Acórdão nº 5189/17.7T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução31 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. C.

, melhor identificado nos autos, intentou contra M. S., também melhor identificada nos autos, a presente acção especial para atribuição da casa de morada de família, pedindo que lhe seja atribuída a casa de morada de família da extinta união de facto que manteve com a requerida, sita na Rua …, Freguesia de ..., Guimarães, e a transmissão para si do direito ao arrendamento, nos termos do art. 1105º do CC.

Alegou, em síntese, que viveu com a Ré em união de facto durante 7 anos, entre 2007 e Dezembro de 2014, altura em que se separaram, tendo dessa união de facto nascido uma filha, Maria, a …, cujas responsabilidades parentais foi atribuída em conjunto a ambos os pais.

Que após a separação ficou a residir na casa de morada de família, com a sua nova companheira e a filha Maria, nos períodos em que ela está consigo.

A requerida reside actualmente com a mãe, e tem várias dificuldades económicas, sendo o requerente quem suporta a totalidade das despesas com a filha Maria, assim como a renda mensal da habitação, no valor de € 22,97.

* Realizada a tentativa de conciliação, as partes não lograram chegar a acordo, sentindo-se ambos com direito sobre a referida habitação.

*Notificada para contestar, veio a requerida deduzir oposição, pugnando pela atribuição a si da casa de morada de família.

Alegou para tanto, em síntese, que o requerente trabalha por conta própria, dedicando-se à organização de eventos, tendo o mesmo, entre Julho e Agosto deste ano, feito animação em cerca de quinze casamentos, cobrando cerca de € 500,00 por cada animação, sem contar com os restantes eventos que tem ao longo do ano.

A companheira trabalha num estabelecimento comercial, auferindo pelo menos remuneração equivalente ao salário mínimo nacional.

Que o Requerente apenas faz face às despesas da filha de ambos quando a tem à sua guarda.

A requerente encontra-se desempregada, sem auferir qualquer rendimento, e tem a seu cargo, além da menor Maria, outra filha menor, vivendo com as mesmas em casa da sua mãe.

Que trabalhou até Fevereiro de 2018 na Fábrica de Calçado ..., que dista cerca de 1 km da casa de morada de família, tendo-lhe sido garantido que ali voltará a trabalhar em breve.

Que não tem carta de condução, pelo que, se ficar a residir na casa que foi a de morada de família, poderá fazer o percurso para o trabalho a pé.

Por outro lado, a escola frequentada pela menor Maria situa-se a cerca de 200 metros daquela casa de morada de família.

Mais alega que teve de sair de casa e de passar a residir com a mãe porque atravessava um quadro clínico depressivo, causado pelo comportamento do requerente.

Conclui, a final, que a sua necessidade da casa de morada de família é superior à do Requerente.

*Tramitados regularmente os autos, foi proferida a seguinte Decisão: “…Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo a presente acção procedente e provada nos termos sobreditos e, consequentemente, decide-se: A) Declarar dissolvida a união de facto entre o requerente, A. C., e a requerida, M. S.; B) Atribuir exclusivamente ao requerente, A. C., a posição de arrendatário da identificada casa de morada de família, correspondente à fracção autónoma designada pelas letras “AL”, correspondente à habitação com o n.º …, situada no … do prédio urbano localizado na Rua …, Freguesia de ..., Concelho de Guimarães, inscrito na matriz predial respectiva sob o art. … e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial sob o n.º …; C) Determinar que, após respectivo trânsito em julgado, se proceda à comunicação da presente sentença ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IHUR IP, senhorio, nos termos e para os efeitos do art. 1105º, n.º3, do CC, aplicável por força do disposto no art. 4º da Lei n.º 7/2001, de 11-05, na versão dada pela Lei n.º 23/2010, de 30-08.

Custas pela requerida – arts. 527º, n.º1, do CPC – sem prejuízo do benefício de apoio judiciário que lhe foi concedido…”.

*Não se conformando com a decisão proferida, dela veio a requerida interpor o presente recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões: “I.

Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos acima identificados que atribuiu a casa de morada de família em exclusivo a A. C..

