Acórdão nº 0225/12.6BEBJA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Setembro de 2019
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 11 de Setembro de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 225/12.6BEBJA Recorrentes: A………… e mulher, B………… Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 Os acima identificados sujeitos passivos recorreram para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que julgou improcedente a impugnação judicial por eles deduzida, na sequência do indeferimento do pedido de revisão da liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) que lhes foi efectuada relativamente ao ano de 2005.
1.2 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e os Recorrentes apresentaram as alegações, com conclusões do seguinte teor: «1- Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo efectuou uma errada interpretação do regime transitório consagrado no art. 5.º, n.º 1 do DL n.º 442-A/88, de 30 de Novembro para efeitos da tributação de rendimentos da categoria G em sede de IRS.
2- À data da aquisição, por sucessão, o prédio estava isento de imposto de mais-valias.
3- A AT não pode considerar que a fracção autónoma alienada em 2005, como um prédio novo e, por conseguinte, sujeito a tributação de mais-valias de acordo com o art. 10.º, n.º 1 al. a) do CIRS.
4- Os recorrentes provaram e demonstraram que o prédio foi adquirido antes de 1/1/1989 e não em 2005.
5- O Tribunal a quo, ao entender que no caso dos autos, estamos perante um prédio novo e sujeito a tributação em sede de mais-valias, fez errada apreciação e interpretação do regime transitório consagrado no art. 5.º, n.º 1 do DL n.º 442-A/88, de 30 de Novembro para efeitos da tributação de rendimentos da categoria G em sede de IRS, violando o princípio da não retroactividade, previsto no art. 103.º, n.º 3 da CRP e no art. 12.º, n.º 1 da LGT.
6- A AT não pode “escudar-se na classificação de um prédio novo” para tributar rendimentos de categoria G (mais-valias) e assim contornar a violação do princípio da não retroactividade do imposto.
7- O princípio da não retroactividade foi consagrado para transmitir segurança jurídica e confiança aos contribuintes.
8- Se a alienação da fracção autónoma em 2005 foi tributada em sede de IRS, rendimentos de categoria G (mais-valias), quando deveria estar isenta de acordo com o regime transitório consagrado no art. 5.º, n.º 1 do DL n.º 442- A/88, de 30 de Novembro, essa tributação foi exagerada e desproporcionada.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser admitido, devendo ser: a) ao ganhos com a alienação, da fracção B do prédio inscrito sob o artigo 713, não estarem sujeitos a tributação como rendimentos da categoria G (mais-valias), atento o disposto no art. 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 442-A/88; b) dado provimento ao pedido de revisão da liquidação n.º 2007 513 0046377, assim fazendo-se a Vossa costumada JUSTIÇA!».
1.3 Não foram apresentadas contra alegações.
1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso merece provimento, devendo revogar-se a sentença, julgar-se procedente a impugnação judicial e anular-se a liquidação, com a seguinte fundamentação: «Questão decidenda: legalidade da tributação em IRS das mais-valias resultantes da alienação onerosa de fracção autónoma no regime de propriedade horizontal (constituída em 2003) de prédio urbano adquirido antes da vigência do CIRS 1.Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos comerciais, industriais ou agrícolas, resultem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis (arts. 9.º n.º 1 al. a) e 10.º n.º 1 al. a) CIRS); O ganho sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor de realização (venda) e o valor de aquisição (art. 10.º n.º 4 al. a) CIRS).
O regime transitório sobre a tributação de rendimentos da categoria G, após o início da vigência do CIRS em 1 de Janeiro de 1989 estabelece, designadamente, que os ganhos que não eram sujeitos ao Imposto de mais-valias só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitam tiver sido efectuada depois da entrada em vigor do CIRS (arts. 2.º e 5.º n.º 1 DL n.º 442-A/88, de 30 de Novembro).
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No caso concreto o primeiro impugnante adquiriu o direito de propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 296 da freguesia de S. Pedro - concelho de Évora em 30.12.1983, por sucessão por morte na data da abertura da herança (factos provados A), factos não provados A) e 7.1; arts. 1316.º, 1317.º al. b) e 2031.º C. Civil) Para a determinação da data da aquisição, componente da formação das mais-valias sujeitas a tributação, são irrelevantes as posteriores vicissitudes da vida jurídica do prédio: constituição de propriedade horizontal, divisão em quatro fracções autónomas e inscrição das mesmas na matriz sob outro artigo matricial (factos provados G) I) J)); ainda que tal inscrição seja obrigatória, na medida em que cada fracção autónoma no regime de propriedade horizontal é considerada como prédio (arts. 2.º n.º 4, 12.º n.º 1 e 13.º n.º 1 al. a) CIMI).
