Acórdão nº 13427/16.7T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA OLINDA GARCIA
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.

    AA instaurou ação especial de inquérito judicial a sociedade, ao abrigo do disposto no art.1048º do Código do Processo Civil, contra BB& CA, sociedade em nome coletivo, e CC, invocando a qualidade de sócia da sociedade, e baseando-se na falta de prestação de informações pelo 2º requerido, gerente da 1ª requerida.

    1. Os requeridos contestaram, por exceção, invocando a ilegitimidade ativa da requerente, nos termos do art.30º, n.1 do CPC, pela natureza indivisa da quota da qual a requerente é contitular, não tendo esta alegado ter a natureza de representante comum; e, por impugnação, invocando que o pedido é infundado por a sociedade prestar mensalmente informações aos detentores de participações sociais, bem como das decisões tomadas e atos praticados (conforme documentos juntos com a PI). Mais alegam que, além destas informações mensais, foram prestadas informações solicitadas pela requerente em reuniões tidas entre os advogados desta e do 2º requerido, alegando ainda que, pretendendo o 2o requerido agendar com a requerente visita ao escritório, a fim de permitir a consulta de documentos e prestar os esclarecimentos solicitados, esta não acedeu.

    2. A autora respondeu às exceções, reafirmando a sua qualidade de sócia e, como tal, interessada no inquérito, como previsto no art.1048º do CPC. Afirmou ainda que o art.222º do CSC não se aplica às sociedades em nome coletivo, por não estar compreendido na remissão do art.189º.

    3. Foi proferida sentença que considerou procedente a exceção de ilegitimidade ativa da requerente. Todavia, considerando que esta poderia, em tese, ser suprida mediante convite à intervenção dos demais contitulares da quota, prosseguiu-se com o conhecimento do mérito da causa, vindo a considerar-se o pedido de inquérito judicial improcedente, dele se absolvendo os requeridos.

    4. Não se conformando com essa decisão, a autora interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual revogou parcialmente a decisão recorrida, na parte em que conheceu do mérito da causa, e declarou a recorrente parte ilegítima, absolvendo os recorridos da instância.

    6. Não se conformando com a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, a recorrente interpôs o presente recurso de revista em cujas alegações formulou as seguintes conclusões: «I.

    A autora, aqui recorrente é sócia da sociedade BB& Ca.

  2. O artigo 181°, n.1, do CSC, estabelece que os gerentes de uma sociedade em nome colectivo devem prestar a qualquer sócio, que o requeira, informação verdadeira, completa e elucidativa sobre a gestão da sociedade e, bem assim, facultar-lhe na sede social a consulta da respectiva escrituração, livros e documentos.

  3. A consulta da escrituração, livros ou documentos deve ser feita pessoalmente pelo sócio, que pode fazer-se assistir de um revisor oficial de contas ou de outro perito, como resulta do n. 3 do mesmo artigo 181° do CSC.

  4. Apesar de inúmeras diligências para a obtenção de respostas a várias questões relacionadas directamente com a vida da sociedade, não foi possível obter, pela aqui recorrente, respostas verdadeiras, completas e elucidativas.

  5. Nos termos do Artigo 1048° do CPC, o interessado que pretenda a realização de inquérito judicial à sociedade, nos casos em que a lei o permita, alega os fundamentos do pedido de inquérito, indica os pontos de facto que interesse averiguar e requer as providências que repute convenientes.

  6. O direito do sócio requerer inquérito judicial releva, não apenas quanto ao não fornecimento de informações, como, também, em caso de recusa do direito de consulta ou de informação sobre a vida da sociedade, nomeadamente, quando lhe é negado o direito de obter informação sobre um especifico assunto respeitante à gestão da sociedade.

  7. O inquérito à sociedade é o meio próprio da recorrente lançar mão, porquanto se trata de uma faculdade jurídica instrumental do direito à informação, lato sensu, isto é, do direito do sócio a ser informado da vida e do giro da sociedade.

  8. A Autora, aqui recorrente colocou 46 pontos de facto, ou seja, 46 questões que estão por responder.

  9. Ficou provado que o gerente da sociedade BB& Ca. envia mensalmente, a todos os detentores de participações sociais, uma folha A4 denominada “Folha de Caixa” com informação sobre algumas situações relacionadas com a vida da sociedade.

    X. Todavia, a informação enviada mensalmente não é completa nem elucidativa sobre a gestão da sociedade.

  10. Não responde às 46 questões que fazem parte do pedido, e que a sócia, aqui recorrente, pretende ver esclarecidas! XII. A considerar válida a posição assumida na decisão de que se recorre, é objectivamente afastar a sócia, aqui recorrente, das informações da vida da sociedade.

  11. Sendo que a recorrente, assume uma responsabilidade acrescida, resultante das características das sociedades em comandita.

  12. Nos termos do artigo 1049° CPC, é referido que o "... juiz decidirá se há motivos para proceder ao inquérito...", situação que tem de ser entendida no âmbito da natureza do processo em que nos encontramos jurisdição voluntária, sendo-lhe por isso aplicável o disposto nos artigos n. 986° a 988º do CPC.

  13. Ora, no seio de tais processos, o Tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, podendo ser proferido um juízo de oportunidade ou conveniência face aos interesses em causa.

  14. Como referia o Professor Alberto dos Reis, Processos Especiais, Vol. III, pág. 400 "... o julgador não está vinculado à observância rigorosa do direito aplicável à espécie vertente; tem liberdade de se subtrair a esse enquadramento rígido e de proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa." XVII. É por via disso que o tribunal "pode investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes" Artigo 986°, n. 2, do Código Civil.

  15. No caso em apreço, a decisão que determinou a não procedência da acção, não valorou todo o comportamento dos requeridos - quer fora do processo, quer no seu seio - e, com o devido respeito, faz uma apreciação não abrangente de todos os elementos conhecidos.

  16. Pois que a conduta reiterada do gerente da sociedade requerida, foi sempre no sentido de não facultar à requerente as informações por ela pedida, o que aconteceu, aliás, na pendência da acção aqui recorrida.» 7. Os recorridos não apresentaram contra-alegações.

  17. APRECIAÇÃO DO RECURSO E FUNDAMENTOS DECISÓRIOS: 1.

    O objeto do recurso: Como legalmente previsto (art.635º, n.4 e art.639º, n.1 do CPC) o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, as quais devem respeitar ao modo como se...

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