Acórdão nº 26294/17.4T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Março de 2019
Magistrado Responsável | PEDRO MARTINS |
Data da Resolução | 07 de Março de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados: G e mulher, T, intentaram uma acção declarativa comum contra (i) o Condomínio do edifício sito na Rua X e (ii) a Câmara Municipal de Y, formulado estes 5 pedido: A- Ser declarada a nulidade de todas as decisões tomadas em sede de assembleia de condóminos datada de 25/05/2016 (acta n.º 31), por irregularidade na convocatória e violação das regras da proporcionalidade na comparticipação das despesas comuns; B- Ser o Condomínio condenado na demolição de todas as obras/inovações construídas ilegalmente, em prazo fixado pelo tribunal, sob pena de se deliberar a nulidade da escritura de constituição de propriedade horizontal, com todas as legais consequências daí advenientes; C- Ser o Condomínio condenado a entregar aos autores cópia das actas de assembleia de Condomínio de Maio de 2005 até à actualidade, cópia do regulamento de Condomínio, [e comprovativo] da existência de fundo comum de reserva e da apólice de seguro; D- Ser o Condomínio condenado a pagar aos autores montante indemnizatório, a título de danos morais e patrimoniais, em montante fixado segundo critérios de equidade, acrescidos de juros e taxas legais até efectivo e integral cumprimento.
E- Ser a Câmara condenada na instauração de processo contra-ordenacional por existência de obras ilegais, com as inerentes consequências legais; O Condomínio não contestou.
O Município (a Câmara é um órgão do Município que não tem personalidade jurídica ou judiciária, pelo que o réu é o Município como este o entendeu, e não a Câmara como pretendiam os autores) contestou, no que importa agora, excepcionando a incompetência material do tribunal e pedindo a sua absolvição da instância. Não impugnou os factos alegados pelos autores.
Depois o tribunal determinou a notificação dos autores para responderem, por escrito, à excepção deduzida pelo Município e as partes para se pronunciarem sobre a questão da caducidade do direito de acção, no termos previstos no art. 1433/4 do Código Civil, quanto ao pedido A.
O Condomínio veio requerer que se declare verificada a excepção peremptória de caducidade do prazo para propor a acção de anulação das deliberações tomadas pela assembleia de condóminos e pedindo a sua absolvição do pedido A.
Os autores responderam à excepção da incompetência e pronunciaram-se sobre a questão da caducidade, defendendo a não verificação de ambas, a da incompetência por se verificar uma coligação de partes passiva e a da caducidade por não ter sido invocada pelo Condomínio e não poder ser apreciada oficiosamente, Foi depois proferido despacho em que, considerando-se que o Condomínio não tinha apresentado contestação, se declararam confessados os factos articulados pelos autores, por força do art. 567/1 do CPC.
E depois julgou-se verificada: a) a excepção de incompetência material do tribunal e, em consequência, absolveu-se o Município da instância quanto ao pedido E; b) a nulidade correspondente ao erro na forma de processo e, em consequência, absolveu-se o Condomínio da instância no que respeita ao pedido C; c) a excepção de ilegitimidade do Condomínio e, em consequência, absolveu-se o mesmo da instância quanto aos pedidos B e D; d) a excepção de caducidade do direito de acção e, em consequência, absolveu-se o Condomínio do pedido A.
Os autores recorrem deste saneador-sentença, pondo em causa estas absolvições e invocando, de passagem, nulidades do saneador-sentença.
O Condomínio contra-alegou defendendo a improcedência do recurso.
O Município não contra-alegou.
* Questões que importa decidir: se existem nulidades no saneador-sentença e se as absolvições da instância (quanto aos pedidos B a E) e do pedido (A) estão erradas.
(I) Da excepção de incompetência material do Tribunal O saneador-sentença recorrido diz, muito em síntese feita por este TRL, que, em relação à matéria do pedido E, tendo ela natureza administrativa, a competência para o seu conhecimento cabe, naturalmente, aos tribunais administrativos e, por isso, não cabe aos tribunais judiciais, que têm uma competência determinada por exclusão de partes (art. 4/1-b-o do Estatuto dos tribunais administrativos e fiscais e arts. 60/2 e 64 do CPC).
Como diz o saneador-sentença e é uma evidência, não cabe aos tribunais judiciais apreciar a legalidade da actuação de um município no âmbito específico da decisão de instaurar ou não um procedimento contra-ordenacional e, muito menos, para lhe ordenar a prática de actos que cabem nas competências dos municípios (esta decorre, para o caso, do art. 98/10 do DL 555/99, de 16/12, como dizia o Município na sua contestação).
Por isso, julgou procedente a excepção de incompetência material deste tribunal, absolvendo o Município da instância quanto ao pedido E, só e apenas.
