Acórdão nº 525/13.8TBSLV-C.S1.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução16 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 525/13.8TBSLV-C.S1.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório 1. Por apenso à insolvência de (…), Lda.

, o Administrador da insolvência (A.I.) apresentou parecer propondo a qualificação da insolvência como culposa e indicou o sócio-gerente (…) para ser afetado pela qualificação.

Alegou, em síntese, que a insolvente celebrou vários contratos de locação financeira que visaram a locação de maquinaria (recebida como nova) que já lhe pertencia, por ela formalmente alienados a (…), Lda. e (…), Lda., esta última gerida por uma irmã do sócio-gerente, (…), as quais as vendiam às locadoras, ficando a Insolvente com os encargos resultantes dos contratos de locação e com equipamentos usados, avaliados como novos para efeitos dos contratos de locação, assim beneficiando aqueles sociedades (terceiros), com prejuízo dos seus credores e que a insolvente apresentou queixa-crime pelo furto de um veiculo automóvel, o qual alegadamente continha as pastas da contabilidade dos anos de 2003 a 2013, cujas caraterísticas, por falta de espaço disponível, não permitiam acomodar tais elementos da contabilidade da Insolvente.

O Ministério Público formulou parecer concordante com o requerido pelo A.I.

(…) deduziu oposição concluindo pela extemporaneidade dos pareceres do AI e do MP e, em qualquer caso, pela qualificação da insolvência como fortuita.

  1. Foi proferido despacho que julgou improcedente a exceção da extemporaneidade dos pareceres, afirmou, em tudo o mais, a validade e regularidade da instância, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova.

    Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e depois foi proferida sentença, em cujo dispositivo designadamente se consignou: “Pelo exposto, nos termos do disposto no artigo 189º, n.ºs 1, 2 e 4, do CIRE, o tribunal qualifica como culposa a insolvência de (…), Lda., pessoa coletiva n.º (…), com sede no Parque Industrial do (…), Pavilhão (…), (…), e, em consequência:

    1. Declara afetado pela qualificação (…); b) Declara (…) inibido, pelo período de 3 (três) anos, para o exercício do comércio, e para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa; c) Determina a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos por (…); d) Condena (…) a indemnizar os credores da sociedade “(…), Lda.”, no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças do respetivo património, a efetuar em liquidação de sentença”.

  2. O afetado pela qualificação (…) recorre da sentença e conclui assim a motivação do recurso: “01 - O Tribunal recorrido andou mal ao ter qualificado a insolvência de que este incidente é apenso como culposa porquanto os factos dados como provados não consentem que se tenham por preenchidos os requisitos previstos no CIRE (mormente o n.º 1 do artigo 186.º do CIRE e alínea b) no n.º 2 do mesmo artigo que a Sentença recorrida convocou).

    02 - Divisam-se quatro requisitos cumulativos que, conquanto haja respaldo nos factos provados, determinam a qualificação da insolvência como culposa: 1) conduta do devedor ou dos seus administradores, de facto ou de direito; 2) que essa conduta tenha criado ou agravado a situação de insolvência; 3) que essa conduta tenha ocorrido nos três anos anteriores ao início do processo que conduziu à insolvência; 4) e que essa mesma conduta seja dolosa ou praticada com culpa grave.

    03 - Relativamente ao requisito cronológico (constante do n.º 1 do artigo 186º do CIRE) resulta do facto n.º 2 do probatório que a Insolvente apresentou o respetivo pedido em 2/05/2013 – pelo que para efeitos de qualificação da insolvência importam os factos jurídicos culposo que conduziram ou agravaram a situação de insolvência que hajam sido praticados entre 2/05/2010 e 2/05/2013.

    04 - No caso dos autos, e por referência aos contratos de locação financeira que, supostamente, constituíram negócios ruinosos que aumentaram o passivo da Insolvente em benefício do Recorrente ou de pessoas com ele relacionados, encontra-se apenas provado o que se acha no ponto de facto 16, de onde se retira, singelamente, que os mesmos foram celebrados “em 2010”.

    05 - Por outro lado, a Decisão recorrida, ainda que timidamente, parece apontar para uma conduta – não provada – de que tenha resultado uma ocultação ou disposição dos bens quando afirma não saber o que aconteceu aos equipamentos. Ora, se não se sabe o que sucedeu, igualmente não se sabe quando é que tais atos putativos atos terão sido praticados, tanto mais quanto resulta dos factos 13 a 15 que a suposta falta de coincidência do equipamento foi detetada na diligência ocorrida em 24 de Setembro de 2013 – pelo que não se pode concluir que tenham ocorrido nos três anos anteriores ao início do processo.

    06 - É ao interessado na qualificação da insolvência e na afetação que cabe o ónus da prova dos respetivos requisitos, nomeadamente dos factos-índice previstos naquela disposição legal (art.º 342º, nº 1, do Código Civil).

    07 - Observa-se pois um non liquet probatório relativamente à condição de punibilidade cronológica em presença, o que só pode significar que a Sentença a quo andou mal ao qualificar a insolvência como culposa, por incorreta aplicação do n.º 1 do artigo 186.º do CIRE.

    08 - Como assim é, afastada esta condição primeira e essencial para o preenchimento do “tipo” da qualificação da culposa, dever-se-á concluir, sem necessidade de ulteriores indagações sobre o preenchimento dos demais requisitos, pelo erro de subsunção jurídica levada a cabo pela Sentença recorrida e que ora confiadamente se espera seja corrigido.

    SEM PRESCINDIR 09 - Os factos adquiridos para o processo não permitem preencher as hipóteses previstas no “facto índice” tipificado na alínea b) do n.º 2 do artigo 186º do CIRE, não se podendo extrair do probatório a conclusão de que os negócios em causa – nomeadamente a circunstância de as máquinas terem “sido recebidas como novas quando na realidade não eram, e ao aceitá-las a insolvente aumentou o seu passivo no valor dos contratos de locação financeira celebrados com as entidades bancárias, num total de mais de 22 milhões de euros” – tenham sido prejudiciais para a Insolvente, tão pouco que esses negócio tenha sido efetuado em interesse do ora Recorrente ou de pessoa com ele especialmente relacionada.

    10 - A alínea b) do n.º 2 do artigo 186.º do CIRE, comporta vários pressupostos (a celebração de negócios ruinosos que causem ou agravem artificialmente passivos ou prejuízos ou a redução de lucros e o benefício do gerente ou de pessoa com ele especialmente relacionada) que constituem cláusulas abertas, não densificados, que impõem que do circunstancialismo fáctico provado resulte que o negócio “ruinoso” seja a causa adequada da...

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