Acórdão nº 0239/19.5BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução03 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal n.º 239/19.5BESNT 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada (adiante Recorrente ou Executada) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou improcedente a reclamação por ela deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 1 quanto à liquidação dos juros moratórios, efectuada nos termos do art. 44.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária (LGT).

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «A. A sentença recorrida padece de erros de julgamento ao ter decidido pela legalidade da liquidação de juros moratórios efectuada à ora Recorrente em sede de execução fiscal.

  1. No caso está em causa uma liquidação de juros de mora que começaram a contar em inícios de 2008 (e cujo prazo de contagem terminou, portanto, em inícios de 2011 face ao artigo 44.º, n.º 2, da LGT, na redacção em vigor à data) mas que foram contados ininterruptamente até inícios de 2019, data em que a ora Recorrente efectuou o pagamento da quantia exequenda (imposto e juros).

  2. No que concerne à aplicação no tempo da versão actual do artigo 44.º, nº 2, da LGT (que estabelece que «Os juros de mora aplicáveis às dívidas tributárias são devidos até à data do pagamento da dívida»), a mesma não pode abranger, sob pena de retroactividade, aqueles casos – como é o caso sub judice – em que já decorreu integralmente o prazo máximo de três anos para cobrança de juros previsto na versão anterior da mesma norma.

  3. Isto significa que o artigo 151.º, n.º 2, da Lei n.º 64-B/2011, deve ser objecto de uma interpretação conforme à Constituição, tendo em conta a proibição de aplicação retroactiva da lei fiscal, prevista no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição e no artigo 12.º da LGT. Neste contexto, quando na citada disposição se estabelece que a nova redacção do artigo 44.º, n.º 2, da LGT, tem aplicação imediata em todos os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes à data da sua entrada em vigor, tal norma não pode deixar de ser entendida restritivamente como reportando-se à aplicação imediata a todos os processos de execução fiscal pendentes em que não tenha ainda decorrido integralmente o prazo máximo de cobrança de juros de mora previsto na redacção anterior do mesmo artigo 44.º. n.º 2.

  4. A questão da aplicação no tempo da alteração do artigo 44.º, n.º 2, da LGT introduzida pela Lei n.º 64-B/2011 deve ser encarada como um problema de aplicação de uma lei que vem suprimir um prazo.

  5. Este problema é resolvido pelas regras do artigo 297.º do Código Civil aplicável por remissão do artigo 2.º da LGT.

  6. Consequentemente, uma vez que no caso sub judice o prazo de três anos para cobrança de juros moratórios já havia decorrido à data da entrada em vigor da lei nova, esta não é aplicável, sendo-o apenas a todos aqueles casos em que o referido prazo não houvesse ainda decorrido a tal data.

  7. É esta a única solução que se afigura correcta para o problema que nos ocupa e que respeita a confiança depositada pelo contribuinte na versão do artigo 44.º, n.º 2, da LGT em vigor no momento em que se iniciou e completou o prazo de três anos nele previsto e que é perfeitamente compaginável com as normas de direito transitório introduzido no artigo 151.º da Lei n.º 64-B/2011, como acima se deixou demonstrado.

    I.

    O entendimento do Tribunal a quo segundo o qual estamos perante uma situação de retroactividade inautêntica não merecedora de tutela por os juros de mora configurarem um facto tributário de formação sucessiva também padece de erro.

  8. Com efeito, a seguir-se este entendimento a contagem dos juros sempre teria, no caso concreto, que ter sido interrompida entre 17 de Janeiro de 2011 e 31 de Dezembro de 2011, por aplicação do artigo 12.º, n.º 2, da LGT, o que não sucedeu.

  9. Acresce que este entendimento do Tribunal recorrido deixa por tutelar a confiança depositada pelos contribuintes nos efeitos do decurso do prazo de três anos previsto na lei, prazo este que se verificou na sua plenitude ao abrigo da lei antiga.

    L. E não serve invocar as dificuldades em torno da implementação do Programa de Assistência Económica e Financeira, iniciado em 2011, considerando que, em tal contexto, a alteração produzida na ordem jurídica pela nova redacção do artigo 44.º, n.º 2, da LGT não se traduziu numa alteração de expectativas dos contribuintes, tanto mais que, à data, «inexistia qualquer garantia de imutabilidade da legislação fiscal ou tão-pouco uma ideia de continuidade com as normas fiscais vigentes enunciadas pelo Estado» (cf. pág. 13 da sentença).

  10. Com efeito, esta afirmação é directamente infirmada, quer pelo princípio da protecção da confiança legítima, quer pela introdução da proibição da retroactividade da lei fiscal, introduzida pela Revisão Constitucional de 1997.

  11. Neste ponto não se põe em causa que a tutela da confiança deva ceder em todos aqueles casos em que o prazo máximo de cobrança de juros moratórios não tivesse decorrido integralmente à data da entrada em vigor da nova versão do artigo 44.º, n.º...

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