Acórdão nº 3246/06.4TTLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : I - O art. 12.º do CT estabelece a presunção que as partes celebraram um contrato de trabalho assente no preenchimento cumulativo de cinco requisitos, o que, traduzindo-se numa valoração dos factos que importam o reconhecimento dessa presunção, determina que se aplique apenas aos factos novos, às relações jurídicas estabelecidas após o início da sua vigência: 1 de Dezembro de 2003.

II - Estando em causa uma relação jurídica cuja execução perdurou desde 1 de Julho de 1998 e 1 de Abril de 2007 e não se extraindo da matéria de facto provada que as partes tivessem alterado, a partir de 1 de Dezembro de 2003, os termos como, na prática, se executava essa relação jurídica, à sua qualificação aplica-se o regime jurídico do contrato individual de trabalho, aprovado pelo DL n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969 (LCT), não tendo aplicação, in casu, a presunção do citado o art. 12.º .

III - Destarte e nesta situação, cabe ao Autor o ónus da prova quanto à natureza jurídico-laboral do vínculo que manteve com a Ré.

IV - O contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviço diferenciam-se, essencialmente, pelo respectivo objecto e pelo relacionamento entre as partes, isto é, o desenvolvimento de uma actividade subordinada, quanto ao primeiro, e a prossecução de um determinado resultado em regime de autonomia, quanto ao segundo.

V - Todavia e porque todo o trabalho ou desempenho de actividade, por princípio, conduz a um resultado, há que buscar no relacionamento entre as partes os indícios quanto à existência, ou não, de uma posição de supremacia da parte a favor da qual reverte a actividade desenvolvida, com a correlativa posição de subordinação do prestador dessa actividade, que, assim, a executa perante os ditames de instrução ou orientação da primeira.

VI - A posição de supremacia da parte a favor da qual reverte a actividade nem sempre se manifesta em cada momento por forma a que todo o desenvolvimento da actividade a prestar constitua uma mera execução de concretas instruções emanadas daquela parte, bastando, para aquilatar da sua existência, a possibilidade de emissão de ordens, instruções, direcção e conformação relativamente àquilo que a outra parte se comprometeu a realizar no âmbito do contrato ou dentro dos limites deste.

VII - Perante a dificuldade de prova de elementos fácticos nítidos de onde resultem as características da subordinação jurídica – dificuldade essa acrescida em razão da natureza eminentemente técnica de determinadas actividades – deve proceder-se à identificação da relação laboral através de indícios que reproduzam elementos do modelo típico do trabalho subordinado, por forma a que se possa concluir pela coexistência, no caso concreto, dos elementos definidores do contrato de trabalho, nestes relevando a potencialidade do exercício do poder disciplinar por parte de quem beneficia da actividade desenvolvida.

VIII - Tal identificação não deve, porém, estar confinada a um ou outro indício mais ou menos relevante, antes se devendo equacionar a totalidade do relacionamento, a fim de se proceder ao balanceamento de todos os indícios, com a finalidade de apurar a existência de subordinação jurídica.

IX - O acordo negocial aprazado entre o Autor e a Ré não é susceptível de ser perspectivado como um contrato de trabalho quando no domínio da execução de tal acordo se verificou que: o Autor foi pago com uma prestação mensal variável em função do número de máquinas a que prestava assistência; podia servir-se de outras pessoas para, em seu nome, ficarem encarregues da assistência contratada, conquanto devendo elas estar treinadas previamente pela Ré; era o Autor quem, de acordo com as suas preferências, normalmente decidia quando e quais os equipamentos a que iria acorrer; o Autor “tirava” férias quando queria, apenas com a obrigação de designar quem, em seu nome, havia de prestar o serviço de assistência técnica, embora de acordo com os níveis de serviço exigidos pela Ré.

Decisão Texto Integral: I 1. No Tribunal do Trabalho de Lisboa intentou AA contra X...Portugal, Ldª, acção de processo comum, peticionando a condenação da ré a reconhecer como contrato de trabalho o negócio jurídico firmado entre ambos, consequentemente devendo “observar os regimes fiscal e de segurança social” e efectuar os descontos para a Segurança Social desde a data da admissão do autor, atribuindo-lhe a antiguidade e categoria que teria se “tivesse sido contratado nos termos legais”, e a pagar-lhe € 19.397,95, a título de compensação pela falta do gozo de férias, € 5.388,30, a título de subsídio de férias “do período gozado”, € 10.908,13, a título de subsídio de Natal, € 33.941,28, a título de prejuízos decorrentes de despesas de deslocação pagas “abaixo do valor legal” e pela não atribuição de veículo automóvel, € 900, a título de prejuízos sofridos por falta de pagamento de chamadas telefónicas, € 488,09, a título de despesas de saúde “por falta de atribuição do direito ao subsídio de doença”, e € 4.882,64, a título de juros vencidos pela falta de pagamento atempado dos subsídios de férias e de Natal, além de juros vincendos até integral pagamento.

Aduziu, em síntese, para alicerçar os seus pedidos, que: – – em 1 de Julho de 1998 outorgaram autor e ré um contrato, que esta última, para sua conveniência, denominou de prestação de serviço, não obstante o seu conteúdo ser claramente revelador de ter por objecto uma relação laboral, contrato esse por via do qual o autor prestaria actividade de assistência técnica a clientes da ré...

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