Acórdão nº 00888/14.8BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | Ricardo de Oliveira e Sousa |
Data da Resolução | 31 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO MSICU, LDA., devidamente identificada nos autos, vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra [doravante T.A.F. de Coimbra], de 15.05.2015, proferida no âmbito da Ação Administrativa Especial que a Recorrente intentou contra o MUNÍCIPIO DE C… e contra AC - ÁGUAS C..., E.M.
, que julgou procedente a exceção de ineptidão da petição inicial, e, consequentemente, absolveu os Réus da instância.
Em alegações, a Recorrente formulou as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) 9.1.- A inexistência jurídica do auto de vistoria e a nulidade do ato que lhe está subjacente [comunicação a que se alude no artigo 25°. da p.i. e conexo Doct°. n°.9], carecendo em termos absolutos de forma legal, conduz inexoravelmente e em qualquer caso à receção tácita das preditas obras de urbanização por força do disposto no artigo 394°., n°s.6 e 7, do Código dos Contratos Públicos.
9.2.
- Em face do pedido sintético final para conhecimento e apreciação das invocadas nulidades e condenação dos Réus à prática do ato omitido, a forma de processo adequada para os subjacentes efeitos é a ação administrativa especial.
9.3.- O pedido preliminar de condenação dos Réus a reconhecer em primeiro lugar o direito da Autora e, por consequência, o pedido de condenação destes à prática do ato omitido, ou seja, na receção tácita definitiva das obras de urbanização, não encerra qualquer contradição perante a respetiva causa de pedir.
9.4.- Atenta a delegação de poderes que se verifica e a relação de domínio existente entre o Réu Município de C... e a Ré AC Águas, ambas exercem conjuntamente os poderes de fiscalização, controlo e licenciamento. - A fim de se prevenir que um empurre as suas responsabilidades para o outro e vice-versa, conforme decorre do alegado no artigo 14°. da p.i., ambos devem ser condenados nos termos do pedido formulado.
9.5.- A cumulação de pedidos formulados, resulta da relação de dependência entre eles, inscrevendo-se nesta lógica o pedido de condenação dos Réus a reconhecer que, na procedência dos pedidos anteriores, se torna desnecessária a garantia subsistente circunscrita à quantia certa de 78.508,23 Euros.
9.6.- A Sentença recorrida estriba-se numa desproporcionada construção semântica e dialética fazendo com que o excesso de forma impere sobre a questão essencial, ignorando assim o disposto constante do artigo 268°., n°.4, da Constituição da República Portuguesa, cujo comando garante o direito à impugnação de quaisquer omissões ou atos administrativos que lesem os interesses legalmente protegidos.
9.7.- A Sentença Recorrida para além da disposição constitucional citada, violou também o disposto nos artigos 4°., n°.1, alínea a) e n°.2, alínea c), 46°., n°s.1 e 2, alíneas a) e b), 47°., n°.1, 53°., todos do C.P.T.A., sendo feita uma errónea aplicação do disposto no artigo 186°., n°.2, alínea b) do C.P.C., ex vi artigo 1º. do aludido C.P.T.A..
TERMOS EM QUE, ADMITINDO O PRESENTE RECURSO NO ÂMBITO DO DISPOSTO NO ARTIGO 149°., N°S.1 A 5, DO C.P.T.A., DEVE SER DADO PROVIMENTO AO MESMO, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, COM O QUE, VOSSAS EXCELÊNCIAS, SENHORES JUÍZES DESEMBARGADORES, ASSIM FARÃO INEQUÍVOCA E PLENA JUSTIÇA.
(…)”.
*Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Município de C... apresentou contra-alegações, que rematou da seguinte forma: “(…) 1. A Autora peticiona o reconhecimento do direito e a consequente condenação dos Réus na receção definitiva das obras de urbanização do loteamento em causa, bem como o cancelamento da garantia bancária prestada a favor do Município.
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A condenação à prática de ato administrativo legalmente devido pode ser pedida, nos termos do disposto no artigo 67.° do CPTA, quando, designadamente, tenha sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir e não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido.
