Acórdão nº 157/17.1T9VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelTERESA COIMBRA
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães.

I.

No processo que, com o nº 157/17.1T9VCT, corre termos no juízo de competência genérica de Monção, foi decidido (transcrição): a) Condenar o arguido A. F., pela prática de um crime de burla qualificada, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nºs 1 e 2, alínea), 22º, 23º, nºs 1 e 2 e 73º, todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período; b) Condenar o arguido A. F. pela prática de dois crimes de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º, nº 1 do CP, na pena de 100 (cem) dias de multa, cada um; c) Condenar o arguido A. F. pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º, nºs 1 e 3 do CP, na pena de 200 (duzentos) dias de multa; d) Condenar o arguido A. F. pela prática de um crime de simulação de crime, p. e p. pelo art. 366º, nº 1 do CP, na pena de 60 (sessenta) dias de multa; e) Em cúmulo jurídico das penas parcelares referidas em b) a d), condenar o arguido A. F. na pena única de 380 (trezentos e oitenta) dias de multa, à razão diária de € 7,50 (sete euros e cinquenta cêntimos), perfazendo um total de € 2.850,00 (dois mil oitocentos e cinquenta euros); f) Condenar a arguida Peixe ..., Lda., pela prática de um de burla qualificada na forma tentada, punido pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nºs 1 e 2, alínea), 22º, 23º, nºs 1 e 2, 73º e 11º, nº 2, a), todos do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 110,00 (cento e dez euros), perfazendo um total de € 6.600,00 (seis mil e seiscentos euros); g) Mais se condenam os arguidos nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC’s cada, atento o número de sessões de julgamento (arts. 513º e 514º, nº 1 do C.P.P. e artº. 8º, nº 5 do Regulamento das Custas Processuais).

Inconformados, recorreram os arguidos Peixe ... – Comércio de Produtos Alimentares, Lda e A. F. concluindo os seus recursos do seguinte modo (transcrição) - Conclusões da arguida Peixe ..., Lda: 1. Sobre a matéria de facto, o cerne da impugnação que se faz da decisão condenatória do Tribunal a quo prende-se com o facto de se ter dado como provada a matéria de facto descrita nos itens 18) à 23) supra enunciados, quando devê-la-ia ter dado como “não provada”.

  1. Ora, das declarações e depoimentos gravados e prestados em audiência de julgamento, não existe matéria de facto suficiente e não resultou provado que, nas circunstâncias de tempo e de lugar apuradas, a arguida tenha praticado o crime pelo qual vem condenada, ainda na forma tentada.

  2. A arguida vê-se deveras surpreendido que tal não tenha sido a decisão do Tribunal a quo, que, quanto à factualidade descrita em 18) à 23) da sua fundamentação, refere ter firmado a sua convicção condenatória pelos depoimentos das testemunhas A. R. – sócio gerente da sociedade arguida, A. P. e V. P., trabalhadores da assistente.

  3. Em nosso modestíssimo ver, não existiu qualquer crime cometido pela sociedade arguida, tendo sido a mesma vítima do assalto denunciado. As regras da experiência comum e do devir natural impunham que assim se decidisse.

  4. A imputação do crime fundamentou-se em meras suposições e pareceres pessoais, sem quaisquer diligências encetadas para procurar os verdadeiros autores do crime de furto.

  5. Atentas as conclusões precedentes, há, in casu, portanto, um erro notório na apreciação da prova, nos termos da al.c) do n.º do artigo 410.º do Código de Processo Penal, relativamente aos itens 18) à 23) da fundamentação da decisão em crise. Por conseguinte, as concretas especificações da prova trazidas à colação pelo ora recorrente têm virtualidade para impor decisão diversa da recorrida.

  6. Ademais, a arguida não compreende que o Tribunal a quo, valorizando especialmente a credibilidade e a narrativa da testemunha A. R., não tendo levantado qualquer suspeição quanto à responsabilidade do mesmo nos factos.

  7. Assim como, a arguida não compreende que o Tribunal a quo, perante os documentos dos autos, em conjugação com os depoimentos das testemunhas A. R. e J. G., não relevou a nulidade insanável referido no artigo 119º do C.P.P, assim como, a violação do artigo 11º, n.º 2 e 4 do C.P, e, do Despacho do PGR n.º1/2011 de 10-10-2011 (revogando a Circular n.º1/09 de 19-01-2009).

  8. A decisão do Tribunal a quo surpreende-nos ainda mais por não ter tido em consideração, no momento da decisão, o princípio da presunção de inocência e da dúvida razoável (in dúbio pro reo).

  9. Acrescentando que, em nosso modestíssimo entender, existe um erro na determinação da medida da pena, com a violação dos artigos 40º, n.ºs1 e 2 e, 71º ambos do C.P; 11. Sendo que, a pena aplicada a arguida, atento a situação económica da mesma, releva-se totalmente inadequada, desproporcionada e em contradição com às exigências preventivas que o caso requer.

