Acórdão nº 18/08.5BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução14 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 30 de junho de 2017, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, constante de fls. 129 a 138 verso dos autos do presente processo que julgou procedente a oposição intentada pela Recorrida, I..., no âmbito do processo de execução fiscal nº 34332001... e apensos, inicialmente instaurada pelo Serviço de Finanças de Cascais 2, contra a sociedade “CAFÉ S..., LDA”, e contra si revertida, para a cobrança coerciva de dívidas de contribuições à Segurança Social referentes aos anos de 1995 a 1998, no montante total de €10.454,67.

A Recorrente, a fls. 153 a 164 dos autos, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “ I - Vem o presente recurso reagir contra a Sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo nos presentes autos em 30-06-2017, a qual julgou procedente a Oposição à Execução Fiscal n.º 34332001..., por ter considerado a Oponente parte ilegítima na execução, em virtude de não se ter provado que a mesma exerceu efectivamente a gerência da sociedade “CAFÉ S..., LDA”, no período de pagamento das dívidas em cobrança naqueles autos executivos.

II - Estando em causa reversão operada nos termos do n.º 1 do artigo 13.º do anterior CPT, sabemos, por um lado, que é o exercício efectivo da gerência que permite vislumbrar que determinado agente actuou como órgão decisivo da sociedade devedora originária e, por outro, que o respectivo ónus da prova compete à Administração Fiscal, cfr. acórdão TCA SUL de 31/10/2013, proc. n.º 06732/13.

III - Contrariamente ao que foi postulado pelo Douto Tribunal a quo, perscrutado todo o acervo documental junto aos autos, do mesmo emergem elementos probatórios reveladores de que a Oponente praticou actos que consubstanciam o exercício efectivo da gerência da sociedade devedora originária no período em apreço.

IV - Na realidade, o que é determinante para apurar do exercício da gerência é averiguar se os actos praticados se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros, ou seja, se são praticados actos através dos quais a sociedade fica juridicamente vinculada perante terceiros.

V - O mesmo é dizer que a Oponente, ao proceder à assinatura de documentos inerentes à sociedade devedora originária, encontra-se a praticar um acto que exterioriza a vontade desta, vinculando-a e representando-a perante terceiros, o que, por si só, consubstancia o exercício efectivo da gerência, nos termos e para os efeitos do n.º 4 do artigo 260.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

VI - Nos presentes autos, resultou provado que a Oponente procedeu à assinatura da declaração modelo 22 de IRC referente ao exercício de 2003 da sociedade devedora originária e que apôs a sua assinatura na declaração de inscrição no registo em sede de IRC e de reinício de actividade em sede de IVA da sociedade originária executada.

VII - Contrariamente ao que foi decidido pelo Douto Tribunal a quo, também deveria ter resultado provado que a Oponente representou e exteriorizou a vontade da sociedade devedora originária através da apresentação do requerimento de regularização de dívidas daquela sociedade ao abrigo do Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de Agosto, bem como deveria ter constado da matéria factual provada a responsabilidade da Oponente pela assinatura das declarações periódicas de IVA relativas à sociedade devedora originária.

VIII - Através da análise de tais documentos, cujo teor e veracidade nunca foram impugnados, não se pode concluir que a Oponente apenas detinha uma mera designação formal para o cargo e que nada sabia e não intervinha em nome da sociedade devedora originária, antes pelo contrário, desempenhava um importante papel e que a sua vontade era determinante para os destinos da sociedade devedora originária, o que se coaduna, integralmente, com o exercício da gerência de facto.

IX - Note-se, de igual modo, que ainda que não seja possível partir-se do pressuposto de que quem figura como gerente de direito se presume como tendo exercido, efectivamente, essas funções, sempre é possível ao Tribunal, em face das regras da experiência, entender que existe uma forte probabilidade desse exercício por parte da Oponente possa ter acontecido, cfr. acórdão do STA de 10-12-2008, proc. n.º 861/08.

X - Dos presentes autos também resultou provado que, na escritura de “Reforço de capital e alteração parcial do pacto” da sociedade devedora originária, se fez constar, expressamente, que a sociedade se obrigava mediante a assinatura da Oponente, cfr. parágrafo 3 dos factos provados e, portanto, tendo em conta esta forma de obrigar a sociedade, ou seja, tendo em consideração que a sua assinatura obrigava a mesma, será legítimo presumir (presunção judicial baseada nas regras da experiência – artigo 35.º do CC), o exercício efectivo e continuado dos poderes de administração e representação de que era titular face à mesma sociedade, cfr. no Acórdão do TCA Sul de 06/10/2009, processo 03336/09 e acórdão do TCA Sul 09-10-2007, processo n.º 01953/07.

XI - E não se refira, tal como faz a Sentença recorrida, que “…a qualificação de determinada pessoa como gerente de uma sociedade comercial não se basta com a prática de actos isolados”, uma vez que verdadeiramente preponderante para verificação do exercício efectivo do cargo é que o sujeito tome decisões, vincule e exteriorize a vontade da sociedade devedora originária, através da prática de actos ou negócios jurídicos.

XII - “Tal como vem sendo jurisprudencialmente entendido, a lei não exige que os gerentes, para que sejam responsabilizados pelas dívidas da sociedade, exerçam uma administração continuada, apenas exigindo que eles pratiquem actos vinculativos da sociedade, exercitando desse modo a gerência de facto. O legislador limita-se, na instituição da obrigação de responsabilidade, a relevar apenas o cargo de gerente, sem entrar em linha de conta se este abarca a totalidade da capacidade jurídica da sociedade ou apenas certa parcela, estando quanto a esse aspecto arredada qualquer restrição da obrigação de responsabilidade».” (cfr. Acórdão do TCA Sul de 11/03/2003, processo 7384/02)”, cfr. acórdão do TCA Sul, de 20-06-2000, proferido no âmbito do processo n.º 3468/00.

XIII - Também não se estipule, como faz a Sentença recorrida, que “…o accionamento do mecanismo da reversão da execução fiscal não foi precedido de qualquer alegação e prova realizada pelos serviços da administração tributária no próprio processo de execução fiscal – de que a Oponente exerceu a gerência de facto, em termos que determinassem a sua legitimidade para o processo de execução fiscal a título de responsável subsidiário (cfr. fundamentação do despacho de reversão, transcrita no parágrafo 12. do elenco de factos provados”.

XIV - Porquanto a Lei não exige que do despacho de reversão ou do acto de citação resulte qualquer alusão concreta aos actos de gestão ou às diligências levadas a cabo pelo órgão de execução fiscal que permitam aferir da verificação dos pressupostos de que depende a reversão do processo de execução fiscal; e não exige porque tais estes vícios de falta de prova dos pressupostos da reversão devem ser destacáveis ou autonomizáveis relativamente à alegada falta de fundamentação da reversão, cfr. a este respeito, o entendimento vertido no Douto Acórdão do TCA Sul, de 05-06-2012, proferido no âmbito do recurso n.º 05431/12.

XV - Na realidade, a Oponente possui uma intervenção pessoal e activa na vinculação da sociedade devedora originária, o que significa que a viabilidade funcional desta apenas era concretizada com a intervenção daquela, o que se subsume, integralmente à noção de gerência de facto e o facto de ter resultado provado que a mesma ter assinou documentos no interesse e por conta da sociedade devedora originária, é o suficiente para que se considere que praticou actos efectivos de gerência.

XVI - Com o devido e muito respeito, a Sentença ora recorrida, ao decidir como efectivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de facto e de direito relevante para a boa decisão da causa, desconsiderando os elementos probatórios carreados para os autos, tendo desconsiderando os elementos probatórios carreados para os autos e violado o disposto nas supra mencionadas disposições legais.

TERMOS EM QUE, E COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A SENTENÇA ORA RECORRIDA, COM AS DEMAIS E DEVIDAS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!”*** A Recorrida apresentou as contra-alegações constantes de fls. 166 a 169 dos autos, tendo concluído da seguinte forma: “1-Verifica-se que as alegações apresentadas pelo Digno Representante da Fazenda Pública não colocam em causa a sentença recorrida; 2-Que a ora oponente/recorrida I…, nunca praticou actos próprios que consubstanciassem um exercício efectivo da gerência de facto na sociedade originalmente devedora; 3-Como ficou provado, quem exerceu de facto e de direito a gerência da sociedade originalmente devedora “CAFÉ S..., LDA”, foram os sócios gerentes: L…, A… e A…; 4-A sentença recorrida é de facto uma decisão de mérito, bem fundamentada em toda a sua plenitude, quer factual, jurídica, doutrinária e jurisprudencial; 5-Que, não foi por culpa da oponente/recorrida, que o património da sociedade originalmente devedora ficou insuficiente para que a mesma pudesse satisfazer os créditos fiscais.

Termos em que, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, não deve ser concedido provimento ao recurso apresentado pelo Digno Representante da Fazenda Pública, e, em consequência, a sentença recorrida não deverá ser revogada, mantendo- se nos termos em que foi proferida, ou seja, que a oposição à execução fiscal seja considerada procedente, por provada e extinto o respectivo processo de execução fiscal nº 34332001..., com as...

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