Os autores dizem o seguinte contra isto (aqui como de seguida utiliza-se o próprio corpo das alegações do recurso dos autores, fazendo este acórdão uma síntese simplificada do mesmo e colocando numeração própria, mas respeitando a construção dos autores): I- como os pedidos B e D dirigidos contra o Condomínio estão em relação directa e necessária com o pedido E dirigido contra o Município e o pedido C o está indirectamente, é admissível a coligação de réus (art. 36/1 do CPC); e como a cumulação não ofende regras de competência material (art. 37/1 do CPC), o tribunal não podia indeferir a coligação e por isso se tem de considerar competente para a matéria do pedido e não podia absolver o Município da instância; II- a apreciação conjunta das pretensões formuladas pelos autores é indispensável para a justa composição do litígio e o seu prosseguimento conjunto não implica uma tramitação manifestamente incompatível, sendo que nestes casos, e como preceituado pelo art. 37/2 do CPC, o juiz pode autorizar a cumulação.
III- o tribunal optou por absolver todos os réus de todos os pedidos formulados pelos autores, desresponsabilizando-se de fazer qualquer apreciação sobre o objecto do litígio, quando, no máximo, deveria absolver o Município do pedido E e considerar-se competente para julgar os demais pedidos; IV- os autores tinham de ter sido notificados para se pronunciarem sobre que pedidos queriam que a demanda judicial incidisse, para que os pedidos contra o Condomínio continuassem em julgamento; não o tendo feito, a decisão de que se recorre violou o disposto nos arts. 567/1 e 38/1 do CPC.
Decidindo: 1.º - os pedidos dirigidos contra o Condomínio e contra o Município não estão, manifestamente, numa relação de prejudicialidade ou de dependência entre si (art. 36/1 do CPC), porque para a procedência dos pedidos contra o Condomínio não é necessário que o pedido contra o Município também proceda, e vice-versa. Assim sendo, a coligação não era admissível.
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- mas, mesmo que o fosse, como a matéria dos pedidos (A a D de um lado, E do outro) pertence a jurisdições distintas (a primeira aos tribunais comuns, a segunda dos tribunais administrativos, por força das normas citadas pelo saneador-sentença recorrido), a coligação não seria admissível (art. 37/1 do CPC, 2ª parte).
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- a previsão do art. 37/2 do CPC não diz respeito à parte do art. 37/1 do CPC (2.ª parte) que se refere à violação das regras de competência, mas apenas à parte (1.ª) que se refere a formas de processo diferentes.
Assim, está errado o que os autores dizem em I e II.
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- o tribunal não disse nada de parecido com aquilo que os autores o acusam, isto é, não decidiu a absolvição do pedido ou da instância quanto aos pedidos A a D por arrastamento do decidido quanto ao pedido E. Ou seja, a decisão de absolvição da instância do Município só a este respeita e só respeita ao pedido E. Os autores não têm a mais pequena razão que seja para dizer o contrário, ou seja, para dizer o que consta de III.
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- não tendo o tribunal judicial competência para conhecer do pedido E, não se punha a alternativa do processo seguir pelos pedidos A a D ou pelo E, pelo que não tem razão de ser o que consta de IV, isto é, que os autores fossem notificados para dizer por quais dos pedidos é que a acção devia prosseguir.
(II) Da ilegalidade da cumulação de pedidos Disse a sentença recorrida, secundada pelo Condomínio: Refere o art. 555/1 do CPC que "pode o autor deduzir cumulativamente contra o mesmo réu, num só processo, vários pedidos que sejam compatíveis, se não se verificarem as circunstâncias que impedem a coligação”, isto é, se aos pedidos não corresponderem formas de processo diferentes ou da cumulação não resultarem ofendidas as regras da competência absoluta dos tribunais vide art. 37/1 do CPC.
Ainda assim, quando aos pedidos correspondam formas de processo que, embora diversas não sigam uma tramitação manifestamente incompatível, pode o juiz autorizar a cumulação sempre que nela haja interesse relevante ou quando a apreciação conjunta das pretensões seja indispensável para a justa composição do litígio – vide art. 37/2 do CPC.
A consequência da verificação da incompatibilidade processual dos pedidos apenas atinge o pedido para o qual a forma de processo utilizada seja considerada imprópria.
No presente caso, em relação ao pedido A a acção deve seguir a forma de processo comum que foi aquele que os autores indicaram.
No entanto, para o pedido C - que o Condomínio seja condenado a entregar aos autores cópia das actas de assembleia de Condomínio até à actualidade, cópia do regulamento de Condomínio, [e comprovativo] da existência de fundo de reserva e de apólice de seguro - existe forma de processo especial prevista no art. 1045 e seguintes CPC.
Da análise da forma de processo especial verifica-se a existência de incompatibilidade processual, não se afigurando existir qualquer interesse relevante na apreciação conjunta das questões colocadas ao tribunal.
Assim sendo, impõe-se declarar a nulidade do processo e a absolvição da instância do Condomínio quanto ao pedido de apresentação de documentos.
Os autores dizem o seguinte contra isto: V- Os pedidos...
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