Acórdão nº 01956/18.2BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução24 de Abril de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 O Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que aquele tribunal, julgando procedente a reclamação deduzida pela sociedade acima identificada (adiante Recorrida) ao abrigo do art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), determinou a extinção do processo de execução fiscal em que aquela era executada e o levantamento da garantia que prestou, no entendimento de que é judicialmente sindicável, por via da reclamação, o prosseguimento da execução fiscal depois de o tribunal arbitral ter anulado totalmente a liquidação que deu origem à dívida exequenda, prosseguimento esse que teve por ilegal.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «A. A ora reclamante vem pelo presente incidente solicitar a extinção do processo executivo n.º 3590201601111248, bem como o levantamento da suspensão do mesmo, por força da garantia prestada, fundamentando a Reclamação na razão do órgão da execução fiscal (Serviço de Finanças de Vila Nova de Famalicão-2) não ter procedido à extinção do processo executivo supra referido, pelo facto da liquidação de IRC n.º 2016 8310033636, do ano de 2012, no montante a pagar de € 465.436,53, subjacente ao identificado PEF, ter sido integralmente anulada, em resultado da decisão colectiva arbitral, proferida no processo n.º 362/2017, transitada em julgado (negrito nosso).

  1. Em consonância com o acima invocado, pronunciou-se o douto Tribunal a quo, com o seguinte segmento decisório: “O Reclamante requereu pronúncia arbitral, junto do CAAD, contra a liquidação de IRC e respectivos juros compensatórios, referente ao exercício de 2012, identificada com o n.º 2016 8310033636 e os juros compensatórios n.ºs 2016 0000551877 e 2016 0000551878, onde se evidencia um montante de imposto a pagar de € 465.436,53, dos quais € 225.746,33 correspondem a tributação autónoma (TA) e € 48.465,46 a juros compensatórios.

    […] Nessa conformidade, e considerando que a decisão arbitral proferida no processo n.º 362/2017-T procedeu à anulação total, e não apenas parcial do acto de liquidação subjacente ao processo de execução fiscal n.º 3590201601111248, a Administração Fiscal estava obrigada a cumprir o que aí se determinou (conforme artigo 24.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/2011, de 20/01) e a retirar da anulação da liquidação as devidas consequências, quais sejam, atento o disposto nos artigos 176.º, n.º 1, alínea b) e 270.º, n.º 1, ambos do CPPT, a de extinguir o processo de execução fiscal instaurado para cobrança coerciva da dívida titulada por aquela liquidação com o consequente levantamento da garantia prestada para efeitos da suspensão do processo de execução fiscal. Não o tendo feito espontaneamente, […] importa determinar a extinção do processo de execução fiscal n.º 3590201601111248, nos termos do artigos 176.º, n.º 1, alínea b) e 270.º, n.º 1, ambos do CPPT, e o levantamento da garantia prestada, nos termos do artigo 271.º do CPPT”.

  2. O Mm.º Juiz [do Tribunal] a quo proferiu a seguinte DECISÃO: “Julgar procedente a presente Reclamação procedente e, em consequência, determinou a extinção do processo de execução fiscal n.º 3590201601111248, com o consequente levantamento da garantia prestada para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal”.

  3. É da referida decisão do Tribunal a quo que a Fazenda Publica discorda, por entender, salvo sempre o devido respeito e melhor opinião, que o M.º Juiz [do Tribunal] a quo fez errada interpretação e aplicação das disposições legais ao caso concreto, ao ter considerado, como considerou, que a questão que contende com a execução espontânea de decisão judicial, podia ser apreciado na forma de processo que o Reclamante lançou mão, muito embora, na douta sentença, admitisse o que aqui se passa a transcrever: “O enfoque referido pela Reclamante assenta nos efeitos, em sede de processo de execução fiscal, da decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 362/2017-T, designadamente atinentes à possibilidade de prosseguimento do processo de execução fiscal para cobrança de valores divergentes daqueles inicialmente instaurados, e seus efeitos na garantia apresentada com vista à suspensão da execução fiscal.

    Com efeito, o facto de inexistir, no caso concreto, qualquer “despacho reclamado”, na medida em que a extinção da execução e/ou o levantamento da garantia prestada para efeitos de suspensão da execução fiscal não foi directamente peticionada, nem directamente objecto de despacho expresso de indeferimento, não é de molde a obviar à sindicância judicial de actuação implícita de prosseguimento de execução fiscal (a AT prosseguiu com a execução fiscal para cobrança dos valores considerados fora da alçada da decisão arbitral, o que se retira, desde logo, da emissão de “liquidação correctiva””. (sublinhados nossos).

  4. Conforme acima se transcreveu na parte da fundamentação extraída da douta sentença, o M.º Juiz [do Tribunal] a quo deixou exarado que o órgão da execução fiscal não havia praticado nenhum acto no seio do processo executivo.

    Ora, F. constituindo a reclamação judicial de acto praticado na execução fiscal uma verdadeira acção impugnatória incidental da execução fiscal, formulada no curso de execução pendente, tendo por objecto determinado acto que nela foi praticado pelo órgão da execução e por finalidade a apreciação da validade desse acto; e, G. estabelecendo o n.º 1 do art. 277.º do CPPT o prazo de 10 dias para deduzir reclamação judicial dos actos materialmente administrativos em matéria tributária praticados no âmbito do processo de execução fiscal, contados desde a sua notificação; H. da factualidade dada como provada na douta sentença a quo ficou assente que, face à inexistência da prática de qualquer acto e/ou despacho proferidos na execução fiscal, consequentemente, inexistiu a notificação referida no predito artigo 277.º, n.º 1, que permitisse ao Reclamante apresentar a Reclamação do art. 276.º do CPPT.

    I. Donde, considera a Fazenda Pública, salvo sempre o devido respeito e melhor opinião, que esta Reclamação da decisão do artigo 276.º do CPPT, deveria ter sido rejeitada, porque, dada a estrutural dependência desta em relação à execução fiscal na qual é praticado o acto potencialmente lesivo “reclamável”, e, inexistindo, in casu, a prática de qualquer acto lesivo, inexistia fundamento para deduzir a Reclamação do artigo 276.º do CPPT.

  5. Apesar disso e não obstante o M.º Juiz [do Tribunal] a quo expressamente referir na fundamentação expressa na douta sentença recorrida (acima transcrita - pontos D e E), certo é que deu por assente que a causa de pedir e o pedido se adequavam à forma de processo utilizada pelo ora Reclamante.

  6. Na presente Reclamante a Reclamante deduz como pretensão a imediata extinção do processo executivo, com todas as consequências legais.

    L. Porém, não podemos perder de vista que, no caso dos autos, está em causa o cumprimento da execução espontânea da decisão arbitral por banda da AT, tendo esta interpretado a acção como sendo parcialmente procedente e, em consequência, procedeu à correspondente anulação “parcial” da liquidação de IRC, no valor de 410.645,67 €, prosseguindo o processo executivo pelo remanescente – € 47.007,87, cujo procedimento é o que subsume à “questão a dirimir” e que é o ponto de discordância do Reclamante e da AT.

  7. Nessa medida, parece-nos, sempre com o devido respeito e melhor opinião, que, tendo o Reclamante em vista o de colocar em crise a “incorrecção” da execução espontânea da decisão arbitral – proferida no âmbito do processo “CAAD” n.º 362/2017-T, levada a cabo pelo OEF, teria que ser discutida, não em sede de Reclamação da decisão do órgão da execução fiscal, admitida e decidida pelo douto Tribunal a quo, mas, antes, em sede de execução de julgado, previsto nos artigos 158.º e 176.º e ss. do CPTA.

  8. Nesta sequência, e quando se analisa o exposto no Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), temos que nos termos do artigo 158.º, n.º 1, daquele diploma “as decisões dos tribunais administrativos são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer autoridades administrativas”.

  9. De acordo com o regime vertido no n.º 1, do artigo 160.º do CPTA: “os prazos dentro dos quais se impõe à Administração a execução das sentenças proferidas pelos Tribunais Administrativos correm a partir do respectivo trânsito em julgado”.

  10. E no n.º 1 do artigo 175.º, do CPTA, que, salvo ocorrência de causa legítima de inexecução, o dever de executar deve ser integralmente cumprido, no máximo de 90 dias.

  11. Se tal não se verificar, determina o n.º 2 do artigo 176.º do CPTA, que o interessado dispõe do prazo de um ano para pedir a respectiva execução ao Tribunal competente (negrito nosso).

  12. Do antedito, se, in casu, a AT, não tivesse executado espontaneamente a decisão arbitral, no prazo legalmente previsto, o Reclamante teria que se socorrer da execução de Julgado, de harmonia com o disposto nos artigos 151.º, 158.º, 175.º e 176.º do CPTA.

  13. A exemplo do que acima ficou dito, interpretando as referidas normas e aplicando-as ao caso concreto, somos de opinião, salvo sempre o devido respeito, que o que está em causa nos presentes autos é sempre a decisão arbitral – a execução espontânea da decisão arbitral que a AT executou espontaneamente (sublinhado nosso).

  14. O processo de execução de julgado está sujeito ao princípio da plenitude da execução, no sentido que é nele que se há-de apurar da legalidade de todos os actos de execução do julgado anulatório.

  15. Tal significa que a obrigação de respeito pelo caso julgado formal sobre a decisão judicial impede a Administração Tributária de actuar de forma que com ela seja incompaginável.

    V. Quanto...

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