Acórdão nº 387/15.0GACDV.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | MAIA COSTA |
Data da Resolução | 28 de Novembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório Por acórdão de 4.12.2017 do Juízo Central Criminal de Loures, da Comarca de Lisboa Norte, deliberou-se o seguinte: Quanto ao arguido AA: 1. Absolvê-lo da prática de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do Código Penal - CP (NUIPCs 10/16.6GBALQ e 239/16.7GDTVD); 2. Condená-lo pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPC 468/15.0GALNH), na pena de 4 anos e 6 meses de prisão; 3. Absolvê-lo da prática de sete crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 368/15.4GALNH, 387/15.0GACDV, 382/15.0GACDV, 20/16.3GACDV, 69/16.6GACDV, 19/16.0GACDV e 81/16.5GACDV); 4. Condená-lo pela prática de cinco crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e), e 3, do CP (NUIPCs 368/15.4GALNH, 387/15.0GACDV, 20/16.3GACDV, 19/16.0GACDV e 81/16.5GACDV), na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, por cada um dos crimes; 5. Condená-lo pela prática de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, a) e e), e 3, do CP (NUIPCs 382/15.0GACDV e 69/16.6GACDV), na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, por cada um dos crimes; 6. Condená-lo pela prática de onze crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 120/16.0GABBR, 115/16.3GABBR, 239/16.7GDTVD, 120/16.0GCCLD, 171/16.4GCCLD, 157/16.9GCCLD, 164/16.1GCCLD, 8/16.4GBALQ, 269/16.9GALNH, 284/16.2GCTVD e 248/16.6 GDTVD), na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, por cada um dos crimes; 7. Condená-lo pela prática de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPC 253/16.2GBCLD), na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, por cada um dos crimes, absolvendo-o da prática dos restantes três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP, que no âmbito do mesmo processo lhe foram imputados; 8. Condená-lo pela prática de cinco crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, c) e h), e 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 243/16.5GCTVD, 244/16.3GCTVD, 118/16.8GABBR, 103/16.0GAPNI, 136/16.6GAACB), na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, por cada um dos crimes; 9. Condená-lo pela prática de um crime de dano simples, p. e p. pelo art. 212º, nº 1, do CP (NUIPC 212/16.5GACDV), na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; 10. Condená-lo pela prática de nove crimes de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nºs 1 e 2 do Decreto-Lei nº 2/98, de 2-1, na pena de 1 ano de prisão por cada um dos crimes; 11. Condená-lo pela prática de um crime de detenção de arma proibida (bastão), p. e p. pelos arts. 3º, nº 2, g) e 86º, nº 1, d), da Lei 5/2006, de 23-2, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; 12. Operado o cúmulo jurídico das penas parcelares de prisão, foi o arguido condenado na pena única de 13 anos e 8 meses de prisão.
Quanto à arguida BB: 1. Condená-la pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPC 468/15.0GALNH), na pena de 3 anos e 9 meses de prisão; 2. Absolvê-la da prática de 5 crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 368/15.4GALNH, 387/15.0GACDV, 20/16.3GACDV, 19/16.0GACDV, 81/16.5GACDV); 3. Condená-la pela prática de cinco crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e), e 3, do CP (NUIPCs 368/15.4GALNH, 387/15.0GACDV), 20/16.3GACDV, 19/16.0GACDV e 81/16.5GACDV), na pena de 3 anos e 9 meses de prisão, por cada um dos crimes; 4. Absolvê-la da prática de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, b) e e), e 3, do CP (NUIPCs 382/15.0GACDV e 69/16.6GACDV); 5. Condená-la pela prática de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, a) e e), e 3, do CP (NUIPCs 382/15.0GACDV e 69/16.6GACDV), na pena de 3 anos e 9 meses de prisão, por cada um dos crimes; 6. Absolvê-la da prática de catorze crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 10/16.6GBALº 120/16.0GABBR, 115/16.3GABBR, 239/16.7GDTVD, 120/16.0GCCLD, 171/16.4GCCLD, 157/16.9GCCLD, 164/16.1GCCLD, 8/16.4GBALQ, 269/16.9GALNH, 284/16.2GCTVD e 248/16.6GDTVD); 7. Condená-la pela prática de catorze crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 10/16.6GBALQ, 120/16.0GABBR, 115/16.3GABBR, 239/16.7GDTVD, 120/16.0GCCLD, 171/16.4GCCLD, 157/16.9GCCLD, 164/16.1GCCLD, 8/16.4GBALQ, 269/16.9GALNH, 284/16.2GCTVD e 248/16.6GDTVD), na pena de 3 anos e 9 meses de prisão, por cada um dos crimes; 8. Absolvê-la da prática de cinco crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPC 253/16.2GBCLD); 9. Condená-la pela prática de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPC 253/16.2GBCLD), na pena de 3 anos e 9 meses de prisão, por cada um dos crimes; 10. Absolvê-la da prática de cinco crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, c) e h), e 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 243/16.5GCTVD, 244/16.3GCTVD, 118/16.8GABBR, 103/16.0GAPNI, 136/16.6GAACB); 11. Condená-la pela prática de cinco crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, nºs 1, c) e h), 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPCs 243/16.5GCTVD, 244/16.3GCTVD, 118/16.8GABBR, 103/16.0GAPNI, 136/16.6GAACB), na pena de 3 anos e 3 meses de prisão, por cada um dos crimes; 12. Operado o cúmulo jurídico das penas parcelares de prisão, foi a arguida condenada na pena única de 10 anos de prisão.
[1] Deste acórdão recorreram os arguidos, de facto e de direito, para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 30.5.2018, decidiu: 1º - Alterar a decisão da matéria de facto constante do acórdão da 1ª instância, de forma que os factos constantes dos pontos 62, 83 a 90 e 94 a 99 foram retirados dos factos provados e incluídos nos factos não provados; 2º - Absolver o arguido AA de dois crimes de furto qualificado dos artigos 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g) e 3, do CP, referentes aos NUIPCs 120/16GCCLD e 171/16.4GCCLD; 3º - Absolver a arguida BB de um crime de furto qualificado dos artigos 203º, 204º nºs 1, h) e 2, e) e g), e 3, do CP (NUIPC 120/16GCCLD) e de dois crimes de furto qualificado dos arts. 203º e 204º, nºs 1, h), 2, e) e g), e 3, referentes aos NUIPCs 239/16.7GDTVD (2ª ocorrência) e 171/16.4GCCLD; 3º - Condenar o arguido AA na pena única de 12 anos de prisão; 4º - Condenar a arguida BB na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.
[2] Deste acórdão recorreram os arguidos para este Supremo Tribunal de Justiça.
Alega o arguido AA: 1. O princípio da presunção da inocência é antes de mais um princípio natural, lógico, de prova.
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Todo o processo nasce a partir de uma dúvida e dados os limites do conhecimento humano, sucede frequentemente que a dúvida permanece a final, malgrado o esforço para a superar.
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Neste caso, o princípio da presunção da inocência imporá a absolvição, já que, sendo a condenação penal e a pena um castigo destinado a resgatar a culpa e a ressocializar o delinquente, é inaceitável que seja condenado sem que haja a certeza moral da culpabilidade a redimir.
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A livre valoração da prova pelo tribunal não pode ser entendida como uma operação puramente subjectiva pela qual se chega a uma conclusão unicamente por meio de conjecturas de difícil ou impossível objectivação.
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Deve, tratar-se, ao invés, de uma valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objectivar a apreciação, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão.
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A apreciação global da prova que se mostra transcrita e que pode ser confirmada mediante audição da prova gravada, permite-nos pôr em crise a factualidade tida por assente pelo tribunal a quo e demonstrar que existe um non liquet na questão da prova.
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O tribunal a quo inverteu o ónus da prova, ao considerar que todos os objectos furtados encontrados na bancada da feira e na residência dos arguidos eram resultado do cometimento pelos próprios dos crimes de furto.
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Não existem no processo quaisquer elementos de prova que demonstrem tal facto.
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O tribunal a quo ignorou, por completo, o depoimento do co-arguido CC na matéria em que seria favorável ao co-arguido AA, pese embora tenha considerado que o mesmo demonstrou isenção e rigor no depoimento e na descrição dos factos que presenciou e cometeu em co-autoria com este último.
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A situação de non liquet surgiu na audiência de julgamento.
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De facto, a conclusão de que o arguido foi o autor material e singular dos crimes de furto qualificado referentes aos NUIPC 387/15.0GACDV, 382/15.0GACDV, 20/16.3GACDV, 69/16.6GACDV, 19/16.0GACDV e 81/16.5GACDV não se baseia em qualquer elemento de prova constante nos autos.
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O tribunal a quo, confrontado com a dúvida sobre a autoria dos furtos - esta dúvida existiu, assumiu uma posição arbitrária e discricionária, concluindo que a mesma era do recorrente, apenas porque o seu depoimento não foi convincente e que já tinha sido condenado, por diversas vezes.
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Verifica-se aqui uma situação em que o tribunal, confrontado com a dúvida, não valorou a prova a favor do arguido, condenando-o e violando o princípio in dubio pro reo.
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É notório que o tribunal não decidiu com a firme certeza que a lei lhe exige.
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Ora, quando a prova produzida, depois de avaliada segundo as regras de experiência e a liberdade de apreciação da prova, conduziu à subsistência no espírito do tribunal de uma dúvida positiva sobre a existência ou inexistência do facto, impõe-se ao tribunal que aplique o princípio in dubio pro reo, corolário do princípio...
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