Acórdão nº 2005/15.8BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 31 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMÁRIO REBELO
Data da Resolução31 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: RECORRENTE: R... - Sociedade Gestora de Participações Sociais, SA RECORRIDO: Autoridade Tributária e Aduaneira OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pela MMº juiz do TAF de Lisboa que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o despacho do EDFA de 6/4/2015 que indeferiu o pedido de pagamento em prestações da dívida tributária no valor de € 859.365,12 relativa a IRC de 2013.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES A. O objeto deste recurso é a, aliás, douta sentença, de 14 de setembro de 2015, do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o indeferimento do pedido de pagamento em prestações praticado pelo Diretor de Finanças Adjunto (DFA) da Direção de Finanças de Lisboa (DFL) no processo de execução fiscal n.º 32552014..., instaurado no SF de Lisboa 10.

B. Invalidam a, aliás, douta sentença recorrida os vícios de falta de fundamentação, omissão de pronúncia e de erro de facto no julgamento da prova produzida .

C. A, aliás, douta sentença recorrida, sem se aperceber dos vícios em que incorria, adotou acriticamente, e nela se louvou, a fundamentação com que o DFA da DFL indeferiu o pedido de pagamento em prestações que, a ora Recorrente, no exercício e um direito que a lei lhe confere, e porque entende reunir os pressupostos legais que tornam vinculado o ato do seu deferimento, legitimamente e em tempo apresentou.

O. Não foram ponderados, no juízo que precedeu a decisão de improcedência da reclamação, no plano da sua validade científica, os fundamentos e a prova apresentados pela ora Recorrente e a contra argumentação desenvolvida pelo DFA da DFL.

E. Desde logo, e na esteira do erro grosseiro com tido pelo DFA da DFL, a, aliás, douta sentença recorrida alinha pela tese de que o rácio de liquidez geral se mede em percentagem, com se "ser superior a 1" fosse a mesma coisa que "ser superior a 1%": um rácio inferior a 1, ainda seria um rácio positivo, porque

F. No entanto, e para que não restem dúvidas um rácio de 50% significa que o passivo de curto prazo é apenas o dobro o ativo circulante.

G. Não se pode pois, por esta via, legitimamente pretender que o iter cognoscitivo percorrido por quem tal tese, sem qualquer restrição, adotou, seja o DFA, seja o Distinto Tribunal, possa ser considerado claro e permita ao seu destinatário saber porque que se decidiu deste modo e não de outro.

H. A sensação que fica é a de que o decisor não dominava minimamente as ferramentas básicas da análise que necessariamente deveria, in casu, ser feita, tendo em vista a decisão legal e justa.

I. O que a ora Recorrente ficou a conhecer, c m a fundamentação subscrita pelo DFA da DFL, foi que ela não permitia sustentar as ilações que então foram tiradas e que levaram ao indeferimento do pedido.

J. Concomitantemente, porque incondicionalmente por ela alinhou, a, aliás, douta sentença recorrida não pode, igualmente, manter-se na ordem jurídica, devendo ser revogada, porque a fundamentação em que se sustenta não suporta a decisão de improcedência da reclamação com que culmina. K. No plano da ciência financeira, as teses em confronto- a tese da ora recorrente e a tese do DFA da DFL - n o são minimamente comparáveis.

L. A abordagem patrimonial, seguida pela DFL porque certamente lhe é mais favorável para o seu confessado objetivo de arrecadar impostos, e também adotada na fundamentação da, aliás, outa sentença recorrida, que, por seu lado, apenas tem por missão aplicar a lei em nome do Povo, nos termos constitucionais, encontra-se hoje manifestamente ultrapassada, em matéria de análise financeira , para sustentar a existência ou não de equilíbrio financeiro a curto a prazo.

M. Nessa abordagem, olha-se para o balanço, medem-se as massas patrimoniais (ativo circulante e passivo de curto prazo), divide-se aquele por este e se o quociente for maior que do 1 proclama-se a saúde financeira da empresa.

N. Portanto, quociente maior que 1 e não maior que 1%, que é coisa totalmente diversa .

O. São consensuais as limitações desta abordagem.

P. Por isso, os Autores que se encontram na vanguarda da área da análise financeira chamam a atenção para, face às insuficiências da perspetiva clássica, a vantagem da abordagem funciona , assente no Balanço funcional, e cujos indicadores considerados sã o Fundo de Maneio Funcional, as Necessidades de Fundo de Maneio e a Tesouraria Líquida.

Q. A, aliás, douta sentença recorrida passa completamente ao lado desta temática, não obstante tudo quanto, a tal propósito, na petição de Reclamação a ora Recorrente invocou.

