Acórdão nº 82/17.6PEPDL.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelFRANCISCO CAETANO
Data da Resolução25 de Outubro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Relatório AA, ..., ...., nascido em ... de 1998, com os demais sinais dos autos, foi julgado, com outro arguido, no âmbito do processo em epígrafe, do Juízo Central Cível e Criminal de … – Juiz …, do Tribunal Judicial da Comarca …, onde, por acórdão do tribunal colectivo de 15 de Dezembro de 2017, foi condenado na pena de 9 anos de prisão, como co-autor da prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-A e I-C anexas a esse diploma legal.

Inconformado com tal decisão, dela recorreu para o Tribunal da Relação de …, com fundamento em insuficiência da prova produzida para a matéria de facto dada como provada, violação do princípio do in dubio pro reo, contradição insanável das fundamentação e entre esta e a decisão e valoração de prova proibida, sendo que, por acórdão de 11 de Abril de 2018, foi esse recurso julgado improcedente e mantida a decisão recorrida.

Ainda irresignado, o arguido recorreu para este STJ, concluindo a respectiva motivação com as seguintes conclusões: “I - Os factos referidos em b) do ponto 3 (…) e ponto 2. Da Fundamentação – a Factos provados, do douto acórdão, resultam exclusivamente, do depoimento da testemunha BB, que já tinha sido prestado no âmbito de outro processo, Proc. 171/13. 6PEPDL – 3º. Juízo PDL, (fls.142-144), existindo pois co-arguição material entre o aqui recorrente e a referida testemunha, o que resulta, aliás notório das declarações desta, nunca tendo tido o ora recorrente qualquer intervenção na formação da referida prova, naquele processo, tanto mais que apesar de tais declarações, no âmbito do referido processo (Proc. 171/13. 6PEPDL – 3º. Juízo PDL) o ora recorrente nem sequer foi constituído arguido.

II - Estamos assim, no nosso modesto entender, perante co-arguição material, estando a testemunha BB (que nem sequer deu o seu consentimento expresso para depor nessa qualidade), nos termos do disposto no art.º 133.° do CPP impedido de testemunhar, por efeito do conceito material de co-arguição.

III - Ao admitir tal prova, proibida por lei, proibição de valoração de prova, e ao dar como facto provado o referido no ponto 2 da Fundamentação e b) supra, está o douto acórdão a cometer uma nulidade.

IV - A testemunha CC é arguido no Proc.297/14. 9 PGPDL, onde foi condenado por tráfico de menor gravidade, pelos factos sobre que recai o seu depoimento (vide certidão de sentença de fIs.409 a 429), tendo sido condenado em pena de prião suspensa na sua execução e sujeito a regime de prova.

V - A referida testemunha é ainda arguido e encontra-se a aguardar julgamento no âmbito do Proc. 72/17.9PEPDL, em que os factos de que está indiciado são precisamente a traficância exercida pelo mesmo, durante o ano de 2017 (vide Auto de interrogatório de arguido de Fls. 432 a 439) e a que se reportam os factos relativos a 2017, e que o tribunal "a quo" dá como provados no ponto 4 da Fundamentação, baseando-se exclusivamente no depoimento de tal testemunha (vide Acórdão AC- motivação da matéria de facto).

VI - Estamos, na nossa modesta opinião, perante co-arguição material, estando, mais uma vez, a testemunha CC (que nem sequer deu o seu consentimento expresso para depor nessa qualidade), nos termos do disposto no art.º 133°. do CPP impedido de testemunhar, por efeito do conceito material de co-arguição.

VII - Ao admitir tal prova, proibida por lei, proibição de valoração de prova, e ao dar como facto provado o referido no ponto 2 da Fundamentação e b) supra, está o douto acórdão a cometer uma nulidade.

VIII - Das declarações do co-arguido DD, nunca poderia o Tribunal "a quo" dar como provados os factos insertos nas alíneas f) g) e h) do ponto 3 supra, (pontos 6, 1 e 8 da fundamentação) porque resultam exclusivamente das declarações de co-arguido.

IX - O Tribunal recorrido face às dúvidas suscitadas, ao ter fundamentado a sua convicção contra a lógica da experiência comum, viola o principio "in dubio pro reo", constitucionalmente protegido.

X - Constatamos a ausência na douta sentença de um juízo de equidade, equilíbrio e justiça que supostamente deveriam informá-la.

