Acórdão nº 18595/12.4T2SNT-A.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Fevereiro de 2019
Magistrado Responsável | ILÍDIO SACARRÃO MARTINS |
Data da Resolução | 28 de Fevereiro de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - RELATÓRIO O Ministério Público instaurou em 09/07/2014 os presentes autos de promoção e protecção relativamente aos menores AA, nascida em 09 de Julho de 2003, e BB, nascido em 1 de Janeiro de 2007, filhos de CC e de DD, à data acolhidos no Centro de Acolhimento Temporário …, …, …, …, por deliberação da CPCJ de ….
Aberta a instrução, por decisão datada de 18/07/2014, foi aplicada às crianças a medida de acolhimento em instituição, a título provisório, pelo prazo de seis meses, posteriormente prorrogada por mais 6 meses, 3 meses, 6 meses e 6 meses, respectivamente (despachos de fls. 424, 490, 658 e738).
Foram juntos relatórios e informações elaborados pela Segurança Social-EMAT e pela instituição de acolhimento.
Posteriormente o MP requereu a substituição da medida de acolhimento pela medida de confiança a instituição com vista a futura adopção.
O processo prosseguiu com o cumprimento do disposto no art. 114º nº 2 da LPCJP, atenta a impossibilidade de obtenção de uma decisão negociada.
Os progenitores apresentaram alegações separadamente a fls. 788 a 793 (mãe) e a fls. 813 a 815 (pai) pugnando pela entrega dos menores aos seus cuidados, respectivamente.
O Ministério Público (fls 798 a 810) pugnou de novo pela aplicação da medida de confiança a instituição com vista a futura adopção.
Realizado o debate judicial com a intervenção de juízes sociais, pelo acórdão de 12.03.2018 (volume II fls. 858/897), foi aplicada às crianças a medida de promoção e protecção de confiança a instituição com vista a futura adopção ou a família de acolhimento ou a pessoa seleccionada para a adopção, ao abrigo do disposto no artº 35° n° 1 alínea g) da LPCJP e, em decorrência do disposto no artº 1978°-A do C. Civil, os progenitores ficaram inibidos do poder paternal da criança, tendo ainda sido proibidas as visitas dos familiares.
A mãe das crianças interpôs recurso de apelação e a Relação, por acórdão de 18.09.2018 (fls 984 a 1002), decidiu nos seguintes termos: 1. Julgou a apelação parcialmente procedente, revogando o acórdão proferido em 1ª instância relativamente à jovem AA, aplicando a esta a medida de promoção e protecção de acolhimento residencial até à maioridade, nos termos dos arts 35° n° 1, f), da LPCJP, mantendo-se sob a guarda do Centro de Acolhimento Temporário …, sem prejuízo de uma futura revisão dessa medida.
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Mais determinou a proibição das visitas dos progenitores e demais familiares à jovem AA, as quais apenas poderão ser reatadas nos termos sobreditos, caso a jovem manifeste expressamente perante os técnicos a vontade da ocorrência das visitas, em horário a determinar pela instituição de acolhimento.
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No demais, confirmou o acórdão recorrido no que toca à criança BB.
A mãe dos menores CC interpôs recurso de revista excepcional, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1ª - Por acórdão datado de 12 de Março de 2018 proferido pelo Juízo de Família e Menores de …, Juiz 3, foi decidido aplicar no superior interesse dos menores AA e BB a medida de promoção e protecção de "confiança a instituição com vista a futura adopção ou a família de acolhimento ou a pessoa seleccionada para a adopção", nos termos dos artigos 3º, nºs 1 e 2, alíneas c) e f), 35º, nº 1, alínea g), 38º e 38-A, alíneas a) e b) da LPCIP - Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei nº 147/99, de 01/09) e artigo 1978º, nº 1, alíneas d) e e) do Código Civil.
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- Não se conformando, a progenitora recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 18 de Setembro de 2018, julgou a apelação parcialmente procedente, revogando o acórdão proferido em 1ª instância relativamente à menor AA e confirmou o acórdão de 1ª instância quanto ao menor BB.
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- A decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa é ilegal e de manifesta injustiça, ao aplicar a favor dos menores medidas de promoção e protecção diferentes, promove a separação dos irmãos, uma vez que ao menor BB foi aplicada a medida de promoção de confiança à instituição com vista à sua futura adopção, enquanto a sua irmã se manterá na instituição até à sua maioridade, podendo esta, caso assim manifeste expressamente, receber visitas dos progenitores, o que já não será permitido ao seu irmão, tal como não respeitou os princípios aplicáveis de proporcionalidade e necessidade e ainda de actualidade e da adequação, nem tampouco respeitou, como devia, os interesses dos menores.
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- A recorrente discorda assim, do decidido, no exclusivo interesse dos menores, por se entender que as medidas em causa afiguram-se contrárias, não acautelam, nem seguem os seus superiores interesses, infligindo nos menores profunda dor e sofrimento.
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- O processo de promoção e protecção visa a protecção e a manutenção da família biológica, no seguimento das prioridades estabelecidas pela Convenção Europeia dos Direitos e Liberdades Fundamentais, devendo a intervenção ser orientada de modo a que os pais assumam os seus deveres para com a criança devendo-se sempre e em primeira linha dar prevalência à família biológica através de medidas que integrem as crianças ou jovens na sua família biológica.
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- Não obstante o previsto no artigo 988°, n° 2 do Código de Processo Civil, in casu é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, porquanto o presente recurso debruçar-se-á na aplicação da lei estrita, uma vez que entende a recorrente que a decisão que ora se recorre violou critérios de legalidade.
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- Tratando-se de pressupostos legais imperativamente fixados para que o juiz possa ponderar da conveniência e da oportunidade de decretar a medida que lhe foi requerida, cabe no âmbito dos poderes do Supremo Tribunal de Justiça e, portanto, deste recurso, a apreciação da respectiva verificação, razão pela qual e admissível o presente recurso, o qual é excepcional, encontrando acolhimento na alínea a) e b) do n.9 1, do artigo 672° do Código de Processo Civil, conforme de seguida se fundamenta.
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- Face a dupla conformidade de decisões, o recurso fica, em regra, vedado, salvo se o requerente da impugnação demonstrar, com êxito, concorrer alguma das três excepções ou pressupostos acolhidos pelas alíneas a), b) e c) do n° 1 do artº 672°, in casu a progenitora recorre nos termos do disposto das alíneas a) e b) - relevância jurídica e social, respectivamente.
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- A medida de confiança a instituição com vista a futura adopção é sem sombra de dúvida uma questão que muito tem movimentado a doutrina e jurisprudência, e consequentemente tem gerado divergência de posições.
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- Trata-se de uma questão com contornos polémicos, difíceis e susceptíveis de interpretações tão divergentes que permitem considerá-la tão relevante que torna necessária uma intervenção deste Supremo Tribunal, para uma melhor aplicação do direito.
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- No que concerne à determinação dos interesses de particular relevância social, alínea b) vem sendo jurisprudência da mesma formação, preencher-se o requisito quando a questão suscitada tenha repercussão fora dos limites da causa por estar "relacionada com valores sócio-económicos importantes e exista o risco, por isso, de fazer perigar a eficácia do direito ou de se duvidar da capacidade das instâncias jurisdicionais para garantir a sua afirmação", em suma, quando estejam em causa interesses que assumam importância na estrutura e relacionamento social, podendo interferir, designadamente, com a tranquilidade e segurança relacionadas com o crédito das instituições e a aplicação do direito, ou ainda quando se trate de questão susceptível de afectar um número de pessoas, quanto à segurança jurídica do seu relacionamento com as instituições, havendo um interesse que ultrapasse significativamente os limites do caso concreto (Acs. de 02/9/2014, Procºs nºs 39:L/08.5TBVPA.P1.S1; 10731/10.1TBVNG.P2.S1).
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- A medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, além de se considerar uma temática bastante discutida na doutrina e na jurisprudência e com posições antagónicas, trata-se, igualmente, de uma questão que poderá interferir com a tranquilidade, a segurança ou a paz social, em termos de haver a possibilidade de descredibilizar as instituições ou o direito.
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- Tratam-se de situações em que, nomeadamente, fique posta em causa a eficácia do direito e a sua credibilidade por se tratar de casos em que há um invulgar impacto na situação da vida que a norma ou normas jurídicas em apreço visem regular, ou em que exista um interesse comunitário que, pela sua particular importância, pudesse levar, por si só, à admissão da revista por os interesses em jogo ultrapassarem significativamente os limites do caso concreto.
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- Não obstante o Tribunal da Relação haver confirmado a decisão da 1ª Instância sem voto de vencido, quanto ao menor BB, a questão equacionada nestes autos possui enorme relevância jurídica, que justifica, face à ausência de jurisprudência inequívoca sobre a matéria, e para uma melhor aplicação do direito, a necessidade da sua apreciação em sede de revista excepcional, nos termos da alínea a) do n° 2 do artigo 672° do Código de Processo Civil.
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- Estão também manifestamente em causa interesses de particular relevância social, que igualmente exigem definição através de pronúncia desse Colendo Tribunal, nos termos da alínea b) daquela disposição legal.
I6ª - Ora, não tendo o Tribunal da Relação pronunciado, como devia sobre uma questão levantada na respectiva alegação de recurso (a de que durante 4 anos e meio os serviços sociais pouco ou nada fizeram para dotar a mãe de competências parentais para receber os seus filhos de volta, através de programa próprio para este tipo de situação - CAFAP) e, aliás, expressamente referida nas conclusões que balizavam o objecto da apelação, assim cometendo a nulidade prevista na alínea d) do n° 1 do artigo 615° do CPC.
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- A questão essencial suscitada pela recorrente prende-se com o facto de considerar que desde a institucionalização em 2013, os serviços do Estado pouco ou nada fizeram para preparar...
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