Acórdão nº 3843/15.7T8CSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução31 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência do Supremo Tribunal de Justiça I.

Veio a 1ª R.

AA - Gabinete de Reabilitação Física, Lda.

impugnar para a conferência a decisão da relatora de 12 de Novembro de 2019 (a fls. 661) de não admissão do presente recurso de revista por falta de verificação do pressuposto da sucumbência, invocando que o valor da sua condenação pelo acórdão recorrido ascende a € 16.029,00, não se situando em apenas € 14.426,10, como se entendeu na decisão impugnada.

Ponderados pelo colectivo todos os dados processuais relevantes, considera-se que a questão relativa à verificação do preenchimento do pressuposto da sucumbência deve efectivamente ser reequacionada, ainda que não exactamente pelas razões invocadas pela Recorrente/reclamante.

Vejamos.

Tendo a sentença condenado a 1ª R. AA, Lda. a pagar à A. a quantia de € 1.602,90, e tendo o acórdão da Relação condenado a mesma 1ª R. a pagar o valor global de € 16.029,00 (que inclui o montante de € 1.602,90), torna-se decisivo determinar se aquela primeira decisão condenatória transitou ou não em julgado. Para resolver esta dúvida importa ter em conta qual o fundamento da condenação em 1ª instância, tanto da 1ª R. como da 2ª R.

Estamos perante uma acção de responsabilidade civil por danos derivados de lesão física sofrida pela A., sendo o pedido indemnizatório principal dirigido contra a 2ª R. BB Seguros, S.A.., (actual CC, S.A.) e o pedido subsidiário dirigido contra a 1ª R., entidade segurada.

Ora, a sentença, dando como verificados os pressupostos da responsabilidade civil, entendeu estar esta coberta pelo contrato de seguro celebrado entre a 1ª e a 2ª RR., condenando a 2ª R. a pagar a quantia de € 14.426,10, e a 1ª R. a pagar a quantia de € 1.602,90, correspondente ao valor da franquia do seguro.

Assim sendo, constata-se que, tendo a 2ª R. interposto recurso de apelação, invocando, entre outros fundamentos, que o sinistro dos autos não se encontra abrangido pelo indicado contrato de seguro (celebrado com a 1ª R.), considera-se que – nos termos do art. 634º, nº 2, alínea b), do Código de Processo Civil – tal recurso aproveita também à 1ª R., uma vez que a sua condenação em 1ª instância se fundara na aplicação da cláusula de franquia do contrato de seguro e que a apelação pôs em causa que o sinistro se encontre abrangido pela cobertura do mesmo contrato.

Não tendo transitado em julgado a condenação da 1ª R. na sentença, conclui-se que, nos termos do art. 629º, nº 1, do CPC, a decisão impugnada na revista (isto é, a decisão proferida pela Relação) é desfavorável à Recorrente no valor global em que foi condenada: € 16.029,00. Sendo este valor superior a metade da alçada da Relação, o recurso é admissível.

Pelo exposto, acorda-se em revogar a decisão reclamada, admitindo-se o recurso de que se passa a conhecer em seguida.

II.

  1. DD intentou, em 7 de Dezembro de 2015, a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra AA - Gabinete de Reabilitação Física, Lda.

    e BB Seguros, S.A.

    (actual CC, S.A.

    ), pedindo que seja: “

    1. Condenada a 2.ª Ré no pagamento à Autora da quantia de € 25.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais; b) Condenada a 2.ª Ré no pagamento à Autora da quantia de € 19.171,87, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e no pagamento de todas as despesas vincendas até à recuperação integral da Autora; c) Condenada a 2.ª Ré no pagamento à Autora no valor que vier a ser fixado posteriormente, nos termos indicados em 59.º e 60.º, até integral recuperação da Autora.

    2. Condenada a 2.ª Ré no pagamento à Autora nos juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, procuradoria, custas de parte e demais custas processuais.

    Caso a responsabilidade pelo pagamento das indemnizações devidas à Autora não seja atribuída à 2.ª Ré, deverá ser: e) Condenada a 1.ª Ré no pagamento à Autora da quantia de € 25.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais; f) Condenada a 1.ª Ré no pagamento à Autora da quantia de € 19.171,87, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e no pagamento de todas as despesas vincendas até à recuperação integral da Autora; g) Condenada a 1. ª Ré no pagamento à Autora no valor que vier a ser fixado posteriormente, nos termos indicados em 59.º e 60.º até integral recuperação da Autora; h) Condenada a 1.ª Ré no pagamento à Autora nos juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, procuradoria, custas de parte e demais custas processuais.” Para tanto alegou a A. em síntese que, no dia 23/10/2014, encontrando-se a realizar tratamentos na clínica da 1ª R., ao transitar do tratamento de massagens realizado com terapeuta da 1ª R. para a utilização das máquinas de manutenção, sofreu uma queda, embatendo violentamente no chão. A queda ficou a dever-se ao facto de a A. não ter tido a ajuda necessária para se deslocar em segurança por parte da terapeuta responsável, sendo certo que tanto a idade (89 anos) e consequente fragilidade física, como a prótese na anca constituíam factores de risco de queda que, para serem minimizados, requeriam cuidado especial, factores esses ignorados pela terapeuta que os conhecia ou devia conhecer.

