Acórdão nº 244/17.6T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMOIS
Data da Resolução06 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 244/17.6T8PTM.E1 Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Apelante: BB (autora).

Apelada: CC (ré).

Tribunal da Comarca de Faro, Juízo do Trabalho de Portimão, J2.

  1. A A. intentou a ação declarativa de condenação, com processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra a R., mediante a apresentação do formulário a que aludem os artigos 98.º-C a 98.º-E do Código de Processo do Trabalho (CPT).

    Procedeu-se à realização da audiência de partes, no decurso da qual não foi possível obter a conciliação das mesmas.

    Regularmente notificada, a entidade empregadora apresentou articulado, no qual alegou, em síntese, que a autora exercia as funções de caixeira de 3.ª classe, desde 16 de março de 2016.

    Porém, alega, em função dos factos descritos na nota de culpa, que dá como reproduzida, entendeu mover à autora processo disciplinar, no termo do qual veio a concluir estarem demonstrados os factos constantes da aludida nota de culpa e, por via disso, que o comportamento da mesma inviabilizou a manutenção do vínculo laboral, decidindo-se pelo respetivo despedimento com invocação de justa causa.

    Pugna, por isso, pela improcedência da ação.

    A trabalhadora respondeu, impugnando os factos e deduzindo reconvenção.

    Refere, desde logo, que inexiste despacho proferido pela sua entidade empregadora a determinar a instauração de processo disciplinar e a mandatar a respetiva instrutora, pelo que conclui pela nulidade do mencionado processo disciplinar.

    Aduz, ainda, que a prova produzida no processo disciplinar se baseia na análise de imagens recolhidas por câmaras de vigilância instaladas no estabelecimento da empregadora e que a utilização das mesmas configura um meio de prova proibido – pelo que é nula a prova obtida por essa via e toda a demais, que dela depende.

    Além disso, alega, em síntese, que não correspondem à verdade os factos alegados pela ré empregadora e que, por isso, inexiste qualquer justa causa que possa fundamentar o seu despedimento.

    Conclui, assim, que não praticou qualquer comportamento violador dos seus deveres laborais, conducente ao despedimento, peticionando a declaração de ilicitude do mesmo e a condenação da ré no pagamento das retribuições vencidas e vincendas, desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão (assentando no pressuposto da nulidade do termo aposto no seu contrato de trabalho), bem como os créditos laborais vencidos e não pagos (sendo € 316,20 a título de retribuição de férias não gozadas e € 223,20 relativos a trabalho prestado em 8 dias feriados), bem como a condenação da ré no pagamento de indemnização em substituição da reintegração, que a autora entende não dever ser inferior a € 837 e, bem assim, em indemnização por danos não patrimoniais, que computa em montante não inferior a € 3 348.

    A ré apresentou resposta e reiterou o já afirmado no seu articulado motivador, pugnando pela improcedência da reconvenção.

    Foi proferido despacho saneador, tendo-se aferido positivamente todos os pressupostos processuais relevantes e dispensada a fixação dos temas da prova.

    Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, com a resposta à matéria de facto, respetiva motivação e apreciação de direito, a qual culminou com a seguinte decisão: Pelo exposto e nos termos das disposições legais citadas, considera-se a presente ação parcialmente procedente, porque apenas parcialmente provada e em consequência: 1. Julga-se improcedente o pedido de declaração de ilicitude do despedimento da autora BB e absolve-se a ré CC, Lda dos pedidos relacionados com o mesmo – declaração de ilicitude do despedimento e pagamento de indemnização pelo despedimento ilícito; 2. Condena-se a ré CC, Lda a pagar à autora BB os créditos laborais resultantes da falta de pagamento da retribuição de férias não gozadas, no valor de € 316,20 (trezentos e dezasseis euros e vinte cêntimos) relativamente ao trabalho prestado no ano de 2016; 3. Sobre esta quantia são devidos juros de mora, à taxa legal, desde a data do despedimento e até integral pagamento; 4. No mais, improcedem os pedidos formulados pela autora.

    Custas por autora e ré, em função do respetivo decaimento, que se fixa em 93,31/100 para a autora e 6,69/100 para a ré (cf. artigo 527.º do Código de Processo Civil).

    Fixa-se o valor da ação em € 4 724,40 (cf. artigo 98.º-P, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho e artigo 297.º n.º 1 do Código de Processo Civil).

  2. Inconformada, veio a A. interpor recurso de apelação que motivou, com as conclusões que se seguem: A. Os factos concretos imputados à autora, descritos na nota de culpa e na decisão de despedimento, foram dados como provados pelo tribunal a quo, (pontos 4, 19 e 20) que valorou as declarações das testemunhas cujo conhecimento dos factos resulta unicamente do visionamento das filmagens obtidas através das câmaras de vigilância instaladas no estabelecimento da ré (cfr. motivação da sentença).

