pagamento seria em prestação de serviços, não era legítimo á A. solicitar o pagamento dessa quantia e ainda menos se poderia considerar razoável esse prazo.

25 - Não colhendo assim o direito á resolução por parte da A. com fundamento no incumprimento definitivo.

26 - Já a R. provou que o incumprimento...

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