Acórdão nº 00175/19.5BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução12 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MSL requereu a intimação para prestação de informações contra o Ministério da Educação, ambos melhor identificados nos autos, pedindo a intimação deste para lhe prestar as informações solicitadas no requerimento.

Por sentença proferida pelo TAF de Aveiro foi julgada procedente a acção e intimada a Entidade Requerida a prestar à Requerente tais informações no prazo de 10 (dez) dias.

Desta vem interposto recurso.

*Alegando, a Entidade Demandada concluiu: 1 – A decisão ora impugnada considerou procedente a Intimação, atentas as respetivas razões de facto e de direito, todavia o Recorrente não concorda com o sentido e fundamentos do decidido, conforme se evidenciou ao logo da alegação, razão pela qual recorre do decidido.

2 - O nº 1, do artigo 4º, do RGPD, [Regulamento (UE) n.º 2016/679] diploma legal que, em termos de hierarquia de fontes de direito, se sobrepõe a quaisquer diplomas legislativos nacionais, sendo de aplicabilidade direta no plano nacional define dados pessoais como qualquer Informação relativa a um qualquer cidadão, seja ela de que índole for pessoal, familiar, profissional, desportiva, religiosa, política, etc.

3 – Atento o disposto no nº 1, do artigo 4º, do RGPD, resulta que os tempos de serviço e os escalões remuneratórios em que os docentes se encontram posicionados configuram, para este efeito, dados pessoais [cfr. art.º 4.º, alínea 1), do Regulamento (UE) n.º 2016/679 e art.º 3.º, alínea a), da LPDP], porquanto traduzem-se em informações relativas a pessoas singulares identificadas ou identificáveis.

4 – Um documento administrativo pode assumir, concomitantemente, a veste administrativa e nominativa, sendo o caso dos presentes autos.

Ou seja; 5 - O conteúdo material de qualquer documento administrativo pode assumir a configuração material de documento nominativo, nos precisos termos que lhe é atribuída por lei - alínea b), do nº 1, do seu artigo 3º, da LADA.

6 - A LADA ao consignar, na alínea b), do nº 1, do artigo 3º, o conceito jurídico de “documento nominativo”, como sendo o “documento administrativo que contenha dados pessoais, definidos nos termos do regime legal de proteção de dados pessoais”, remete para o regime geral da proteção de dados pessoais para efeitos de integração do conteúdo semântico das expressões jurídicas “dados pessoais”.

7 - O nº 1, do artº 1º, do Regulamento (EU) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho “…estabelece as regras relativas à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados.” e (cfr. nº 2, do artº 1º) “ …defende os direitos e as liberdades fundamentais das pessoas singulares, nomeadamente o seu direito à proteção dos dados pessoais.” 8 - Do primeiro considerando do Regulamento (EU) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, resulta expressamente que: “… A proteção das pessoas singulares relativamente ao tratamento de dados pessoais é um direito fundamental… “.

9 – O Regulamento (EU) 2016/679 (RGPD) considera os dados pessoais como direitos fundamentais dos respetivos titulares, com todas as consequências que daí advêm, designadamente, a proteção que lhes é conferida, quer pelo referido Regulamento (EU) 2016/679, quer pela lei de Acesso a Documentos Administrativos (Lei nº 26/2016, de 22 de agosto), quer pela CRP.

10 – Da alínea b), do nº 1, do artigo 3º, da LADA e dos 1 e 2, do artº 1º, e dos 1 e 2, do artº 4º, do RGPD, resulta que os documentos e/ou informações que contenham dados profissionais, designadamente, índices remuneratórios, categorias profissionais etc. de uma pessoa singular são dados pessoais consubstanciando informação de natureza nominativa, cujo tratamento só pode ocorrer caso estejam reunidos os pressupostos de facto plasmados na previsão normativa resultante do nº 1, do artº 6º, do RGPD.

11 – Do nº 5, do artº 6º, da LADA reverte que documentos e dados nominativos só podem ser facultados a terceiro caso o terceiro estiver munido de autorização escrita do titular dos dados; 12 - Do nº 5, do artº 6º, da LADA resulta que os documentos e dados nominativos só podem ser facultados a terceiro, não havendo autorização do titular, caso o terceiro demonstrar, fundamentadamente, ser titular de um interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante, após ponderação, no quadro do princípio da proporcionalidade, de todos os direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta, que justifique o acesso à informação.

13 - O Tribunal recorrido considerou demonstrado o interesse direto, pessoal e legítimo da Requerente no acesso às informações em causa alegando que foi justificada com fundamento na sua relevância e pertinência para o Requerente poder decidir um eventual recurso à via judicial, nomeadamente, com base no princípio da igualdade.

