Acórdão nº 312/07.2TCFUN.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | PINTO DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 14 de Maio de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: I.
AA, LDA instaurou esta acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra BB, LDA, CC, DD, EE e FF, LDA.
Pediu: a) - a condenação solidária dos RR. a pagarem-lhe a quantia de € 800 000,00, a título de cláusula penal, conforme cláusula 7ª, nº3 do contrato-promessa, igualmente aplicável ao contrato de compra e venda de carteira, acrescida de juros de mora, à taxa legal comercial, desde a citação; b) - no caso de procedência do pedido da al. anterior, a declaração de validade e eficácia da declaração de compensação realizada pela A. e a condenação solidária dos RR. a pagarem-lhe a quantia de € 660 541,88, acrescida de juros de mora, à taxa legal comercial, desde a citação; c) - a condenação solidária dos RR. a pagarem-lhe indemnização pelos danos excedentes, patrimoniais e não patrimoniais, a liquidar ulteriormente; d) - a condenação solidária dos RR. FF, CC, DDe EE a pagarem-lhe, a título de cláusula penal conforme al. 10 da "side letter", a quantia de € 490.200,00, que corresponde a € 4.300,00 x 114 contratos de manutenção rescindidos por iniciativa da FF, acrescida de juros de mora, à taxa legal comercial, desde a citação; e) - a título subsidiário e no caso de se verificar o circunstancialismo previsto na al. 11) da "side letter", a condenação da R. FF a pagar-lhe, a título de cláusula penal, a quantia correspondente a 100% do valor mensal por cada mês ainda não decorrido até ao fim do respectivo contrato resolvido por iniciativa dos condóminos, a liquidar ulteriormente, acrescida de juros de mora, à taxa legal comercial, desde a citação.
Como fundamento, alegou: Dedica-se à montagem e assistência técnica de elevadores e de outros aparelhos similares; A R. BB tem por objecto o fabrico, instalação e comercialização de ascensores e de equipamentos similares; A R. FF tem por objecto a gestão e manutenção de condomínios e reparação de sistemas eléctricos, reparação e comércio de ascensores e outros; Os RR. CC e DD são os únicos sócios daquelas RR., sendo, ainda, o R. CC gerente da BB e o R. DD gerente da FF, para além de casado com a R. EE, que é responsável pelas dívidas contraídas pelo cônjuge no exercício da actividade comercial deste; No dia 29.07.05, a A. (promitente-compradora) celebrou um contrato-promessa com a R. BB (promitente-vendedora) e com os RR. CC e DD(terceiros outorgantes), em que, por um preço a calcular posteriormente, mas estimado em € 485.071,71, a R. BB prometeu vender e a A. prometeu comprar a sua posição em 113 contratos de manutenção e assistência técnica de elevadores, devendo os novos contratos ser celebrados directamente pela A., obrigando-se a promitente-vendedora e os terceiros outorgantes a não praticar quaisquer actos de concorrência em relação à A., durante dez anos, sob pena de cada faltoso pagar uma indemnização de € 200.000,00, a título de cláusula penal, sem prejuízo de indemnização pelo dano excedente e demais sanções legais e comprometendo-se todos a indemnizar a A. de quaisquer danos eventualmente sofridos com a violação das declarações e garantias previstas no contrato; Na mesma data do contrato-promessa, a FF (administradora dos condomínios a que respeitavam os contratos objecto do contrato-promessa), e os RR. CC e DD assinaram e entregaram à A. uma declaração escrita que denominaram “side letter”, onde reconheciam e aceitavam integralmente o teor, direitos e obrigações constantes no contrato-promessa, assumindo em nome próprio tais obrigações e o seu cumprimento e também, na proporção de um terço cada, o cumprimento das obrigações assumidas pela BB, comprometendo-se a FF a manter em vigor e a não resolver por sua iniciativa os contratos de manutenção, durante dez anos, e a tomar diligências para que não fossem resolvidos pelos condóminos, sob pena de pagamento de € 4.300,00, a título de cláusula penal, por cada contrato cessado; Em 30.09.05, foi celebrado o contrato definitivo de compra e venda entre a A. e os RR. BB, CC e DD, com 121 contratos de manutenção de elevadores, mediante a revogação dos anteriores contratos e a celebração dos mesmos pela A., tendo esta pago à R. BB a quantia de € 438.502,28; Contudo, em Dezembro de 2006, a FF rescindiu 106 contratos de manutenção de elevadores, comunicando à A. que a decisão de rescisão pertence à assembleia de condóminos e, em alguns casos e de forma infundada, a deficiente manutenção da A., exigindo, ainda, a entrega dos cartões “...” instalados nos elevadores de marca “...”; por seu lado, a R. BB, em Setembro de 2006, publicitou e ofereceu os seus serviços, em violação de cláusula de não concorrência de 10 anos acordada com a A. e passando, posteriormente, a assegurar a manutenção em contratos rescindidos pela FF.
