Acórdão nº 396/08.6BECTB de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelHÉLIA GAMEIRO SILVA
Data da Resolução08 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul 1 – RELATÓRIO José ............... e Ana ..............., notificados da decisão de indeferimento do recurso hierárquico por si interposto na sequência de indeferimento da sua reclamação graciosa, vieram deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares referente ao ano de 2002, no montante de € 19.031,78.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, por decisão de 30 de junho de 2016, julgou improcedente a impugnação.

Inconformados, José ............... e Ana ...............

, vieram recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões: «a) Embora a falta de impugnação especificada dos factos por parte da Fazenda Pública não represente a sua confissão (art.º 110.º n.º 7,do CPPT), deve o juiz apreciá-la livremente; b) Sendo assim, impõe-se que, à falta dessa impugnação especificada por banda da Fazenda Pública, se faça relevar a presunção de veracidade das declarações do contribuinte, por mor do disposto no art.º 75. n.º 1,da LGT, conferindo a esta disposição efectiva eficácia normativoaplicativa; c) Por outro lado, não pode o tribunal deixar de valorar no sentido da sua credibilidade, na ausência de impugnação, as afirmações de facto feitas pelos recorrentes na petição inicial da impugnação judicial que estejam em linha de coerência com o também alegado na reclamação graciosa e no recurso hierárquico apensos, bem como com os documentos apresentados; d) Para além dos factos que fez constar do probatório da decisão recorrida, o tribunal a quo devia dar também como provados mais os seguintes factos, pelo que, não o tendo feito, incorreu em erro de julgamento de facto: 1) Desde criança que o impugnante morou com os seus pais, no imóvel sito na Rua ..............., n.º 158, ....-... Coimbra, primeiro em regime de locação e, posteriormente, como proprietários; 2) Os impugnantes contraíram matrimónio e foram habitar para o referido imóvel com os pais do impugnante marido; 3) Em 1992, os pais do impugnante, que é filho único, doaram-lhe o imóvel, mantendo contudo, por questões de salvaguarda, o usufruto do mesmo; 4) Por força da actividade profissional do impugnante de funcionário público, os impugnantes por diversas vezes tiveram que fixar residência profissional fora de Coimbra, voltando, todavia, a esta cidade durante os fins de semana e as férias e aqui mantendo a sua residência habitual, inclusivamente, para efeitos de correspondência, constando de alguns documentos oficiais (cfr. doc. 1 junto com a petição).

5) Em 2002, os impugnantes e os pais do impugnante venderam o imóvel; 6) Com o produto da venda os impugnantes adquiriram um imóvel na Covilhã, cidade onde trabalhavam e onde, então, se decidiram fixar definitivamente; e) Quando o titular do direito de usufruto sobre certo imóvel abandona, em acordo com o titular do direito o seu direito, permitindo a venda do imóvel, coetânea e conjuntamente, com o titular do direito da nua propriedade do imóvel estamos perante uma transmissão onerosa do imóvel que releva para os efeitos consignados no art.º 10.º, n.º 5;. do CIRS; f) Esta interpretação tem na letra da lei suficiente e adequada expressão (art.º 9.º do CC) e cumpre inteiramente a axiologia e teleologia da exclusão da tributação: na verdade, o objectivo da lei é do eliminar obstáculos fiscais à mudança de habitação, em casa própria, por parte das famílias em território português, favorecendo a mobilidade que a economia de hoje impõe quase como regra e de que hoje tanto se fala e o Governo incentiva, mesmo na administração pública; g) O conceito de residência permanente, embora de origem civil, é um daqueles conceitos de essência ou de síntese substancialmente normativa, de plasticidade variável, e não de conceito de facto, razão pela qual deve ser entendido de acordo com a axiologia e teleologia que justificam materialmente a sua convocação no direito civil ou no direito tributário, sendo que as mesmas são diferentes: no direito civil está funcionalmente dirigido a ser (ou a servir de), aí, uma causa de resolução do contrato de arrendamento existente entre dois sujeitos de direito privado; no art.º 10.º, n.º 5; do CIRS, o conceito é convocado para justificar materialmente a atribuição de um direito fiscal - do universo hipotético jurígeno da norma de tributação ficam excluídas certas situações, por o legislador entender que as razões que subjazem a essas situações se sobrepõem às que justificam a obtenção da receita fiscal.

h) A plasticidade ou elasticidade normativas do conceito de residência permanente justificam que deva ser equacionado com o grau de vida do residente e consequente incidência em relação ao espaço, nas situações fácticas de ausência do inquilino do locado por virtude, entre outras, do exercício de outras funções públicas ou de comissão de serviço público, mencionadas no art.º 64.º, n.º 2 alínea b), do RAU - categoria onde cabe a situação do impugnante discutida nos autos - continue a ser tida como residência permanente a residência que anteriormente se tinha no locado; i) A lei civil apenas contempla esse prolongamento de efeitos por períodos determinados [art.º 64.º, n.º 1, alínea i), do RAU]. Mas não é assim no plano fiscal. É que as razões (teleologia) que justificam essa limitação no âmbito do direito civil não ocorrem no direito fiscal: no direito civil, a limitação encontra a sua razão de ser na necessidade de não manter o locado fechado por longos períodos, pois isso determina a sua deterioração física e com isso perda do seu valor económico; no domínio fiscal, este interesse está totalmente ausente da norma de exclusão da tributação, devendo o conceito de residência permanente ser aferido essencialmente em face da sua ratio tributária; j) O conceito de residência permanente, sendo embora um conceito relativo, plástico ou plurignificante, apela, no entanto, à existência de traços constitutivos e indispensáveis, sob pena de se tomar um conceito imprestável como diferenciador de situações jurídicas e lácticas e se frustrarem a razões que levaram à construção dele como síntese jurídica; l) Tais traços são a habitualidade de residência, a estabilidade de residência e a circunstância de a residência constituir o centro da organização da vida doméstica (cfr. Jorge Alberto Aragão Seia, Arrendamento Urbano,7.ª edição, revista e actualizada,págs.449); k) A habitualidade não pode ser entendida enquanto referente a qualquer média de comportamentos à semana, ao mês ou ao ano, mas sim enquanto atitude que é a tomada normalmente quando inexistem condições limitativas da liberdade de residir aqui ou acolá; l) O elemento constitutivo da estabilidade apela a que pessoa do morador possa, com toda a normalidade e eficácia, ser achada, contactada, interpelada na sua mesma morada: a morada estável é algo que está sempre no mesmo sítio, não é uma morada que à laia da do caracol hoje está aqui mas amanhã está ali e é neste novo local que o caracol tem de ser procurado; m) O traço constitutivo de a residência permanente dever ser o centro de organização da vida doméstica significa sinteticamente que essa residência seja o ninho onde se desenvolve o essencial da relação familiar e do agregado familiar em função se cuja protecção se move o legislador na construção do conceito: é o local onde, na ausência de constrangimentos não definitivos de saúde (cfr. Acórdão da Relação de Lisboa, de 4/6/2002, Col Jur. XXVII, 3,90, referente a pessoa que passou a residir num lar de idosos), profissionais ou...

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