Acórdão nº 640/13.8TBLMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | MARIA TERESA ALBUQUERQUE |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – F... intentou acção declarativa na forma comum, contra ..., pedindo que seja reconhecido: - o seu direito de propriedade sobre o artº ..., e à R. H... o direito de propriedade sobre o artº ..., e aos restantes RR. o direito de propriedade em comum e sem determinação de parte ou direito sobre os arts ..., todos da freguesia de ...; - à A. e RR., o direito às águas da barroca por as haverem adquirido pelo estatuto da preocupação, cfr art 1386º al d) do CC; - à A. o direito de propriedade às águas que nascem das duas nascentes existentes nos prédios identificados; - à A. o direito de servidão de passagem para aproveitamento das águas da barroca e das nascentes existentes nos próprios prédios; - à A. o direito de servidão de aqueduto para aproveitamento das águas da barroca e das duas nascentes; - à A. o direito a depositar e a guardar/acumular as águas que correm no rego e a que se reporta a presente acção nas duas poças; Pedindo ainda que, - sejam condenados todos os RR. a limpar o rego e a permitir o acesso à A. e seus familiares à barroca, mina, rego e poças; - seja a R. H... condenada a pagar €500 pelos danos que a A. sofreu com a perda da água, e os restantes RR. condenados a pagar, em comum e partes iguais, também o montante de €500.
Refere que é irmã da R. H..., cunhada do R. ... e tia dos RR. ..., e é dona e possuidora do prédio rústico, inscrito na matriz da freguesia de ... sob o art ..., possuído por ela e seus antepossuidores há mais de 20 e 30 anos, de forma pública, pacífica, contínua e de boa fé, e a R. H... do prédio rústico inscrito na matriz da freguesia de ... sob o art ..., sendo os demais RR. donos e possuidores do prédio rústico inscrito na matriz da freguesia de ... sob os arts ..., referindo que o art ... é propriedade de M... (irmã dela, A. e da R. H...), mais referindo terem ela e os RR. recebido os referidos prédios por herança dos seus pais, sogros e avós, ... Refere ainda que todos os referidos prédios, hoje individualizados, constituíam um só prédio rústico possuído pelos referidos ... Desde há mais de 200/300 anos até hoje, esse prédio rústico e hoje todos os prédios rústicos identificados, eram, e são regados, com a água que corria, e corre, na barroca ou linha de água que passava, e passa, ao fundo dos mesmos, e entre paredes com uma largura média de 60 cm e altura 1,80/2 m, e que nascia e nasce, no lugar de ..., e bem assim por duas nascentes que nasciam, e nascem, a nascente dos mesmos prédios, ao lado do rego ou vala, referindo que uma das nascentes foi explorada através da construção de uma mina aberta há mais de 100 anos e cujo interior entra num prédio rústico vizinho. A A. e os RR. e antepossuidores desde há mais de 200/300 anos dirigem-se à barroca pelo cimo dos prédios rústicos acima identificados – e também a M... titular do art ...- e procedem à derivação da água que por ali corre, fazendo deslocar um penedo que ali está. Refere ainda que a nascente de todos os prédios referidos e desde a barroca até ao prédio rústico dos herdeiros de ... há, desde há mais de 200/300 anos, um rego ou sulco aberto pelos antigos, numa distância de mais de 100 m e com 22 cm de largura por 15 cm, de profundidade, ladeado pelo caminho ou carreiro por onde passam os titulares das águas para seu controlo, boa condução e utilização. E que ao lado desse rego havia e há, duas poças, uma perto da habitação que era dos falecidos ..., com 3 m de diâmetro, e outra, com 5 m, mais a norte e a uns 33 m daquela. E que A. e RR. e antepossuidores há mais de 200/300 anos, ora conduzem as águas da barroca ou linha de água e das duas nascentes directamente para os referidos prédios rústicos, ora as ajuntam/acumulam nas duas poças de forma a obter um caudal suficiente para irrigação daqueles prédios rústicos. Refere ainda que as referidas duas poças foram construídas para regular o caudal e racionalizar a rega de todos os campos. Entende a A. que assim procedendo, ela e os RR e antepossuidores, de forma continua, e pública de boa fé e na convicção de que não violam direitos de outrém, adquiriram o direito à água da barroca pelo estatuto da preocupação e das águas das nascentes pelo da usucapião e destinação do pai de família. Sucede que a A. está impedida de utilizar as ditas poças, as águas, as nascentes, o rego e o caminho, porquanto o R. A..., ameaça com zaragata, com a GNR e participação crime quem passar nos prédios rústicos arts ... ambos da secção B, não permitindo que a A. e seus familiares façam uso do rego, das águas da barroca, das nascentes, das poças e da mina; a R. H... obsta com iguais ameaças e tapou com pedras o rego, inutilizou o carreiro e colocou plantas no leito do rego e destruiu a poça mais próxima do urbano, tornando-a inutilizável, sofrendo a A. os correspondentes danos por não poder regar as suas culturas, dano esse que estima em 1.000 € .
