Acórdão nº 1265/18.7BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Agosto de 2019

Magistrado ResponsávelCRISTINA SANTOS
Data da Resolução30 de Agosto de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Miguel .........., com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. Vem o Recorrente interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal a quo que decidiu improceder a providência cautelar intentada pelo mesmo sem necessidade de produção de qualquer prova em sede de diligência judicial; 2. A aplicação dos princípios da livre apreciação e da aquisição processual permitem ao Tribunal Central Administrativo Sul reponderar as questões em discussão, confirmando a decisão ou alterando-a; 3. Constam do processo os elementos que serviram de base à formação da convicção do julgador, podendo a mesma ser, naturalmente, sindicável; 4. Em 07.01.2019 o Recorrente foi notificado para, em respeito do princípio do dispositivo, “informar os autos sobre que matéria de tacto concretamente alegada pretende ouvir as testemunhas arroladas no segmento final do seu requerimento cautelar, bem como sobre que matéria de facto concretamente alegada pretende prestar declarações de parte", o que o Recorrente fez tempestivamente; 5. O Recorrente ficou assim na legítima expectativa de vir poder produzir prova em sede de diligência judicial dos factos que alegou no RI, em especial dos danos que a decisão da Entidade Recorrida lhe causa ou pode vir a causar; 6. Ao ter decidido como decidiu, ou seja, impedindo o Recorrente de produzir essa prova, o Tribunal a quo violou direito que ao Recorrente assiste (direito à prova) que tem inclusivamente dignidade constitucional; 7. Caso assim não se entenda, o requisito do periculum in mora foi devidamente alegado pelo Recorrente no RI, 8. Pelo que, ao não ter entendido assim, o Tribunal a quo violou o artigo 120° do CPTA; 9. O facto de o Recorrente ter que pagar uma multa como sanção de um processo disciplinar pejado de vícios e que contesta frontalmente e o averbamento dessa sanção no registo de sanções do Recorrente na OMD constituem circunstâncias mais do que notórias do periculum in mora que o Tribunal a quo entendeu não estar devidamente alegado, 10. Causadoras de danos patrimoniais e não patrimoniais irremediáveis ao Recorrente; 11. O fundado receio do Recorrente de que a execução da decisão da Entidade Recorrida venha a provocar na sua esfera jurídica prejuízos sérios e irreparáveis é mais do que legítimo; 12. Caso também assim não se entenda, o Tribunal a quo jamais convidou, como era sua obrigação, o Recorrente a aperfeiçoar a sua alegação quanto ao periculum in mora; 13. Ao não o ter feito e ao ter decidido como decidiu, em especial depois da notificação de 07.01.2019, o Tribunal a quo cometeu nulidade processual, nulidade essa que se estende até à decisão que ora se impugna e que tem importância decisiva nos autos, com repercussão notória na decisão da causa; 14. Submete-se, desta forma, o presente à apreciação dos Venerandos Juizes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul.

Termos em que, balizado o objeto do recurso e atentos os fundamentos do mesmo, deve a sentença ser revogada por outra nos termos supra alegados.

* A Ordem dos Médicos Dentistas, ora Recorrida, ~contra-alegou, sustentando a bondade do decidido.

* Com substituição legal de vistos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

* Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade: A. Em 31-05-2016, a edição on-line da revista L... (l....pt) publicou um artigo com o título "Boxeur e vem a Portugal colocar novo sorriso”, com o teor constante de fls. 1 do Processo Administrativo -PA) B. Por despacho de 30-06-2016 do Presidente do Conselho Deontológico e de Disciplina da Ordem dos Médicos foi instaurado processo disciplinar ao Requerente, o qual correu como processo n.° .../2016. (Cfr. fls. 2 e 3 do PA, que se têm por integralmente reproduzidas) C. Em 2-09-2016, foi dado início à instrução do processo disciplinar. (Cfr. fls. 5 do PA) D. Em 5-12-2016, constavam no certificado de registo disciplinar do Requerente uma pena disciplinar de multa no valor de € 900,00, aplicada por decisão de 18-04-2015, por divulgação da atividade profissional e uma pena disciplinar de censura, aplicada por decisão de 27-07-2014, por divulgação da atividade profissional. (Cfr. fls. 9 do PA) E. Em 19-12-2016, o Requerente foi ouvido no processo disciplinar, tendo prestado as declarações constantes de fls. 10 e 11 do PA.

F. Em 16-01-2017 a Diretora da revista “C....” informou no processo disciplinar «que a notícia com o título "L.......... em Portugal a convite de Miguel ..........” foi feita com base num comunicado enviado pela agência de comunicação N.........., que assessora o referido médico". (Cfr. fls. 25 do PA) G. Em 18-01-2017, o Requerente juntou ao processo disciplinar mensagem de correio eletrônico de L.......... de 16-01-2017, dirigida ao Requerente, com o seguinte teor: «Assunto: L.......... "Eu, L.........., vim a Portugal em 2016 para realizar cuidados dentários na W.......... com o Dr. Miguel .......... e a sua equipa. A minha reputação enquanto antiga estrela de futebol, a minha abertura em relação à saúde mental e, agora, sendo pugilista, fizeram despertar o interesse da imprensa portuguesa em. relação à minha história, pelo que tive uma pequena reunião na W...........

