Acórdão nº 109/15.6GBFND.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | MARIA PILAR DE OLIVEIRA |
Data da Resolução | 08 de Maio de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório No processo comum com intervenção do tribunal singular 109/15.6GBFND da Comarca de Castelo Branco, Juízo Local Criminal do Fundão, após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença em 4 de Junho de 2018 com o seguinte dispositivo: Por todo o exposto, o Tribunal julga procedente e provada a acusação pública e, em consequência, decide: 1. Condenar o arguido A., pela prática em autoria material, sob a forma consumada, de um crime de incêndio florestal, p. e p. pelo art. 274, ns. 1 e 4 e 15, al. a), ambos do C. Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de 7,5 euros (sete euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a multa global de 1500,00 (mil e quinhentos) euros.
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Condenar o arguido no pagamento das custas criminais do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC ´S – cfr. arts. 513, n. 1, do C. P. Penal e 8, n. 9, do R.C.P..
Inconformado, recorreu o arguido, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões:
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Na senda de Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 28 de Fevereiro de 2018 que declarou nula Sentença condenatória, o Tribunal a quo proferiu nova Sentença de fls… que condenou o Arguido pela prática, em autoria material, sob a forma consumada, de um crime de incêndio florestal, p. e p. pelos n.ºs 1 e 4 do art. 274º e al. a) do art. 15º do CP em pena de duzentos (200) dias de multa, à taxa diária de € 7,50 (sete euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a multa global de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) e, em custas criminais no valor de três (3) UCs, sucede porém que a Sentença de fls…padece de vicissitudes que consubstanciam contradições insanáveis entre a própria fundamentação e entre esta e a decisão e que de per si a inquinam de forma irreparável e reflete, erro na apreciação da prova documental e testemunhal carreada para os presentes autos em violação declarada das regras e princípios da apreciação e valoração, maxime do preceituado no art. 127º do CPP e do Princípio Constitucional in dubio pro reo.
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Com efeito, o Tribunal a quo decidiu condenar o aqui Recorrente pela prática de um crime de um crime de incêndio florestal p. e p. nos n.ºs 1 e 4 do art. 274º e al. a) do art. 15º do CP porquanto, “(…) No dia 02.04.2015, cerca das 14h50m, o arguido, que se deslocou àquele local, colocou lenha no interior do forno e ateou-lhe fogo. “ (ponto 3. do quadro factológico provado) e motiva a aludida decisão, no conjunto de depoimentos e prova documental, essencialmente no Relatório de Ocorrência de fls. 61 a 63 que relata a verificação de um incêndio na Quinta X (...) , (...) no dia 02 de Abril de 2015 cerca das 14h36m.
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Donde se verifica uma incompatibilidade insuscetível de ser ultrapassada pela simples circunstância de a conduta do aqui Recorrente ter ocorrido posteriormente – cerca das 14h50m, ao momento da ocorrência de incêndio florestal que se iniciou pelas 14h36m, na Quinta X (...) , pelo que o ato de atear fogo a um forno, pelas 14h50m não tem a virtualidade de originar a propagação do incêndio florestal e, por conseguinte, motivar a condenação pela prática de crime de incêndio florestal nos termos decididos, razões pelas quais, a decisão condenatória se apresenta incorreta e desconforme à lei pois, de acordo com um raciocínio lógico estribado no texto da decisão e conjugado com as regras da experiência comum importaria decisão absolutória e, por conseguinte a Sentença de fls… encontra-se viciada por contradição insanável entre a fundamentação e a decisão – al. b) do n.º2 do art. 410º do CPP, o que desde logo importa, nos termos do n.º1 do art. 426º do CPP o reenvio do processo para nova decisão e consequente absolvição do aqui Recorrente.
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Por outro lado, o Tribunal a quo mal andou ao coligir e na ponderação e valoração dos meios de prova carreados para os autos, o que importou a existência de omissão quanto a factualidade provada e erro na qualificação dos factos constantes dos pontos 1., 2., 3., 4., 5., 6., 7., 8., 9 e 10 do quadro factológico como provados, pelo que, nos termos e para os efeitos do preceituado na al. a) do n.º3 do art. 413º do CPP foram incorretamente julgados os pontos 1., 2., 3., 4., 5., 6., 7., 8., 9 e 10 do quadro factológico e levianamente ponderado o Relatório de Ocorrência de fls. 61 a 63 que gerou omissão determinante no quadro factológico provado.
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As provas carreadas para os autos, quer de natureza documental, quer de natureza testemunhal, maxime relatório de ocorrência elaborado pelos Bombeiros Voluntários (...) – fls. 61 a 63, depoimentos das testemunhas (…), ambos agentes da GNR, bem como de (…), (…), (…) e (…), salvo o devido respeito, impunham in totum decisão diversa da recorrida.
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O quadro factológico, maxime nos pontos evidenciados em D) denota uma afronta às regras da experiência comum e livre convicção uma vez que revelam uma decisão irracional puramente subjetiva e que se furta à fundamentação, não reproduzindo uma apreciação critica, racional e fundada nas regras da experiência, da lógica e da ciência de molde a permitir ao julgador uma convicção objetivável e motivável – art. 127º do CPP.
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Donde, a contrario do preconizado na Sentença de fls… não resulta que o Arguido tenha informado os Srs. Agentes da GNR que havia sido o primeiro a chegar ao local, que o forno se encontrava queimado, que o incêndio se tenha originado no forno, que o arguido assumiu que procedeu a queima no interior do forno e que nele colocou lenha em excesso, pelo que a condenação do aqui Recorrente pela prática de um crime de incêndio florestal por negligência para além de configurar uma precipitação do Tribunal a quo decorrente de uma análise coartada das provas produzidas, importou a violação declarada das regras da experiência comum e as demais inerentes à valoração de prova, maxime dos depoimentos e violou o Princípio in dubio pro reo.
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Compulsado o teor e conteúdo do Relatório de Ocorrência de Incêndio elaborado pelos Bombeiros Voluntários (...) – fls. 61 a 63, resulta que na Quinta da (…), (…), (…) em 02 de Abril de 2015 se verificou um incêndio pelas 14h36m, que os Bombeiros saíram do quartel pelas 14h39m e chegaram ao local pelas 15h30m; que estiveram no local as corporações de Bombeiros de (…), (…), (…), um veículo da GNR que procederam a combate, extinção, rescaldo e vigilância de incêndio de natureza rural – mato e que os Bombeiros abandonaram o local pelas 18h10m e chegaram ao quartel pelas 18h35m, o que foi corroborado pelos depoimentos dos Bombeiros que se deslocaram ao local de incêndio – (…) – Depoimento prestado em Audiência de Julgamento de dia 15 de Março de 2017 e gravado através de sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática utilizada pelo Tribunal com início pelas 16h02m e termo pelas 16h10m, cfr. Ata de Audiência de Julgamento de fls… nas passagens [00:09:55] a [00:10:15] e de (…) - Depoimento prestado em Audiência de Julgamento de dia 15 de Março de 2017 e gravado através de sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática utilizada pelo Tribunal com início pelas 16h10m e termo pelas 16h29m, cfr. Ata de Audiência de Julgamento de fls… nas passagens de [00:01:22] a [00:01:45], [00:03:15], [00:03:19], [00:08:36] a [00:09:09].
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Ora, do Relatório de Ocorrência de Incêndio de fls. 61 a 63, aliado aos depoimentos dos Bombeiros (…) e (…) (parcialmente transcritos e evidenciados em H) - b) do n.º 3 do art. 413º do CPP) resulta de forma cristalina que a ocorrência de incêndio se verificou na Quinta da (…), (…), pelas 14h36m, o que impõe uma alteração ao quadro factológico provado mediante aditamento de facto com a seguinte redação: - Os bombeiros foram chamados para comparecer na Quinta da (…), (…), em 02 de Abril de 2015 pelas 14h36m em virtude de incêndio.
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Mal andou, também, o Tribunal a quo ao decidir que o Arguido era proprietário da Quinta da (…) sita na (…), na qual se encontrava implantada uma casa com um forno em anexo; mais decidiu que a mesma se encontrava desabitada e como tal, em seu redor tinha vegetação espontânea, essencialmente pasto e mato – pontos 1 e 2 do quadro factológico provado, pois fê-lo desacompanhado de qualquer elemento probatório pois, não foram carreados para os presentes autos quaisquer documentos que de per si atestassem a propriedade e a qualidade de proprietário do aqui Recorrente; assim como não se alcançou da prova testemunhal, de forma determinante, a qualidade de proprietário do Arguido, bem como a existência de uma casa e a verificação de vegetação espontânea junto da casa.
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Outrossim, resultou da prova testemunhal, designadamente dos depoimentos dos Srs. Agentes da GNR (…) Depoimento prestado em Audiência de Julgamento de dia 15 de Março de 2017 e gravado através de sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática utilizada pelo Tribunal com início pelas 15h04m e termo pelas 15h24m, cfr. Ata de Audiência de Julgamento de fls… nas passagens [00:09:42] a [00:10:06] e de (…) - Depoimento prestado em Audiência de Julgamento de dia 15 de Março de 2017 e gravado através de sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática utilizada pelo Tribunal com início pelas 15h24m e termo pelas 15h45m, cfr. Ata de Audiência de Julgamento de fls… nas passagens [00:05:14] a [00:05:18] que a Quinta X (...) foi arrendada pelo aqui Recorrente.
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Ademais, resulta dos depoimentos da testemunha – (…), aliado aos depoimentos de (…), (…) e (…), todos prestados em Audiência de Julgamento de dia 15 de Março de 2017 e gravados através de sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática utilizada pelo Tribunal (cfr. Ata de Audiência de julgamento de fls…) nas passagens [00:04:35] a [00:05:00]; [00:03:15] a [00:04:29]; [00:02:34] a [00:03:16]; [00:01:59] a [00:03:19] respetivamente, que o local se encontrava cuidado junto da casa, em ruínas, bem como próximo do forno; tendo...
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