Acórdão nº 132/11.0TCFUN-A.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 04 de Julho de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I M nos autos de acção executiva que lhe move o BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, SA deduziu oposição, invocando, para tanto e em síntese, ter direito a ser indemnizada pelo exequente por danos que a atuação ilícita deste lhe causou, pretendendo compensar o crédito dado à execução com o crédito indemnizatório a que se acha com direito, concluindo pedindo que seja reconhecido o direito da executada ao ressarcimento de danos sofridos até ao montante reclamado pelo BCP na presente execução, sem prejuízo do que venha a reclamar noutra sede na parte que excede tal montante; que seja declarada a compensação de créditos entre o crédito exequendo e o crédito indemnizatório de que a executada é titular e em consequência, seja declarada extinta a instância executiva.
A oposição foi recebida e o exequente, regularmente notificado para contestar, pugnou pela sua improcedência, impugnando a existência do crédito compensante.
Foi proferida a sentença a julgar improcedente a oposição com o fundamento de que não se pode pretender a compensação, em oposição à execução, do crédito exequendo com um eventual crédito indemnizatório que venha a ser reconhecido neste apenso declarativo.
Com esta decisão não se conformou a Executada, Oponente, que dela recorreu de Apelação a qual veio a ser julgada improcedente com a manutenção da sentença recorrida.
De novo irresignada recorreu a Executada, agora de Revista excepcional, admitida pela Formação através do seu Acórdão de fls 693 a 697, nos termos da alínea a) do nº1 do artigo 672º do CPCivil, tendo apresentado as seguintes conclusões, no que à economia da questão decidenda concerne: - A sentença de 1ª instância e o acórdão ora recorrido, que a confirma, perfilham uma orientação jurisprudencial que se tem vindo a insinuar recentemente, segundo a qual a compensação, arguida como causa extintiva da execução, tem de reportar-se a um crédito previamente reconhecido por decisão judicial.
- Tal orientação jurisprudencial assenta em interpretação manifestamente errónea dos preceitos que convoca.
- É inquestionável que o art. 816.° do C.P.C., devidamente conjugado com o art. 814.° do mesmo código, nas redacções aplicáveis (ou seja, nas redacções do C.P.C, revogado), determina que, não se baseando a execução em sentença, podem ser alegados como fundamento de oposição quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo de declaração, o que compreenderá, em princípio, qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação. Daí se entender que, sendo a compensação um facto extintivo das obrigações, pode fazer-se extinguir-se a obrigação exequenda através do recurso a tal compensação.
- Todavia, a jurisprudência em que se louvam as instâncias, conjugando os arts. 812.° e 816.°, ambos do C.P.C., com o art. 847.° do C.C. - segundo o qual constitui requisito da compensação "ser o crédito exigível judicialmente" -, conclui que, não estando o crédito judicialmente reconhecido - i.e., comprovado e declarado por sentença anterior -, é meramente hipotético, não podendo a sua verificação ter lugar no âmbito do incidente de oposição à execução, sob pena de se entorpecer ou inviabilizar a própria acção executiva.
- O erro desta jurisprudência assenta no entendimento normativo adoptado quanto ao art. 847.°, n.° 1, a) do C.C., no sentido de que a expressão "ser o seu crédito exigível judicialmente" tem o alcance de que a compensação pressupõe que já tenha havido uma comprovação judicial do contra-crédito invocado para o exercício da compensação.
- Mas não é assim, como se retira da letra da lei - exigível judicialmente não significa judicialmente já demonstrado - como do espírito do instituto, através do qual se pretende, de uma forma ampla, favorecer a operacionalidade da extinção de obrigações quando haja créditos recíprocos.
