Acórdão nº 1517/14.5T8STS-B.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelGRAÇA AMARAL
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 6ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça, I – relatório 1. Nos autos de reclamação e graduação de créditos referente a AA e mulher BB, declarados insolventes por sentença de 05-01-2015, a Administradora da Insolvência, em 16-03-2016, juntou lista dos créditos reconhecidos (fls.8/10 dos autos), não tendo reconhecido o crédito no valor de 200.000€, reclamado por CC e DD. 2. Impugaram os Reclamantes (fls.19v/93) pugnando pelo reconhecimento do crédito e pela sua qualificação enquanto crédito privilegiado sobre os imóveis objecto de hipoteca voluntária.

  1. No saneador o tribunal determinou o objecto do litígio (caracterização e reconhecimento do crédito reclamado por CC e DD.) e fixou os temas de prova (fls. 47/49).

  2. Realizado julgamento foi proferida sentença na qual foi decidido: “a) Homologar a lista de credores reconhecidos elaborada pela Sr.a Administradora da Insolvência, constante de fls. 8, dela passando a fazer parte o crédito dos credores CC e DD, no montante de € 200 000,00, e sob a qualificação de "subordinado"; b) Graduar tais créditos, para serem pagos pelo produto da liquidação dos bens apreendidos para a massa insolvente, nos seguintes termos: No que tange à verba 1 do auto de apreensão: 1.° Os créditos titulados pelo EE, S.A., nos montantes reconhecidos e apurados como gozando de garantia; 2.° Todos os demais créditos, reclamados e reconhecidos, em pé de igualdade, dando-se entre eles rateio se necessário for, sendo que apenas após a já referida salvaguarda das despesas e dívidas da massa, se houver remanescente serão pagos todos os créditos reclamados, rateadamente, em primeiro lugar os comuns e só após, havendo remanescente, os subordinados.

    No que tange às verbas 2 e 3 do auto de apreensão: 1.° Todos os créditos, reclamados e reconhecidos, em pé de igualdade, dando-se entre eles rateio se necessário for, sendo que apenas após a já referida salvaguarda das despesas e dívidas da massa, se houver remanescente serão pagos todos os créditos reclamados, rateadamente, em primeiro lugar os comuns, e só após, os subordinados.

    ” 5. Inconformada, apelou CC, tendo o Tribunal da Relação do Porto (por acórdão de 06-03-2018) julgado improcedente a apelação confirmando a sentença “sem prejuízo de alguma dissonância nos fundamentos”.

  3. CC veio interpor recurso de revista formulando as seguintes conclusões (transcrição do que se reporta ao objecto do recurso a conhecer na revista): “ (…) VI- In casu, foi o recurso de Apelação interposto para o Venerando Tribunal da Relação do Porto com vista à revogação da decisão proferida pela 1ª instância no que à qualificação do crédito reclamado pela ora Recorrente diz respeito; VII- Sendo que a Relação, ainda que não sufragando o raciocínio seguido pela Mª Juiz a quo - o qual, refere, deveria conduzir à qualificação de tal crédito como comum - e com fundamentação dissonante, decide pela confirmação do sentido decisório da sentença de 1ª instância, ou seja, manteve a qualificação de subordinado do crédito em causa, tendo tal decisão merecido a unanimidade do colectivo.

    VIII - Ora, podendo entender-se que a Relação, no acórdão proferido, não empregou “fundamentação essencialmente diferente”, o que inviabilizará a sua revista nos termos do disposto no Artigo 671º; IX- Entende a ora Recorrente que tal decisão foi proferida em contradição com o acórdão datado de 6 de Dezembro de 2016, proferido no Proc. 1223/13.8TBPFR-C.P1.S1, por este Supremo Tribunal (acórdão fundamento), já transitado em julgado, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, sendo pois admissível a revista excepcional, nos termos do Artigo 672º, n.º 1, al. c) do C.P.C (Acórdão acessível em www.dgsi.pt e cuja certidão com data de trânsito em julgado se protestará juntar).

    X- Vem o presente recurso interposto do, aliás, douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - por sua vez, interposto da sentença de verificação e graduação de créditos proferida nos autos de insolvência de AA e mulher, FF na parte em que, não obstante tenha julgado verificado e reconhecido o crédito reclamado pelos credores/impugnantes CC e DD; julgado válida a garantia de pagamento do mesmo, constituída mediante hipoteca voluntária de 27 de Outubro de 2009 e registada nessa mesma data sobre três imóveis pertença dos insolventes, qualificou, porém, tal crédito, como subordinado -, o qual, ainda que com distinta fundamentação, confirmou o decido em 1ª instância, ou seja, manteve a qualificação do crédito da ora Recorrente como subordinado.