R. O que consubstancia, também, manifesta omissão de pronúncia sobre matéria relevante para a decisão da causa.

S. Outro enviesamento no julgamento é o que decorre do juízo que é feito dos "meios libertos" das operações realizadas pela ora Recorrente e que, na perspetiva do Tribunal, deveriam ser integralmente utilizados no pagamento da dívida fiscal.

T. Obviamente que tal acarretaria para ela consequências económicas gravosas e, como JORGE LOPES DE SOUSA reconhece, este é um dos casos em que o pedido de pagamento em prestações deve ser objeto de deferimento.

U. Mas, mais do que isso, a verdade é que a ora Recorrente vive, e demonstrou-o, numa situação de desequilíbrio financeiro grave que o Distinto Tribunal também não entendeu.

V. E não entendeu porque afirma que a ora Recorrente dispõe de um fundo de maneio de 8 milhões de euros, quando precisa de um fundo de maneio de 11 milhões de euros.

W. Mesmo assim, teria de ponderar que havia uma diferença, um desajustamento, entre o existente e o necessário, de 3 milhões de euros, o que, para "dificuldades financeiras de curto prazo", não é despiciendo. X. Além de que se trata de um desajustamento de 3 milhões numa operação que demora um ano a "libertar", como se viu, menos de 1/3 desse montante.

V. De onde decorre que a, aliás, douta sentença não ponderou minimamente este aspeto da prova produzida na sua decisão, pois sendo as necessidades de fundo de maneio muito superiores ao existente, tal facto é, por si só, demonstrativo das dificuldades financeiras de curto prazo existentes.

Z. Tais factos não foram refutados.

AA. Vem afirmar-se que a prova feita pela ora Recorrente não teve materialidade. É lamentável.

BB. A prova foi feita com as demonstrações financeiras , cuja veracidade não foi posta em causa. E nelas que está a materialidade da prova. E certo que têm de ser interpretadas, compreendidas. Mas esse é um problema que não pode ser imputado à ora Recorrente.

CC. Em rigor, o que sucedeu foi que o Distinto Tribunal recorrido não viu, nem quis ver, as demonstrações financeiras, e embalado como estava pela tese do senhor DFA da DFL.

DD. E o que se pergunta é se a prova, nestes casos, se não faz com as demonstrações financeiras, então far-se-á com quê? EE. Está-se, admite-se embora que de boa-fé, perante mais um erro grosseiro do Distinto Tribunal a quo.

FF. A última confusão conceptual prende-se com a expressão "fundo de maneio" e resulta de, na, aliás, douta sentença recorrida se afirmar que "do ponto de vista real se situa 10 vezes acima da dívida exequenda", causando naturalmente alguma estranheza à MMª Juiz que, com tal "fundo de maneio" a empresa não possa pagar de uma só vez a dívida. GG. É, de novo, o resultado da notória falta de conhecimentos na área da análise financeira e dos seus conceitos próprios.

HH. Provavelmente, foi tomada a expressão "fundo de maneio" na sua aceção corrente, de "dinheiro em caixa", dinheiro disponível nos cofres da empresa ou em contas bancárias por ela tituladas.

11. Ora, fundo de maneio, na aceção técnica, não é igual a liquidez disponível nos cofres da empresa. JJ. No sentido em que foi utilizada, a expressão significa, tão só, a diferença entre ativos correntes e passivos de curto prazo.

KK. Dos ativos correntes, à data, a ora Recorrente dispunha apenas de 34.155,00 € em matéria de disponibilidades financeiras.

LL. É este mais um erro de fato no julgamento da prova produzida que vicia de ilegalidade a, aliás, douta sentença recorrida.

MM. A, aliás, douta decisão recorrida ao julgar improcedente a reclamação deduzida contra o ato de indeferimento do pedido de pagamento em prestações que dela era objeto violou o disposto no n.º 4 do artigo 196.º do CPPT, enferma de falta de fundamentação, de erro de facto no julgamento da prova produzida e de omissão de pronúncia, o que tudo é suscetível de constituir nulidade, nos termos do disposto no n.º 1do artigo 125.º do CPPT e determina a sua revogação.

NESTES TERMOS, e nos mais que o Venerando Tribunal ad quem suprirá, deve presente recurso ser julgado procedente por provada e, em consequência, deve a, aliás, douta sentença re corrida ser revogada com todas as legais consequências, deferindo-se à ora requerente o pedido de pagamento em prestações oportuna e legitimamente efetuado, como é de JUSTIÇA.

Valor do Processo: € 859.365,12 CONTRA ALEGAÇÕES.

Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença é nula por falta de fundamentação e omissão de pronúncia e se errou no julgamento da matéria de facto e de direito ao julgar improcedente a reclamação.

Com dispensa dos vistos, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação de facto: 1) Por referência ao exercício de 2013, a reclamante tinha registado, nos seus elementos contabilísticos, um total do ativo circulante de 37.754.016,00 Eur., total de passivo circulante de 28.979.966,00 Eur...

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