Acórdão nº 00600/05.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO SFS, casado, residente na Rua P…, Porto, instaurou acção administrativa especial contra o Município de O.....

, com fundamento na impugnação da deliberação desta Câmara Municipal de 16 de dezembro de 2004 que indeferiu o seu projecto de arquitectura com vista à reconstrução da moradia que consta do Processo de Obra n° 3374/2003 e que ordenou a demolição das obras efectuadas no prazo de 30 dias, pedindo que seja: a) decretada a anulação da deliberação da Câmara Municipal de O..... de 16 de dezembro de 2004, no que se refere à aprovação do estudo de alinhamentos, indeferimento do projecto de arquitectura apresentado e ordem de demolição das obras efectuadas; b) condenada a Entidade demandada a praticar um acto de deferimento do projecto por si apresentado relativamente às obras de reconstrução da sua moradia; Ou, subsidiariamente em relação ao pedido formulado em b) que se declare ter-se produzido o deferimento tácito da sua pretensão.

Por decisão proferida pelo TAF de Aveiro foi julgada improcedente a acção e absolvida a Entidade Demandada dos pedidos.

Desta vem interposto recurso.

*Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: 1 – A petição inicial concluía com o seguinte pedido, sob a alínea a): “Termos em que, na procedência da presente acção administrativa especial, se deverá: a) - Decretar a anulação da impugnada deliberação da Câmara Municipal de O..... de 16 de Dezembro de 2004, no que se refere a 1. Aprovação do estudo de alinhamentos; 2 – Indeferir o projecto de arquitectura apresentado pelo A.; 3 – Ordenar a demolição das obras efectuadas.” 2 - Sobre o primeiro deste conjunto de 3 pedidos – decretar a anulação da deliberação do R. no que respeita à aprovação do estudo de alinhamentos - , suscitou o R. a questão prévia da sua inimpugnabilidade contenciosa, por, a seu ver, se não tratar de um acto administrativo, mas de uma norma.

3 – Tal questão prévia foi transitadamente definida no saneador no sentido de que a deliberação do R., de aprovação do referido estudo de alinhamentos constituía um acto administrativo.

4 – Em fundamento do referido pedido de anulação da deliberação camarária, no que ao estudo de alinhamentos respeita, o A. imputara na petição inicial a tal deliberação o vício invalidante de erro sobre os pressupostos de facto, por desconformidade entre a realidade material e a sua representação na planta que serviu de base ao dito estudo de alinhamentos.

5 - Isto é, tal específico acto fora objecto de impugnação contenciosa, com fundamento no vício de violação de lei, por erro de facto sobre os pressupostos e, nessa medida, levado ao pedido na petição inicial.

É o que consta expressamente do artº 69º da petição e do correspondente pedido, a final.

6 – Todavia, em nenhum ponto das suas 37 páginas o acórdão recorrido trata, de forma expressa ou implícita, da alegada invalidade do estudo de alinhamentos, de acordo com as Conclusões precedentes.

Tal ausência configura omissão de pronúncia, ferindo o acórdão da nulidade do artº 668º, 1., d) do Código do Processo Civil.

7 - Na sequência do exposto quanto à nulidade do acórdão, na medida em que o mesmo se não pronunciou sobre a factualidade invocada pelo A., relativa à desconformidade entre a realidade concreta e a sua representação no plano de alinhamentos – e ao correspondente vício de violação de lei, por erro de facto sobre os pressupostos (nº II das presentes Alegações) -, é mister levar essa factualidade, enunciada nos artsº 60º a 65º da petição inicial, à Matéria de Facto pertinente para a boa e integral resolução da causa, no caso de o Senhor Juiz entender que a prova de tal factualidade decorre directamente do processo.

8 – Ou, caso assim não entenda, ordenando a produção de prova para o efeito, nos termos do artº 87º, 1., c) do C.P.T.A.

9 - Isto é, o Tribunal errou – sempre salvo o devido respeito -, por omissão, na fixação da matéria de Facto relevante para a boa decisão da causa, violando o artº 511º, 1 do Código do Processo Civil .

10 – Tal eventual exigência de prova suplementar não é afectada pelo facto de, no saneador, o Senhor Juiz ter declarado “não haver matéria de facto controvertida”, já que, tratando-se tal declaração de matéria de livre apreciação do Juiz, não oponível às partes processuais, de carácter meramente regulador, tem o valor que tem: uma mera declaração do juiz da causa.

11 - Declaração, aliás, por natureza provisória, incompatível com qualquer definitividade, antes da sentença, na medida em que o Juiz tem a faculdade, relativamente à fixação da matéria de facto, de, mesmo após o encerramento da discussão, “ordenar … as diligências necessárias”, como prevê o artº 653º, 1. do Código do Processo Civil.

12 - O que afasta qualquer hipótese de trânsito dessa matéria no saneador – não tendo aplicação o ónus de reclamação quanto à fixação de tal matéria, a que alude o nº 2 do referido artº 511º do C.P.C., na medida em que no processo de acção administrativa especial a selecção da matéria de facto só é efectuada na sentença, só após ela se podendo impugnar essa selecção – como agora se faz.

