Acórdão nº 2743/13.0TBTVD.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelHELDER ALMEIDA
Data da Resolução14 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1] I – RELATÓRIO 1. AA propôs contra BB a presente acção com processo comum, pedindo a condenação daquele a pagar ao A. a quantia de € 224.945,04, a título de indemnização pelos danos alegadamente decorrentes da actuação do R., na qualidade de mandatário judicial.

  1. Contestou o R., impugnando a ocorrência dos invocados danos e concluindo pela improcedência da acção.

  2. Efectuado julgamento, foi proferida sentença, na qual se considerou a acção parcialmente procedente, condenando-se o R. a pagar ao A. a quantia de € 76.033,88, absolvendo-o do restante pedido.

  3. Inconformado, o R. interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual – por Acórdão de fls. 582 e ss.- , lhe concedeu parcial provimento, condenando o R. a pagar ao A. a quantia de € 7.294,00, absolvendo-o do demais peticionado.

  4. Por sua vez discordante, o A. interpôs o vertente recurso de revista para este Supremo, encerrando a sua alegação com as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa que, conhecendo parcialmente do recurso interposto pelo aqui Recorrido, entendeu haver inexistido prova suficiente que, no caso concreto, permitisse a condenação do Recorrido em indemnização pelo dano de perda de chance; B. Igualmente, vem o presente recurso interposto da parte daquela decisão que reduziu o montante arbitrado a título de reparação dos danos não patrimoniais sofridos pelo aqui Recorrente, bem como relativamente aos montantes despendidos pelo ora Recorrente com o patrocínio judiciário na demanda, custas e multas suportadas e honorários de agente de execução suportados em ulterior acção executiva; C. Entende o ora Recorrente que o Acórdão de que ora se recorre mal andou ao considerar parcialmente procedente o recurso interposto pelo aqui Recorrido e, em suma, que a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância sempre haveria de ter sido mantida porque isenta de qualquer censura e, acima de tudo, justa! D. Entendeu o Venerando Tribunal "a quo" ser de revogar a decisão então proferida por, no seu entender, não haver sido estabelecida qualquer prova acerca da probabilidade elevada de um desfecho mais favorável caso tivesse sido outra a conduta do aqui Recorrido no desempenho do patrocínio forense que se lhe encontrava confiado; E. O Recorrente não se conforma, nem se poderia conformar com tal entendimento porquanto, e conforme revela a Douta Sentença proferida em 1.ª Instância, a ponderação acerca da credibilidade da chance perdida pelo ora Recorrente foi devidamente efectuada, dentro daquilo que se afigura possível, no âmbito do apelidado "julgamento dentro do julgamento"; F. Demonstrado e provado ficou nos Autos que a conduta do Recorrido, não só o fez perder a chance de evitar o prejuízo decorrente da perda da demanda e de ver apreciado o pedido reconvencional formulado como, ademais, demonstrado ficou que a conduta do Recorrido, inclusivamente, agravou a posição do ora Recorrente; G. Na humilde opinião do ora Recorrente o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação aparenta exigir uma prova que não só se afiguraria muito difícil como, em bom rigor, resultaria praticamente impossível, quando, é certo, precisamente por conta dessa impossibilidade, pela destrinça existente entre a chance enquanto dano autónomo e o próprio dano consubstanciado no resultado obtido ou não obtido e a própria alea que gira em torno de todo e qualquer caso onde se suscite uma hipótese de perda de chance, vem sendo entendido que o nexo de causalidade não deverá, aqui, ser perspectivado e entendido como o fez o Digníssimo Tribunal recorrido; H. Entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa que «não contém a matéria provada elementos bastantes para permitir concluir que, caso houvesse o apelante usado na sua actuação da máxima diligência, não viesse a ocorrer, em idênticos termos a condenação do apelado no pagamento da quantia reclamada na acção contra si movida - ou obtivesse procedência o pedido reconvencional na mesma deduzido», o que, desde logo e a nosso ver, nem sequer se compadece com a apreciação e autonomização da chance perdida, porquanto, caso assim fosse, caso demonstrado houvesse ficado que não fosse a conduta do ora recorrido, o aqui Recorrente não teria tido decaimento na acção, teria tido outro decaimento que não aquele ou teria obtido ganho de causa no pedido formulado, então, nesse caso, a indemnização a arbitrar não seria pela perda da chance mas antes sim, e verdadeiramente, pelo dano sofrido, consubstanciado como o resultado que a chance visava alcançar; I. Tratam-se de duas realidades absolutamente distintas: num caso a chance enquanto dano patrimonial de natureza autónoma, noutro o prejuízo efectivo consubstanciado na perda da demanda e que, como tal, merecem tratamento diferenciado; J. A chance, de forma a ser concebida como dano autónomo em si mesmo, não carece, conforme sustentou a