    1. “Não podem as câmaras incidir regularmente sobre os trabalhadores durante a atividade laboral, nem as imagens podem ser utilizadas para o controlo da atividade dos trabalhadores, seja para aferir a produtividade, seja para efeitos de responsabilização disciplinar” (teor da Autorização n.º 9392/2015 emitida a favor da ré pela Comissão Nacional de Proteção de Dados, junto ao processo disciplinar).

    2. As imagens captadas por câmaras de videovigilância, envolvendo o desempenho profissional do trabalhador ou para efeitos de responsabilidade disciplinar não são admissíveis como meio de prova em processo laboral.

    3. A decisão fundada em prova nula ou ilicitamente obtida é causa de nulidade da decisão, conforme ensina o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-12-2014 no Processo n.º 231/14.6TTVNG.P1, http://www.dgsi.pt.

    4. A ré tentou justificar que a instalação de câmaras no estabelecimento tinha por fim exclusivo a segurança de bens e pessoas.

    5. Que a existência das câmaras se justificava por causa de um assalto, ocorrido meses antes, durante a noite.

    6. Tal facto deve ser dado como não provado, pois nenhuma prova foi junta aos autos relativa ao alegado assalto ou a data desse facto.

    7. Entretanto, restou provado que das 4 câmaras instaladas no estabelecimento da ré, uma incide diretamente sobre o posto de trabalho da autora.

      I. A ré não logrou provar a licitude da utilização desse meio de vigilância.

    8. O empregado da ré, DD, reconheceu que a filmagem abrange o balcão, que é o posto de trabalho dos funcionários da ré, violando o direito de reserva da vida privada, conforme ensina o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º SJ200602080031394, de 08-02-2006, http://www.dgsi.pt.

    9. No processo disciplinar, a ré omitiu diligência probatória requerida pela autora na resposta à nota de culpa, nomeadamente, a junção ao processo disciplinar do registo integral das imagens gravadas nos dias 15, 16 e 17 de outubro de 2016.

      L. A omissão de diligência probatória é causa de nulidade do procedimento disciplinar, pois impede o trabalhador de exercer o direito ao contraditório.

    10. No que respeita à regularidade do processo disciplinar, a ré não comprovou a existência de mandato conferido à instrutora, uma vez que atribuição de poderes para o processo disciplinar tem de ser feita por escrito, com referência explícita ao poder de instrução e decisão.

    11. A instrutora conduziu a inquirição das testemunhas ouvidas no âmbito do processo disciplinar sem poderes para o efeito.

    12. O processo disciplinar é nulo, pois foi instruído por quem não tinha competência para o fazer (artigo 356.º n.º 1 do Código do Trabalho), consubstanciando-se na ausência do procedimento, devendo o despedimento ser declarado ilícito, nos termos do previsto na alínea c) do artigo 381.º do Código de Trabalho.

    13. Na reconvenção, a autora requereu declaração de nulidade do termo aposto no contrato de trabalho.

    14. O n.º 3 do artigo 141.º do Código do Trabalho, prevê que para efeitos da alínea e) do n.º 1, a indicação do motivo justificativo do termo do contrato de trabalho deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.

    15. No contrato de trabalho celebrado entre a autora e a ré não se encontra cumprido o dispositivo legal supracitado, facto admitido pelo tribunal a quo.

    16. A estipulação do termo é nula, devendo ser considerado um contrato de trabalho sem termo, nos termos do artigo 147.º, n.º 1, c) do Código do Trabalho.

    17. Assim, andou mal o tribunal a quo ao julgar improcedente o pedido de declaração de ilicitude do despedimento da autora pois de acordo com o exposto, impunha-se uma decisão diferente.

    18. Bem como errou ao não conhecer do pedido de declaração de nulidade do termo aposto no contrato de trabalho celebrado entre autora e ré.

      Nestes termos, e nos melhores de Direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser concedido total provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença na parte recorrida, devendo ser substituída por outra que declare nulo o processo disciplinar e, em consequência, declare a ilicitude do despedimento da autora, promovido pela ré, e ainda, conhecendo-se do pedido de declaração da nulidade do termo aposto no contrato de trabalho da autora, devendo ser considerado um contrato de trabalho sem termo, tudo com as legais consequências.

  3. A R. respondeu e concluiu que: A) À ora Apelante falece em absoluto razão no presente recurso, no que concerne aos reparos feitos, pois a Meritíssima Juíz “a quo” fez uma correta interpretação dos factos e uma correta aplicação do Direito, não merecendo o mínimo reparo ou censura.

    1. Esteve bem a Julgadora “a quo” em julgar improcedente o pedido de declaração de ilicitude do despedimento da autora e em absolver a sociedade ré dos pedidos relacionados com o mesmo.

    2. Não assiste qualquer razão à ora apelante, quando alega que as imagens obtidas através das câmaras de...

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