Acórdão nº 262/12.0BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução22 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I – Relatório A Fazenda Pública instaurou contra a S... – Administração de Propriedades, S.A. execução fiscal para pagamento de dívida relativa a Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) e Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), tendo, no decorrer desse processo de execução fiscal, sido penhorado o veículo automóvel da marca Mercedes Benz, modelo E300 Turbo Diesel, matrícula 2..., registado em nome da executada em 4-08-2011. Após ter tomado conhecimento da referida penhora, R... (doravante Recorrido), deduziu oposição à penhora, por meio de Embargos de Terceiro, invocando, nuclearmente, ser ele, e não a sociedade executada, o proprietário do veículo penhorado, alegando tê-lo adquirido em Fevereiro de 2010 a A..., que nessa mesma data lho entregou, bem como a respectiva documentação

A Fazenda Pública (de ora em diante Recorrente) contestou os Embargos, que, em julgamento, foram julgados procedentes - decisão que constitui objecto do presente recurso - aí se tendo determinado o levantamento da penhora.

Inconformada, interpôs recurso jurisdicional concluindo a sua motivação nos seguintes termos: «i. Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julga procedente os embargos de terceiro deduzidos por R..., na sequência da penhora do veículo automóvel, com a matrícula 2..., de marca Mercedes E300, efectuada em 04/08/2011, no âmbito do processo de execução fiscal com nº15622008..., para cobrança coerciva de dívidas referente a IRC e IVA, no montante de €566.086,40, instauradas a S...-Administração de Propriedades, SA, com o contribuinte 5....

ii. Entende a Fazenda Pública que, face à prova produzida, a Embargante não detinha, no passado, se não a posse precária (mera detenção) do veiculo embargado, e, actualmente, não está sequer demonstrada a sua detenção. Vejamos, iii. Veio o Embargante alegar que é o legítimo proprietário e possuidor da viatura, desde Fevereiro de 2010, em virtude de a ter adquirido a A….. Defende que é o único proprietário da viatura e requer que seja levantada a penhora que incide sobre o veículo automóvel. iv. Entendeu a douta sentença "que a aquisição da propriedade do veículo por parte do Embargante é anterior à penhora da AT." v. Ou seja, a questão a dirimir é saber se um terceiro que tenha adquirido um bem sujeito a registo antes da constituição da penhora, mas que não tenha registado a sua aquisição, poderá fazer valer o seu direito contra as partes primitivas em sede de embargos de terceiro. Ora face à prova produzida, entendemos que não. vi. Para haver aquisição da propriedade, é necessário que o embargante esteja na posse do bem penhorado porque, tal como dispõe o artigo 1251º do CC, posse é "o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real." vii. O Embargante baseia a sua posse alegando ter adquirido a viatura em Fevereiro de 2010 e ter realizado a sua contra prestação na data da entrega do veículo, ou seja, que desde dessa data passou a ter a posse do veículo. viii. No entanto, não juntou qualquer documento ou fez prova dessa qualidade e como sabemos, os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo. ix. Dos factos provados não é feita referência a qualquer pagamento, ou seja, a douta sentença conclui apenas que "Em data que não é possível precisar, mas situada entre os meses de Janeiro e Fevereiro de 2010, o A… vendeu a viatura referida em b) ao ora embargante R..., tendo-lhe entregue a documentação referida em c) - Cfr. Idem;" x. E que existem divergências nos documentos ao concluir que "A assinatura do representante legal da S... constante da declaração de venda da viatura de marca Mercedes com a matrícula 2… apresenta diferenças com a constante da cópia do respectivo bilhete de identidade constante dos autos - Cfr. Documentos 2 e 3 juntos com a p.i.; " xi. As próprias testemunhas arroladas pelo Embargante entraram em contradição nas datas referidas como sendo de aquisição do veículo, ou seja, não consegui provar a sua alegada posse e quando ocorreu. xii. E como refere o Professor Antunes Varela, o conceito de terceiro decorre da função do registo, "do fim tido em vista pela lei ao sujeitar o acto a registo, e, pretendendo a lei assegurar a terceiros que o mesmo autor não dispôs da coisa ou não a onerou senão nos termos que constarem do registo, esta intenção legal é aplicável também ao caso da penhora, já que o credor que fez penhorar a coisa carece de saber se esta se encontra, ou não, livre e na propriedade do executado." xiii. Ora, a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, como é caso do contrato de compra e venda. xiv. E, tanto quanto resulta dos autos, até ao momento em que foi efectuada a penhora do bem não havia sido celebrada qualquer contrato de compra e venda nem qualquer registo do bem em nome do Embargante. xv. É o registo o instrumento jurídico que, pela sua natureza, tem a virtude de transmitir, a título definitivo, o direito real de propriedade sobre o veículo automóvel. xvi. Acontece que o Embargante não detinha, no passado, senão a posse precária (mera detenção) do veículo automóvel embargado, e, actualmente, não ficou demonstrada a sua detenção. xvii. Como é possível deterá posse precária de um veículo, desde 2010, como alega o Embargante e ainda não ter procedido ao seu registo, tanto mais que, estamos perante um bem sujeito a um desgaste constante com o seu uso e uma desvalorização rápida. xviii. Pelo que, se um terceiro que tenha adquirido um bem sujeito a registo antes da constituição da penhora, mas que não tenha registado a sua aquisição, não poderá fazer valer o seu direito contra as partes primitivas em sede de embargos de terceiro, ou seja, entendemos que, a penhora sobre o veículo é legítima, não tendo sido demonstrado que a aquisição do referido bem se efectivou em momento anterior ao da penhora. xix. Atento o exposto, mostra-se a douta sentença proferida em erro de julgamento de facto e de direito, fazendo uma errónea apreciação dos factos trazidos a juízo, e em violação do disposto nos artigos 237º do CPPT, do nº1 do artigo 342º do Código do Processo Civil (CPC) e 1285º do Código Civil (CC). Termos em que, concedendo-se provi mento ao recurso deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue os embargos de terceiro totalmente improcedentes com as devidas consequências legais. SENDO QUE EXAS. DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.» O recurso foi admitido por despacho de 26 de Maio de 2017 e, após o decurso do prazo para apresentação de contra-alegações, foi ordenada a sua subida a este Tribunal Central Administrativo Sul. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. Por requerimento proveniente do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datado de 2 de Outubro de 2017, recepcionado no correio oficial deste Tribunal Central Administrativo Sul a 7 de Novembro de 2017, foram juntas aos autos as contra-alegações do Recorrido A Recorrente, notificada da junção, quedou-se pelo silêncio, A Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal, a quem foi dado igualmente conhecimento da integração nos autos das contra-alegações, declarou nada ter a requerer, “por ora. “. Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

II – Objecto do recurso Como é sabido...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT