Acórdão nº 689/11.5BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelISABEL FERNANDES
Data da Resolução11 de Julho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 1ª SUB-SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: I - Relatório A Fazenda Pública, não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que considerou procedente a oposição intentada por J....., citado por reversão, na qualidade de responsável subsidiário da executada G....., Lda., referente ao processo 334420……, relativo a IRC e IVA de 2006 e 2007, coima e juros de mora, cujo pagamento voluntário terminou em 09-06-2010, veio apresentar recurso jurisdicional em cujas alegações concluiu como segue: «I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a oposição à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, por ter considerado que o oponente não praticou actos de gerência, sendo parte ilegítima.

II – Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em determinar se o oponente havia ou não exercido a gerência de facto da sociedade devedora originária e se foi por sua culpa que o património da sociedade se delapidou.

III – O oponente foi gerente da sociedade uma vez que a mesma se obrigava com a assinatura de qualquer dos gerentes nomeados, sendo um deles, o ora oponente, não tendo logrado provar que nunca exerceu a gerência até porque assinou contratos e cheques, sendo que o seu nome, enquanto gerente, vinculava a sociedade devedora originária perante o banco, ou seja, perante terceiros, descontando como membro do órgão estatutário, isto é, como gerente pois só sendo gerente é que poderia efectuar os descontos para a Segurança Social naquela modalidade, pelo que a AT provou que o oponente era gerente desde 07/08/2001.

IV – Mas, para além do oponente, eram gerentes o seu pai e o seu cunhado, sendo que o seu pai faleceu em 13/05/2008, tendo tomado os destinos da devedora originária desde essa data, no intuito de cumprir os contratos realizados pelo seu pai.

V - Ora, neste circunspecto, o oponente é herdeiro de G……, seu pai, sendo que da herança, por si aceite, há-de sair e pagar, em 1.ª linha, as dividas, nos termos do art.º 2068.º do CC.

VI – Na verdade, tal como foi referido a sociedade não tinha bens e a insuficiência do património da sociedade reflectiu-se na esfera da devedora originária e, consequentemente, na dos herdeiros, podendo estes serem revertidos.

VII – Contudo, o oponente foi revertido por ter sido gerente e no período da sua gerência ter sido posto a pagamento a dívida exequenda, nos termos do art.º 24.º, n.º 1, al. b) da LGT, isto é, em 2010, pelo que é parte legítima.

VIII - Por outro lado, também, não conseguiu provar que a insuficiência do património não foi por culpa sua, uma vez que a sua actuação não foi diligente, tendo desprotegido os credores.

IX – Mas, ainda que se admitisse que o oponente, actuou esporadicamente na sua condição de gerente, tal não seria suficiente para a eximir da responsabilidade porque “a jurisprudência tem vindo também a entender que a lei não exige, para a responsabilização dos gerentes pelas dívidas fiscais das sociedades, que estes exerçam uma administração continuada, nem em todas as áreas por que se desenvolve a actividade da sociedade, bastando que pratiquem actos exteriorizadores da vontade e que vinculem a sociedade”. – vide Ac. do TCAN, de 06/07/2006, proferido no proc. n.º 00129/98 X – Em sede de oposição, é ao responsável subsidiário que incumbe o ónus da prova de que não exerceu a administração de facto.

XI – Por outro lado, o oponente não provou a inexistência da prática de actos de gerência tais como as fichas bancárias em que se ateste a impossibilidade do oponente ter acesso a dados de contas bancárias e legitimidade na sua movimentação, nem outros quaisquer documentos que comprovassem que não exerceu a gerência bem pelo contrário, pois ao assinar cheques significa que tem acesso às contas bancárias e, ao emiti-los vinculou a sociedade a sociedade, com a sua assinatura, perante terceiros.

XII - A actuação do oponente como gerente da sociedade, fez, assim, crer a terceiros que era responsável pelas obrigações que advinham em resultado do exercício da actividade da sociedade.

XIII - “Quanto à responsabilidade dos oponentes, não podendo esquecer que o regime é o do art.º 24.º da LGT, para ilidir a culpa o oponente teria que fazer uma prova positiva de que não existiu qualquer relação causal entre a sua actuação e a insuficiência patrimonial da empresa que geriu. E tal só será alcançado se o oponente alegar factos, por exemplo, respeitantes à situação financeira económica da empresa, à sua actuação concreta para alcançar os objectivos para que a sociedade se constituiu. Quais sejam esses factos em concreto, apenas cada gerente o poderá saber pois dependem das particularidades de cada sociedade, da actividade que desenvolvida, da conjuntura em que laboraram. Certo é que nada valem para aquele efeito as afirmações de foi um gerente rigoroso ou sóbrio, ou criterioso, ou diligente ou cumpridor”. – vide Ac. do TCAN de 07/12/2005, rec. 0086/01 XIV - Ora, o oponente não logrou fazer esta prova, não se podendo concluir que não tenha agido com culpa quanto ao facto de o património social se ter revelado inexistente quando a dívida exequenda foi instaurada.

XV - Na verdade, não pode a Fazenda corroborar com a posição assumida pelo Tribunal a quo quando considera que o oponente é parte ilegítima.

XVI - Neste desiderato, não pode ser considerado o oponente como parte ilegítima da execução fiscal, pelo que a douta sentença deverá ser substituída por uma outra que considera o oponente como parte legítima da execução fiscal.

XVII - Assim, a responsabilidade do oponente, nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, “nada tem que ver com o facto constitutivo da obrigação tributária não cumprida, mas com deveres funcionais de administração, mais concretamente, pela inobservância culposa das disposições legais destinadas à protecção do credor tributário e que foi a causa da insuficiência do património social para a satisfação daquele crédito” – vide PAULO MARQUES, Responsabilidade tributária dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, 2011, Coimbra Editora, pág. 176 XVIII - “A culpa afere-se em abstracto, pela diligência de um administrador ou gerente pressuposto medianamente diligente e respeitador das boas práticas comerciais (bonus pater familiae, na tradição jurídica), operando com a teoria da causalidade, seguindo um processo lógico de prognose póstuma, por forma a averiguar se a actuação daquele enquanto representante da sociedade originária devedora, concretizada quer em actos positivos quer em omissões, foi adequada à insuficiência do património societário para a satisfação dos créditos fiscais” - vide Ac. do TCAS de 06/10/2009, proferido no proc. n.º 03267/09).

XIX - Nos termos do n.º 1 do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), os gerentes ou administradores da sociedade devem observar: “a) Deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado; e b) Deveres de lealdade, no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores.” XX - O oponente, ao alegar que não teve intervenção nos destinos da sociedade, como era seu dever tendo legitimidade para tal, apenas indica que norteou a sua actuação, enquanto administrador da devedora originária, por condutas omissivas, ou seja, que se demitiu dos seus deveres, nomeadamente de vigilância.

XXI - O ora oponente, na sua actuação enquanto administrador da sociedade violou o dever diligência, tal como vimos a aludir, pelo que é parte legítima na presente oposição.

XXII - Pelo facto de não ter provado de que não era gerente de facto ou por quem era exercido esse cargo, através de acta e, por se ter afirmado e provado que o oponente era gerente à data da constituição da dívida exequenda, foi por sua culpa que a sociedade devedora originária não cumpriu com as suas obrigações.

XXIII - Ou seja, a culpa “…traduz-se sempre num juízo de censura em relação à actuação do agente: o lesante, pela sua capacidade, e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo”. - vide Ac. TCAS de 23/06/2009, proferido no Proc. n.º 02890/09 XXIV - Face ao exposto, demonstra-se a culpa do oponente, nomeadamente por omissão de deveres legais que lhe estavam cometidos por força da sua qualidade de gerente na devedora originária.

XXV - Efectivamente, é à gerência (enquanto órgão cujas funções são definidas por lei que força criá-lo para permitir à sociedade actuar no comércio jurídico) que incumbe (pode e deve) praticar todos os actos necessários para o cumprimento dos deveres impostos por lei à sociedade e os necessários ou convenientes...

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