XI - Não ajusta, a douta sentença, os limites da responsabilidade às diferentes posições de culpa que lhe estão na base, segundo o sentimento do mérito e do demérito.

XII - Viola assim o douto acórdão o principio da proporcionalidade e adequação, princípios estes orientadores que devem presidir à determinação da pena aplicável (art.°40° do CP e 71° n.º 1).

Termos em que deve o presente recurso ser recebido e, em consequência ser o arguido ora recorrente absolvido, ou atenuada a sua pena, ou ainda se não for possível decidir a causa pelos vícios presentes no acórdão ora posto em crise, deve o Tribunal de recurso determinar o reenvio do processo para novo julgamento”.

O M.º P.º junto da Relação, rebatendo ponto por ponto as questões recorridas, pronunciou-se a favor da manutenção do julgado e neste Supremo Tribunal a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da inexistência de quaisquer vícios ou nulidades na decisão recorrida, pronunciando-se, quanto à medida da pena, pela sua redução para 7 anos e 6 meses de prisão.

Após os vistos e conferência cumpre decidir, decisão que versa sobre as seguintes questões: a) – Proibição de valoração de prova; b) – Violação do princípio in dubio pro reo; c) – Âmbito do recurso e dosimetria da pena aplicada.

* II.

Fundamentação 1. A matéria de facto dada como provada (e respectiva fundamentação), sem qualquer alteração pelo Tribunal da Relação, foi a seguinte: “1. Como forma de obter ganhos financeiros, o arguido AA, desde data não concretamente apurada, mas anterior ao mês de Setembro de 2013, tomou a resolução de proceder à compra e posterior revenda a terceiros de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína e canábis; 2. Assim, no exercício de tal actividade, durante o período compreendido entre o mês de Setembro de 2013 até 31.10.2013, diariamente, BB transportou e entregou heroína, que lhe foi entregue por AA, a diversos indivíduos. As quantidades de heroína que transportou e entregou oscilavam, no mínimo, entre os 5 e os 30 gramas; 3. Também em dia não concretamente apurado do ano de 2013 e até 11.12.2014 AA acordou com o CC para que este último procedesse à venda de 5 a 10 gramas de heroína por semana, o que este fez até ter sido detido por agentes da Policia de Segurança Pública em 11.12.2014 no âmbito do P. n°. 297/14.9PGPDL; 4. Desde o início do ano de 2017 até momento desconhecido, mas anterior a 21.4.2017, AA acordou novamente com CC para este último proceder à venda de heroína. Assim, no referido período, CC vendeu (por conta daquele) 5 a 10 gramas de heroína, por semana, na zona de …, em Ponta Delgada; 5. Também no âmbito dessa actividade de traficância, desde o início do mês de Abril de 2017, que o arguido AA acordou com o DD, que este guardasse produto estupefaciente - canábis -, na sua residência sita na ....ª Rua … n.º …, ...; 6. Assim, desde o início do mês de Abril de 2017, em dias não concretamente apurados, AA deslocou-se à residência de DD, onde lhe entregou, por diversas vezes, canábis para DD guardar; 7. Sendo que a última entrega ocorreu no final do mês de Abril de 2017, em concreto AA entregou dez placas de canábis a DD, que este guardou na sua residência, e, em troca, DD recebeu de AA quatro ou cinco tranches de € 50,00; 8. No início de Maio de 2017 AA pediu ao arguido DD para entregar três placas de canábis a um individuo que cuja identidade se desconhece, o que o arguido fez; 9. Nessa actividade, no dia 16.5.2017, o arguido DD foi surpreendido por agentes da Policia de Segurança Pública, com sete placas de canábis com um peso líquido de 663,300 gramas; 10. Assim, devido a essa actividade pelo menos desde o período compreendido entre o mês de Setembro de 2013 até ao dia 16.5.2017 o arguido AA adquiriu grandes quantidades de dinheiro proveniente na venda de heroína e canábis, como exemplo disso: - no dia 7.5.2017, pelas 7h15, junto ao Bar …na rua …., AA foi surpreendido por agentes da Policia de Segurança Pública com € 1.634,47 em notas; - no dia 16.5.2017, pelas 20h35 horas AA tinha na sua residência sita na Rua …, n°…., 3° Esq...

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