13 – O Tribunal recorrido entendeu, no acórdão sub judice, que as razões de indeferimento da pretensão do Autor, no que toca ao acto impugnado que indeferiu o projecto de arquitectura por si apresentado no R., se prendem com o incumprimento da Portaria nº 1110/2001, de 19 de Setembro, nomeadamente o seu artº 11º.

14 – Ora, quer no procedimento administrativo, quer no processo judicial, a posição uniforme do A. foi sempre no sentido de que a questão do cumprimento dos requisitos constantes da Portaria em causa consistia numa questão para exame posterior, após decisão da questão prévia e prejudicial de saber se a construção poderia manter o alinhamento que era originariamente o seu; ou se o deveria alterar, em coerência com o estudo de alinhamentos.

15 - Isto é, mesmo que o A, cumprisse todas as especificações exigidas pelo artº 11º da Portaria nº 1110/2001 e entregasse toda a documentação aí prevista, o projecto seria na mesma reprovado, por causa do alinhamento.

16 – É essa, aliás, a posição que deve ser acolhida, a partir do teor da própria deliberação do R. a esse respeito, no sentido de que “deverá a Câmara Municipal deliberar: b) Dar parcialmente provimento ao alegado pelo particular no seu requerimento …, nos termos e fundamentos da presente informação, porquanto a decisão administrativa quanto à definição do alinhamento é uma questão prévia e prejudicial da notificação para completar/corrigir o pedido de licenciamento.” (Alínea T do Probatório) 17 - Ao ter considerado que o estudo de alinhamentos não constituiu fundamento da deliberação impugnada, no que se refere ao indeferimento do projecto de arquitectura, nem constitui questão prévia e prejudicial relativamente à apreciação das exigências do artº 11º da Portaria nº 1110/2001, como se refere no último parágrafo da pág. 33 do acórdão, o mesmo acórdão afasta-se da própria posição expressa do R. na deliberação impugnada e pareceres que a suportaram, ficando ferido de erro de julgamento.

18 - Além do já descrito relevo essencial do estudo de alinhamentos na fundamentação da deliberação de indeferimento da pretensão do A., que o Tribunal não reconheceu, há um outro aspecto relativo ao mesmo estudo que o Tribunal igualmente depreciou.

Trata-se do facto de esse estudo, aceite que seja a posição de que constituiu, na espécie, um fundamento para o indeferimento do projecto de arquitectura, não poder fundamentar a decisão administrativa como fundamentou, não ter idoneidade para tanto.

19 – Na verdade, independentemente de o acto de aprovação de tal estudo ser qualificado como acto ou como norma, o certo é que o acto de aprovação por parte da Câmara constitui coisa distinta do conteúdo intrínseco de tal plano - uma coisa é o acto de aprovação do estudo; outra coisa, e diversa, é o conteúdo material desse estudo.

20 - O que interessa, do ponto de vista da realidade e não da abstracção, é que esse estudo de alinhamentos representa a introdução de condicionantes novas, de carácter geral, nos processos de aprovação de iniciativas urbanísticas dos particulares atingidos pelo âmbito territorial do mesmo estudo.

21 - Ora, e não obstante ter sido invocado pelo R., ao longo de todo o procedimento, de 4.12.03 – data da primeira posição formal do R. quanto ao projecto de arquitectura apresentado pelo A. - até à deliberação final de 26.11.2004, como motivo de sucessivas intenções de indeferimento, o certo é que o dito estudo apenas foi aprovado na reunião da Câmara do mesmo dia 26 de Novembro de 2004 e no âmbito da mesma deliberação que indeferiu o projecto apresentado pelo A.

22 - Isto é, o estudo foi invocado como fundamento para o indeferimento e sucessivamente notificado ao A. para o efeito de o mesmo alterar o alinhamento proposto numa altura em que tal estudo não tinha sequer existência jurídica – na medida em que o mesmo só foi aprovado pela Câmara no mesmo momento e no mesmo acto em que indeferiu o requerimento do A.

23 - Isto é assim, quer o estudo seja acto, quer seja norma.

24 - Quer isto dizer, como o A. tem insistentemente dito ao longo do processo, que a Câmara introduziu no âmbito da decisão de indeferimento do requerimento do A. um fundamento para tal indeferimento que só foi criado no mesmo momento do indeferimento.

25 - A acolher-se o entendimento do Tribunal, de que as vinculações a que se refere o artº 60º, 2 do RJUE - no sentido de não poderem ser aplicadas a pedidos de reconstrução ou alteração de edificações normas supervenientes relativamente à data da construção primitiva -, só seriam aplicáveis em caso de normas, e não de actos – pág. 34, 3º parágrafo do acórdão - e para efeitos de garantia dos particulares, os actos administrativos estariam graduados hierarquicamente acima das normas – o que constituiria uma aberratio iuris.

26 - Dito de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT