Acórdão nº 376/11.4BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | JOSÉ GOMES CORREIA |
Data da Resolução | 04 de Abril de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1. Relatório …………………………………., Lda, , A. na presente Acção Administrativa Especial, por ela intentada contra o Hospital de Faro, E. P.E, não se conformando com a sentença nela proferida e que a julgou parcialmente procedente, por provada e, em consequência foi anulado o acto administrativo que aplicou à Autora multas contratuais, notificado à Autora por ofício datado de 3 de Março de 2011, absolvida a Entidade Demandada dos demais pedidos formulados e condenada a Autora e a Entidade Demandada no pagamento das custas processuais, na proporção de, respectivamente, 80% e 20%, dela interpõe recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo Sul.
Das alegações de recurso extrai-se a seguinte síntese conclusiva: “1 - De acordo com o artigo 100° do Código do Procedimento Administrativo (doravante "CPA"), "os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.". 2 - Isto significa na prática, que antes da R. notificar a A da alegada resolução do Contrato de Concessão, esta teria o direito de ser ouvida e exercer o seu direito de audição prévia. 3 - Contudo, o R. não facultou essa prerrogativa legal à A ., violando assim um legitimo direito que lhe assiste por lei. 4 - A R. veio simplesmente resolver o Contrato de Concessão, sem que anteriormente tivesse sido dada a devida oportunidade da A exercer o seu direito do exercício de audição prévia. 5 - A decisão recorrida, ao não reconhecer a violação do direito de audiência prévia, violou o disposto nos artigos 100 do CPA:, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que reconheça a violação do direito de audiência prévia que assiste à A. e, consequentemente, procedente a acção determinando a anulação do acto da Ré consubstanciado na deliberação do respectivo Conselho por oficio nº4310, datado de 17 de Março de 2011, que declarou a resolução do Contrato de Concessão. 6 - O Tribunal a quo andou mal, salvo o devido respeito, ao não ordenar o prosseguimento destes autos para julgamento, a fim de ser produzida prova pelas partes, designadamente as testemunhas arroladas pela A., aqui recorrente. a quem competia, em primeira linha, provar os factos constitutivos do direito a que se arrogou. 7 - A esmagadora maioria dos factos alegados pela aqui recorrente e que consubstanciam a invocada alteração anormal e imprevisível das circunstâncias são controvertidos. 8 - Era, assim, crucial que o Tribunal a quo tivesse apurado as razões (rectius, factos) que estiveram subjacentes à decisão de contratar por banda da A e, depois, a realidade que esta viveu logo após a outorga do contrato de concessão. 9 - Ora, foram invocados factos que sustentam que a resolução do contrato de concessão é ilegítima e ilegal: -Da petição inicial - 21.a 43., 52. a 54., 68. e 69., 84. A 102., 106 a 115, 120 a 138. -Da Réplica - 10., 11., 12., 13., 14., 15., 16., 17., 18.. 19., 20., 21., 22., 23., 24., 25., 26., 27., 28., 29., 30., 31., 32., 33., 34., 35., 36., 37., 49., 50., 51., 52., 53., 54. 10 - Ora, os factos acabados de transcrever são controvertidos (daí não terem sido considerados pelo Tribunal a quo na decisão ora posta em crise), donde emerge ser curial o apuramento dos mesmos para a justa composição do litígio e boa decisão da causa. Note-se que o Tribunal tem o poder-dever de, oficiosamente ou a requerimento, buscar a verdade material. 11 - A concessão em causa nos autos - tal qual todas as outras - deve subordinar-se ao princípio do equilíbrio económico-financeiro. 12 - Este equilíbrio económico-financeiro exigia que se tivessem verificado determinadas circunstâncias - cuja factualidade foi devidamente explanada na petição inicial - que estiveram na base da contratação por banda da concessionária. 13 - Os factos que estiveram subjacentes à decisão de contratar foram dados como certos por ambos os outorgantes (A. e R) e, como se provaria cabalmente em sede de audiência prévia e julgamento, incluindo inquirição de testemunhas (ainda que a sentença sob escrutínio tenha acolhido algumas dessas circunstâncias nos pontos mm) a pp) da matéria de facto dada como provada), esses pressupostos não se vieram a concretizar. 14 - Ora, devem as partes do contrato assumir e reconhecer a existência dessas circunstâncias e adaptar os termos do contrato à realidade efectivamente existente. 15 - E não se fale, como o faz a sentença recorrida, em "risco do negócio". 16 - Não se poderá considerar a impossibilidade das farmácias hospitalares de vender medicamentos retrovirais, bem como o caso da dispensa de medicamentos em unidose e I ou a falta da prometida exclusividadede funcionamento 24h I 7 dias como fazendo parte do risco normal do próprio do contrato. 