Acórdão nº 404/17.0T8VCT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Fevereiro de 2019
Magistrado Responsável | NUNO PINTO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 21 de Fevereiro de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO 1.
Condomínio do ......... representado pela administradora “AA – Contabilidade e Administração de Condomínios, Lda.”, deduziu acção declarativa contra “BB, Lda.” pedindo: — “que a ré seja condenada a pagar ao Condomínio autor o valor correspondente ao custo da eliminação dos defeitos indicados mediante a colocação, em toda a fachada, de nova tijoleira com cola adequada e prévio tratamento da fachada, custo que orça a quantia total de € 36.237,50 (trinta e seis mil duzentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos) acrescidos dos juros de mora vincendos calculados a taxa legal desde a citação da presente ação até integral e efetivo pagamento”; — “subsidiariamente, se assim não se entender, deve a ré ser condenada a suportar todos os custos inerentes a eliminação dos defeitos indicados a realizar por terceiro escolhido pelo autor, pagando imediatamente após o trânsito em julgado da decisão, de forma antecipada a quantia de € 36.237,50 (trinta e seis mil duzentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos), sem prejuízo de se vir a apurar custo superior a liquidar em execução de sentença”; — “subsidiariamente caso também assim não se entenda ser a ré condenada a proceder a eliminação dos defeitos mediante a colocação, em toda a fachada, de nova tijoleira com cola adequada e prévio tratamento da fachada, fixando-se prazo nunca superior a quatro meses para o efeito”; — “finalmente, caso também assim não se entenda, ser a ré condenada a proceder a eliminação dos defeitos com todos os custos inerentes a seu cargo fixando-se prazo nunca superior a quatro meses para o efeito”; — “em qualquer dos casos ser a ré condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória nunca inferior a € 50,00 por cada dia de atraso no pagamento ou execução da obra de eliminação dos defeitos”. A Ré contestou, excepcionando a caducidade do direito do Autor, e impugnou os factos alegados por aquele.
Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou procedente a excepção de caducidade, absolvendo a Ré do pedido.
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O Autor interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes conclusões: “A. — O presente recurso abrange quer a matéria de facto, quer a fundamentação jurídica.
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— Quanto aos factos dados como provados, o recorrente descorda da redacção dada ao ponto n.º 7, dos factos provados.
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— Isto porque tal redacção não está em consonância com a motivação da decisão, nem com a prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.
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— Na verdade, tanto o depoimento da testemunha CC sócio da ré / recorrida, como a motivação da douta sentença recorrida referem que a recorrida recolocou por duas vezes a tijoleira da fachada do prédio, sendo a primeira vez um ano e tal após a conclusão da obra e a segunda dois-três meses após esta.
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— Ora, o facto provado n.º 7 refere-se a uma só reparação e a alguns meses após a conclusão da obra.
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— Pelo que, fundamentando-se o facto provado número 7 nesse depoimento, a redação desse facto deveria ser a seguinte: "Algumas peças de tijoleira que revestiam as fachadas do edifício descolaram-se e caíram, um ano e tal após a conclusão da obra, tendo a ré, se deslocado ao local e recolocado as peças de tijoleira no local onde as mesmas caíram, o que voltou a fazer passados dois- três meses sobre essa reparação por terem caído entretanto tijoleira." G. — A recorrente igualmente entende que os factos não provados sob as alíneas A), B), C), F), G), H), I) e J), deveriam ter sido incluídos na listagem dos factos provados.
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— Com efeito, da motivação constante da douta sentença recorrida consta que todas as testemunhas alegaram que após a conclusão da obra, a recorrida, por diversas vezes, reparou os defeitos do prédio, recolocando a tijoleira caída da fachada.
I. — Mais precisamente, alega a douta sentença recorrida, na parte da motivação, que as testemunhas DD e EE referiram que a última reparação ocorreu em inícios de 2016, que a testemunha FF referiu que há mais de 3 anos que não via o representante legal da recorrida no prédio e que a testemunha GG referiu que a recorrida fez umas 4 ou 5 intervenções na fachada sendo a ultima de que se recorda em 2014/2015.
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— E de facto tal fundamentação está em consonância com a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento na medida em que as referidas testemunhas referiram-se todas a diversas deslocações ao local por parte da recorrida para recolocar tijoleira.
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— No entanto e contrariando esses depoimentos e inclusive a própria fundamentação tal facto foi considerado não provado.
L . — O que está errado devendo consequentemente os factos não provados sob as alíneas A), B), C), F), G), H), I) e J) serem considerados provados.
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— A recorrente discorda ainda que os factos não provados sob as alíneas O), P), Q) e R), não tenham sido incluídos na listagem dos factos provados.
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— Isto porque é a própria recorrida quem, em sede de contestação nos seus artigos 3º, 5º, 7º e 10º, aceita tais factos, pelo que os mesmos deveriam ter sido considerados como provados por acordo.
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— Na verdade, em sede de contestação, a recorrida afirma que (o prédio) "não têm consistência para que os materiais aplicados adiram, nomeadamente a cola" (artigo 3º da contestação), que os "defeitos da obra são perfeitamente visíveis por observação à vista desarmada", (artigo 5º da contestação), que colocou "materiais iguais aos originariamente colocados, mesmo lote e marca, designadamente tijoleira, sem colocação de massas", (artigo 7º da contestação) para finalmente confessar que "a cola não aderiu e a tijoleira caiu" (artigo 10º da contestação).
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— Para além dessa confissão expressa foi junto aos autos um parecer técnico elaborado pela testemunha Engº HH que afasta a hipótese da causa da queda da tijoleira ser de origem estrutural, afirmando outrossim que a queda se deveu a falta de aderência da cola à cerâmica.
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— Causa da queda - falta de aderência da cola - que a recorrida confirma no artigo 10º da sua contestação.
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— Contudo o Tribunal a quo não valorou o depoimento dessa testemunha em virtude do método empregue ter sido uma simples visualização ao local.
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— Ora, em sede de contestação a recorrida igualmente confirma que os defeitos são visíveis "por observação à vista desarmada".
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— Pelo que se a recorrida aceita — e é ela que tem interesse na causa ¬que os defeitos sejam constatáveis a "vista desarmada", o Tribunal a quo deveria ter valorado o parecer e consequente depoimento da referida testemunha Engº HH em virtude do método utilizado - inspecção visual ao local - se mostrar suficiente e adequado para as exigências que o caso requer.
U. — Pelo que conjugados a confissão da recorrida em sede de contestação, o parecer técnico junto aos autos e o depoimento da testemunha Engº HH, deveriam os factos não provados das alíneas O), P), Q) e R) terem sido considerados provados.
V. — Aqui chegados facilmente se conclui que a douta sentença recorrida errou ao concluir pela caducidade do direito a ação na medida em que o regime específico dos prazos de caducidade previstos no Código Civil e na Directiva 1999/44/CE, de 25-5-99, aplicável ao caso por se tratar de uma relação de consumo entre um profissional da construção civil (recorrida) e o recorrente, estes na sua qualidade de consumidor - é afastado nos casos como o dos autos em que a recorrida reconheceu expressamente os defeitos e inclusive, por diversas vezes, procedeu a tentativas para a sua eliminação.
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— É pois impeditivo da caducidade o reconhecimento do direito pela contraparte perante o respectivo titular, nos termos do artigo 331 º, n.º 2, do CC, por aplicação do instituto do abuso de direito, na modalidade do venire contra factum proprium,.
X. — Sendo igualmente entendimento corrente que, uma vez impedida a caducidade do direito de reparação dos defeitos por via daquele reconhecimento, deixa de correr qualquer prazo de caducidade, passando a situação a ser regulada pelas regras da prescrição.
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— Errou assim a douta sentença recorrida ao julgar procedente a exceção peremptória da caducidade na medida em que esta não se verificou no caso concreto.
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— Como tal, deverá a douta sentença recorrida ser substituída por outra que julgue totalmente procedente a ação e condene a recorrida nos pedidos formulados em sede de PI, mormente no pagamento do custo necessário a eliminação desses defeitos.
TERMOS EM QE, concedendo-se provimento ao presente recurso, deve revogar-se a douta sentença recorrida e substitui-la por outra que condene a recorrida nos pedidos formulados em sede de petição inicial”.
A Ré contra-alegou pugnando pela manutenção da sentença recorrida.
O recurso foi admitido como de apelação com efeito meramente devolutivo.
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O Tribunal da Relação de Guimarães alterou a decisão da matéria de facto e julgou procedente a apelação, revogando a sentença recorrida e condenando a Ré a proceder à eliminação dos defeitos existentes nas fachadas do prédio identificado no ponto n.º 1 da matéria de facto e relativos à colocação de tijoleira nas mesmas fachadas, no prazo de quatro meses a contar do trânsito em julgado.
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A Ré interpôs recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão proferido pela Relação de Guimarães está ferido das nulidades previstas nas alíneas d) e e), do n.º 1, do art. 615.º do CPC.
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O acórdão ora impugnado supõe, erroneamente, estarem verificados os prazos de denúncia e de instauração da acção competente a exigir a eliminação dos defeitos de obra.
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Não existe matéria de facto provada suficiente que conduzisse à decisão proferida.
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A alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando este Tribunal, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência...
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