14 - A Recorrida diz carecer das informações para decidir se eventualmente recorre ou não à via judicial, com base no princípio da igualdade, tendo assim necessidade de conhecer os dados relativos aos docentes do Agrupamento que, alegadamente, terão sido posicionados em escalão e índice remuneratório acima daquele em que se encontra a Recorrida, por força do estatuído na Portaria n.º 119/2018, de 04/05, não tendo autorização dos titulares dos dados em questão.

15 - O Tribunal recorrido ao decidir, na convicção do Recorrente, não preencheu factualmente todos os segmentos normativos que resultam da lei a saber: existência de um interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante, que após ponderação, no quadro do princípio da proporcionalidade, de todos os direitos fundamentais em presença, e do princípio da administração aberta justifique o acesso à informação.

16 – Não resulta dos autos a existência de qualquer interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante, situado na esfera jurídica da Recorrida que lhe permita ter acesso aos dados solicitados para decidir-se sobre um eventual recurso à via judicial, designadamente, com base no princípio da igualdade.

17 - Não resulta dos autos uma ponderação detalhada e pormenorizada, feita pelo TAF, no quadro do princípio da proporcionalidade, de todos os direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta, que justifique o acesso à informação em detrimento do tratamento dos dados pessoais dos respetivos titulares.

18 - A Recorrida sustenta a sua pretensão na necessidade de conhecer os dados relativos aos docentes do Agrupamento que, eventualmente, terão sido reposicionados em escalão e índice remuneratório superior ao seu, ex vi da Portaria n.º 119/2018, de 04/05 para poder decidir sobre um hipotético recurso à via judicial, designadamente, com fundamento no princípio da igualdade.

No entanto; 19 – A pretensão da Recorrida tal, tal como é delineada, não fundamenta em que medida os seus alegados interesses se situam num plano de supra ordenação relativamente à tutela constitucional dos dados pessoais cujo acesso pretende obter nem tal hierarquização de interesses conflituantes é devidamente ponderada na sentença.

20 - A pretensão da Recorrida constitui uma argumentação genérica, abstrata, da qual não resulta matéria de facto suscetível de preencher todos os segmentos normativos de verificação cumulativa exauridos na alínea b), do nº 5, do artº 6º, da LADA.

21 - O Tribunal recorrido não nos parece ter demonstrado de onde resulta a ponderação feita, no quadro do princípio da proporcionalidade, de todos os direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta, que justifique o acesso à informação.

22 - A Lei da Proteção de Dados portuguesa, face à entrada em vigor do RGPD caso se entenda não estar revogada pelo RGPD, no entanto, cede face à normatividade do RGPD em termos de hierarquia de fontes de direito, sobrepondo-se-lhe a respetiva normatividade, não podendo fazer-se alusão ao art.º 3.º, alínea a), da LPDP, nem a jurisprudência anterior à entrada em vigor do atual Regulamento (EU) 2016/679 (RGPD).

23 – A remissão da alínea b), do nº 1, do seu artigo 3º, da LADA para o “regime legal de proteção de dados pessoais”, vai focalizar tudo quanto se lhe segue no Regulamento (EU) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho.

24 - A remissão da alínea b), do nº 1, do seu artigo 3º, da LADA para o “regime legal de proteção de dados pessoais”, não se reporta à Lei Portuguesa sobre a matéria, lei esta que, caso não se entenda estar revogada tacitamente pelo RGPD, Regulamento EU, cede sempre face à sua posição de infra ordenação, em termos de hierarquia de fontes de direito, relativamente ao RGPD, Regulamento EU.

Normas jurídicas violadas.

Pela forma como o TAF decidiu, salvo o devido respeito, foram violadas, entre outras, as seguintes normas legais, a saber: - O nº 1, do artigo 4º, do RGPD, ou seja, do Regulamento (UE) n.º 2016/679, - A alínea a), do nº 1, do artigo 3º, da Lei n.º 26/2016 (LADA); - Subalínea iv), e art.º 5.º, n.º 1, da LADA; - Alínea b), do nº 1, do artigo 3º da LADA; - Primeiro considerando do Regulamento (EU) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, que entrou em vigor em 25 de maio de 2018 - Artº 18º, nº 3, da CRP; - Nº 2, do artº 4º, do RGPD; - Nº 1, do artº 6º, do RGPD; - Nºs. 1 e 2, do artº 1º da LADA - Nºs. 1 e 2, do artº 4º, do RGPD - Nº 5, do artº 6º, da LADA TERMOS EM QUE: - O recurso deve proceder; - Deve considerar-se estar em causa o tratamento de dados pessoais de natureza nominativa; - Deve considerar-se que, na ponderação devida de interesses, o direito à proteção de dados dos docentes situa-se num plano de supra ordenação relativamente ao pedido da Recorrida.

*A Requerente juntou contra-alegações, concluindo: 1- As informações solicitadas pela Recorrida ao Recorrente constam de documentos administrativos, nos termos do artº 3º, nº 1...

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