Acórdão nº 1926/17.8BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução16 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO R………. BELGIUM (doravante Recorrente) veio apresentar recurso do despacho decisório proferido a 03.04.2018, no Tribunal Tributário de Lisboa, no qual foi julgado improcedente o recurso por si apresentado da decisão de aplicação de coima, proferida pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3, no processo de contraordenação (PCO) a que foi atribuído, na fase administrativa, o n.º 30852015….. .

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “i. O presente recurso vem interposto da sentença proferida que julgou improcedente o recurso apresentado da decisão do 3.º Serviço de Finanças de Lisboa que lhe aplicou a coima no montante de €1.430,78 (mil quatrocentos e trinta euros e setenta e seis cêntimos), acrescida de €76,50 (setenta e seis euros e cinquenta cêntimos) a título de custas, no processo de contra ordenação n.º 30852015…, confirmando aquela decisão recorrida.

ii.

 sentença sob recurso decidiu pela confirmação da decisão recorrida do 3.º Serviço de Finanças de Lisboa, o que fez, ademais de outros vícios verificados na sentença em causa, sem se pronunciar sobre todas as questões suscitadas no recurso, pois que o Tribunal a quo não atendeu devidamente à motivação de facto e de direito do recurso, omitindo a decisão sobre questões essenciais invocadas pela Recorrente, decidindo pela à aplicabilidade da coima e aceitando a mensuração da mesma (sem qualquer fundamentação sustentada) - quando o objecto do recurso incluía, igualmente, a invocação i) da falta de pressupostos para a punibilidade e ii) da inobservância de requisitos legais da decisão administrativa, nomeadamente no que respeitava à determinação concreta da medida da sanção.

iii.

O Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, incorreu, simultaneamente, em omissão de pronúncia, vício de fundamentação, contradição entre os fundamentos e a decisão, erro de julgamento da matéria de facto e erro de julgamento da matéria de direito – a implicar a revogação da decisão recorrida.

iv.

Rememorando a factualidade apurada (incluindo a que destes resulta e não foi relevada na sentença recorrida) nos autos: - A Recorrente exerceu, durante determinado período de tempo – entre o primeiro trimestre de 2011 até 31-03-2015 – actividade que, do ponto de vista de IVA, está sujeita a tributação em Portugal.

- Apercebendo-se de tal factualidade, a Recorrente apresentou, em 30-10-2015, declaração de início de actividade, bem como as declarações periódicas que eram devidas e, ainda declaração de cessação de actividade reportada a 31-03-2015, - o que fez, nomeadamente relativamente ao período de tributação em causa no presente procedimento de contra-ordenação (cfr.

doc. n.º 2 com a petição), - tendo, ademais, pago o imposto em causa (cfr.

doc. n.º 3 com a petição), - o que fez à custa do seu próprio património, pois que não chegou a liquidar e cobrar do clientes dos seus clientes IVA aquando das operações que veio a integrar naquelas declarações periódicas de IVA – o que logo se compreende, até, pela data em que as declarações de início e cessação de actividade e declarações periódicas de imposto foram apresentadas.

- Foi, aplicada à Recorrente uma coima que lhe foi fixada no procedimento de contra-ordenação supra referenciado, no montante de €1.430,78, por imputada infracção prevista e punida pelo artigo 114.º n.º 2 e n.º 5 a) e 26 n.º 4 do RGIT – falta de entrega de prestação tributária dentro do prazo – relativa ao período de tributação correspondente quarto trimestre de 2012 [quando, em abstracto, a moldura sancionatória aplicada se cifrava entre €637,32 e €2.124,41, não obstante o entendimento errado da AT – aparentemente aceite pelo Tribunal a quo – de que o valor mínimo de coima aplicável seria de €1.274,64].

v.

Como se alcança da decisão recorrida, vem a ora Recorrente acusada da prática de infracção prevista e punida pelo artigo 114.º n.º 2 e n.º 5 a) e 26 n.º 4 do RGIT – falta de entrega de prestação tributária dentro do prazo – relativa ao período de tributação correspondente quarto trimestre de 2012, e a sentença recorrida julgou negar provimento ao recurso, «confirmando a decisão de aplicação de coima recorrida, nos seus exatos termos» por ter entendido que se não verificavam quaisquer dos vícios invocados pela Recorrente contra decisão de aplicação de coima em crise, «Improcedendo todos os fundamentos do presente recurso, e não se vislumbrando qualquer outro motivo de nulidade que importe conhecer oficiosamente» (sic).

vi.

O Tribunal a quo aceita a qualificação feita pela AT à conduta da Recorrente, o que, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo faz: - sem fundamentar essa qualificação; - sem apreciar (em toda a extensão) a questão suscitada pela Recorrente, de falta de pressupostos legais para a aplicação de coima; - sem considerar todos os factos provados nos autos; - incorrendo em erro de julgamento quanto à qualificação jurídica dos factos apurados nos autos (mesmo que fossem considerados apenas os factos vertidos na sentença).

vii.

É que, lendo-se a decisão recorrida, é inequívoco que o Tribunal a quo, dá como adquirida a conduta negligente da Recorrente, sem que seja apreensível qualquer fundamentação factual para essa qualificação.

viii.

Nos termos do art. 205º/1 da Constituição da República Portuguesa (CRP), “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”, e a necessidade de fundamentação, enquanto garantia integrante do próprio conceito de Estado de direito democrático (artigo 2º da CRP), prende-se igualmente com a própria garantia do direito ao recurso e tem a ver com a legitimação da decisão judicial em si mesma8, pelo que a “justiça” da decisão revê-se, assim, necessariamente, num mínimo de fundamentação factual.

[8 Ac. do TC, nº 55/85, de 25-03-1985, in Acs. do TC, 5º, págs. 467 e segs.] ix.

A sentença recorrida não contém esse conteúdo mínimo fundamentador, pelo que estamos perante uma falta de fundamentação que acarreta a nulidade da douta sentença recorrida, nos termos do artigo 374.º, nº2, CPP, ex vi art. 32.º do D.L. 433/82, de 27.10.2, Por outro lado: x.

Com efeito, na sentença recorrida, diz-se apenas (e somente a propósito da invocada violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT, no que respeita ao vício de fundamentação quanto à determinação da medida concreta da coima aplicada) que «Também no que se refere à satisfação do disposto na alínea s) do mesmo preito, se verifica estarem indicados o montante da coima fixada (próxima do mínimo legal) [o que não ocorre, como adiante se verá] e, como elementos que serviram de base à sua fixação, a imputação a título de negligência simples […]», o que o Tribunal a quo afirma sem que, no entanto, refira, afinal, com que base factual teria sido alcançado tal juízo conclusivo de imputação de culpa, naquela modalidade, à Recorrente, e sem que na decisão quanto à matéria de facto julgada provada conste qualquer factualidade de que pudesse ser retirado tal juízo de censura.

xi.

Nestes termos, verifica-se, inclusivamente, uma contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que a decisão proferida é contraditória com a decisão proferida quanto aos factos julgados provados, na medida em que haverá contradição entre os seus fundamentos e a decisão, quando os fundamentos invocados pelo Juiz conduziriam, não ao resultado expresso na decisão, mas a um resultado oposto, ou seja, quando das premissas de facto e/ou de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma conclusão oposta à que, logicamente, deveria ter extraído – como sucede in casu –, e a contradição entre os fundamentos e a decisão constitui nulidade da sentença, nos termos do disposto no artigo 410º, nº2, b) do CPP, ex vi art. 32.º do D.L 433/82, de 27.10 (ou, quando muito, pelo menos a sua anulabilidade).

Acresce que: xii.

A falta de verificação do elemento subjectivo foi expressamente invocado pela Recorrente na petição de recurso, como foi invocado o vício de fundamentação daquela decisão, na medida em que da mesma também não constava qualquer factualidade invocada de que fosse possível retirar aquele juízo de censura relativamente à Recorrente, com o que o Tribunal a quo omitiu pronúncia sobre as referidas questões – o que acarreta a nulidade da sentença, nos termos do artº 379.º, n.º 1, al. c) do CPP, ex vi do art. 32.º do D.L. 433/82, de 27.10.

Por outro lado, ainda: xiii.

Devem ser aditados à matéria de facto provada as seguintes alíneas, nos termos do artigo 431.º a) do CPP, ex vi art. 32.º do D.L. 433/82, de 27.10 [assim inseridas por ordem alfabética, por uma questão se sistematização]: A) a Recorrente exerceu, entre o primeiro trimestre de 2011 até 31-03-2015, actividade que, do ponto de vista de IVA, está sujeita a tributação em Portugal [alegado pela Recorrente sem que tivesse sido posto em causa, além de ser elemento que deveria ter sido objecto de diligências probatórias determinadas oficiosamente caso o Tribunal entendesse que haveria dúvida quanto a corresponder à verdade material, ao abrigo do principio do inquisitório, bem como considerando o princípio do in dúbio pro reu]; B) Apercebendo-se disso, a Recorrente apresentou, em 30-10-2015, declaração de início de actividade, bem como as declarações periódicas que eram devidas e, ainda, declaração de cessação de actividade reportada a 31-03-2015, o que fez, nomeadamente relativamente ao período de tributação em causa no presente procedimento de contra-ordenação [doc. n.º 2 da petição e factualidade alegada pela Recorrente sem que tivesse sido posto em causa, além de ser elemento que deveria ter sido objecto de diligências probatórias determinadas oficiosamente caso o Tribunal entendesse que haveria dúvida quanto a corresponder à verdade material, ao abrigo do principio do inquisitório, bem como considerando o princípio do in dúbio pro reu].

9 F 1) Tal pagamento foi feito à custa do próprio património da...

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