Acórdão nº 2604/15.8T8LRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelROSA RIBEIRO COELHO
Data da Resolução12 de Setembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I - AA e BB intentaram contra o Município de … a presente ação declarativa, com processo comum, pedindo a condenação deste: a) A indemnizar os autores em € 500.000,00 acrescidos de juros calculados à taxa legal, contados desde a data da notificação do réu para a ação especial de fixação do prazo; Subsidiariamente, b) A entregar aos autores no 1.º piso do Bloco os 200 m2 de área, um espaço dividido em duas ou três frações, sendo uma delas destinada a restaurante, frações essas devidamente aprovadas pelo réu e aceites pelo coletivo de condóminos do edifício, dotadas das acessibilidades combinadas e inicialmente projetadas, dos devidos acabamentos e expurgadas de elementos nocivos como o da passagem indevida de esgotos e providas das necessárias condutas de evacuação de fumos e gazes e do mais a que se faz referência na causa de pedir.

Alegaram, em síntese, o seguinte: - A partir do ano de 2004 os autores e o réu, por iniciativa deste, iniciaram negociações para a permuta de dois imóveis pertencentes aos autores com um espaço de um prédio a construir na Av. …, em …, propriedade do réu; - Por avaliação foi atribuído a cada uma das prestações a permutar o valor de 500.000 €; - Nessas negociações, além do mais, foi acordado que o espaço cuja propriedade seria transmitida para os autores situar-se-ia no primeiro andar do prédio a construir, seria virado para a Rua …, seria subdividido em duas ou três frações, facto a decidir no momento da constituição da propriedade horizontal e que a maior parte do espaço seria destinada à instalação de um restaurante.

- No projeto do prédio a construir onde se situaria esse espaço constava a previsão de umas escadas exteriores e de um elevador de acesso exclusivo ao 1.º andar; - Em 22.12.2008 foi celebrado um contrato-promessa de permuta entre os autores e o réu, dele constando na cláusula 3.ª que o Réu promete dar aos autores e estes prometem aceitar, uma fração autónoma com a área de 199,636 m2 no piso um, pertencente ao réu, de um prédio em construção numa parcela sita na Av. …, inscrita na Conservatória do Registo Predial a favor da sociedade CC - Investimentos Imobiliários, S.A., com o valor de € 499.090,00.

- Em 2011, já após a constituição da propriedade horizontal deste prédio pela CC em 16.6.2010, os autores tomaram conhecimento de que, devido a alterações introduzidas no projeto de construção deles conhecido e com base no qual ocorreram as negociações preliminares, o espaço a permutar no 1.º andar integrava uma única fração, que se haviam suprimido as escadas exteriores e o elevador de acesso exclusivo ao 1.º piso e que nem toda a área da fração a permutar estava virada para a Rua …, com o que ficou significativamente desvalorizado o espaço que constituiria a contraprestação camarária. - E em 21.3.2015 quando os autores visitaram o espaço a permutar verificaram as seguintes situações: as canalizações de esgotos vindas dos andares superiores atravessavam o interior daquele espaço, coladas ao teto; por cima das vidraças que fazem de empena existiam espaços ocupados por grelhas de alumínio em que as réguas são paralelas, inamovíveis, permitindo sem cessar a entrada e saída de ar quente ou frio; o espaço não estava pavimentado; os tetos não estavam rebocados; as casas de banho estavam incompletas; não havia tubagem para exaustão de gases e fumos a partir do primeiro piso ou tal tubagem não estava disponível para esse piso.

- O réu incumpriu o acordado nas negociações que antecederam a celebração do contrato-promessa, nunca tendo informado os Autores das alterações ocorridas.

Contestou o Réu, alegando, em síntese, o seguinte: - O direito a indemnização invocado pelos Autores encontra-se prescrito, uma vez que estes, já desde 2011, conhecem os factos que fundamentam esse direito; - O Réu apenas se comprometeu a deixar a fração a permutar em condições de ser subdividida, o que acontece; - A fração em apreço está voltada para a Av. …; - O Réu não se comprometeu a que a fração se destinasse à instalação de um restaurante; - O valor dos bens a permutar foi calculado em € 499.090,00.

- A fração em causa destina-se a comércio e serviços, tendo sido sempre este o destino acordado para essa fração; - A supressão das escadas exteriores para o 1.º andar resultou de uma alteração do projeto ocorrida em 21 de Junho de 2007 anterior à outorga do contrato-promessa; - O Réu prestou-se a edificar umas escadas e um elevador exterior de acesso ao 1.º andar; - O elevador interior de acesso ao 1.º andar não foi suprimido, encontrando-se instalado; - As canalizações de esgotos e a parte de cima das vidraças estão edificadas no estrito cumprimento da lei, estando licenciadas; - O Réu desde sempre se comprometeu a pavimentar a fração, a rebocar os tetos e a concluir as casas de banho de acordo com as instruções dos Autores; - O Réu já marcou a realização da escritura de permuta, à qual os Autores não compareceram; Pediu a improcedência da ação e, em sede de reconvenção, pediu a execução específica do contrato-promessa celebrado.