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O preenchimento deste pressuposto determina, por um lado, que tenha sido apresentado à autoridade administrativa competente um requerimento que a constitua no dever legal de decidir sobre a pretensão nele formulada através de um ato administrativo e que não tenha sido proferida qualquer decisão, de deferimento ou de indeferimento.
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Por outro lado é necessário que o silêncio da Administração não corresponda legalmente a um deferimento tácito da pretensão formulada.
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A Autora alega sistematicamente na sua douta petição que se formou tacitamente o ato de receção definitiva, nos termos previstos nos artigos 394.°, n.° 7 e 398.°, n.° 6 do CCT, ex vi artigo 87.° do RJUE, para, a final, peticionar o reconhecimento dos Réus que se deu a receção tácita das mesmas obras.
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A ação dirigida ao reconhecimento de que o ato tácito se produziu segue a forma da ação administrativa comum e não a ação administrativa especial.
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É evidente o erro na forma de processo, bem como é clara e notória a contradição entre a causa de pedir e o pedido, o que determinou a ineptidão da p.i. e a consequente absolvição da instância dos Réus.
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Contradição que resulta do pedido de reconhecimento do direito da Autora decorrente de uma receção definitiva tácita e, por outro, do pedido de condenação dos Réus a praticar o ato de receção definitiva da obra, mas também da contradição intrínseca de condenação de ambos os Réus na prática de um mesmo ato, quando a autoria do ato pedido só pode pertencer a um dos Réus.
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Não violou a sentença recorrida qualquer norma invocada pela Autora.
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Andou bem o tribunal recorrido ao absolver os Réus da instância por ineptidão da petição inicial, decisão que deve ser confirmada.
Termos em que e nos mais de direito, deve negar-se provimento ao recurso interposto pela recorrente, assim se fazendo JUSTIÇA.
(…)”.
*A recorrida AC- ÁGUAS C..., EM, também contra-alegou, embora de forma não conclusiva, nos seguintes termos: “(…) I - O presente recurso vem interposto da sentença de fls.. que decidiu que “...por ineptidão da petição inicial, absolvo da Instância ambos os Réus".
A douta sentença recorrida não merece a mais leve censura, devendo antes ser aplaudida, pois está fundamentada e conforme o DIREITO, dando-se por isso aqui por integralmente reproduzida a sua douta fundamentação.
II - A Autora recorrente veio interpor recurso para o Tribunal Central Administrativo do Norte, apresentando como razão do seu dissídio para com a decisão, que “o Tribunal a quo fez uma incorreta aplicação do direito”.
Acontece que, não assiste qualquer razão à recorrente e das suas alegações não se vislumbra qualquer fundamento que justifique a alteração do decidido pelo Tribunal a quo, devendo a douta sentença proferida manter-se, pois traduz de forma certeira a aplicação do Direito.
III - A Autora recorrente, produz as suas alegações, sem compreender que lavra em profundo erro e contradição na formulação da sua peça processual tendente a fazer valer a sua pretensão, quando é certo que foi até antes notificada para suprir as contradições identificadas por douto despacho de fls... e isso não fez ou promoveu.
Com efeito, a recorrente intentou a presente ação administrativa especial e não ignora, de facto, que conforme alegou no art.° 1 da sua p.i. constitui objeto da presente ação “...o pedido de reconhecimento do direito e a consequente condenação dos Réus na receção definitiva das obras de urbanização, bem como o cancelamento da inerente Garantia Bancária.”.
E como refere o Tribunal a quo na douta sentença recorrida, o objeto da presente ação consiste, pois, além do mais, num pedido de condenação à prática de ato administrativo tido por devido, ou seja, no pedido de condenação dos Réus na “.receção definitiva das obras de urbanização”.
A Autora, porém, contraditoriamente, peticiona na sua peça processual que “I)- Mais deverão ser os Réus condenados a reconhecer o direito da A. e por consequência, serem outrossim condenados na receção definitiva das obras de urbanização." (negrito e sublinhado nosso) Ora, não pode a Autora querer demandar os Réus na presente ação administrativa especial na condenação à prática de ato administrativo devido, isto é, na condenação dum ato a praticar, quando o que na...
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