A R. H... contestou arguindo a ilegitimidade passiva, nos termos do art. 33º CPC, referindo que, pretendendo a A. o reconhecimento como adquirente por usucapião do prédio ..., tenho o mesmo advindo da herança de ... e sua mulher, não estando junto aos autos qualquer documento matricial ou predial ou escritura do qual conste a mesma como proprietária desse prédio, a acção deveria ter sido intentada contra os demais herdeiros – irmãos dos AA. e descendentes – dos falecidos ... mulher, para se pronunciarem quanto à alegação da pretensa propriedade sobre tal prédio rústico. Também a A. pretende, por parte dos RR., o reconhecimento da existência de servidões de águas, de aqueduto, sobre os prédios indicados como pertencentes à A. e RR, tendo inclusive feito referência de que o art ... é da propriedade da irmã, sendo que o rego, passagem e servidões alegados pela mesma envolvem esse prédio rústico, o qual usufruirá (ou onera) quer do rego, água e passagens (servidões), segundo a versão dos factos apresentados pela A., pelo que a acção deveria ter sido também intentada contra a proprietária desse prédio rústico. No mais, impugnam os factos alegados pela A., não deixando, no entanto, de referir que se de facto existiu e existe uma barroca, distante do prédio da A., tais águas pertencem na totalidade a vários consortes que são proprietários de outros terrenos, que nada tem a ver com os referidos na petição, tendo cada uma deles os seus dias e horas próprios da água, sendo que se a A. pretende reivindicar água dessa barroca deveria ter intentado também a acção contra esses consortes, mais referindo que, de todo o modo, nem a A. nem os RR. têm utilizado a água da barroca, porque tais prédios rústicos têm sido regados com agua do poço que cada um deles possui.
O R. A... contestou, arguindo igualmente a ilegitimidade passiva nos termos do art. 33º CPC, referindo que é pai dos RR. ..., e viúvo da falecida ..., mãe daqueles, e que a acção deveria ter sido proposta contra a herança ilíquida indivisa aberta por óbito da referida ..., por ainda não terem sido efectuadas partilhas, alegando no mais, e ainda referentemente à excepção de ilegitimidade passiva, o mesmo que a R. H...
O R. B... contestou e arguiu a referida excepção nos mesmos termos que o R A...
A R. M... - cuja citação ocorreu bem mais tarde – contestou igualmente e, essencialmente nos mesmos termos que os anteriores RR, pondo apenas em destaque a circunstância de ter saído de Lamego com 18 anos, ter sido criada pela tia ..., e muitos dos factos não os conhecer pessoalmente mas por ouvir dizer.
Foi proferido despacho de aperfeiçoamento, sendo a A. convidada a concretizar alguns aspectos da matéria de facto, concretamente: de onde provém a propriedade dos prédios rústicos cuja propriedade pretende ver reconhecida; em que prédio, dos três referidos como pertencentes aos RR., nasce cada uma das nascentes em causa; proceder à individualização dos prédios que são onerados pela servidão de passagem para aproveitamento das águas da barroca e das nascentes e fazer intervir esses proprietários dos demais prédios onerados. A A. acolheu o convite, referindo que, conforme se depreende do doc 6 junto com a petição, é dona do prédio ...; o art ... é propriedade da R. H...; o prédio inscrito na matriz sob o art ... é propriedade de M... e é onde está aberto o caminho e o rego; os prédios inscritos sob os arts ... são propriedade do R A...; e que todos os prédios referidos integravam o acervo hereditário de ..., mais referindo que M... é viúva há mais de 50 anos, “e está sempre ao lado da A. na defesa dos direitos que a todos assiste, e que é o da utilização da água da ribeira ou linha de água e das duas nascentes – uma com mina – existentes nos prédios rústicos ...”.
Requerimento este a que a R. H.... contrapôs a necessidade, a que já se referira na contestação, da intervenção de todos os interessados na acção para que a decisão possa produzir o seu efeito normal, no mais impugnando os factos ali alegados, tendo a R. M... produzido resposta semelhante.
Foi proferido novo despacho convidando a A. para, no intuito de se conhecerem as características físicas dos prédios de que derivam as águas e a localização dos mecanismos de captação e derivação da água, juntar aos autos croqui/planta, fotografia a cores/aérea dos prédios em referência, aqui incluindo os prédios alegadamente beneficiários da dita água e da concreta passagem da mesma até ao prédio da A, devendo constar da referida planta, ainda que manual, as confrontações e localização dos prédios.
Não tendo sido satisfeito o convite, foi determinada a realização de uma verificação não judicial ao local em causa, a realizar por pessoa idónea, tendo por objecto a descrição das características físicas dos prédios em referência, localização das nascentes /minas de água, dos mecanismos de captação, derivação da água e da sua concreta passagem, identificando os prédios alegadamente onerados pela servidão de passagem invocada, por referência aos arts 6, 10, 16 a 22, 26 e 27 da petição, devendo...
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