- De resto, há um grande consenso doutrinário - ao contrário do que pressupõe o acórdão recorrido - no sentido de que o requisito do art. 847.º, nº1, a), do C.C. se reporta a um crédito que pode ser judicialmente exigível, não sendo necessário que já tenha sido objecto de decisão judicial (no caso, como é óbvio, de execuções não baseadas em sentença), o qual pode, por isso mesmo, ser compensado no âmbito da oposição à execução, a qual não é mais do que uma acção declarativa enxertada no processo executivo para fazer valer um facto extintivo do direito exequenda. E há igualmente jurisprudência que sufraga essa posição, como vem assinalado no corpo das alegações.
- Não ocorrendo excepção de direito material, nem nenhuma outra das circunstâncias supra referidas [no corpo das alegações] que impeçam o reconhecimento do crédito (v.g., ser produto de uma obrigação natural ou estar dependente de prazo - a não ser quando estabelecido a favor do declarante - ou condição), o declarante pode demonstrar, no âmbito da oposição, a natureza e montante do crédito que invoca. E por isso que a oposição à execução assume o caráter de uma contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo, constituindo como que a petição inicial de uma acção declarativa, na qual deve ser apreciado e reconhecido a existência, validade e exigibilidade do crédito que se pretende compensar.
- Pelo exposto, não procede o argumento de que deve ser julgada improcedente a oposição à execução com o fundamento em que o alegado crédito compensatório de natureza indemnizatória da Oponente seria futuro e eventual - ainda dependente de uma apreciação judicial -, não podendo essa apreciação ter lugar no âmbito da oposição à execução, uma vez que esse entendimento faz uma errónea aplicação do art. 847.º, n.° 1, a), do C.C., devidamente conjugado com os arts. 814.º e 816.º do C.P.C, (na redacção aplicável do C.P.C, revogado).
- Ademais, tal entendimento normativo, pelo seu cariz desproporcionado, até é inconstitucional, por violação do direito a um processo equitativo, tal como previsto no art. 20.º da C.R.P..
- Uma nota final apenas para referir que a circunstância do crédito invocado ter uma natureza indemnizatória - decorrente da responsabilidade civil do Exequente - não altera os dados do problema, uma vez que aquilo que está na raiz da posição das instâncias tem a ver com a circunstância do crédito da Oponente não estar judicialmente reconhecido, estando ainda pendente do julgamento da acção enxertada na oposição deduzida, situação que tanto ocorre num crédito indemnizatório, como...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 1615/20.6T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Novembro de 2021
...de Processo Civil, Vol. II, 2014, p. 248. Neste mesmo sentido, vd. mais recentemente, o Ac. STJ de 4-07-2019, proferido no Proc. n.º 132/11.0TCFUN-A.L1.S2 e acessível in Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 18-01-2007, proferido no Proc. n.º 4519/06. Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 14-12-2006, pro......
-
Acórdão nº 472/20.7T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Janeiro de 2021
...de Processo Civil, Vol. II, 2014, p. 248. 11 Neste mesmo sentido, vd. mais recentemente, o Ac. STJ de 4-07-2019, proferido no Proc. n.º 132/11.0TCFUN-A.L1.S2 e acessível in 12 Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 18-01-2007, proferido no Proc. n.º 4519/06. 13 Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 14-12-......
-
Acórdão nº 1615/20.6T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Novembro de 2021
...de Processo Civil, Vol. II, 2014, p. 248. Neste mesmo sentido, vd. mais recentemente, o Ac. STJ de 4-07-2019, proferido no Proc. n.º 132/11.0TCFUN-A.L1.S2 e acessível in Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 18-01-2007, proferido no Proc. n.º 4519/06. Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 14-12-2006, pro......
-
Acórdão nº 472/20.7T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Janeiro de 2021
...de Processo Civil, Vol. II, 2014, p. 248. 11 Neste mesmo sentido, vd. mais recentemente, o Ac. STJ de 4-07-2019, proferido no Proc. n.º 132/11.0TCFUN-A.L1.S2 e acessível in 12 Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 18-01-2007, proferido no Proc. n.º 4519/06. 13 Neste sentido, cfr. Ac. STJ de 14-12-......