Acórdão nº 02831/11.7BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A………….

, médica especialista em otorrinolaringologia, intentou junto do TAF do Porto a presente acção administrativa especial contra o CENTRO HOSPITALAR DE SÃO JOÃO, E.P.E.

, com vista à impugnação da deliberação de 20/06/2011 do Conselho de Administração do R., que lhe aplicou a pena de demissão, pedindo que se declarasse nulo ou anulasse o acto impugnado e condenasse o R. numa indemnização no valor de 20.000,00€, acrescendo os danos morais e patrimoniais que se venham a apurar.

* O TAF do Porto julgou a acção parcialmente procedente e, nessa procedência anulou o acto administrativo impugnado, condenando o R. a readmitir a A. ao seu serviço e a pagar-lhe uma indemnização no valor de 6.720,57€ (seis mil e setecentos e vinte euros e cinquenta e sete cêntimos), acrescido dos correspondentes juros de mora a contar desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

* Inconformado, R. interpôs recurso jurisdicional para o TCA Norte, tendo a A. interposto recurso subordinado relativamente ao quantum indemnizatório fixado na decisão recorrida, tendo o TCA Norte, por acórdão datado de 15 de Junho de 2018, negado provimento a ambos os recursos.

* É desta decisão que o CENTRO HOSPITALAR DE SÃO JOÃO E.P.E.

vem interpor o presente recurso de revista, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: «

A) O douto acórdão, ora recorrido, julgou no sentido de negar provimento ao recurso, ainda que fundamento diferente, mantendo a decisão da 1ª instância; B) Tal fundamento baseou-se em ponderação das circunstâncias dos factos, concluindo o TCAN que, por ter existido uma suposta “incúria na liderança do Serviço” do recorrente, tal conduz a uma “redução do grau de culpa da arguida” em sede de processo disciplinar, inquinando o preenchimento da cláusula geral de inviabilidade da manutenção da relação funcional; C) A admissão do presente recurso é “claramente necessária para uma melhor aplicação de direito”, nos termos do art. 150º nº 1 do CPTA, na medida em que tal ponderação está em manifesta oposição à orientação do STA, na medida em que é insindicável jurisdicionalmente, resulta de um conhecimento oficioso indevido e resulta de uma consideração discricionária em violação da lei; D) A admissão do presente recurso é “claramente necessária para uma melhor aplicação de direito”, nos termos do art. 150º, nº 1 do CPTA, na medida em que o fundamento do TCAN para a sua decisão encerra, em si mesma, 3 questões de direito já consagradas pelo STA, havendo necessidade de evitar a ocorrência de situações de resolução desigualitária dos litígios, na medida em que aquele fundamento contraria a jurisprudência do Supremo; E) Deve ser admitida a revista, relativamente à questão de saber se o TCAN poderia conhecer de matérias insindicáveis jurisdicionalmente, que cabem exclusivamente à Administração, no âmbito dos seus poderes discricionários, sendo claramente a admissão necessária para uma melhor aplicação do direito, nos termos do art. 150º, nº1 do CPTA – ver Acórdão do STA, de 12/03/2015, Proc. nº 245/14, Acórdão do STA, de 07/02/2002, Proc. nº 48.149, Acórdão do STA, de 03/11/2016, Proc. nº 548/16; F) Deve ser admitida a revista, relativamente à questão de saber se o TCAN poderia conhecer oficiosamente de matéria não apreciada pelo Tribunal da 1ª instância, e que não foi objeto de recurso, em clara violação do art. 676º nº 1 e, art. 684º nº 3 do CPC, sendo claramente a admissão necessária para uma melhor aplicação do direito, nos termos do art. 150º, nº1 do CPTA – ver Acórdão do STA de 29/03/2007, Proc. nº 412/05, Acórdão do STA, de 18/12/2003, Proc. nº 1010/02; G) Deve ser admitida a revista, relativamente à questão de saber se o TCAN poderia invocar, a título discricionário, uma qualquer “circunstância atenuante” com vista à redução de culpa, em clara violação dos arts. 22º e 23º do Estatuto Disciplinar, aprovado pela então aplicável Lei nº 58/2008, de 9 de setembro, assim como em violação do princípio da legalidade, sendo claramente a admissão necessária para uma melhor aplicação do direito, nos termos do art. 150º nº 1 do CPTA – ver Acórdão do STA de 14/07/2015, Proc. nº 1409/12; H) Pelo que, não obstante o carácter de excepcionalidade do recurso de revista, entende o recorrente que estão reunidos os pressupostos para a admissão do presente recurso; I) Admitido o recurso, deve o mesmo ser considerado procedente, na medida em que TCAN não podia ter sindicado sobre matéria atinente ao grau de culpa, reservada à recorrente, como entidade administrativa – em manifesta violação do princípio da separação dos poderes; J) Admitido o recurso, deve o mesmo ser considerado procedente, na medida em que TCAN não podia conhecer oficiosamente de matéria não apreciada pelo Tribunal da 1ª instância, e que não foi objecto de recurso, em clara violação do art. 676º nº 1 e, art. 684º nº 3 do CPC; K) Admitido o recurso, deve o mesmo ser considerado procedente, na medida em que TCAN não poderia invocar discricionariamente uma qualquer “circunstância atenuante” com vista à redução de culpa, em clara violação dos art. 22º e 23º do Estatuto Disciplinar, aprovado pela então aplicável Lei nº 58/2008, de 9 de setembro, assim como em violação do princípio da legalidade; Termos em que deve ser admitido o presente recurso de revista.