A adesão ao entendimento da administração tributária (coonestada pela sentença impugnada), segundo o qual a data da aquisição corresponde à data da entrega da declaração modelo 129 para modificação do prédio na matriz mediante a inscrição de quatro fracções autónomas em 27.08.2003, traduzir-se-ia na validação da aquisição do direito de propriedade de modo não contemplado na lei (factos provado P) projecto de decisão considerando 15; art. 1316.º C. Civil) Neste contexto, tendo a única aquisição do direito de propriedade por modo legalmente válido sido efectuada em 30.12.1983, não estão sujeitas a tributação as mais-valias resultantes da alienação efectuada em 10.01.2005 de fracção autónoma resultante da modificação do prédio originário adquirido (art. 5.º n.º 1 DL n.º 442-A/88, 30 Novembro)».
1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.
1.6 Cumpre apreciar e decidir.
* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja deu como provados os seguintes factos: «A) Em 30/12/1983 faleceu C…………; B) Nessa sequência foi instaurado, em 13/01/1984, o processo de liquidação de Imposto sobre as Sucessões e Doações com o n.º 9718 de onde consta, além de outros, o Impugnante A…………; C) Atendendo a que, à data, o Impugnante era menor de idade foi instaurado no Tribunal Judicial da Comarca de Évora o processo de inventário obrigatório com o n.º 2/84; D) Na relação de bens apresentada no processo de liquidação de imposto n.º 9718 consta como verba n.º 20 e no processo de inventário obrigatório n.º 2/84 como verba n.º 35 como fazendo parte da herança do falecido o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 296 da freguesia de São Pedro, concelho de Évora, aí indicado com o valor de 540.000$00; E) Através de partilha, homologada por sentença em 13/04/1988, o prédio citado em D) foi adjudicado ao Impugnante; F) Em 1996 o Impugnante alienou 50% do prédio ao seu irmão D………… para tanto apresentando o conhecimento de Sisa n.º 284/276, em 01/04/1996, à ATA; G) Em 27/08/2003 foi entregue pelo Impugnante no Serviço de Finanças de Évora o modelo 129 nos termos do qual o artigo 296 foi modificado, passando a constar na matriz com quatro fracções autónomas; H) Passaram a constar como seus titulares ambos os irmãos e suas respectivas mulheres; I) Em 02/03/2004 os Impugnantes celebraram escritura de propriedade horizontal e divisão do prédio urbano antes citado em 4 fracções; J) Tais imóveis foram inscritos na matriz da mesma freguesia sob o artigo 713, fracções A a D, posteriormente inscritos sob o artigo 547; K) Em 10/01/2005 o Impugnante vendeu a fracção denominada por B do prédio urbano indicado na alínea J) pelo valor declarado de 110.000,00 €; L) Em 27/03/2007 o Impugnante apresentou a declaração modelo 3 de IRS referente ao IRS de 2005 na qual fez constar no anexo G os seguintes valores: - realização – 110.000,00 € - aquisição – 45.263,81 € - despesas e encargos – 4.971,16 €; M) Esta liquidação deu origem à liquidação n.º 5130046377, de 30/03/2007, na qual resultava imposto a pagar no valor de 5.592,36 €; N) Em 29/02/2008 os Impugnantes apresentaram pedido de revisão oficiosa de tal liquidação; O) Sobre este recaiu despacho de indeferimento, datado de 08/07/2009, proferido pela Chefe de Divisão de Administração da Direcção de Serviços do IRS, com fundamento na seguinte informação complementar após apreciação do direito de audição dos Impugnantes: “5- Analisados os argumentos expendidos, verifica-se que não são apresentados factos novos susceptíveis de alterar o sentido do projecto de despacho.
6- Apesar disso, sempre se dirá que o facto de o imóvel só ter sido registado em 1993 em nome do requerente não é, só por si, suficiente para que se considere estar perante uma injustiça grave e notória (ao contrário do alegado).
7- Também não é correcto afirmar que “a Administração Fiscal não pode infirmar que a tributação não foi exagerada ou desproporcionada só porque a matéria tributável resultou da declaração apresentada pelo contribuinte”, pois é desvirtuar os argumentos da administração, que devem ser lidos no contexto em que foram proferidos.
8- E, aquilo que se disse é que, nos termos do disposto no n.º 5 [do artigo 78.º] da LGT, se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade (de que resultará um sério dano na economia do lesado) e que tal acontece quando a administração dispõe da possibilidade legal de fixar a matéria tributável (quando a pode graduar de acordo com critérios de discricionariedade técnica).
9- Apreciado o caso concreto, verifica-se que a situação não se enquadra na previsão legal.
10- Relativamente ao acórdão citado no exercício do direito de...
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