Acórdão nº 00387/14.8BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução28 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: ABALMSL (Rua J…, 4150-413 Porto), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Penafiel, em acção comum ordinária intentada contra CHTS, E.P.E.

(Lugar T…, 4564-007 Penafiel) e outros (entretanto absolvidos da instância), julgada improcedente.

*Conclui a recorrente: 1. A Autora candidatou-se a una vaga aberta pelo Réu, no âmbito de um procedimento Procedimento Simplificado conducente ao recrutamento de pessoal médico para a categoria de assistente, da área hospitalar – Imunoalergologia – da carreira médica" e, uma vez terminada a avaliação das duas candidatas admitidas, o Júri nomeado, no âmbito do procedimento simplificado aberto pelo Réu, classificou a ora Autora em primeiro lugar.

  1. Posteriormente, o Réu anulou o presente procedimento e fundamentou a sua decisão com um alegado incumprimento do prazo de abertura do respetivo procedimento e com a suposta indevida fundamentação do Júri quanto à avaliação das duas candidatas.

  2. O Tribunal a quo entendeu que o Réu podia fundamentar a decisão de anulação com o alegado incumprimento do referido prazo, mas que a mesma deveria ter pedido maior fundamentação ao Júri em questão.

  3. No nosso entendimento, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo não valorou devidamente a prova produzida nos presentes autos.

  4. Com efeito, a testemunha, AD (Coordenador Técnico dos Serviços dos Recursos Humanos do Réu) e a testemunha, AVC (Diretora dos Recursos Humanos da Réu), confirmaram, no respetivos depoimentos, que a questão do alegado incumprimento do prazo para abertura do presente procedimento nunca foi levantada ao longo de todo o mesmo procedimento, conformando-se os intervenientes com a forma e o conteúdo da abertura do presente procedimento, e apenas foi invocado quando a outra candidata, TMSP, tomou conhecimento que tinha ficado em segundo lugar e consequentemente não tinha sido selecionada para a vaga existente.

  5. A testemunha, JPFMS, Médico Imonoalergologista, Presidente do Júri do presente procedimento, no respetivo depoimento, confirmou que a nota do internato médico é atribuída pelo Júri nomeado, no âmbito do respetivo internato médico, e não pelo Júri nomeado para este tipo de procedimentos e que, quanto à entrevista propriamente dita, conforme é regra e obrigatório neste tipo de procedimento, é aplicado uma grelha individual de avaliação com os parâmetros/critérios predefinidos, sendo que as respetivas notas são as fundamentadas com os próprios critérios acima identificados.

  6. A Jurisprudência e Doutrina dominante têm perfilhado o entendimento que: “29. (…) desde que das actas das reuniões do júri conste o critério observado para a classificação, não sendo necessário justificar por que em cada caso foi atribuída determinada pontuação e não outra – ac. de 11/12/1986, in Bol. M. Just., n.º 362, pág. 428)” (Cfr. Código do Procedimento Anotado e Comentado, António Francisco de Sousa, 2.ª Edição (revista e atualizada), Quid Iuris,. p. 379.

  7. Neste sentido também: “ 36 No seu acórdão de 1 de Julho de 2010, concluiu o TCAS que “no caso do procedimento concursal, considera-se satisfeito o dever de fundamentação da classificação operada desde que se mostrem vertidas na grelha classificativa previamente elaborada pelo Júri as valorações atribuídas a cada item e que, posteriormente seja consignada em acta a pontuação atribuída, sem necessidade de se justificar aquela pontuação, sob pena de se incorrer em fundamentação da própria fundamentação. (Cfr. Código do Procedimento Anotado e Comentado, António Francisco de Sousa, 2.ª Edição (revista e atualizada), Quid Iuris, p. 3809.

  8. Por outro lado, o Tribunal a quo entendeu, a nosso ver, erradamente, que não ficaram provados alguns dos danos morais, mencionados na p.i., vistos que as testemunhas JGMS, MDL e JML confirmaram os mesmos, sendo que realçaram que a Autora é uma pessoa algo reservada e que não exprime muitos os seus sentimentos.

  9. Para além disso, a Autora apresentou um recurso tutelar e, ao contrário do que é referido na douta sentença (cfr. pag, 15, ponto 25), o Réu informou, o presente Tribunal, que alegadamente enviou o mesmo para o Ministério da Saúde, mas este último afirma perentoriamente que não recebeu esse mesmo recurso. (Cfr. fls. 200, 212, 231, 239, 248, 265).

  10. De acordo com o disposto no art.º 9.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro “1 - Consideram-se ilícitas as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.