Na sequência, deve o mesmo recurso proceder, revogando-se a decisão recorrida e absolvendo-se o ora recorrente dos pedidos ou baixando-se os autos para decisão em conformidade.» * A………….

apresentou contra-alegações e formulou conclusões, destinadas à não admissão do recurso de revista, que se dão aqui por integralmente reproduzidas * A Revista foi admitida por acórdão proferido a 11 de Janeiro de 2019.

* O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146º, nº 1 do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

* Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

* 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. MATÉRIA DE FACTO A matéria assente nos autos é a seguinte: «1.º - A A. iniciou funções enquanto Médica Interna do Internato Geral em 01/01/1987, tendo concluído o internato com aproveitamento, em 04/08/1988; 2.º - Em 01/01/1989, a A. iniciou funções na categoria de Médica Interna do Internato Complementar de Otorrinolaringologia, nos serviços do R., tendo tomado posse em 26/05/1989, cargo que concluiu em 30/01/1993, com a classificação final de 19,7 valores, obtendo, assim, o grau de Assistente de Otorrinolaringologia, com grande distinção, passando, a partir da mesma data, a Assistente Eventual de Otorrinolaringologia; 3.º - Em 10/02/1994, a A. tomou posse, após concurso em que obteve a classificação de 19,2 valores, como Assistente de Otorrinolaringologia no Serviço de Otorrinolaringologia do R., com efeitos retroativos a 02/12/1993, em regime de tempo completo; 4.º - Em 25/06/2002, a A. obteve aprovação no concurso de habilitação ao grau de Consultora de Otorrinolaringologia da carreira médica hospitalar, passando, a partir desse exato momento, a Assistente Graduada de Otorrinolaringologia (cfr. publicação no Diário da República, II Série nº 144, de 25/06/2002), categoria que mantém; 5.º - A A. apresentou atestado médico em 02/05/2006, mantendo-se em baixa médica até 30/06/2006; 6.º - A A. esteve em gozo de licença sem vencimento, autorizada por despacho do Conselho de Administração do R. em 05/05/2006, desde 01/07/2006 a 29/09/2006; 7.º - A A. apresentou atestado médico em 30/09/2006, mantendo-se em baixa médica até 04/12/2006; 8.º - A A. compareceu a junta médica em 05/12/2006, 06/03/2007 e 03/07/2007, tendo sido emitido parecer no sentido da impossibilidade da A. regressar ao serviço e designada data para realização de nova junta médica, nos termos previstos no art.º 11º, nº 2, al. b) do Decreto Regulamentar nº 41/90, de 29 de Novembro; 9.º - A A. compareceu a junta médica em 16/10/2007, tendo sido emitido parecer no sentido de ocorrer eventual incapacidade permanente para o serviço, com recomendação ao respetivo serviço sugerindo a apresentação à junta médica da Caixa Geral de Aposentações, nos termos previstos no art.º 11º, nº 2, al. g) do Decreto Regulamentar nº 41/90, de 29 de Novembro; 10.º - Em 27/11/2007, 06/03/2008, 18/06/2008 e 12/09/2008 foi a A. notificada, além do mais, para comparecer no prazo de 10 dias úteis no Hospital de S. João, Serviço de Gestão de Recursos Humanos, Posto de Atendimento nº 01, munido(a) do respetivo Bilhete de Identidade, cartão de Contribuinte, número Identificação Bancária (NIB) e declaração da segurança Social (caso tenha efetuado descontos); 11.º - Do ofício expedido em último lugar, melhor descrito no ponto anterior, consta ainda o que se segue: “(…) Mais se informa, que o comparecimento físico é imprescindível, pois o processo terá que ser preenchido e assinado pelo próprio. Caso não se cumpra o prazo estipulado, irá ser remetido o processo ao C.A. deste hospital, propondo a passagem à situação de licença sem vencimento de longa duração (de acordo com a legislação em vigor).”; 12.º - A A. compareceu nos serviços do R. em 26/09/2008 - data em que preencheu e assinou o requerimento dirigido à Caixa Geral de Aposentações; 13.º - Em 27/11/2008, o R. expediu o ofício n.º 29749, acompanhado de aviso de receção, dirigido à A. e de cujo teor consta, além do mais, o seguinte: “(…) Levo ao conhecimento de V. Exª que deverá comparecer no próximo dia 09 de Dezembro de 2008, pelas 15:15 horas, no Serviço de Verificação de Incapacidades do Centro Distrital do Porto, (…), a fim de ser submetido a exame médico, conforme ofício enviado a estes Serviços.(…)”; 14.º - Em 09/12/2008, a A. não compareceu à junta médica a que se refere o descrito no ponto anterior; 15.º - Em 23/11/2009, por meio de telecópia, o R. solicitou à Caixa Geral de Aposentações, informação sobre a situação profissional da A., mencionando que a mesma foi submetida a...

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