Acórdão nº 3125/17.0T8VIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | FÁTIMA GOMES |
Data da Resolução | 19 de Junho de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1. AA propôs acção declarativa contra BB, CC e DD, Lda, tendo formulado os seguintes pedidos: «
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Sejam declaradas nulas todas as deliberações tomadas na acta n.º 13; b) Consequentemente seja declarada nula a eleição da terceira Ré- DD, Lda.
c) Seja declarada nula e de nenhum efeito a renúncia ao cargo pelos Administradores CC e BB, ora primeiros e segundos Réus; d) Ainda que se entenda ser eficaz a renúncia do cargo pela administradora e ora primeira Ré CC, seja declarada nula e de nenhum efeito a renúncia levada a cabo pelo administrador e ora segundo Réu BB.
e) Devem os primeiro e segundo Réus ser exonerados do cargo, atenta a negligência e prática reiterada de irregularidades na administração, nos termos dos artigos 1435º do Código Civil e 1056º do Código de Processo Civil; f) Devem os primeiro, segundo e terceiros Réus ser condenados a prestar contas da administração desenvolvida desde o ano de 2016; g) Devem os primeiro, segundo e terceiros Réus ser condenados a apresentar extractos bancários referentes a - Responsabilidade Limitada - todo o período de administração durante o ano de 2016 e 2017; h) Devem os Réus ser condenados a justificar as eventuais despesas realizadas e receitas obtidas durante o período de 2016 e 2017; i) Devem os Réus ser condenados no pagamento de eventuais dívidas perante terceiros que da sua actuação hajam resultado para o condomínio.
j) Devem ainda todos os Réus ser condenados a restituir ao condomínio o acesso às contas bancárias e todos os documentos propriedade do condomínio, nomeadamente livros de actas e livros de recibos, e tudo quanto seja propriedade do condomínio e esteja em posse dos Réus».
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Contestou o réu BB alegando que foram respeitadas todas as regras relativas à convocação da assembleia de condóminos, devendo, por isso, improceder a acção, alegando ainda ter caducado, pelo decurso do tempo o direito de pedir a anulação das deliberações.
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Na sequência da tentativa de conciliação realizada nos autos, a autora desistiu dos pedidos deduzidos sob as alíneas f), g), h) e i) da petição inicial (relativos à prestação de contas), desistência que foi homologada.
O tribunal entendeu que já tinha os elementos necessários para decidir quanto aos restantes pedidos e conheceu dos mesmos no despacho saneador, tendo proferido a seguinte decisão: «Pelo exposto o Tribunal:
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Julga procedente a excepção da caducidade do direito da autora propor acção de anulação das deliberações exaradas na acta n.º 13 e, em consequência, absolvem-se os réus dos pedidos contra si formulados sob as als. a) a d).
b) Declara a extinção da instância referente ao pedido deduzido em e), por inutilidade superveniente da lide respectiva.
Custas eventualmente em dívida a juízo a cargo da autora e sem prejuízo do apoio».
4.
A autora veio interpôs recurso de apelação da decisão, que foi admitido pelo Tribunal de Relação de Coimbra, e que veio a proferir acórdão, em 20/2/2019, do qual consta a seguinte decisão: “Considerando o exposto: 1 – Admitem-se os documentos juntos com o recurso.
2 – Revoga-se a sentença quanto à decisão que julgou caduco o direito de instaurar a acção.
3 – Anulam-se as deliberações tomadas na ata n.º 13 identificada nos factos provados na parte em que a assembleia: «
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Elegeu a ré DD, Lda., pelo período compreendido entre Dezembro de 2016 e Novembro de 2017; b) Aprovou o orçamento constante dessa ata; c) Conferiu poderes ao legal representante da ré DD para livremente movimentar as contas bancárias existentes, podendo até encerrá-las e abrir novas contas onde entender».
4 – Condenam-se os Réus a restituir ao condomínio o acesso às contas bancárias e todos os documentos propriedade do condomínio, nomeadamente livros de atas e livros de recibos, e tudo quanto seja propriedade do condomínio e esteja em posse dos Réus.
Custas pelos Réus.” 5.
Inconformado com a decisão dela apresentou revista o R, BB, na qual formula as seguintes conclusões (transcrição): “1. A decisão proferida pelo douto Tribunal da Relação de Coimbra, salvo o devido e merecido respeito, assenta no erro de interpretação ou aplicação do preceituado no artigo 1433.º, n.º 4 do Código Civil, violando expressamente o disposto no referido preceito legal.
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A A. confessa ter sido convocada para a assembleia extraordinária a realizar no dia 26/10/2016, se em primeira convocatória, ou no dia 02/11/2016 na eventualidade de naquele dia 26 de Outubro não existir quórum constitutivo, tal como veio a suceder.
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Naquele dia 02/11/2017 a assembleia deliberou unanimemente acerca: 1) da aprovação do orçamento - e correspondente distribuição da despesa - para reparação das campainhas; 2) da renúncia ao cargo de administradores do condomínio por parte dos RR. CC e BB, ora recorrido e; acerca da entrega da administração do condomínio a uma empresa do ramo atenta a falta de condóminos presentes e interessados em desempenhar tais funções; da suspensão da assembleia para recolha de orçamentos de empresas do ramo da administração de condomínios.
