Acórdão nº 0203/17.9BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelASCENSÃO LOPES
Data da Resolução11 de Setembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A……………. e B…………….. melhor identificados nos autos, vêm recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a impugnação por eles deduzida a liquidação de IRS referente ao ano de 2013 e respectivos juros compensatórios.

Inconformados com o assim decidido, apresentaram as respectivas alegações que resumiram nas seguintes conclusões: «1. A sentença é ilegal, por errada interpretação e aplicação do art. 5.°, n.º 2, al. h) do ClRS (e por decorrência do art. 71.°, n.º 1, al. c), do CIRS), art. 11.°, n.º 2 da LGT e parágrafo 102 da Estrutura Concetual do Sistema de Normalização Contabilístico.

  1. O “lucro” está contido na definição legal (n.º 1) e nos exemplos do n.º 2 (al h)) do art. 5º do CIRS.

  2. A noção de lucros do art. 5.º, n.º 2, aI. h) do CIRS não se “enjaula” no tipo formal (lucros distribuídos segundo as regras formais do código das sociedades comerciais), mas estende-se ao tipo funcional — distribuição informal aos sócios de qualquer valor residual gerado pela empresa (coberto ou não por um modelo jurídico típico).

  3. In casu, a entrega e distribuição aos sócios (recorrentes) de valores da sociedade, sem outra causa (não é salário, não é empréstimo...) que não a participação social — constitui um lucro (como distribuição de valor residual) — cfr. Estrutura Concetual, parágrafo 102.

  4. O sócio é tributado pelos valores residuais recebidos da empresa (lucros), seja essa distribuição deliberada formalmente ou não — sob pena, se assim não fosse, de se criar um incentivo fiscal ao incumprimento das regras do direito comercial; 6. Mas esses lucros (valores residuais distribuídos aos sócios) devem ter o mesmo regime tributário, a mesma forma de tributação, sejam ou não regulados pela lei comercial (sejam “formais” ou “informais”), pelas seguintes razões: 7. a) Consequência da incidência sobre tipos funcionais; b) manifestação do realismo do direito fiscal; c) Concretização do princípio da igualdade, capacidade contributiva e rendimento real.

  5. O art. 5.°, nº e 2, al. h) e 71.°, n.º 1, aI. c) do CIRS, se assim interpretados — como foram na sentença recorrida — são ilegais e inconstitucionais, por violação dos princípios: 9. a) Igualdade e capacidade contributiva (art. 13.° da CRP) — os lucros “informais” (tributados a taxa progressiva, até quase 50%) são mais tributados do que quem tem lucros “formais” (com taxa liberatória de 28%), não obstante revelarem a mesma capacidade contributiva.

  6. b) Rendimento real (art. 104.°, n.º 2, da CRP) — sobre tributação dos lucros “informais” (caso dos autos) face aos demais lucros — e esse excesso já não tributa o rendimento real, mas a penalização tributária de comportamentos tidos como indesejados.

  7. O “lucro” descrito na al. h) do n.º 2, do art. 5.º do CIRS deve ser interpretado no sentido de que abarca todas as distribuições aos sócios de excedentes residuais da sociedade, sejam ou não objeto do formalismo do direito societário. Abrangendo, por conseguinte, os rendimentos distribuídos aos sócios descritos nos autos.

  8. Essa interpretação é conforme: 13. Ao elemento literal (descrito na Estrutura Concetual do Sistema de normalização contabilístico) em respeito do art. 11.°, nº 2, da LGT.

  9. Ao elemento teleológico e à interpretação conforme à constituição — como referido nas conclusões 7 a 10.

  10. A sentença é ilegal porque os rendimentos (lucros informais distribuídos aos sócios) estão sujeitos: a retenção na fonte à taxa liberatória de 28% (e não a englobamento, à taxa progressiva máxima como advoga a Sentença); o sujeito passivo, porque em substituição total, é a sociedade D……………. (e não os recorrentes, como indica a Sentença [art. 28.°, n.º 3, do CIRS]).

  11. Caso o tribunal entenda que deve analisar os demais argumentos do caso (num contencioso que extravasa a mera anulação) — que impõe-se sempre o deferimento das pretensões dos recorrentes.

  12. É irrelevante a existência de opção pelo englobamento para os rendimentos sujeitos a substituição total: não há in casu qualquer intenção volitiva dos recorrentes nesse sentido; impor-se-ia sempre a aplicação do art 40.°A do CIRS (o que não foi efetuado in casu) e os juros nunca seriam da responsabilidade dos recorrentes (art. 28.º, n° 2, da LGT).

