Acórdão nº 1713/18.6T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução12 de Setembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 1713/18.6T8STR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo Central de Competência Cível de Santarém – J3 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: Na presente acção declarativa proposta por (…) contra “Banco BIC Português, SA”, esta instituição bancária veio interpor recurso da sentença proferida.

* A Autora invoca que procedeu à aplicação de uma verba de € 50.000,00 num produto comercializado pelo “BPN – Banco Português de Negócios, SA”, que julgava equivalente a um depósito a prazo, mas que redundou na subscrição de obrigações subordinadas "SLN – 2006", sem que de tal se apercebesse.

* Devidamente citada, a Ré contestou, defendendo-se quer por excepção [arguindo, entre outras, a excepção de prescrição], quer por impugnação.

* Na tese da Ré, a Autora ficou suficientemente elucidada a respeito do produto financeiro subscrito e assim nunca poderia ser assacada responsabilidade à entidade bancária que simplesmente intermediou a subscrição das obrigações e não é o sujeito emitente das obrigações.

* Realizado o julgamento, o Tribunal «a quo» decidiu condenar a sociedade Ré “Banco BIC Português, SA” a pagar à Autora a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde 04/09/2018, até integral pagamento.

* A instituição bancária recorrente não se conformou com a referida decisão e na peça de recurso apresentou as seguintes conclusões: «1. Por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode de modo algum concordar, sendo que a presente decisão veio surpreender sobremaneira o aqui Recorrente, pois que, considerando o Tribunal Recorrido a presente acção parcialmente procedente, não julgou corretamente.

2. Com tal decisão, a Mm.ª Juiz a quo violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos artigos 7º, 290º, nº 1, alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D do CdVM; 4º, 12º, 17º e 19º do DL nº 69/2004, de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE; 220º, 232º e 236º, 483º e ss., 595º e 615º do C.C; 615º, nº 1, alínea e), do CPC.

3. Apesar da natural e compreensível consternação que é possível observar das peças apresentadas a juízo pela Autora, importa lembrar que a pretensão pela mesma deduzida se encontra despida de qualquer fundamento provatório, bem como factual, além de ser manifestamente mal direcionada contra o Banco Réu.

4. Certo é que o Banco Réu, tal qual estava obrigado, prestou à Autora informações completas, verdadeiras, actuais, claras, objectivas e lícitas (nos termos e para os efeitos do artigo 7º do Código de Valores Mobiliários), quanto às obrigações por estes subscritas, dando cumprimento não só à lei, mas também a uma política de transparência e de confiança pela qual sempre se pautou.

5. Da prova produzida resulta, sem margem para dúvidas, que a Autora sabia perfeitamente o que estava a subscrever, bem sabendo também das semelhanças e diferenças entre o instrumento financeiro subscrito e a figura do depósito a prazo (note-se que o próprio tratamento fiscal de um e de outro instrumento é inclusive diverso). Mas a “estranha” construção deste argumento ganha novas dimensões, se considerarmos o facto de a Autora nunca ter reclamado de qualquer dos extractos bancários recebidos, onde o investimento em juízo aparecia referenciado individualmente tal e qual como fora realizado – e nunca enquanto depósito a prazo! –, bem como da ausência de qualquer reclamação junto do funcionário bancário que, alegadamente, lhe teria vendido um instrumento financeiro diverso do por si pretendido – é de facto estranho que tal intervenção junto do funcionário indicado nunca tenha ocorrido, pois se o sentimento de revolta era tal, cremos que sempre ditariam as regras comuns que a Autora diligenciasse pelo contacto com o referido vendedor, o que nunca aconteceu.

6. O Apelante entende, assim, que os factos dados como provados nos números “2, 4, 5, 6, 7 e 8” não deveriam constar do corpo da Sentença nos termos ali propostos, em face da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento. Nestes termos, é o Banco Apelante de pugnar pela alteração de tais números, de acordo com a redação adiante proposta.

7. Por um lado, o facto que tem que ver com o e-mail junto aos autos com a petição inicial. É que, cremos, ser fatal ver nesse e-mail qualquer facto que possa servir de motivação a estribar uma putativa condenação do Banco Apelante. De facto, através de um olhar minimamente atento ao teor do mesmo ressaltam, imediatamente, dois importantes fatores: (i) o produto em questão no mesmo é “Papel Comercial da SLN Valor, SGPS, S.A.” e, portanto, escusado será dizer que se trata de um produto diferente do que aquele que é tratado no caso sub judice, que são Obrigações SLN; (ii) tal e-mail é datado de 26 de Julho de 2008 e, assim, temporalmente por muito posterior à subscrição do produto em causa (2006), pelo que, ver em tal “documento” qualquer proximidade de informação a prestar, sempre se dirá que incorre em erro manifesto. Sempre se concluindo pela impossibilidade objectiva de valorar tal “documento” como fundamentador de uma convicção.

8. Por outro lado, e não menos importante, outra situação que tem bastante interesse para uma correcta decisão da causa sub judice, e que o Tribunal a quo se limitou a fazer “tábua rasa” da mesma, tem que ver com o facto de o funcionário bancário – a testemunha (…) – não se recordava de que informações é que foram (ou não) transmitidas no acto de subscrição. Referindo, até, que não poderia garantir que tivesse sido ele próprio a colocar o produto à Autora. Veja-se, corroborando com o que foi dito, o depoimento da testemunha (…), gravado no sistema CITIUS, no ficheiro com a referência 20181219154550_2785255 _2871698, nomeadamente nos minutos [05:28 a 05:45] e [09:30 a 09:45]. Pode concluir-se, então, que qualquer motivação, quanto à matéria de facto, estribada no seu depoimento, se encontraria prejudicada.

9. O produto – Obrigações SLN 2006 – terá sido vendido pela aludida testemunha, genericamente, da seguinte forma: era um produto com uma taxa favorável; com capital garantido; com liquidez garantida e vencimento em tal data. Era referindo, ainda, que a SLN era a dona do Banco. Aliás, este modus operandi de venda foi, ainda, corroborado pela testemunha (…), referindo que o produto, na sua colocação, era vendido como um depósito a prazo (embora não o sendo); era um produto garantido; tinha liquidez (este factor tinha que ver com o facto de se poder colocar noutro cliente); e ser um produto seguro.

10. Já no que concerne à garantia de capital, e aqui a testemunha (putativamente) vendedora das Obrigações SLN 2006 foi peremptória, referiu que, ao referir “Obrigações de capital garantido” não precisariam de dizer mais nada, nem se era a SLN ou o BPN. Referindo, e reiterando que, a propósito da garantia, só transmitiam que era capital garantido, até porque essa questão nem se colocava. Afirmações estas, acerca da não destrinça, ou da não positivação de quem garantia, corroboradas pela testemunha (…), que refere que o argumentário, embora dizendo que era capital garantido, não dizia especificamente quem é que o garantia.

11. Por fim, e no que tange a outros tipos de produtos que a Autora tinha, tanto a testemunha (…), que foi o gestor de conta da mesma, após 2009, referiu que, antes dessa data, a Autora teria subscrito outro tipo de produtos. Afirmação esta, aliás, corroborada pelo gestor de conta da Autora em data anterior a 2009, a testemunha (…), referindo que a mesma tinha produtos que não depósitos a prazo, como Fundos de Investimento.

12. De tudo o que vem dito, podemos afirmar com meridiana clareza que os factos dados como provados: “2, 4, 5, 6, 7 e 8” deveriam ter a seguinte redação: “2 – Em Abril de 2006, o gerente do Banco BPN, agência de (…), disse à Autora, que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido e com rentabilidade assegurada.

4 - E que por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro.

5 – O seu dinheiro, € 50.000,00, viria a ser colocado em obrigações SLN 2006, sem que a Autora soubesse em concreto o que era.

6 – O que motivou a autorização, por parte da Autora, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias 7 - A Autora actuou convicta de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo.

8 – Se a Autora tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco, e que o capital não era garantido, não o autorizaria”.

13. Os contratos de intermediação financeira implicam relações jurídicas que se estabelecem em níveis diferentes. O negócio de cobertura é o concreto contrato de intermediação financeira celebrado entre o intermediário e o cliente e que tem por objeto imediato conceder ao intermediário os poderes necessários para celebrar o negócio de execução. O negócio de execução, por seu turno, é o contrato celebrado entre o intermediário e o terceiro, no interesse e por conta do cliente (ou também o negócio celebrado directamente entre o terceiro e o cliente, com a intermediação do intermediário financeiro), e tem a maioria das vezes por objecto a aquisição, alienação ou qualquer outro negócio sobre valores mobiliários.

14. Claro está, que o dever de informação relativo ao negócio de cobertura deve ser prestado em momento anterior ao contrato de intermediação e o dever de informação relativo ao negócio de execução será cumprido já na vigência daquele, tal como sucederá, aliás, com os deveres de informação relativos aos instrumentos financeiros escolhidos! Os deveres de informação a prestar pelo intermediário financeiro, previstos no artigo 312º, nº 1, do CdVM, são os deveres de...

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