Acórdão nº 206/16.0PALGS.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelNUNO GONÇALVES
Data da Resolução26 de Junho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

O Supremo Tribunal de Justiça, 3ª secção, acorda em conferência: A- RELATÓRIO: O Tribunal Judicial da Comarca de ..., Juízo Central Criminal de ..., por acórdão datado de 1 de Fevereiro de 2019, efectuando o cúmulo jurídico das penas de prisão impostas ao arguido AA nos seguintes processos: - comum colectivo nº 206/16.0PALGS (estes autos), a pena de 6 (seis) anos de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes (entre 20.05.2016 e 27/01/2017), aplicada no acórdão de 11/10/2017, transitado em julgado em 01.08.2018; e - comum colectivo nº 376/12.7PHSNT, as penas de 1 (um) ano de prisão pela prática de um crime de detenção de arma proibida, e a pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes (em 20.03.2013), aplicadas no acórdão de 13.05.2016, transitado em julgado em 24.01.2017, Condenou-o na pena única de 8 (oito) anos de prisão.

  1. o recurso: O arguido, inconformado com a medida da pena única, interpôs recurso, para Supremo Tribunal de Justiça (STJ), ao abrigo do disposto no art. 432º n.º 1 al.ª c) do Código de Processo Penal (CPP).

    Remata a alegação, com as seguintes: - CONCLUSÕES: 1) Vem o presente recurso interposto do, aliás douto, acórdão, que realizando o cúmulo jurídico da pena de 6 (seis) anos de prisão aplicada ao Recorrente no âmbito dos autos à margem identificados pela pratica do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21º do DL 15/93 de 22/01, por referência às Tabelas I-A, I-B anexas, com a pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, aplicada ao Recorrente no âmbito do processo nº 376/12.7PHSNT pela prática do crime de detenção de arma proibida e um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, aplicou a pena única de 8 (oito) anos de prisão.

    2) É grande o inconformismo do aqui Recorrente com o teor da, aliás douta, decisão, mormente no que tange à pena única de 8 anos de prisão aplicada, constituindo este o objecto principal do presente recurso.

    3) Decorre da leitura do douto acórdão recorrido (pág. 9) que “Nos termos do disposto no artigo 77.º nº 1 do Código Penal, a “pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (…) e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas (…)”, pelo que a pena única a aplicar deverá situar-se entre o limite máximo de 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de prisão e um limite mínimo de (seis) anos de prisão.” 4) É patente o erro de que esse segmento do acórdão padece, porquanto as penas a atender para efeitos do cúmulo jurídico, são: a) de 6 (seis) anos de prisão aplicada no Proc. nº 206/16.0PALGS; e b) de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, aplicada no proc. nº 376/12.7PHSNT 5) o que perfaz um limite máximo de 9 (nove) anos de prisão, 6) o que resulta da simples leitura do ponto 1 dos factos provados, 7) e não de 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de prisão como consta do acórdão recorrido.

    8) Uma decisão que erra no quantum da pena máxima aplicável (seis meses é muito tempo para quem se encontra privado da sua liberdade como sucede com o aqui Recorrente) é nula por ferir de morte todos os princípios e normas constitucionais do direito a um processo justo e equitativo, consagrado no artigo 20.º, nº 4 da CRP, pois face a esse erro, o Recorrente desconhece qual foi o limite máximo que o tribunal “a quo” utilizou na determinação da sua pena única.

    9) Esse vício decorre da simples leitura do acórdão, pelo que aqui se convoca nos termos e para os efeitos do disposto na al. c) do nº 2 do artigo 410.º do CPP..

    Ademais, 10) O acórdão recorrido fez incluir na pena única do concurso penas de substituição, sem que tenha havido decisão nos termos combinados dos art.ºs 56.º do CP e 492.º do CPP, relativamente à pena suspensa, não resultando dos factos que o Tribunal «a quo» tomou em consideração que no processo em que foi aplicada, tenha sido decidida a revogação da pena suspensa, pelo que o acórdão é nulo por não ter tomado conhecimento de questões de que deveria conhecer (art.º 379.º n.º 1 al. c) do Código de Processo Penal).

    Sem conceder, Da medida concreta da pena única 11) Estabelecida a moldura penal abstrata, a determinação da medida da pena do concurso, encontrar-se-á em função das exigências gerais de culpa e de prevenção e do critério especial de serem considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.

    12) No que se refere a este critério especial, esclarece o Prof. FIGUEIREDO DIAS, (In Direito Penal Português, Parte Geral II, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 291), que: «Tudo deve passar-se, por conseguinte, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente a uma “carreira”) criminosa, ou tão só uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)».

    13) No mesmo sentido se pronunciou esse mais Alto Tribunal no douto Acórdão de 3.10.2007, segundo o qual «na determinação da medida concreta da pena única atender-se-á à globalidade dos factos em interligação com a personalidade do agente de forma a aquilatar-se, fundamentalmente, se o conjunto dos factos traduz uma personalidade propensa ao crime, ou é antes, a expressão de uma pluriocasionalidade, que não encontra a sua razão de ser na personalidade do arguido».

    14) Na avaliação da personalidade expressa nos factos importa considerar todo um processo de socialização e inserção ou, pelo contrário, de repúdio pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade, que deverá ser ponderado.

    15) Aplicando o que se acabou de dizer ao caso dos autos, entendemos com o devido respeito, que a pena única de 8 (oito) anos de prisão aplicada ao arguido é excessiva, porque desnecessária e porque ultrapassa a sua culpa, limite da pena (cfr. artigo 40.º do C.P.) 16) Numa moldura penal abstracta entre 6 (seis) anos e 9 (nove) anos de prisão o tribunal “a quo” aplicou ao Recorrente uma pena mais próxima do limite máximo do que do seu limite mínimo.

    17) Para tanto, é a seguinte a fundamentação da decisão recorrida: “(…) quanto aos factos subjacentes às penas a cumular, alguns assumem idêntica natureza (tráfico de estupefaciente). O grau de ilicitude é elevado, atendendo à persistente energia criminosa revelada e à personalidade do arguido neles reflectida.

    Ao nível do historial clinico regista experiencias aditivas, ainda que breves, ma que contribuíram para a sua desorganização pessoal num determinado período, tendo-se envolvido com grupo de pares de características desfavoráveis às convenções e práticas delinquenciais.

    Em termos laborais, o arguido não especifica um projecto concreto de empregabilidade.

    Assim e não obstante a inserção social e o apoio familiar de que goza, mantêm-se assinaláveis necessidades da prevenção especial.

    ” 18) Salvo o devido respeito, para além de escassa, a fundamentação da douta decisão quanto à pena concreta que aplicou ao arguido, não atendeu a todas as circunstâncias exigidas nas alíneas a) a e) do artigo 71.º, nº 2 do C.P..

    19) A douta decisão recorrida não teve em consideração que o arguido é um jovem de 29 anos de idade, porquanto nasceu aos 04-05-1989.

    20) Que se encontra em situação de reclusão desde o dia 27 de Janeiro de 2017, ou seja, há mais de 2 (dois) anos.

    21) Que o seu comportamento em meio prisional tem sido globalmente ajustado. Que desde que entrou no EP de ..., tem mantido um percurso isento de reparos, não averbando qualquer sanção disciplinar.

    22) Que evidencia preocupação em manter em meio prisional postura ajustada à especificidade normativa a que está sujeito, bem como motivação para a valorização pessoal e escolar.

    23) Que desde 17 de Janeiro de 2018, frequenta o Curso de Educação e Formação de Adultos Nível Secundário (EFA NS) via escola, onde tem registado boa assiduidade e empenho.

    24) Que iniciou o processo de reaproximação ao meio livre através de medidas de flexibilização da pena, tendo usufruído a primeira licença de saída jurisdicional em Dezembro de 2018, situação avaliada pelos familiares de forma positiva, remetendo para um comportamento responsável da parte de AA em contexto familiar e comunitário.

    25) Que aguarda colocação em Regime Aberto no Interior (RAI).

    Com efeito, 26) Refere a douta decisão recorrida que o arguido, aqui Recorrente, “Ao nível do historial clinico regista experiencias aditivas, ainda que breves, ma que contribuíram para a sua desorganização pessoal num determinado período, tendo-se envolvido com grupo de pares de características desfavoráveis às convenções e práticas delinquenciais.” 27) Todavia, resulta do Ponto 11. da matéria assente que “Em relação à problemática aditiva e desta poder ser um factor potenciador de desajustamento psicossocial, AA afirma apenas consumos pontuais, ocorridos numa fase de vida em que a influência do grupo de pares tinha um peso significativo no convívio social, afastando qualquer condição de dependência. Actualmente, não anuncia qualquer problemática aditiva.” 28) Fundamenta ainda a douta decisão a pena concreta no facto de “Em termos laborais, o arguido não especifica um projecto concreto de empregabilidade.” 29) Ora do ponto 14. da matéria assente consta que “Em termos laborais, o arguido não especifica um projecto concreto de empregabilidade e remete-se para a confiança em inserir-se na vida activa de forma célere após libertação...

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