Em conformidade com as conclusões expostas e o douto suprimento de V.

as Ex.

as, deve conceder-se provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por uma outra que, alterando a matéria de facto dada como provada, absolva a arguida do crime de burla qualificada, na forma tentada.

Como é de inteira e sã JUSTIÇA.

* - Conclusões de recurso do arguido A. F.: A – Logo no início do inquérito, donde foi extraída certidão para o prosseguimento do segundo inquérito, existiam suspeitas, porém prosseguiram os autos, do prévio inquérito, durante dois anos sem a constituição de arguido de quem quer que fosse, violando os direitos de garantia de defesa consagrados no Art.º 32º, da C.R.P..

B – O inquérito é arquivado, mas por dúvidas e tendo em atenção eventuais crimes apontados pela seguradora (não sabemos onde), que na conclusão do relatório de peritagem apresentado, apenas refere: “A elaboração, embora precipitada, do presente relatório de peritagem tem como objetivo permitir à seguradora disponibilizar informação ao Ministério Público do Tribunal Judicial de Monção, no sentido de possibilitar a realização de diligências por parte das autoridades, principalmente junto do fornecedor, do Segurado, “Y” (fls. 175).

Não refere quaisquer indícios de crimes praticados pelo recorrente e outros, nomeadamente de burla qualificada e simulação de crime.

C – Por dúvidas, o M.P. remete certidão do inquérito arquivado, para que se proceda a novo inquérito, que iniciou os presentes autos.

D – Com absoluta violação do princípio “in dúbio pro reo” ferindo de morte o princípio de presunção de inocência, devendo, tal ato ser considerado nulo, nos termos da al. c), do n.º 1, do Art.º 379º, do C.P.P., anulando-se, assim, todo o processado posterior.

Sem prescindir, E – No inquérito dos presentes autos, de acordo com a certidão registral da sociedade arguida, a mesma, obriga-se com a intervenção de ambos os gerentes, verifica-se a falta de constituição da sociedade, como arguida, pois não foi constituída com a intervenção dos dois gerentes.

F- Tal facto foi alvo de reparo, assinalando-se tal falta, no início da audiência de julgamento, porém, o julgamento prossegue, sem tal requisito, ou seja, com a ausência da arguida, pois não estava devidamente representada, nem constituída, além de gerar a falta de inquérito, a ausência na audiência de julgamento, da arguida, constitui nulidade insanável, nos termos da al. c), do Art.º 119º, do C.P.P.

G- Analisada a acusação que foi levada a julgamento, da mesma, não constam factos objetivos e concretos mas só conclusivos e subjetivos, que indiciem a prática dos crimes nelaconstantes, pelo recorrente e sociedade arguida, de falsidade de testemunho, simulação de crime e burla qualificada, na forma tentada, e que, decorrida a audiência de julgamento, sem qualquer alteração ou inclusão de factos novos, o recorrente e a sociedade arguidos foram condenados, como consta da sentença recorrida.

H – Como prescreve a al. b), do n.º 3, do Art.º 283º, do C.P.P. e estrutura acusatória que é exigida, no referido Código, onde vigora o princípio da imediação e do contraditório, faltando os factos-base, ou indícios, periféricos dos factos a provar ou inter- relacionados com os factos que racionalmente se possam inferir para conduzir à prova da prática dos crimes de falso testemunho, simulação de crime e burla qualificada, na forma tentada.

  1. Quanto à burla qualificada na forma tentada, não consta da acusação, factos concretos e objetivos, ou outros que tenham, tentado praticar, o recorrente e sociedade arguida, que revelassem astúcia para induzirem, em erro ou engano, outrem.

J – Relativamente à falsidade de testemunho, não constam, da acusação, factos relativamente à inexistência de furto ou roubo, ou que factos concretos e objetivos que inferissem a inexistência ou simulação do furto ou roubo, que provassem indiretamente que o recorrente, quando prestou os depoimentos sabia bem estar a faltar à verdade.

K – Atendendo ao princípio do acusatório que deve presidir ao nosso processo penal, tal omissão factual na acusação, viola os princípios da certeza e da suficiência e da confiança e lealdade em sede processual penal, consagrados nos artigos 283º, n.º 3, al. b) e 308º, ambos do C.P.P., com a consequente inviabilização do direito de defesa do arguido e do contraditório, violação, esta, cominada de nulidade processual.

L – Quando do despacho previsto no Art.º 311º, do C.P.C., o Juiz, no saneamento do processo e apreciando a acusação, com as nulidadees supra elencadas, teria de fazer um juízo sobre a suficiência ou insuficiência de indícios que sustentam a acusação proferida explicitando de modo claro e taxativo, os quatro motivos que podem levar à conclusão de se estar perante acusação manifestamente infundada ( Art. 311 nº 3, do C.P.P.).

M – Tal solução não tendo sido acolhida, os autos prosseguiram, indevidamente, para julgamento, gerando uma condena ação por factos não descritos na acusação, o que resulta na nulidade da sentença recorrida nos...

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