Verificou-se, por isso, um incumprimento do contrato de transferência de carteira, concertado entre todos os RR., que se constituíram, assim, na obrigação de indemnizar a A., devendo pagar-lhe as cláusulas penais convencionadas e o dano excedente e não sendo devido à R. BB o pagamento de € 131.458,12, a título de parte do preço do mesmo contrato não cumprida pela A. e estando esta quantia, reclamada pela R., paga mediante a compensação com a indemnização devida à A. e que esta, expressamente, declara pretender compensar.
Os RR contestaram, alegando: Os contratos em causa são nulos, porque, à data da outorga dos mesmos, a R. BB não estava legalmente habilitada para o exercício da actividade de manutenção de elevadores, nem era titular de qualquer contrato de assistência de elevadores, pois, pretendendo a FF cessar a sua parceria com a empresa de manutenção de elevadores TT e encontrando-se à procura de uma empresa de manutenção de elevadores para os condomínios de que é gerente, foi contactada pela A., que pretendia adquirir os respectivos contratos de manutenção, mas com a intermediação de uma empresa de manutenção constituída para o efeito, razão pela qual, em 25.05.05, foi constituída a R. BB a quem, só em 05.12.05 foi atribuído o certificado provisório pela DRCIE (Direcção Regional de Comércio, Indústria e Energia), tornado definitivo em 21.06.06, tendo os contratos em causa sido celebrados anteriormente com outras empresas, mas sendo certo que, apesar da nulidade dos contratos, estes produziram efeitos em 2005 e 2006, traduzidos na facturação da A., num total de € 177.453,43, dos quais já foi pago o valor de € 42.341,38; A A. realizou a sua prestação de forma deficiente, sucedendo-se as avarias e paragens dos elevadores, impondo, ainda, preços de reparações excessivos, retirando os “...s” dos equipamentos e não pagando também a última prestação do preço da transferência da carteira, pelo que a FF resolveu os contratos de manutenção, quer por via destas situações, quer porque não podia obrigar os condóminos a manter os contratos, apresentando, então, a R. BB propostas para a manutenção dos elevadores depois da legítima extinção dos contratos celebrados com a A.; A FF não interveio no contrato de transferência de carteira, não estando obrigada a manter os contratos de manutenção e, quanto aos contratos-promessa e de transferência de carteira, mesmo que fossem válidos, seria inválida a cláusula de não concorrência e, se esta fosse válida, nunca o poderia ser por mais de dois anos, sendo, ainda, excessivo o valor da respectiva cláusula penal e, não estando demonstrada a qualidade de comerciante do R. DD, a dívida alegada pela A. não é comunicável ao cônjuge, a R. EE.
Subsidiariamente, em reconvenção, os RR alegaram: Não tendo a A. pago a 4ª prestação do preço do contrato de transferência de carteira, no montante de € 158.822,75, invocando, sem fundamento, incumprimento dos RR., deve ser condenada a pagar à R. BB esse valor que, acrescido de juros, ascende ao montante de € 172.443,37.
E pediram: 1 - A declaração de nulidade do contrato-promessa e do contrato definitivo de compra e venda de carteira, devido à falta de legitimidade das RR. BB e FF e à falta ou impossibilidade do respectivo objecto, com a improcedência da acção e a absolvição dos RR. do pedido e com a declaração de que, na restituição do que foi prestado em execução dos contratos nulos, seja deduzida a quantia de € 177.453,43, relativa aos serviços que a A. facturou em virtude da manutenção e das reparações que efectuou; 2 - Caso se entenda que os contratos são válidos, a improcedência da acção e a absolvição dos RR. do pedido por via de: - A declaração de que o contrato definitivo não é oponível à R. FF, que não o outorgou; - A validade da resolução dos contratos de manutenção por factos imputáveis à A.; 3 - Caso assim se não entenda: - A declaração de nulidade da cláusula de não concorrência, ou, pelo menos, a sua validade por prazo nunca superior a dois anos; - A redução equitativa da cláusula penal, para valor que não exceda € 261 048,85 (correspondente ao valor de € 438 502,28 pago pela A., deduzido da quantia de € 177 453,43 relativo a serviços que a A. facturou na manutenção e reparações efectuadas com base nos contratos); - A declaração de que as dívidas não são comunicáveis à R. EE; 4 - Caso assim não se entenda, julgar-se “procedente o pedido reconvencional”, com a condenação da A. a pagar à R. BB a quantia de € 172.443,37, acrescida de juros vincendos, à taxa legal comercial.
A A. replicou, alegando: Os RR. CC e DD declararam-lhe que a R. BB era a titular dos contratos incluídos na carteira, no que a A. confiou e transmitiram-lhe que a BB ainda não era titular do legal certificado, o que não afectaria a validade do negócio, o que a A. aceitou, uma vez que a R. BB foi efectivamente constituída com o adequado objecto social, sendo a falta de certificado motivo de procedimento contra-ordenacional mas não causa de nulidade do negócio, assim como não é causa de nulidade a não intervenção da R. FF, pois esta subscreveu a “side letter”, constituindo a arguição de nulidade um abuso de direito dos RR. e podendo sempre, subsidiariamente, o contrato de compra e venda...
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