Acórdão nº 012/19 de Tribunal dos Conflitos, 30 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução30 de Maio de 2019
EmissorTribunal dos Conflitos
  1. O MUNICÍPIO DE S. PEDRO DO SUL instaurou no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu ação declarativa comum contra A………. e mulher, B……….. e mulher, C…………. e mulher, devidamente identificados nos autos, requerendo a condenação dos RR a: “_Reconhecer que foi o autor que procedeu, no verão de 1995, à abertura do estradão identificado em 1º a 16º desta P.I.

    _ Reconhecer que a sua mãe, D……….. autorizou que, na abertura daquele estradão, fossem ocupados os prédios identificados em 4.º da P.I., junto ao rio Paiva, com as áreas necessárias àquele fim.

    _Reconhecer que foram ocupadas as áreas de, aproximadamente, 180 m2 e 250 m2, respetivamente, do primeiro e segundo prédios identificados em 4.º da P. I.

    _ Reconhecer que após aquela abertura do estradão, tais parcelas foram destacadas dos referidos prédios.

    _A reconhecer que o autor adquiriu, por usucapião, o direito de propriedade daquelas parcelas e para fins de utilidade pública.

    _ A removerem os obstáculos que colocaram no referido estradão e que impedem a livre circulação de veículos automóveis e pessoas, arrasando a vala que abriram no leito do caminho, nivelando o terreno e removendo a cancela, no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença.

    _ A absterem-se de praticar qualquer ato que impeça a livre circulação de qualquer veículo automóvel ou pessoas no estradão, incluindo o troço do mesmo que margina aqueles prédios.

    _ Fixar sanção pecuniária compulsória de, pelo menos, 500,00 € por cada dia de atraso na reposição do caminho e por cada ato que venham a praticar e que impeça aquela livre circulação de veículos automóveis e de pessoas.

    Subsidiariamente, para a hipótese de naufragar os pedidos anteriores, _ Serem condenados, solidariamente, a pagar ao autor o valor de 2.950,12 €, acrescido de juros de mora após a citação, até efetivo e integral pagamento....” Fundamentou tais pedidos, invocando que a Junta de Freguesia de S. M. Moitas, hoje União das Freguesias de Covas do Rio e S. Martinho das Moitas, em 20 de Marco de 1995, lhe solicitou “que mandasse uma máquina retro escavadora, com condutor, para abrir um estradão, nos limites do lugar de ……….., com vista à abertura de uma ligação desde a ponte que atravessa o rio Paiva até ao Largo ……….. ou lugar da ………., ligando a um outro caminho ai existente”, anexando a tal solicitação um documento subscrito por vários particulares, nomeadamente a mãe dos RR, então viúva.

    Esse documento consistia na seguinte declaração: “Nós abaixo assinados declaramos que deixamos romper um estradão nos terrenos que nos pertencem entre a ………. e o ………., terrenos estes pertencentes aos limites de ………., Freguesia de S. Martinho das Moitas, Concelho de S. Pedro do Sul, sem qualquer indemnização e direito ao terreno por esta câmara ocupado”.

    Na sequência de tal solicitação, por despacho de 20.3.95 foi determinado à Divisão de Obras Municipais (DOM), que “face aos compromissos assumidos que temos, agendar a máquina.” No seguimento dessa determinação, veio o “Estradão” a ser aberto no Verão desse ano.

    Desde esse Verão até ao ano de 2014, aquele “estradão” esteve aberto ao trânsito de qualquer veículo automóvel, conduzido por qualquer pessoa, tendo passado aí a transitar quaisquer pessoas, de carro e a pé, na convicção de que o mesmo era do domínio público municipal e aberto ao público.

    Este uso direto e imediato do público manteve-se por um período durante mais de 18 anos seguidos.

    Pelo que adquiriu o direito de propriedade, quer pelo conteúdo do documento particular, quer por via de usucapião.

    Em Julho de 2014 os serviços de fiscalização “verificaram que o estradão estava vedado com uma cancela de madeira, colocada a distância de 250 metros da...ponte sobre o rio Paiva, onde teve o início da sua abertura”, tendo o A. concluído que tinham sido os RR a fechá-lo.

    Notificados os RR pelo A. para procederem a desobstrução do “estradão”, estes responderam não existir qualquer direito de passagem sobre os seus prédios, invocando a sentença transitada em julgado, proferida no processo 281/11.4TBSPS.

    Reconhecendo o A. que não adquiriu por titulo válido (através de contrato — via de direito privado - ou expropriação) o direito de propriedade sobre as parcelas de terreno ocupadas, invoca a sua aquisição através de usucapião, face ao uso continuado, por qualquer pessoa, a pé ou em veículos terrestres, há mais de 15 anos, de boa-fé, à vista de todos, sem oposição de ninguém, na convicção de que se trata dum caminho municipal “arts. 1287º e 1296º ab initio, do C.C.”.

    Conclui o A. que na ausência de aquisição derivada do direito privado para fins de utilidade pública, o Estado, e demais pessoas colectivas de utilidade pública, não estão impedidas da aquisição originária “usucapião”, pois foram verificados os respectivos pressupostos.

    O A. teve custos com a construção do “estradão”, e, a não lhe ser reconhecido o seu direito de propriedade por usucapião, terá de ser ressarcido pela privação definitiva do mesmo.

  2. Os RR contestaram a ação, arguindo as exceções de ineptidão da petição inicial, caso julgado, ilegitimidade passiva, impugnando o alegado na P.I., anexando as decisões judiciais transitadas em julgado e deduzindo reconvenção, em que requerem ser ressarcidos por danos patrimoniais e morais no valor de 5.500€, invocando ainda a litigância de má fé por parte do A.

  3. O Tribunal judicial da comarca de Viseu, por despacho de 23.8.2016 — com fundamento no facto do objeto da ação não se limitar a uma mera ação real, tendo por escopo essencial o reconhecimento da natureza pública de “dois tratos de terreno”, que configuram parte de um determinado caminho que o A. assume como público — julgou-se incompetente, em razão da matéria, por dele ser competente a jurisdição administrativa.

  4. Determinada a remessa dos autos ao TAF de Viseu, e após a notificação do A. da contestação dos RR, face às exceções alegadas e pedido reconvencional, — o A. apresentou em 29.9.2017 nova petição...

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