Termos em que se solicita

  1. O deferimento integral do presente recurso b) Com a anulação da Sentença recorrida c) Com as devidas consequências legais, nomeadamente com a anulação das liquidações impugnadas» Não foram apresentadas contra alegações.

    O Ministério Público a fls. 105 dos autos, emitiu parecer com o seguinte conteúdo: «1 – A………………….. e B…………………… vêm recorrer da douta sentença proferida nos autos, que julgou improcedente a impugnação que haviam deduzido contra a liquidação efectuada em sede de IRS do ano de 2013 e de juros compensatórios, devidamente identificadas nos autos, e por com isso se não conformar.

    Para tanto, alega nos termos conclusivos que constam de fls.,91 vº a 92 de que a decisão “a quo” peca de erro de julgamento quanto ao direito.

    Pede, a final, a revogação da decisão e a anulação das liquidações impugnadas.

    2 – A recorrida não contra-alegou.

    3 – Da análise da matéria controvertida entendemos que o presente recurso deverá improceder “in totum”.

    A douta decisão recorrida mostra-se, quanto a nós, correcta. Fez acertada análise e interpretação dos factos e correcta se mostra a sua subsunção jurídica, mostrando-se devidamente fundamentada e apoiada em pertinente doutrina a propósito citada não sendo passível de quaisquer censuras.

    4 – Emite-se, assim, parecer no sentido da improcedência do presente recurso com a manutenção da decisão recorrida nos seus precisos termos.» 2 – Fundamentação.

    O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte matéria de facto:

    1. Em 4 de Março de 2013 foi emitida a fatura n.º 14/2013 por «C……………… Lda.» a «D…………….. SA» no valor de EUR 83.800,74 [cfr. fatura anexa ao relatório inspetivo integrante do procedimento administrativo apenso, facto incontrovertido] B) Em 4 de Março de 2013 foi emitida a fatura n.º 16/2013 por «C……………… Lda.» a «D…………SA» no valor de EUR 65.574,71 [cfr. fatura anexa ao relatório inspetivo integrante do procedimento administrativo apenso, facto incontrovertido] C) As obras faturadas nas faturas mencionadas nos factos precedentes foram realizadas na habitação dos Impugnantes à data [cfr. emerge da posição das partes] D) As faturas referidas nos factos precedentes foram pagas pela «D…………….SA» [cfr. emerge da posição das partes] E) A «D………………… SA» não efetuou qualquer lançamento na contabilidade em conta de terceiros relativa ao débito daquele encargo aos Impugnantes [cfr. se encontra assumido pelo Impugnante marido no auto de declarações anexo ao relatório inspetivo – anexo 1 e consta] F) Os Impugnantes não ressarciram a «D………….. SA» do pagamento referido no facto precedente [cfr. emerge da posição das partes e se encontra assumido pelo Impugnante marido no auto de declarações anexo ao relatório inspetivo – anexo 1] G) Os Impugnantes foram objeto de ação inspetiva efetuada a coberto da ordem de serviço OI201600480 e com referência ao exercício fiscal de 2013 [cfr. emerge do introito do relatório inspetivo] H) No relatório inspetivo foram propostas correções com os seguintes fundamentos: “(…) Na sequência das ações de inspeção efetuadas à D…………. SA (…) e C…………….. Lda (…) recolhemos prova de que o agregado familiar efetuou obras de remodelação na sua moradia, que foram efetuadas pelas C………….. Lda. e pagas pela D………… SA, de que os mesmos eram administradores ao tempo.

    Vejamos: - Foi inquirido A……………, sujeito passivo e administrador da D…………… SA, sobre as obras realizadas na sua moradia (…) - Na inspeção efetuada à D………… SA, verificamos que na sua escrita se encontram registadas as seguintes faturas emitidas por C………… Lda (anexo 2) - Conclui-se que o descritivo das faturas se refere a uma outra obra que não foi realizada pelo emitente; - E também que estas faturas foram pagas por transferência bancária, pela D………….. SA, conforme se verificou pelos extratos bancários desta firma, que foram apresentados (anexo 3); - Não consta da escrita da D……………. SA qualquer registo de faturação desta obra aos administradores, nem tão pouco nenhuma conta corrente que evidencie qualquer débito dos administradores a esta sociedade.

    - Na inspeção efetuada a C………………… Lda verificamos que a sua contabilidade registou numa conta individualizada, os gastos (compras e subcontratos) referentes à remodelação duma moradia em ………………., em Viseu.

    - Os responsáveis pela sociedade identificaram a obra como segue: (…) Não restam pois dúvidas de que: - O...

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