Acórdão nº 0827/18.7BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução22 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A………….., LDA., com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276.º do Código de Procedimento e Processo Tributário contra o acto de indeferimento de dispensa parcial de garantia, apresentando, para tanto, as seguintes conclusões: A) - Atento o facto provado no ponto B. do probatório, verifica-se que a recorrente indicou para efeitos de garantia os bens do ativo imobilizado, não o fazendo quanto aos bens do inventário e justificando que em caso de oneração das embarcações detidas para venda não poderá manter a sua atividade, pois não conseguirá comercializar bens onerados.

  1. – A douta sentença incorre em erro de análise, ao confundir património e inventário, e ao concluir que são oneráveis/penhoráveis, para efeitos de garantia, as mercadorias detidas para venda (ou seja, o inventário).

  2. – Tal conclusão implica que a mercadoria da recorrente, até perfazer o montante da garantia, estivesse na disponibilidade do credor hipotecário, que autorizaria ou não a venda, bem como o destino a que seria afeto o produto da venda, o que na realidade constrange efetivamente a atividade regular da recorrente.

  3. – Com efeito, decorre das regras de experiência comum que não é normal, nem usualmente praticado, em qualquer atividade comercial, a venda de bens onerados.

  4. – Logo, a afirmação contida na sentença recorrida de que a ora recorrente não fica impedida de continuar a exercer a sua atividade, ainda que onerada a sua mercadoria, é infundada e não corresponde a um juízo de senso comum assente na realidade comercial das empresas.

  5. – A afirmação contida na douta sentença recorrida de que a oneração das mercadorias não impede que a recorrente desenvolva a atividade a que se dedica é um juízo meramente teórico, sem aderência à prática e atividade empresarial, e da própria realidade procedimental da AT.

  6. – De facto, em teoria, nada impede a oneração de barcos detidos para venda, mas ao fazê-lo a recorrente sabe que dificilmente conseguirá vender os bens em condições normais de negócio, o que é também percetível para uma pessoa média, colocada perante os factos e a realidade concreta.

  7. – Porém, na prática comercial, o expectável e habitual é que, perante essa informação prestada a possível comprador, o interessado desistiria do negócio.

  8. – Mas, admitindo que, não ocorria desistência imediata por parte do interessado, e sendo pedido ao credor hipotecário autorização para venda ou substituição, esbarramos no que são os procedimentos da AT no que toca a demora na apreciação e decisão na avaliação e substituição de garantias, que não é compatível com as intenções ou decisões comerciais dos clientes.

  9. – Acresce que, perante informação prestada a potenciais compradores da existência de ónus sobre a mercadoria, os termos negociais alterar-se-iam com séria probabilidade de o comprador, sabedor da existência de dívidas fiscais, ficaria numa posição de vantagem económica que poderia usar para forçar a redução de preço.

  10. – Ademais, é expectável que a AT/OEF condicionasse a libertação da garantia mediante a entrega do preço, o que também ocasionaria graves dificuldades económicas para a recorrente, porque a recorrente seria forçada a pagar a dívida exequenda ao credor hipotecário, quando a dívida em causa é suscetível de ser apenas garantida face à existência de processo contencioso.

  11. – Por outro lado, ainda que o produto da venda ficasse constituído em garantia, implicaria de igual forma constrangimentos económicos e financeiros graves à recorrente, pois é através do produto das suas vendas que a recorrente adquire nova mercadoria e paga aos seus demais fornecedores, donde sem a disponibilidade do produto das vendas a recorrente enfrentaria prejuízos graves e incalculáveis.

  12. – Assim, resulta das constatações da experiência comum e do ponto de vista do homem mediano, que se impunha um juízo que considerasse demonstrado que a oneração de mercadoria detida para venda é incompatível com a atividade de venda de barcos a que se dedica a recorrente e causa-lhe, por isso, prejuízo grave e irreparável.

  13. – Conclui-se assim, que a solução preconizada pela douta sentença recorrida embora no plano teórico seja aplicável, é, na verdade, e na prática, impeditiva da continuação regular da atividade comercial da recorrente.

  14. – A douta decisão recorrida incorre em errónea de análise e conclusão, no que toca à oneração da mercadoria para venda, porquanto a existência de ónus é motivo de grave constrangimento negocial nos termos acima descritos e, consequentemente, é impeditiva do exercício da atividade da recorrente.

  15. – Donde a decisão recorrida violou o disposto no n.º 4 do art.º 52º da LGT.

    Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta decisão recorrida, determinando-se a anulação do despacho do OEF que indeferiu o pedido de dispensa parcial de prestação de garantia.

    2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

    3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 348 e 349 dos autos, no qual considerou que para a correta apreciação da pretensão da Recorrente se mostra “necessário que constem da sentença elementos esclarecedores sobre o tipo de bens e respetivo valor que fazem parte [do seu] ativo circulante, assim como a caraterização da atividade da executada”, pronunciando-se no sentido de que a sentença recorrida padece do vício de insuficiência da matéria de facto, “o que constitui fundamento para a sua revogação, e a baixa dos autos para efeitos de ampliação da matéria de facto, nos termos do artigo 682º, nº3, do Código de Processo Civil”.

    4 – Por despacho de 30 de Abril último – a fls. 210/211 dos autos –, a Relatora suscitou a questão da incompetência em razão da hierarquia deste STA para conhecimento do objecto o recurso e ordenou a notificação da recorrente para, querendo, se pronunciar.

    Em resposta, veio esta manifestar a sua discordância com a verificação de tal excepção por entender que “nos presentes autos não está em causa a apreciação de matéria de facto relevante para o julgamento da causa, mas sim a aplicação de conceitos plasmados na lei aos factos provados”. Para a Recorrente, “na...

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