Acórdão nº 126696/17.0YIPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | JAIME CARLOS FERREIRA |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I No Tribunal Judicial da Comarca de Leiria - Juízo Local Cível de Leiria - Juiz 1, corre termos a presente ação declarativa, com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, que a sociedade ‘A... Limited’, com sede em ..., Reino Unido, instaurou, através de requerimento inicial de injunção, contra J..., residente na Rua ..., peticionando a condenação do mesmo a pagar-lhe a quantia global de €9.206,36.
Alega, em síntese, que celebrou com a sociedade “C...” um contrato de cessão de créditos, na sequência do qual a “C...” cedeu o seu crédito sobre o Réu à autora; que a presente ação constitui o meio idóneo para dar conhecimento ao Réu da mencionada cessão de créditos; que por documento particular foi celebrado entre a C... e o ora Réu, em 10/01/2006, um contrato de abertura de crédito, ao qual foi atribuído o n.º ..., comprometendo-se o Réu a pagar prestações, mensais e sucessivas; que desde pelo menos 08.06.2007 o réu deixou de efectuar o pagamento daquelas prestações mensais, tendo ficado em dívida o montante de €4.073,61, acrescendo a essa quantia os juros de mora à taxa legal, contados desde 08.06.2007 até à data da propositura da presente ação, que somam €1.710,92; reclama ainda a quantia de €3.421,83, a título de cláusula penal, correspondente a 8% sobre a totalidade do saldo em dívida.
Que o montante global em dívida ascende a €9.206,36, cujo pagamento reclama do Réu, com o acréscimo de juros vincendos até efetivo pagamento.
II O Réu deduziu oposição, invocando, além do mais, o desconhecimento do sobredito contrato de abertura crédito, e a prescrição da dívida reclamada, nos termos do artº 310º, als. d) e e) do C. Civil.
Pede a sua absolvição do pedido.
III Na sequência de despacho proferido no Tribunal as partes foram notificadas para se pronunciarem sobre a verificação de um eventual erro na forma do processo, tendo tomado posição o réu, no sentido afirmativo, e a autora, em sentido negativo.
IV De seguida foi proferido despacho nos seguintes termos: ‘Cumpre apreciar e decidir.
A referência a este contrato de crédito no qual a autora, na qualidade de cessionária, não foi parte, demonstra que os créditos de que esta se arroga titular não emergem directamente do contrato por si invocado, celebrado com a cedente.
Pelo contrário, estamos perante obrigações pecuniárias decorrentes, não directamente do contrato celebrado entre a autora, na qualidade de cessionária, e a C..., na qualidade de cedente, mas da articulação desse contrato com o sobredito “contrato de crédito”, havido entre a cedente e o ora réu (devedor cedido). Quer dizer: o direito de crédito invocado pela autora emerge, não do contrato que originariamente o fez nascer (o contrato de crédito), mas de um segundo contrato, subsequente, surgindo agora como devedor – quanto ao crédito cedido - uma pessoa que é alheia a este segundo contrato, de cessão de créditos, operada entre a cedente (C...) e a cessionária (a ora autora).
Aliás, refira-se, ainda, que a própria cessão de créditos invocada pela autora não se mostra, por ora, apta a produzir efeitos, não sendo, por isso, geradora de obrigações para o réu.
Nos termos da lei, “a cessão produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada, ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite” – cf. CC, art.º 583º.
Verifica-se que a autora não só não fez prova da notificação da cessão de créditos ao réu, nem a presente acção constitui meio idóneo para dar conhecimento ao devedor da cessão de créditos em termos idênticos à notificação prevista no art.º 583º do Código Civil, uma vez que esta notificação, a que alude esta norma, constitui uma declaração receptícia, subordinando-se o início da produção dos efeitos do negócio jurídico ajuizado ao conhecimento efectivo do mesmo pelo devedor. Tal conduz à cisão entre dois momentos: um primeiro, em que se opera a notificação da cessão de créditos ao devedor; e um segundo, que se lhe seguirá, de reclamação dos mesmos pelo cessionário, o que apenas lhe é permitido quando a cessão se mostra válida e eficaz, porque é apenas nesse momento que nasce, na sua esfera jurídica, o direito de que vem arrogar-se titular e que pretende exercitar por via litigiosa, razão por que é de concluir que o próprio contrato de cessão de créditos invocado pela autora para...
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