Acórdão nº 385/08.0TTOAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) - LIVRO 97 - FLS 117.

Área Temática: .

Sumário: I - Consubstanciando a relação jurídica entre o Estado e o trabalhador um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços, não lhe é aplicável o art. 100, nº 6, do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05.

II - No domínio do DL 427/89, de 07.12 (alterado pelo DL 218/98, de 17.06), era proibida a celebração, pelo Estado, de contrato de trabalho por tempo indeterminado, proibição essa que é absoluta, englobando por isso, a contratação tácita a contratação originária e a contratação por conversão” (Acórdão do STJ de 10.12.09, www.dgsi.pt. Proc. 6/08. 1TTPTG.S1).

III - A Lei 23/04, de 22.06 veio admitir, no seio da administração Pública, o contrato de trabalho sem termo, condicionando, porém, a sua celebração a diversos requisitos, designadamente à forma escrita e à observância de um prévio processo de selecção de candidatos subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades, com fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos (art. 5º da referida lei).

IV - Porém, não obstante essa admissibilidade, tendo em conta o entendimento sufragado, com força obrigatória geral, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 368/2000 (DR IS-A, de 30.11.2000) e 61/2004 (DR IS-A, de 27.02.2004), bem como a jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por todos, Acórdãos de 14.1107, 18.06.08, 01.10.08, 26.11.08, 01.07.09, 25.11.09 e 03.02.10, ii w si. t, Processos 0852451, 06S2445m 08S1536, 08S1982, 08S3443, 1846/06.1YRCBR.S1 e 387/09OYFLSB), a contratação sem termo pelo Estado, seja ela tácita, originária ou por conversão, será inconstitucional, por violação do art. 47°, n° 2, da CRP, se não observar um prévio processo concursório que garanta o referido princípio de igualdade de condições e de oportunidade de acesso.

V - Como consequência de um despedimento ilícito ocorrido no âmbito de um contrato de trabalho nulo, o trabalhador tem direito ás retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao momento em que a invocação da nulidade foi notificada ao trabalhador ou, não sendo invocada, até ao momento em que é declarada oficiosamente pelo tribunal.

VI - A nulidade do contrato de trabalho impede, em caso de despedimento ilícito, a reintegração, mas confere o direito à indemnização de antiguidade caso por ela o trabalhador haja optado até à sentença, não cabendo, porém, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal condenar no pagamento dessa indemnização se o trabalhador, tendo embora formulado, em alternativa, o pedido de reintegração ou indemnização, não procedeu a essa opção até ao referido momento.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Procº nº 385/08.0TTOAZ.P1 Apelação Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 278) Adjuntos: Des. André da Silva Des. Machado da Silva (Reg. nº 1360) Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B………., intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra o ESTADO PORTUGUÊS, pedindo que: -Seja declarada a existência, validade e eficácia de um contrato de trabalho subordinado sem termo entre si e a C………. vigente desde 18.1.1999 e, em consequência, declarada a ilicitude do seu despedimento, por não ter sido precedido de processo disciplinar e o R. condenado: a) no pagamento dos subsídios de férias e de Natal vencidos durante a vigência do contrato, no total de € 9.636,02.

  1. no pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde da data do despedimento até à efectiva execução da sentença.

  2. na reintegração sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, ou caso venha a exercer o seu direito de opção, na indemnização prevista no art. 439º, nº1 do C.Trabalho.

  3. no pagamento da indemnização por danos morais na quantia de € 5.363,98.

Para tanto alegou, em síntese, que: Em 18.1.1999, celebrou com a C………. um contrato para exercer para esta o controlo de processamento de materiais de risco específico e subprodutos de animais de talho e caça nas unidades de transformação de subprodutos, sendo tal contrato denominado de Prestação de Serviços em Regime de Tarefa celebrado pelo prazo de 5 meses; em 17.6.1999 outorgou novo contrato com o mesmo objecto, desta feita designado de Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença, o qual teve sucessivos aditamentos até 31.3.2006, data em que subscreveu outro contrato intitulado de prestação de serviços em regime de avença para o exercício das mesmas funções, contrato esse que foi rescindido por comunicação de 2.5.2007, com efeitos a partir de 30.6.2007.

Não obstante a designação dos contratos durante todo o referido período nunca exerceu as suas funções para que foi contratada de forma independente e com autonomia técnica mas antes sob as ordens, direcção e fiscalização da C………., pelo que o contrato realmente existente sempre foi um contrato de trabalho subordinado.