    XI- Decisão esta que a ora Recorrente, CC não aceita por entender que, salvo o devido respeito, a mesma resulta de incorrecta interpretação e aplicação do direito aos factos apurados, os quais ora se transcrevem: a)Por sentença proferida em 05.01.2015, transitada em julgado, foi declarada a insolvência de AA e FF, com os demais sinais identificadores constantes dos autos, após aqueles se terem apresentado à insolvência através de requerimento que deu entrada em juízo em 26 de Dezembro de 2014; b)No âmbito do apenso de apreensão de bens, foram apreendidos a favor da massa insolvente três prédios, a saber, um prédio urbano, sito em ..., e dois rústicos sitos em ..., ali melhor identificados a fls. 4 daquele apenso, cujo teor aqui se dá por reproduzido; c) Sobre tais prédios constam registadas hipotecas voluntárias a favor de CC e DD, em 27.10.2009, para garantia de empréstimo, sendo que apenas por referência ao prédio urbano consta registada hipoteca anterior a favor do GG, conforme decorre das certidões registrais juntas a fls. 9 a 16 do apenso A, que aqui se dão por reproduzidas; d) Por documento intitulado “Hipoteca Unilateral” realizado em 27.10.2009, na Primeira Conservatória do Registo Predial da Maia, FF, declarou, por si e na qualidade de procuradora de seu marido AA, ser dona, juntamente com seu marido, dos três prédios referidos em c), e que, nesse acto, constitui hipoteca sobre os aludidos imóveis a favor de DD e mulher CC, hipoteca que é constituída para garantir um empréstimo no montante de “duzentos mil euros” já concedido à declarante e seu marido, por documento particular, e que o prazo de amortização da referida quantia terminaria em 30.09.2013, mantendo-se a hipoteca enquanto durar qualquer responsabilidade emergente, tudo conforme documento junto a fls. 25 verso a fls. 27 deste apenso, que aqui se dá por inteiramente reproduzido; e) O valor mencionado em d) resultou da concessão de vários empréstimos por banda dos ora impugnantes aos aqui insolventes, ao longo de vários anos, entre 1994 e 2006; f) Tais empréstimos foram objecto de registo num livro de “deve-haver” pertença e em posse dos credores impugnantes, do qual resultam as datas e os valores que foram sendo mutuados, tudo conforme ressalta da cópia do documento junto a fls. 32 verso a 33 deste apenso, cujo teor se dá aqui por reproduzido; g) Tal documento é da autoria da impugnante CC e encontra-se rubricado pelo insolvente AA no canto inferior direito; h) A Sr.ª AI nomeada nos autos, aquando da prolação da sentença declaratória da insolvência, Dr.ª HH, apresentou a lista a que alude o art.º 129.º do CIRE, sendo que da lista dos credores não reconhecidos foi feito constar a identificação dos credores CC e DD, e o valor do crédito não reconhecido como sendo de € 200.000,00, mais constando a razão de tal “não reconhecimento” como tendo tido fundamento na nulidade do contrato de mútuo por vício de forma (art.º 1143.º do Código Civil), já que conforme documento de constituição de hipoteca, esta se terá destinado a garantir um empréstimo de 200.000,00 concedido por documento particular, tudo como flui do teor de fls. 10 deste apenso, que aqui se dá por reproduzido; i) AA é filho de DD e de CC, e a escritura referida em d) resultou de acto de vontade por parte dos insolventes, face à circunstância de o marido insolvente ter pretendido salvaguardar a satisfação das quantias mutuadas, atenta a existência de outros filhos daqueles DD e CC.

    XII - Sendo o presente recurso de revista excepcional interposto ao abrigo do disposto no Artigo 672º, n.º 1, al. c) do C.P.C., porquanto o acórdão recorrido confirma, sem voto de vencido e, podendo entender-se, sem fundamentação essencialmente diferente, que a sentença proferida em 1º instância está em manifesta contradição com o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, 6ª Secção, processo 1223/13.8TBPFR-C.P1.S1 (acórdão fundamento).

    XIII- Sem prescindir, caso se entenda que in casu não se verificam os pressupostos do Artigo 672º, n.º 1, al. c) do C.P.C., deverá o presente recurso de revista ser admitido nos termos do disposto no Artigo 671º, n.º 3 e 672º, n.º 5, ambos do C.P.C., atendendo, máxime, à dissonância na fundamentação apresentada no acórdão em crise.

    XIV- As classes de créditos sobre a insolvência encontram-se plasmadas no Artigo 47º, n.º 4 do CIRE, o qual dispõe que: «4 - Para efeitos deste Código, os créditos sobre a insolvência são: a) ‘Garantidos’ e ‘privilegiados’ os créditos que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais, e de privilégios creditórios gerais sobre bens integrantes da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais, tendo em conta as eventuais onerações prevalecentes; b)‘Subordinados’ os créditos enumerados no artigo seguinte, excepto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais, que não se extingam por efeito da declaração de insolvência; c)‘Comuns’ os demais créditos.» XV- Dispondo o Artigo 48º, al. a) do CIRE, quanto ao caso que aqui nos ocupa que: «Consideram-se subordinados, sendo graduados depois dos restantes créditos sobre a insolvência: a) Os créditos detidos por pessoas especialmente relacionadas com o devedor, desde que a relação especial existisse já aquando da respectiva aquisição,…»,prevendo o artigo seguinte do CIRE (Artigo 49º)...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
4 temas prácticos
4 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT