Acórdão nº 6727/17.0T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução14 de Março de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório “X II, Indústria Têxtil, Lda” Intentou, no Juízo Local Cível de Vila Nova de Famalicão – Juiz 3 – do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, a presente acção declarativa de simples apreciação negativa, sob a forma de processo comum, contra “Instituto de Formação, Lda.”, pedindo que seja declarado que nada deve à R..

Para tanto, e em síntese, alegou que: Tendo acertado com a ré um contrato de prestação de serviços, destinado à elaboração da contabilidade organizada, o mesmo veio a findar, por sua (da autora) iniciativa, através de comunicação enviada no dia 11 de Abril de 2017.

Após ter tomado conhecimento desta cessação contratual e com o intuito de impedir a constituição de novo contabilista certificado, a ré vem invocando ser credora da quantia de 12.727,50 € e recusa-se a entregar à autora os elementos documentais que ainda mantém na sua posse em virtude da execução daquele contrato, razão pela qual invoca ter interesse em ver declarado nada dever à ré.

*Citada, a ré contestou e deduziu reconvenção, nos termos constantes de fls. 22 a 34, pedindo que a A. seja condenada a pagar-lhe a quantia de 14.095,50 €, acrescida dos respectivos juros vencidos e vincendos.

Invoca, em síntese, que o referido contrato de prestação de serviços, que se iniciou há vários anos e terminou em Setembro de 2017, tinha, num primeiro momento (até Dezembro de 2011), uma remuneração mensal acordada de 465,00€ e, numa segunda fase (de Janeiro de 2012 em diante), uma remuneração mensal de 232,50 €, correspondente a metade daquele valor, fixado temporariamente, face às dificuldades financeiras que a A. atravessava.

Mais refere que, naquele período temporal, a A. apenas lhe pagou a quantia de 5.872,50 €, mostrando-se ainda em dívida, até Abril de 2017, a título de honorários, o valor de 12.727,50 €.

Além disso, afirma a R. que, relativamente ao período situado entre Maio de 2017 a Setembro de 2017, durante o qual continuou a prestar serviços à A., encontram-se por pagar honorários no valor 670,50 €.

Reclama, por outro lado, o pagamento de uma indemnização de 697,50 €, equivalente às remunerações de Outubro a Dezembro de 2017, pelo facto de a autora ter procedido à revogação unilateral do contrato sem a antecedência conveniente.

*Replicou a autora, invocando a excepção de prescrição a que alude o art. 317.º, al. c), do CC e concluindo pela improcedência da reconvenção (cfr. fls. 65 a 68).

Mais alegou que os montantes que a ré refere já ter recebido equivalem aos valores que a própria ré fixou como remuneração dos serviços prestados, quantias que nesse mesmo pressuposto foram facturadas e pagas, razão pela qual impugnou o crédito invocado.

*Foi dispensada a audiência prévia.

*Proferiu-se despacho saneador, no qual se afirmou a validade e a regularidade da instância, com dispensa da fixação do objeto do litígio e dos temas da prova (fls. 74 e 75).

*Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento (cfr. acta de fls. 101, 102, 107, 108 e 120 a 122).

*Posteriormente, o Mm.º Julgador “a quo” proferiu sentença (cfr. fls. 123 a 135), nos termos da qual decidiu: - julgar a acção totalmente improcedente, absolvendo a R. do pedido formulado pela A..

- julgar a reconvenção parcialmente procedente e, consequentemente, condenou a autora/reconvinda a pagar à ré/reconvinte a quantia que se vier a apurar em posterior incidente de liquidação, de acordo com os parâmetros a seguir mencionados, sem nunca ultrapassar o valor peticionado de 14 095,50 €: 1.

A quantia a liquidar compreenderá as remunerações mensais devidas entre Maio de 2011 e Dezembro de 2017, cujo montante mensal individual deverá ser determinado por reporte aos critérios previstos no artigo 1158.º, n.º 2, do CC (tarifas profissionais; na ausência destas, usos; e, inexistindo aqueles ou estes, juízos de equidade); 2.

À quantia que se vier a apurar pelo modo referido em 1) deverá ser deduzido o valor já pago pela autora/reconvinda, no montante total de 6 364,50 €, e; 3. Ao montante apurado em resultado do referido em 1) e 2) acrescerão juros de mora, à taxa comercial, prevista no artigo 102.º §3, do Código Comercial, contados desde a data a fixar na decisão a proferir em posterior incidente de liquidação, até efectivo e integral pagamento.

*Inconformada, a autora interpôs recurso da sentença (cfr. fls. 136 a 158) e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem1): «1ª PELAS RAZÕES EXPOSTAS NO PONTO II.A.1. DO CORPO DESTAS ALEGAÇÕES DEVE A MATÉRIA DE FACTO SER ALTERADA E SER ACRESCENTADO UM PONTO ONDE SE CONSIDERE COMO PROVADO QUE “DO BALANCETE GERAL ANALÍTICO DA AUTORIA DA RÉ, EM NOVEMBRO DE 2016 A AUTORA NÃO ERA DEVEDORA DE QUALQUER QUANTIA À RÉ.” 2ª PELAS RAZÕES EXPOSTAS NO PONTO II.A.2.1. DO CORPO DESTAS ALEGAÇÕES DEVE A MATÉRIA DE FACTO SER ALTERADA E SER CONSIDERADO COMO PROVADO QUE: “É TAMBÉM FALSO QUE A AUTORA TENHA PROCEDIDO AO PAGAMENTO DA QUANTIA DE € 492,00 NO DIA 10/08/2017 POR CONTA DOS HONORÁRIOS DEVIDOS À RÉ,” 3ª PELAS RAZÕES EXPOSTAS NO PONTO II.A.2.2 DO CORPO DESTAS ALEGAÇÕES DEVE A MATÉRIA DE FACTO SER ALTERADA E SER CONSIDERADO COMO PROVADO QUE: “É QUE, CONFORME SE VERIFICA DO EMAIL JUNTO COMO DOCUMENTO N.º 1, TAL QUANTIA DESTINAVA-SE TAMBÉM AO PAGAMENTO DOS HONORÁRIOS PRESTADOS DE FORMA EXCEPCIONAL, DE TÉCNICO OFICIAL DE CONTAS DAS FIRMAS C., X, Y, LDA, E NO MONTANTE DE € 123,00 DE CADA UMA DELAS.” 4ª PELAS RAZÕES EXPOSTAS NO PONTO II.B.1. DO CORPO DESTAS ALEGAÇÕES DEVE A MATÉRIA DE FACTO PROVADA SER ALTERADA E SER CONSIDERADO COMO PROVADO APENAS QUE: “PARA PAGAMENTO DOS SERVIÇOS DE CONTABILIDADE ORGANIZADA, PRESTADOS ENTRE MAIO DE 2011 E ABRIL DE 2017, A AUTORA PAGOU À RÉ PELO MENOS A QUANTIA DE € 5.872,50.” 5ª PELAS RAZÕES EXPOSTAS NO PONTO II.B.2. DO CORPO DESTAS ALEGAÇÕES DEVE A MATÉRIA DE FACTO PROVADA SER ALTERADA E SER CONSIDERADO COMO PROVADO APENAS QUE: “PELO RECEBIMENTO DAQUELA QUANTIA REFERIDA EM 8), A RÉ INSTITUTO DE FORMAÇÃO, LDA, EMITIU AS FACTURAS NO VALOR EQUIVALENTE ÀQUELES MONTANTES.” 6ª PELAS RAZÕES EXPOSTAS NO PONTO II.C.1. DO CORPO DESTAS ALEGAÇÕES DEVE SER A MATÉRIA DE FACTO ALTERADA E SER CONSIDERADO COMO PROVADO QUE: “OS VALORES ENTREGUES PELA AUTORA À RÉ FORAM-NO PARA PAGAMENTO DO VALOR INTEGRAL DOS HONORÁRIOS À RÉ.” 7ª NO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS CELEBRADO ENTRE AUTORA E RÉ NÃO SE APLICA O REGIME LEGAL DO MANDATO, MAS SIM O REGIME QUE SE ENCONTRA PLASMADO NO DL 310/2009, DE 26 DE NOVEMBRO.

8ª DE ACORDO COM O ART.º 9º DO DL 310/2009, DE 26 DE NOVEMBRO O VALOR DOS HONORÁRIOS É FIXADO ENTRE AS PARTES.

9ª EXISTE ERRO DE JULGAMENTO “QUANDO O JUIZ SE PRONUNCIA SOBRE QUESTÕES QUE NENHUMA DAS PARTES SUSCITOU NO PROCESSO EXCEDENDO-SE O ÂMBITO DO CONFLITO NOS LIMITES POR ELE PEDIDOS.” 10ª AS PARTES ALEGARAM QUE OS HONORÁRIOS TINHAM SIDO ENTRE ELAS ACORDADOS, HAVENDO APENAS DISCORDÂNCIA QUANTO AO SEU VALOR.

11ª NAS ACÇÕES DE SIMPLES APRECIAÇÃO NEGATIVA CABE AO RÉU A PROVA DOS FACTOS ALEGADOS CNSTITUTIVOS DO DIREITO DE QUE SE ARROGA, O QUE A RÉ NÃO CUMPRIU NO CASO DOS AUTOS.

12ª UMA VEZ QUE DECORREU MAIS DE DOIS ANOS, DESDE QUE A RECORRIDA, INVOCA EM ABRIL DE 2017 CRÉDITOS ANTERIORES A ABRIL DE 2015, E A RECORRENTE ALEGA QUE SE ENCONTRA TUDO PAGO, TAIS CRÉDITOS ALEGADOS PELA RECORRIDA ESTÃO PRESCRITOS.

Assim, a sentença recorrida, por erro de interpretação e aplicação, violou, além do mais, o disposto nos art.ºs 317º, 343º, 405º, 1156º e 1158º todos do Código Civil, art.º 9º do DL 310/2009, de 26 de Novembro, pelo que, na procedência das anteriores conclusões, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra, que julgue a acção procedente e improcedente a reconvenção, com as legais consequências.

ASSIM se decidirá conforme o Direito aplicável e se fará JUSTIÇA.

»*Contra-alega a R./recorrida, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção da sentença recorrida (cfr. fls. 159 a 167).

*O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 169).

*Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II. Questões a decidir.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso e não tenham sido ainda conhecidas com trânsito em julgado [cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho].

No caso, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber: 1.ª – Da nulidade da sentença recorrida; 2ª – Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto; 3ª – Da errada aplicação do regime do mandato; 4ª – Da inobservância do cumprimento do ónus da prova no âmbito da ação de simples apreciação negativa.

5ª – Da prescrição presuntiva.

*III.

Fundamentos I. Fundamentação de Facto.

  1. A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: 1.

A autora X II, LD.ª é uma sociedade comercial por quotas, com escopo lucrativo, que se dedica à indústria de tecelagem e acabamento de tecidos; 2. A ré INSTITUTO DE FORMAÇÃO, LD.ª tem por objecto o ensino para adultos e outras actividades educativas, explorando ainda, com escopo lucrativo, a prestação de serviços de contabilidade; 3. A autora X II, LD.ª foi constituída em 17-4-2002, ficando estipulado que para obrigar a sociedade seria necessária a intervenção de dois gerentes.

  1. Por acordo verbal ocorrido em data não concretamente apurada, mas no ano de 2005, após a constituição da R., estabelecido entre os legais representantes da autora X II, LDA.” e da ré INSTITUTO DE FORMAÇÃO, LD.ª, esta obrigou-se, a partir dessa data, a prestar àquela os serviços de contabilizada organizada, inerente à sua actividade comercial; 5. Mediante o pagamento de uma contrapartida mensal...

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