  11. Nos termos do preceito normativo previsto no 1 do art.º 141.º do C.P. Administrativo (velho): “1- Os atos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respetivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida” 13. De acordo o disposto no artigo 6.º-A do C.P. Administrativo (velho): “1 - No exercício da actividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa fé. 2 - No cumprimento do disposto nos números anteriores, devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas, e, em especial: a) A confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa; b) O objectivo a alcançar com a actuação empreendida.” 14. Tem sido entendimento da Doutrina e Jurisprudência dominante que: “XI. O Recorrente, concorrente ao concurso sub judice, tomou conhecimento do programa de concurso, conformando-se com o mesmo, apresentou a sua proposta nos termos nele prescritos, deixou que decorresse todo o procedimento concursal, e só aquando da adjudicação e, porque esta decisão não lhe foi favorável, veio invocar a ilegalidade de um acto sem reservas e com o qual se conformou, tendo-se o mesmo consolidado na sua esfera jurídica; XII. Refira-se, aliás, que a inimpugnabilidade de actos com base na sua aceitação deve constituir um princípio geral, que, no caso dos concursos, corresponderá a uma concretização da boa fé nas relações entre a administração e os concorrentes” cfr. Ac. STA de 06-02-2003, Processo n.º 047855.

  12. “4. O princípio da boa fé mantém uma relação de proximidade com o princípio da confiança, que faz parte da própria ideia de Estado de direito democrático (art.º 2º da C.R.P). Este exige um mínimo de certeza nos direitos e legítimas expectativas das pessoas, ao mesmo tempo que proíbe quaisquer afectações arbitrárias ou excessivamente onerosas – (Cfr. Código do Procedimento Anotado e Comentado, António Francisco de Sousa, 2.ª Edição (revista e atualizada), Quid Iuris, p. 67.) 16. No nosso entendimento, salvo o devido respeito, foram violados os preceitos normativos referidos anteriormente, visto que o Tribunal a quo interpretou as mesmas de forma restritiva, sendo certo que o Réu violou claramente o princípio da Boa Fé e o princípio da Confiança previsto no artigo 6.º-A do C.P. Administrativo (velho), dado que anulou o presente procedimento com fundamentos ilícitos.

  13. No âmbito da Teoria “Perda de chance” perfilhada pela grande parte da Jurisprudência e Doutrina portuguesa e europeia, é entendimento dominante que: ““E, especialmente, no domínio dos concursos de provimento para cargos públicos ou de adjudicação de contratos, em que a indevida exclusão de um candidato que tivesse uma efetiva possibilidade de sucesso fica praticamente desprotegida se não se tiver em consideração o dano que provém da própria expectativa de obter a indigitação” Cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilhe, Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, 2008, pág. 85) 18. Ora, com o devido respeito, cremos que a presente Teoria da “Perda de Chance" foi claramente violada, dado que o Tribunal a quo não a interpretou corretamente, visto que invocou que a Ré entendia que a decisão do Júri não estava devidamente fundamentada - o que é falso - e, por isso, não existiria uma probabilidade alta de homologação da decisão.

  14. Tem sido entendimento da jurisprudência e doutrina dominante que: “É necessário relembrar que, com a emancipação do “dano de perda de chance”, não ocorre qualquer desvirtuamento na aplicação dos pressupostos clássicos da responsabilidade civil, nomeadamente no que diz respeito à verificação do nexo causal. Este é afirmado, não entre o fato danoso e o resultado último que a vítima esperava alcançar, mas entre o primeiro e a perda da possibilidade de se obter o segundo. Esta causalidade terá então que ser provada por parte da vítima, com base na tradicional teoria da causalidade adequada presente no artigo 563º do CC. Não se verifica assim qualquer aplicação menos ortodoxa no nexo causal, mas apenas uma extensão do conceito de dano reparável, com o “aparecimento” do dano da “perda de chance”, que resultando de um acto ilícito e culposo, e verificado que esteja o nexo causal entre este e as “chances” perdidas, terá de ser obrigatoriamente indemnizado. (Cfr. A «perda de Chance» Como Uma Nova Espécie de Dano, Nuno Santos Rocha, Almedina, 2014, p. 97.

  15. O Tribunal a quo não apreciou os outros pressupostos legais da responsabilidade civil extracontratual, pois entendeu que tal não era necessário, visto que alegadamente a anulação do procedimento concursal não era ilícita.

  16. Com o devido respeito, no nosso entendimento, devem ser aplicados os preceitos normativos previstos nos artigos 10.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, 487.º n.º 2, 496.º n.º 1 e 563.º estes últimos todos do C. Civil.

  17. De acordo com o disposto no artigo 10.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, quando estamos perante um ato ilícito, verifica-se uma presunção legal da culpa leve, sendo que, ainda assim, sempre se dirá que é...

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