Acórdão nº 00519/17.4BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução28 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório MBOR, devidamente identificada nos autos, no âmbito de Ação Administrativa que intentou contra o Fundo de Garantia Salarial, tendente à impugnação do Despacho do Presidente do Conselho de Gestão do FGS que indeferiu o pedido que havia formulado, no sentido de lhe serem pagos os créditos laborais que entendia ter direito, inconformado com a decisão proferida no TAF de Aveiro que em 31 de novembro de 2018 julgou improcedente a Ação, veio recorrer jurisdicionalmente para esta instância em 9 de janeiro de 2019, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1. O art° 1° nº 1 al. a) do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, doravante aqui designado por NRFGS, preceitua que o Fundo assegura o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja proferida sentença de declaração de insolvência do empregador.

  1. A interpretação da citada norma no sentido de que a declaração de insolvência não é requisito material para que o trabalhador possa exercer o seu direito não tem o mínimo de correspondência com a letra da lei.

  2. O sentido apreensível por qualquer destinatário do comando da norma é o de que a declaração de insolvência constitui requisito material necessário para o exercício do direito de exigir do FGS o pagamento dos créditos garantidos.

  3. Qualquer trabalhador perante a leitura da norma fica na convicção de que o seu direito só pode ser exercido desde que a sua entidade empregadora seja declarada em estado de insolvência, e por tal, jamais admitirá nessa circunstância, que o seu direito possa ser extinto sem que estejam verificados os requisitos legais para o seu exercício.

  4. Por violação do princípio da efetivação e garantia dos direitos fundamentais previstos, respetivamente, nos artºs 2° e 59° nº 3 do Constituição da República Portuguesa, a norma constante do art° 1° nº 1 al. a) do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial aprovado pelo Dec-Lei nº 59/2015 de 21 de Abril é materialmente inconstitucional quando, na unidade do diploma em que está inserida, é interpretada no sentido de que o pedido de pagamento dos créditos garantidos ao Fundo de Garantia Salarial não depende da declaração de insolvência da entidade empregadora.

  5. Na data em que entrou em vigor o NRFGS o direito de a Autor reclamar o pagamento dos seus créditos garantidos ao abrigo do Fundo de Garantia Salarial estava consolidado na sua esfera jurídica a coberto de qualquer prazo prescritivo ou preclusivo.

  6. O art° 3° nº 1 do Dec-Lei nº 59/2015 ao retroagir os efeitos do NRFGS a relações jurídicas já constituídas no regime legal anterior afronta a certeza e proteção das relações jurídicas constituídas e frustra expectativas legitimamente criadas, sendo por isso materialmente inconstitucional por violar o disposto no art° 2° da Constituição da República Portuguesa, 8. Não sendo o prazo de caducidade previsto no nº 8 do art° 2° do NRFGS suscetível de suspensão ou interrupção, tal como entendeu da douta sentença recorrida, o seu decurso pode ocorrer sem que o trabalhador possa exercer o seu direito perante o Fundo de Garantia Salarial por falta da verificação dos requisitos materiais e formais previstos nos artºs 1° nº al a) e 5° nº 2 al. a ) do NRJFGS.

  7. A norma contida no artigo 2.°, n.º 8, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial instituído pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão; e, consequentemente, Termos porque ao presente recurso deve ser dado provimento, revogando-se por consequência a douta decisão recorrida, assim se fazendo inteira e merecida Justiça.”*O Recorrido/FGS não veio apresentar contra-alegações de Recurso.

    *O Recurso apresentado veio a ser admitido por Despacho de 11 de abril de 2019.

    *O Ministério Público, junto deste Tribunal, em Parecer emitido em 20 de maio de 2019, veio a emitir Parecer em 23 de maio de 2019, no qual, a final, se pronunciou no sentido da procedência do Recurso.

    *Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

    *II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir, designadamente, as invocadas inconstitucionalidade de normas do DL 59/2015, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

    III – Fundamentação de Facto Consta da decisão proferida a seguinte factualidade: 1.

    A autora foi admitida ao serviço de " TN & R, Lda." em 1 de fevereiro de 1987; (Facto Provado por acordo e por documento a fls 67 e segs do PA – paginação eletrónica) 2.

    A 5 de janeiro de 2015 a autora comunicou a " TN & R, Lda." a cessação do seu contrato de trabalho por falta de pagamento de remunerações; (Facto Provado por documento a fls 67 e segs do PA – paginação eletrónica) 3.

    A 26 de setembro de 2016 é proferido Acórdão do Tribunal da Relação do Porto mantém a decisão de primeira instância quanto à declaração de insolvência de " TN & R, Lda."; (Facto Provado por documento a fls 67 e segs do PA – paginação eletrónica) 4.

    A 21 de outubro de 2016 MBOR requer ao Fundo de Garantia Salarial pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, nos termos seguintes: […] (Dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC) (Facto Provado por documento, a fls 1 e segs dos autos – paginação eletrónica) 5.

    Em 14 de fevereiro de 2017 é subscrito documento timbrado de "Unidade de Apoio à Direção. Núcleo de Assuntos Jurídicos e Contencioso. Instituto de Segurança Social, IP", dirigido a MBOR, onde consta em especial: (Dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC) (Facto Provado por documento, a fls 1 e segs dos autos – paginação eletrónica)*IV – Do Direito A Autora intentou a presente ação administrativa contra o “Fundo de Garantia Salarial” invocando a nulidade do despacho de 24.01.2017, que indeferiu o seu pedido de pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho celebrado com “TN & R, Lda.”, com o fundamento de que o requerimento da A. não foi apresentado dentro do prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do nº 8 do art. 2º do DL 59/2015, de 21.04, pedindo a sua condenação ao pagamento créditos descriminados no requerimento indeferido.

    No que ao direito concerne, e no que aqui releva, discorreu-se em 1ª instância: “(...) De harmonia com o disposto no artigo 2.,º n.º 8 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL. n.º 59/2015, de 21 de Abril, o Fundo de Garantia Salarial só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano, a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

    Ora, este prazo previsto no n.º 8 do artigo 2.º do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), aprovado pelo DL. n.º 59/2015, de 21 de Abril, cuja entrada em vigor ocorreu em 04-04-2015, é um prazo de caducidade.

    Sobre o tempo e a sua repercussão nas relações jurídicas dispõe o artigo 298.º do Código Civil o seguinte: "… 1. Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição. 2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição…".

    Portanto, o artigo 2.º, n.º 8 do NRFGS estabelece um prazo para o trabalhador pedir o pagamento de créditos laborais ao Fundo de Garantia Salarial, sem dizer expressamente que se trata de prazo prescricional (artigo 298º, n.º 2 do CC), pelo que se a lei nada refere acerca da natureza daquele prazo, forçoso é concluir que se trata de um prazo de caducidade e não de prescrição.

    O prazo de caducidade é, por fim, um prazo prefixo que, pressupondo o interesse na rápida definição do direito, não se compadece com dilações e, por isso, não comporta a paralisação do direito.

    Assim, por determinação legal expressa, exceto nos casos em que a lei o determine, os prazos de caducidade não se suspendem nem se interrompem [artigo 328.º do CC].

    Na caducidade, o prazo visa preestabelecer o lapso de tempo dentro do qual se terá de exercer o direito, por imposição da lei ou vontade negocial. O prazo, na caducidade, é condição de admissibilidade e procedibilidade, por ser elemento constitutivo do direito.

    Por isso, considerando que o prazo do artigo 2.º/8 do DL nº 59/2015, de 21 de abril começa a correr a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, em conformidade com o disposto no artigo 329.º do CC, entendendo-se que o início da contagem daquele prazo, de caducidade, vem expressamente fixado na letra da lei e corresponde ao momento a partir do qual a autora pode pedir ao Fundo o pagamento dos créditos laborais em dívida, pelo que o início da sua contagem não depende, como pretende o autor, da existência de sentença que declare a insolvência do empregador.

    Em síntese: se a lei não fixar outra data, nos casos em que a lei se limita a fixar o prazo da caducidade, sem fixar a data a partir do qual se conta, começa a correr a partir do momento em que puder ser exercido [artigo 329º CC].

    O decurso do prazo de caducidade provoca a extinção ou a perda da prerrogativa de exercer o direito. Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua efeito...

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