Os Autores replicaram e pediram a condenação do réu como litigante de má-fé e houve resposta do réu.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que: - julgou procedente a exceção da prescrição do direito de indemnização invocado pelos autores, absolvendo o réu do correspondente pedido.

- declarou o pedido subsidiário ininteligível e, julgando verificada a respetiva exceção dilatória, absolveu o réu da instância relativamente a ele.

- julgou procedente a reconvenção e, em consequência, decretou a execução específica do contrato-promessa de permuta celebrado entre os autores e o réu.

Os autores apelaram, tendo o Tribunal da Relação de Coimbra proferido acórdão onde se decidiu: “- julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelos Autores; - revogar-se a decisão recorrida na parte em que julgou procedente a excepção de prescrição e, em consequência, absolveu o Réu do pedido indemnizatório formulado pelos Autores; - revogar-se a decisão recorrida na parte em declarou o pedido subsidiário ininteligível e julgou verificada a excepção dilatória da nulidade, tendo absolvido o Réu da instância; - julgar improcedente a excepção da prescrição deduzida pelo Réu; - determinar, se possível pelo mesmo juiz, a fixação dos factos provados e não provados relativos aos pedidos formulados pelos Autores, e o julgamento do pedido indemnizatório formulado pelos Autores e, no caso de improcedência deste, o julgamento do pedido subsidiário.

- julgar improcedente o recurso interposto pelos Autores na parte em que pretendia que este tribunal de recurso desse provimento às suas pretensões.

” Contra tal acórdão trouxe o réu a presente revista, tendo apresentado alegações onde formula as conclusões que passamos a transcrever: I - O D. Acórdão recorrido viola o disposto nos artigos 227º, nº 2, 913º e seguintes, 410º, nº 1 e 939º, todos do Código Civil, bem como os artigos 674º, nº 1, alínea a), 186º, nº 2 al. a), 196º, 200º, nº 2, 577º al. a) e 576º, nº 2, todos do C.P.C..

II - Em sede de D. Acórdão, de que ora se recorre, o Tribunal recorrido alterou o regime aplicável aos factos em apreço nos presentes autos, entendendo que seria aplicável o regime previsto para a venda de coisas defeituosas, por força do princípio da equiparação do regime do contrato prometido ao contrato-promessa - art. 410º, nº 1, do C. Civil - e da aplicação das regras de compra e venda aos contratos de permuta, conforme prevê o art. 939º do C. Civil, ao invés do regime previsto para a responsabilidade pré-contratual.

III - Entendeu o Tribunal recorrido que, da leitura da causa de pedir descrita pelos Autores na sua Petição Inicial, não resulta estar-se perante a descrição de uma situação que possa ser juridicamente qualificada como erro na celebração de um contrato-promessa de permuta, resultante de incumprimento de deveres de informação na fase pré-contratual que possa dar origem a um direito de indemnização, nos termos do artigo 227º do Código Civil.

IV - Não obstante o Recorrente não ter violado qualquer dever pré-contratual, porquanto agiu de boa-fé em sede de negociações com vista à celebração do contrato-promessa de permuta, contrato-promessa este que reproduz a real vontade das partes, bem como não violou qualquer dever de informação ou confiança, certo é que os Autores alicerçam a sua causa de pedir precisamente na violação destes deveres.

V - Os Autores, em sede de Petição Inicial, bem como em sede de Alegações de Recurso, alegam factos que, na sua perspectiva, fariam incorrer o ora Recorrente em responsabilidade pré-contratual. É com base nesta qualificação jurídica que constroem a sua acção, bem como fundamentam o seu pedido.

VI - O aqui Recorrente defendeu-se por excepção e por impugnação, tendo por base os factos alegados pelos Autores na sua Petição Inicial, bem como pela qualificação jurídica que os Autores configuraram àquela factualidade.

VII - Parte da factualidade alegada pelos Autores é anterior à outorga do contrato-promessa. Os Autores alegam que o Réu Município de … produziu alterações ao projecto do prédio em apreço em momento anterior à outorga do contrato-promessa, designadamente a supressão de escadas exteriores de acesso exclusivo ao primeiro andar. E que tal alteração consubstanciaria a violação de um dever de informação, logo, responsabilidade pré-contratual.

VIII - Não obstante o Recorrente entender que não assiste razão aos Autores, certo é que os factos alegados pelos Autores configurariam uma hipotética...

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