17 - Aliás, dada a própria definição. nem sequer é o que está em causa nos autos. O que houve - e que está controvertido - foram uma série de acontecimentos totalmente imprevistos para a concessionária (e também para a concedente) e que a esta não podem ser assacadas. Na verdade, como poderia a A. prever à data da celebração do Contrato de Concessão (e que culpa tem a mesma), que esta matéria, uma vez assumida pública e politicamente (nomeadamente como pressuposto para o funcionamento das farmácias localizadas nos hospitais do SNS), não iria ser devidamente implementada, e que, por consequência, a mesma ainda não poder comercializar medicamentos antiretrovirais? E o que dizer da não exclusividade de abertura 24h/ 7dias? E que culpa tem a A. na impossibilidade de venda de medicamentos por unidose? 18 - A A. não poderá pois ser simplesmente penalizada. por confiar e formar expectativas legítimas com base em compromissos e actos legislativos emanados do Estado, que não se concretizam. 19 - A A. não poderia prever na data em que decidiu concorrer e contratar, que os "Compromissos" assumidos entre a ANF e o Governo em 2006 não iriam ser concretizados. 20 - A A. não poderia prever nesse momento, que o Governo procedesse a uma drástica, inesperada e constante descida do PVP dos medicamentos não genéricos e medicamentos genéricos. 21 - A A. não poderia prever que o Estado viesse a permitir e a autorizar que o regime de funcionamento contínuo, especial e exclusivamente previsto para as farmácias de dispensa de medicamentos ao público nos hospitais do SNS, fossa alargado às restantes farmácias. 22 - Daí, repete-se, ser incorrecto dizer-se que estas alterações caem na alçada do "risco" do negócio. 23 - Ao não se verificarem os pressupostos que estiveram na base da decisão de contratar gerou-se um desequilíbrio económico, nomeadamente para a concessionária já que o concedente vê sempre a sua posição ressalvada com o pagamento da renda variável) que, já se disse, competia à concedente repor, designadamente tomando a iniciativa de reduzir a remuneração (rendas) fixa e variável. É que competia - e compete - ao concedente repor o equilíbrio económico-financeiro da concessão decorrente de factos novos que o põem em causa. E várias foram as missivas e os contactos, por banda da A., a dar conta à R. das alterações e das consequências gravosas para a sua saúde financeira. 24 - Mas, ao invés de repor o equilíbrio económico-financeiro da concessão, a entidade concedente veio exigir o pagamento do valor da totalidade das rendas, as quais não eram exigíveis face à alteração superveniente, anormal e imprevisível das circunstâncias. 25 - Efectivamente, a exploração da farmácia concessionada, como se vê do espectro factual supra referido, era absolutamente deficitária, dado que os proveitos gerados, cada vez menos, não cobriam os custos incorridos (nomeadamente renda e pessoal). 26 - Em conjugação com a privação de obtenção do crédito por comparticipação na venda de medicamentos, titulado junto da ARS, a situação da farmácia em causa - e. por conseguinte, da A - era extremamente delicada, no plano económico e financeiro. 27 - Dispõem os nºs 1 e 2 do artigo 327° do CCP: 1 - Nos contratos bilaterais, quando o incumprimento seja imputável ao contraente público, o co-contratante, independentemente do direito de resolução do contrato que lhe assista, nos termos do disposto no artigo 332.º, pode invocar a excepção de não cumprimento desde que a sua recusa em cumprir não implique grave prejuízo para a realização do interesse público subjacente à relação jurídica contratual. 2 - Se a recusa de cumprir pelo co-contratante implicar grave prejuízo para a realização do interesse público nos termos do disposto na parte final do número anterior, aquele apenas pode invocar a excepção de não cumprimento quando a realização das prestações contratuais coloque manifestamente em causa a viabilidade económico-financeira do co-contratante ou se revele excessivamente onerosa, devendo, nesse último caso, ser devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença. 28 - No caso dos autos, a A. apenas se recusou a cumprir o dever de pagar a renda prevista, sem que tal assumisse qualquer prejuízo para o interesse público, nessa medida que não o meramente financeiro (decorrente da perda do valor da renda). 29 - Mantendo - como manteve, mas que o Tribunal se absteve de indagar violando, desse jeito o dever de indagação - o cumprimento dos demais deveres concessionados, nomeadamente o dever fundamental de dispensa de medicamentos ao público se a R. se visse na contingência de ter de cumprir com o valor da renda - em especial a renda variável -, ficaria sem disponibilidades para pagar a fornecedores, trabalhadores, financiadores e credores em geral, ficando sem tesouraria, e em situação de colapso financeiro. 30 - Prevê o artigo 437.º do Código Civil que perante a verificação de uma alteração das circunstâncias, o respectivo Contrato pode ser modificado, por acordo das partes ou por decisão judicial. 31 - Não só o contrato pode ser modificado, como a parte lesada tem direito a...
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