    Em consequência dessa queda a A. sofreu lesões no corpo que lhe causaram danos não patrimoniais pelos quais peticiona compensação no valor de € 25.000,00.

    Sofreu ainda danos patrimoniais correspondentes a despesas com transporte pelos Bombeiros Voluntários, no montante de € 413,00, com tratamentos, num total de € 938,87, bem como a despesas que suportou na clínica onde está a completar a sua reabilitação e tratamento no valor de € 17.820,00.

    Peticiona ainda montante a determinar posteriormente relativo a sequelas decorrentes das lesões que sofreu.

    Os danos são de imputar a título de culpa à 1ª R., a qual, tendo celebrado contrato de seguro de responsabilidade civil com a 2ª R., válido e eficaz à data do acidente, transferiu para esta a responsabilidade decorrente da sua actividade de unidade de medicina e de reabilitação, sendo assim a 2ª R. obrigada ao pagamento dos danos apurados e a apurar.

    As RR., devidamente citadas, vieram apresentar contestação, defendendo-se por impugnação.

    Alega ainda em sua defesa a 1.ª R. que a passagem da marquesa para a cadeira onde iria realizar tratamento de ultra-sons, distantes 1,5 metros uma da outra, não carece de acompanhamento por parte dos colaboradores da 1ª R., além de que o processo de reabilitação da A. até o aconselhava, sendo a própria A. a querer fazer sozinha tudo o que lhe era possível e aconselhável. O ocorrido constituiu assim um lamentável acidente decorrente de risco normal em processo de reabilitação da A., não tendo a 1ª R. violado qualquer regra de segurança.

    Quanto à 2ª R., a mesma aceita a existência de contrato de seguro, referindo contudo existir uma franquia de 10% do valor da indemnização a cargo do tomador do seguro, com um mínimo de € 250,00. Confirma a participação do sinistro e da averiguação que fez ao mesmo e das razões que levaram à não aceitação de responsabilidade por considerar não existir qualquer acto ou omissão da 1ª R. que tenha originado a queda, aderindo ainda aos fundamentos da contestação da 1ª R.

    A fls. 443 foi proferida sentença que julgou o pedido formulado na petição inicial parcialmente procedente e, em consequência: - Condenou a R. BB Seguros, S.A.. no pagamento à A. DD da quantia de € 14.426,1, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal aplicável às dívidas civis a contar da citação até integral e efectivo pagamento.

    - Condenou a R. AA, Lda. no pagamento à A. DD da quantia de € 1.602,90, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, correspondente à franquia do contrato de seguro de 10%, acrescida de juros à taxa legal aplicável às dívidas civis a contar da citação até integral e efectivo pagamento.

    - Absolveu as RR. do demais peticionado.

    Inconformada, a R. BB Seguros, S.A.. interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, pedindo a modificação da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.

    Por decisão de fls. 529 foi declarado habilitado como herdeiro da A., entretanto falecida, o seu filho EE.

    Por requerimento de fls. 543v, veio a CC, S.A.. dizer ter a BB Seguros, S.A.. sido incorporada, por fusão, em 30/12/2016, na Companhia de Seguros FF, S.A. e que esta na mesma data alterou a sua denominação para CC, S.A.

    , pelo que assume a posição processual da extinta BB Seguros, S.A..

    Por despacho do Exmo. Juiz Desembargador relator (a fls. 553) foram as partes notificadas para se pronunciarem quanto à possibilidade de, vindo a apelação da 2ª R. (seguradora) a ser julgada procedente, ser de conhecer da questão da eventual responsabilidade civil exclusiva da 1ª R. (segurada), que não fora apreciada em 1ª instância por ter ficado prejudicada pela solução dada ao litígio.

    Por acórdão de fls. 570 foi mantida a decisão relativa à matéria de facto e, a final, foi proferida a seguinte decisão: “… julgar procedente a apelação, revogando a sentença recorrida, substituindo-a por outra cuja parte decisória passa a ter a seguinte redação: 1. Absolver a Ré CC, S.A. dos pedidos formulados contra si.

  2. Condenar a Ré AA, Ld.ª no pagamento à Autora DD da quantia de €16.029,00 (dezasseis mil e vinte e nove cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal aplicável a juros civis, a contar da citação até integral e efetivo pagamento.” 2.

    Vem a R. AA - Gabinete de Reabilitação Física, Lda. interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões: “1. Ao pessoal auxiliar da Recorrente não é aplicável a nota anexa à apólice dos autos, pelo que não está excluída da respectiva cobertura a auxiliar de fisioterapia a quem é directamente assacada a responsabilidade pelo evento.

  3. Na exclusão de coberturas não é aceitável interpretação que não tenha um mínimo de correspondência...

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