Quando me perguntaram porque estava eu em Portugal, eu respondi-lhes o que tinha feito, que não tinha absolutamente nenhum problema e que estava muito satisfeito com o tratamento recebido. Em Inglaterra tinha ouvido grandes coisas sobre o Dr. .......... e para mim ele era a pessoa ideal para me tratar. Considero que Dr. .......... e sua equipa têm o mais alto padrão ético e aconselho a qualquer pessoa que procure os melhores conselhos e o melhor tratamento dentário que contacte o Dr. .......... e a sua equipa que são muito profissionais e amáveis.» (Cfr. fls. 26 a 34 do PA) H. Em 15-01-2018, foi proferido despacho de acusação no processo disciplinar n.° .../2016, constando do mesmo, designadamente o seguinte: «(...) Está em causa nos presentes autos a divulgação da atividade profissional realizada pela Clínica de Medicina Dentária “W..........” Decorrida que foi a fase de Instrução, a mesma se dá por terminada, consequentemente Deduzo, ACUSAÇÃO contra o Dr. Miguel .......... portador da cédula profissional n° ......

Porquanto: 1 - O arguido é médico dentista, portador da cédula profissional n° ..... e fundador da Clínica de Medicina Dentária “W..........’’, (cfr.fls.l) 2- No dia 1 de junho de 2016, foi publicada no site da referida clínica uma fotografia que divulgava o tratamento dentário realizado ao lutador de boxe britânico L...........

3- A referida publicação chamava atenção para a reportagem realizada pela revista C.... de fls. 1.

4- Do meio de comunicação social C...., consta a publicação de uma fotografia do aqui arguido acompanhado pelo “Boxeur", bem como a seguinte menção: “O prestigiado lutador de boxe britânico L.......... veio a Portugal para um tratamento dentário a convite de Miguel .........., CEO e Fundador da W........... O desportista saiu da clínica com um novo sorriso após uma higienização, um implante de carga imediata (colocação da coroa no dia do implante) e duas cerâmicas nos dentes da frente, que estavam escurecidos.

5- A mesma imagem foi ainda divulgada pela Revista L..., na qual consta a publicação da fotografia do aqui arguido acompanhado do “Boxeur”, bem como a seguinte menção: “O lutador de boxe L.......... veio a Portugal a convite do conhecido dentista Miguel .........., para um tratamento dentário. O boxeur britânico, de 37 anos, submeteu-se a uma higienização, a um implante e ainda à colocação de duas cerâmicas nos dentes da frente (que estavam escurecidos), saindo da clínica com um sorriso «novinho em folha» 6- Com o propósito de averiguar a origem da respetiva informação sobre o tratamento dentário divulgado, a OMD diligenciou por despacho, datado de 19 de dezembro de 2016, um pedido de informação a ambos os meios de comunicação social.

7- Em resposta ao despacho atrás mencionado, a 16 de janeiro de 2017, a Revista C.... alega que o conhecimento da notícia teve por base um comunicado enviado pela agência de comunicação N.........., que assessora o referido médico dentista.

8- Ora, o artigo 3 o, alínea a) do regulamento de divulgação da atividade profissional (regulamento interno n° 115/2007 publicado na 2a série do Diário da República de 14 de junho), proíbe o médico dentista de utilizar a identificação direta ou indireta dos pacientes, bem como qualquer alusão às suas caraterísticas.

9- A divulgação da fotografia do paciente nos diversos órgãos de comunicação social, a convite da referida clínica, (de fls. 1) consubstancia desta forma uma violação do referido preceito.

10- Ainda, a respetiva publicação descreve os atos médicos praticados pelo aqui arguido.

11- Tal comportamento, viola o preceituado no artigo 21° do Código Deontológico da OMD, o qual menciona que o médico dentista é obrigado a guardar sigilo profissional sobre toda a informação relacionada com o doente, constante ou não da sua ficha clínica, obtida no exercício da sua profissão.

12- Com efeito, qualquer divulgação de matéria sujeita a sigilo profissional depende de prévia autorização da OMD, algo a verificar-se no caso em apreço uma vez que a referida publicação não visa quaisquer fins académico-científicos.

13- No caso em concreto, tal autorização não foi requerida pelo aqui visado.

14- Ao proceder à divulgação de um comunicado para os referidos meios de comunicação social, o arguido agiu consciente e livremente sabendo bem, dada a sua experiência profissional, que a informação nele contida iria chamar atenção para a sua clínica, obtendo com isso benefícios económicos.

15- Perante o exposto anteriormente, o arguido violou intencionalmente o disposto no artigo 3º, alínea a) do regulamento de divulgação da atividade profissional (regulamento...

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