decisão aqui recorrida, do estabelecimento de prova de que outro teria sido o resultado obtido, tal seria confundir o dano de perda de chance com o dano decorrente da perda efectivamente sofrida no pleito; K. Diferentemente, para que a chance seja portadora de um valor em si mesma o que se exige é que a mesma surja como actual, real e séria, não no sentido de se afirmar que, não fosse a conduta lesiva, não se haveria produzido o resultado "X", mas antes que a conduta lesiva irremediavelmente fez perder a outrem a chance credível de evitar um determinado prejuízo ou obter uma determinada vantagem; L. Se assim o é, como é bom de se ver, não faz, nem fará, qualquer sentido tentar-se estabelecer e/ou apreciar um qualquer nexo causal entre a conduta lesiva e o resultado final obtido ou perdido, porquanto se o dano a relevar for o da perda de chance em si mesma o nexo causal sempre haverá de ser apreciado à luz desse dano autónomo e não qualquer outro; M. O julgamento dentro do julgamento, a que a decisão recorrida se reporta e contrariamente ao que ali vai dito, foi efectuado; N. Tendo-o sido dentro daquilo que era possível, ou seja, foi-o no sentido de se aferir abstractamente, já que em concreto nunca seria possível, se a chance cujo ressarcimento se peticionou se afiguraria idónea, credível e séria; O. Exigir prova como aquela que a decisão recorrida refere afigurar-se-ia impossível e redundaria na existência de condutas ilícitas, culposas e altamente censuráveis do prisma da culpa mas que, no entanto, permaneceriam sem sanção ou sanção suficiente, porquanto absolutamente impossível se afigura provar o grau de probabilidade que, em concreto, mereceria qualquer uma das pretensões formuladas P. Da conduta (gravemente) omissiva do Recorrido resultou a ausência de junção de prova documental, a ausência, em bom rigor, de qualquer actividade probatória que suportasse o alegado pelo aqui Recorrente e, bem assim, a ausência de junção de procurações forenses a determinar uma rejeição liminar do pedido reconvencional; Q. Impossível se afigurava qualquer outro exercício que não aquele que o Douto Tribunal de 1.ª Instância empreendeu, isto é apreciar o conteúdo da defesa e pedido reconvencional deduzidos, analisando e apreciando, no abstracto, os factos alegados de sorte a obstar à procedência da acção interposta/ as excepções deduzidas, factos substanciadores do pedido reconvencional deduzido e, ainda que perfunctoriamente, procedendo a um breve enquadramento jurídico desses mesmos factos em ordem a analisar os desfechos possíveis; R. Mais do que isso S. Afigurar-se-ia impossível porquanto da conduta omissiva do aqui Recorrido resultou uma total impossibilidade de sustentação probatória dos factos alegados, quer numa sede (defesa por impugnação e excepção), quer noutra (defesa reconvencional), pelo que, in casu, apenas se afigurava possível analisar e apreciar se dos factos alegados e defesa deduzida no seu todo se afiguraria, abstractamente, possível a obtenção de um resultado outro que não aquele que se veio a verificar; T. Se é certo que não nos é possível averiguar o grau concreto de probabilidade de procedência ou improcedência das pretensões formuladas pelo então Réu (aqui Recorrente) não menos certa se afigura a circunstância de na contestação então apresentada terem sido contraditados todos os factos articulados de que dependia a então procedência da pretensão formulada pela contraparte, terem sido deduzidas excepções que, em abstracto, detinham a virtualidade de obstar à pretensão então formulada pela contraparte e, bem assim, de terem sido articulados todos os factos essenciais que substanciavam o pedido reconvencional dirigido contra a então Autora; U. O Douto Tribunal de 1.ª Instância, no seu prudente e livre arbítrio, face ao teor do que os Autos ofereciam formulou convicção prudente no sentido de existir a possibilidade de verificação de qualquer um daqueles resultados, convicção essa última que, salvo melhor opinião que se concede, situando-se no patamar dos 50% para qualquer um dos resultados, já se afigura de per si suficiente em ordem a erigir, e assim considerar, a chance perdida enquanto utilidade séria, actual, real e idónea irremediavelmente perdida e, portanto, enquanto um dano autónomo em si mesmo V. Não se mostra correcto o entendimento sufragado na decisão de que ora se recorre no sentido de não haver sido provada a existência de uma chance credível ao ponto de ser/ dever ser considerada à luz do dano autónomo de perda de chance; W. Pelo que, em conformidade, deverá a decisão ser revogada e substituída por uma outra que, considerando a efectiva verificação daquele dano, tal qual provado, conceda a indemnização peticionada, àquele título, pelo ora Recorrente até ao limite da condenação, então, proferida em 1ª Instância a título de dano de perda de chance.

    X. Mostra-se bastante redutora a referência a meros incómodos quando dos factos provados resultou designadamente que o ora Recorrente "sofreu de ansiedade...

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