O Estado, representado pelo Ministério Público, aos 17.07.2008, contestou, por excepção, invocando a incompetência material do Tribunal, e por impugnação, aduzindo que a A. nunca actuou na dependência e sob a autoridade e direcção do R., sendo por isso de prestação de serviços a relação contratual com a mesma estabelecida e que, caso venha a entender-se que o contrato existente foi um contrato de trabalho subordinado, o mesmo será nulo por violação de normas imperativas e, em consequência, só produz efeitos durante o período que está em execução, podendo qualquer das partes pôr-lhe termo a todo instante, pelo que a comunicação de rescisão não traduz qualquer despedimento ilícito e a pretensão da A., só poderá proceder relativamente aos subsídios de férias e de Natal peticionados.

A contestação foi notificada à A., por correio registado expedido aos 28.07.2008, tendo esta respondido no sentido da improcedência da excepção.

Foi proferido o despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção de incompetência do Tribunal em razão da matéria, afirmando-se a validade e regularidade da instância.

Dispensada a selecção da matéria de facto, realizada a audiência de discussão e julgamento, decidida a matéria de facto, que não foi objecto de qualquer reclamação, proferiu-se sentença absolvendo o réu de todos os pedidos contra ele formulados.

Inconformada, veio a Autora recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: I. Contrato de trabalho é aquele mediante o qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta (cfr. arts. 1º da L.C.T., 10º do Código do Trabalho e 1152º do Código Civil).

É pacífico que a subordinação jurídica do trabalhador à sua entidade patronal constitui o elemento essencial caracterizador do contrato de trabalho, subordinação que a douta sentença sob recurso peremptoriamente reconhece ter existido.

De facto, a concatenação dos diversos elementos factuais (mormente, pontos 23. a 29. dos factos provados) quanto ao modo de organização da actividade profissional da Recorrente, levam-nos, indiscutivelmente, à qualificação do contrato em causa como um verdadeiro e próprio contrato de trabalho subordinado, apesar do nomen juris que lhe foi atribuído, o qual terá de ser considerado sem termo, uma vez que à data da comunicação da rescisão unilateral (datada de 02/05/2007 – cfr. ponto 20. dos factos provados), “não existia qualquer contrato escrito em vigor desde 31/03/2007” (cfr. ponto 21. Dos factos provados) – artigo 131º, n.º 4 do Código do Trabalho.

I.1 – Mostram-se violados os artigos 10º do Código do Trabalho e 1152º do Código Civil, artigo 131º, n.º 4 do Código do Trabalho, bem como o artigo 10º do D.L. 184/89 de 2 de Junho, por errada interpretação.

  1. Estando perante um contrato de trabalho subordinado, não tem aplicação o regime previsto no artigo 10.º, n.º 6, do Decreto-Lei n.º 184/89, de 14 de Junho, convocado na douta sentença sob recurso.

    Ao estabelecer que “são nulos todos os contratos de prestação de serviços, seja qual for a forma utilizada, para o exercício de actividades subordinadas, sem prejuízo da produção de todos os seus efeitos como se fossem válidos em relação ao tempo durante o qual estiveram em execução”, estriba-se no necessário pressuposto de que outro contrato não haja sido o contrato efectivamente celebrado – Acórdãos do STJ de 12-02-2009 e de 25-03-2009, respectivamente, processos 08S2583 e 08S3260 in www.dgsi.pt.

    Estando perante um contrato de trabalho subordinado, a consequência é esse contrato passar a reger-se pelas leis laborais de direito privado ou pelo regime da constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego público, consignado no Decreto-Lei nº 427/89, consoante o contrato em causa possa ser considerado como contrato de trabalho por tempo indeterminado ou contrato de trabalho a termo certo, nos termos previstos no art.º 115.º do Código do Trabalho: “o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz, efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução (…)”.

    No caso vertente, sendo o contrato em causa necessariamente qualificado como de trabalho, deve em consequência ser o Recorrido condenado no pagamento dos subsídios de férias e de Natal referentes ao período de vigência do contrato, no montante pedido de 9.636,02€ (nove mil seiscentos e trinta e seis euros e dois cêntimos), ao qual acrescem os juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, uma vez que, conforme consta do ponto 30. dos factos provados “a C………., desde a data da contratação da A., sempre lhe pagou a remuneração apenas durante 12 meses por ano, nunca lhe tendo pago qualquer quantia a título de subsídio de férias ou de Natal”.

    De resto, salvo melhor opinião, outra conclusão não é possível, sob pena de...

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