Acórdão nº 325/17.6T8LAG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Fevereiro de 2019
Magistrado Responsável | MANUEL BARGADO |
Data da Resolução | 28 de Fevereiro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO BB e CC instauraram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra DD, pedindo que seja declarada a nulidade do negócio de compra e venda de um lote de terreno realizado entre eles, por simulação, com o respetivo cancelamento do registo de aquisição do imóvel.
Alegaram, em síntese, que tendo passado por dificuldades financeiras que os impediram de honrar compromissos para com certos credores e por haver risco de ser penhorado o respetivo património, acordaram com um seu amigo, por sugestão deste, transferir a propriedade de um lote de terreno que haviam adquirido para nome do filho desse amigo, o ora réu, outorgando escritura de compra e venda, num negócio simulado, em que o preço declarado nunca foi pago, nem o comprador tomou posse do terreno, o qual se mantém desde Janeiro de 1997 na posse dos autores.
O réu contestou, contrapondo que nunca privou com os autores, recusando que o negócio haja sido simulado, afirmando ter-se tratado de um investimento, por valor justo e cujo preço foi liquidado por acerto de contas entre os autores e pai do réu, concluindo pela sua absolvição do pedido.
Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação e foi logo designada data para realização do julgamento.
Posteriormente, em face da dispensa de realização da audiência prévia, os autores vieram apresentar o seu requerimento probatório, no qual, além de renovarem a prova testemunhal e documental indicada na petição inicial, requereram a realização de prova pericial, por um único perito, para prova do alegado nos artigos 15º e 26º daquele articulado (fls. 72).
Considerando não ser impertinente ou dilatória a perícia requerida pelos autores, o Sr. Juiz a quo determinou a notificação do réu para se pronunciar, vindo este dizer que nada tinha “a opor ao quesito formulado ao perito” (cfr. fls. 88 e 92).
Procedeu-se à realização da audiência de julgamento sem que tivesse sido ordenada a realização da perícia requerida pelos autores, e após finda a produção de prova, o Sr. Juiz a quo proferiu o seguinte despacho: «Face à prova já produzida a perícia requerida pelos autores é redundante, nada acrescentando ao vasto instrutório já reunido, pelo que se indefere a sua realização.
Notifique.
» Inconformados, os autores apelaram do assim decidido, tendo finalizado a respetiva alegação com as seguintes conclusões (transcrição): «
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No âmbito da prova de uma simulação invocada, é importante determinar o valor real dos bens objecto da alienação, designadamente face ao valor declarado como preço no negócio de compra e venda.
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A perícia ao prédio urbano – lote de terreno para construção urbana - é pertinente e imprescindível para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, pois irá permitir apurar se o preço declarado corresponde ou não ao valor real desse bem e se o Réu efectivamente pagou o preço deste bem aos Autores – cfr. arts. 411.º, 467.º, do CPC e arts. 341.º e 388.º do Código Civil.
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A perícia requerida revela-se necessária, desde logo, para prova da inexistência de entrega de qualquer quantia por parte do Réu aos Autores a título de preço, e da emissão de declarações contrárias à real vontade do Réu aquando da celebração por intermédio do seu Pai da escritura de compra e venda do prédio urbano, por acordo entre os simuladores, com intenção de enganar os credores do Autor marido.
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Pertencendo o ónus da prova da simulação alegada aos Autores, o indeferimento da perícia impedi-los-á de a produzir.
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A não admissão da perícia requerida, impossibilita, pois, os Autores de fazerem prova em juízo da simulação do negócio de compra e venda – cfr. arts. 341.º e 342.º, do Código Civil.
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A prova pericial surge, não só como idónea, mas mesmo como natural ou preferencial para o apuramento do valor de mercado do prédio urbano alienado pelos Autores ao Réu.
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Em sentido similar, pronunciou-se recentemente o Tribunal da Relação de Guimarães, em Acórdão datado de 02/02/2017, proc. 6420/14.6T8VNF-A.G1, disponível em www.dgsi.pt, onde conclui que “I. Sendo a prova da simulação quase sempre indirecta, por se reportar a eventos do foro interno dos simuladores (nomeadamente, à divergência entre a sua vontade real e a sua vontade declarada, ao acordo havido entre eles, e à sua intenção de enganar terceiros), fará comumente uso de presunções judiciais, alicerçadas em indícios condensados pela uniforme prática jurisprudencial. II. Entre os indícios/presunções da simulação avulta o pretium vilis, isto é, uma efectiva divergência entre o preço declarado na transacção de bens havida (inferior) e o real valor de mercado dos ditos bens (superior). III. A prova pericial é, não só idónea, como natural ou preferencial para se apurar com rigor o valor de prédios urbanos e de veículos automóveis (por esse apuramento pressupor conhecimentos técnicos subtraídos ao indiferenciado julgador); e, por isso, não deverá ser recusada num litígio que tenha por objecto a determinação da alegada simulação de uma venda de tais bens”.
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Tendo presente que, na grande maioria dos casos, a prova da simulação se obtém de forma indirecta (pela demonstração dos seus indícios), e que nestes a divergência entre o preço declarado e o valor real de mercado assume primordial importância, não se pode deixar de discordar do Tribunal a quo, quando mesmo declarou que “a perícia requerida pelos autores é redundante, nada acrescentando ao vasto instrutório já reunido (…)”.
Termos em que V.Ex.as concedendo provimento ao recurso e alterando a douta decisão recorrida nos termos pugnados nas presentes alegações, Farão inteira JUSTIÇA!» Entretanto foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu o réu do pedido.
Irresignados, os autores interpuseram recurso da sentença, finalizando as alegações com as seguintes conclusões: «1 - Resulta pendente no tribunal “a quo”, um recurso de apelação autónoma, com subida em separado, interposto pelos Autores/recorrentes por requerimento com a ref.ª citius: 28796637, de 11/04/2018, relativo ao despacho de não admissão de prova pericial requerido pelos Autores, datado de 21/03/2018; 2 - Fundamentou o tribunal “a quo” na decisão recorrida o facto de não ressoarem na actividade instrutória levada a cabo em audiência, nem a sua afirmação se revelar...
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