  1. A douta sentença padece de um erro de avaliação dos critérios previstos nos artigos 1105°, nº2 e 1793°, nº1, do Código Civil.

  2. Estes artigos enunciam os critérios a atender no caso de não haver acordo entre os ex-cônjuges sobre a atribuição da casa de morada de família.

  3. São eles os da "necessidade de cada um", "os interesses dos filhos" e "outros factores relevantes".

  4. Para aferir da "necessidade de cada um" dos ex-cônjuges, deve o tribunal atender aos rendimentos e proventos de cada um.

  5. Para avaliar "os interesses dos filhos", deve o tribunal aferir a quem ficou atribuída a guarda do menor e se é do interesse deste ficar a viver na casa de morada de família com o progenitor a quem foi confiado.

  6. Só quando as necessidades dos ex-cônjuges forem iguais ou sensivelmente iguais é que o tribunal deve apreciar "outros factores relevantes".

  7. Nomeadamente, a idade, o estado de saúde, a localização da casa em relação ao local de trabalho de cada um dos ex-cônjuges e o facto de algum deles dispor de outra casa onde possa restabelecer a sua residência.

  8. Assim, e analisando a situação patrimonial de cada uma das partes, ou seja, quais os rendimentos e encargos de cada um, o tribunal deu como provado que a Recorrente está desempregada e vive, juntamente com uma outra filha menor e a Maria, filha da Recorrente e do Recorrido, quando esta está ao seu cuidado em casa da mãe. O Recorrido, por sua vez, vive com a sua companheira e com a filha menor, Maria, quando esta está ao seu cuidado, trabalha por conta própria, aufere anualmente cerca de € 2000,00 e a sua companheira aufere mensalmente cerca de € 580,00.

  9. Ora, ponderando os rendimentos e os encargos de cada uma das partes, é notório que a Recorrente, que está desempregada e tem duas filhas menores a seu cargo, sendo que a Maria é em regime de guarda partilhada com o Recorrido, tem uma "premente necessidade" da casa de morada de família muito superior à do Recorrido que aufere anualmente cerca de € 2.000,00 e a sua companheira aufere mensalmente cerca de € 580,00.

  10. Acresce que, se atendermos aos rendimentos e aos encargos da Recorrente, facilmente concluímos que lhe é muito difícil, ou praticamente impossível, arrendar uma casa que não seja no regime de renda apoiada, como é a do caso dos autos.

  11. Já o Recorrido, atentos os seus rendimentos e os da companheira, tem facilidade em arrendar uma casa no regime geral.

  12. Assim, é evidente que a Recorrente tem mais necessidade da casa de morada de família do que o Recorrido.

  13. Todavia, o tribunal a quo considerou que a matéria de facto apurada não permite concluir que a requerida tenha incómodos patrimoniais ou de outra natureza significativamente acrescidos com a não ocupação da habitação, em relação àqueles que o requerente teria caso tivesse de cessar a ocupação da mesma.

  14. Acontece que os critérios enunciados nos artigos 1105 nº 2 e 1793 nº1 do CC, visam proteger o cônjuge que foi mais atingido pela separação, isto é, aquele que ficou numa situação mais frágil e não aquele que terá mais ou menos incómodos com a desocupação da casa de morada de família.

  15. Pelo que, andou mal o tribunal a quo uma vez que aferiu, não as necessidades de cada uma das partes, mas apenas os incómodos patrimoniais ou de outra natureza significativamente acrescidos com a não ocupação da habitação que cada uma das partes venha a ter caso tivesse de cessar a ocupação da mesma.

  16. No que toca ao critério do interesse dos filhos, deve o tribunal aferir se é do interesse destes ficarem a viver na casa que foi de morada de família com o progenitor a quem foram confiados.

  17. Ora, nos presentes autos, a guarda da filha menor da Recorrente e do Recorrido, a Maria, ficou atribuída, alternadamente, a ambos os progenitores.

  18. Como tal, independentemente da casa de morada de família ser atribuída à Recorrente ou ao Recorrido, a...

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