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No dia 17/11/2017 a assembleia deliberou unanimemente acerca da escolha da empresa que iria desempenhar as funções de administradora do condomínio para o período compreendido entre Dezembro de 2017 e Novembro de 2018, tendo sido eleita a R. DD, tendo ainda sido aprovado o orçamento a vigorar para o período referido.
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O prazo de 60 dias previsto no artigo 1433.º, n.º 4 do Código Civil iniciou-se no dia 02/11/2017, por ser a data da tomada das deliberações, e não no dia 16/12/2016, data em que a A. foi notificada por carta registada das deliberações.
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Se por mera hipótese académica se considerar que o referido prazo se iniciou no dia 17/11/2017, sê-lo-á apenas em relação às deliberações tomadas naquele dia e nunca em relação às deliberações tomadas no dia 02/11/2017.
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O prazo de impugnação das deliberações em causa por via de acção de anulação terminou no dia 02/01/2017 ou, em última instância, quanto às deliberações tomadas no dia 17/11/2017, no dia 16/01/2017.
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O tribunal a quo decidiu mal ao considerar que o prazo de 60 dias previsto no n.º 4 do artigo 1433.º do CC se iniciou no dia 16/12/2016 por ter sido a data em que a A. foi notificada das deliberações por carta registada, decisão que viola frontalmente o disposto naquele preceito legal.
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À data de apresentação do pedido de apoio judiciário junto da Segurança Social (23/01/2017), o prazo de 60 dias estabelecido no referido artigo 1433.º, n.º 4 do Código Civil estava ultrapassado.
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O direito de a Autora reagir, por via de acção de anulação, contra as deliberações constantes da acta n.º 13 caducou, assim, por força do disposto no artigo 1433.º, n.º 4 do Código Civil.
POR TUDO O EXPOSTO, E SEM NECESSIDADE DE MAIS AMPLAS CONSIDERAÇÕES, DEVERÁ A PRESENTE REVISTA SER JULGADA PROCEDENTE, POR PROVADA, E, CONSEQUENTEMENTE, REVOGAR-SE A DECISÃO PROFERIDA PELO DOUTO TRIBUNAL A QUO FICANDO A SUBSISTIR A SENTENÇA DA 1.ª INSTÂNCIA, ASSIM SE FAZENDO TÃO COSTUMADA JUSTIÇA.” 6.
A A. apresentou contra-alegações nas quais formula as seguintes conclusões (transcrição): I. Tendo as deliberações tomadas na assembleia realizada em 17/11/2016 e constantes da acta nº 13 sido comunicadas à Autora/Recorrida através de correio registado com aviso de recepção recebido em 16.12.2016, é a partir desta data que se conta o prazo para a propositura da acção de anulação das deliberações.
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O art. 1433º, nº 4 do Código Civil tem de ser conjugado com o 1432º, nº 6, sob pena de se coarctarem irremediavelmente os direitos dos condóminos ausentes, concedendo ainda carta branca para que as administrações decidam a seu bel-prazer, bastando para isso que convoquem assembleias com uma ordem de trabalhos despicienda, vindo depois na assembleia a discutir assuntos importantes que não constavam da ordem de trabalhos, abstendo-se de comunicar as decisões aos ausentes ou, como na situação que nos ocupa, a comunicar 29 dias depois da deliberação (assim manietando a Autora/Recorrente, mais ainda que necessitou de requerer o benefício do apoio judiciário).
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É, aliás, o que resulta do art. 329º do Código Civil, segundo o qual o prazo de caducidade apenas pode começar a contar quando o direito puder ser legalmente exercido – o que no caso em apreço significa que apenas começa a contar quando as deliberações da assembleia chegam ao conhecimento dos condóminos.
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Ainda que assim não se entenda, o que apenas por cautela se admite, não se pode olvidar que foi solicitada a realização de uma assembleia extraordinária pelo condómino EE.
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Assembleia essa cuja realização foi negada sem fundamento válido pela então administradora DD, decisão que comunicou aos condóminos através de carta datada de 24/01/2017 junta pelo Recorrente sob o documento nº 7 da contestação.
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Dispondo o art. 1433º, nº 4 que “o direito a propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária”, entendemos que, perante a recusa na realização da assembleia extraordinária, tal prazo só pode começar a contar a partir da notificação da recusa.
VII.
Considerando-se a acção proposta em juízo em 23/01/2017, sendo a missiva que informa da não realização da assembleia extraordinária de 24/01/2017, sempre a acção foi proposta no prazo. Termos em que, deve o recurso interposto pelo Réu/recorrente ser julgado improcedente, pois só assim se fará Justiça!” 7.
Tendo em consideração que o âmbito dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente (artigos 639.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as questões que este recurso coloca são as seguintes: 1 – Quando a presente acção foi proposta já se encontrava ultrapassado o prazo para a impugnação da deliberação da assembleia de condóminos? 2 – Como se conta esse prazo quando existe assembleia suspensa? Colhidos os visto, cumpre analisar e decidir.
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Fundamentação 8. A matéria...
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