Acórdão nº 572/15.5T8LRA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelPAULA DO PA
Data da Resolução21 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

P.572/15.5T8LRA.E1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] 1. Relatório Na presente ação especial emergente de acidente de trabalho em que é sinistrado BB, frustrada a tentativa de conciliação realizada pelo Ministério Público, deu-se início à fase contenciosa do processo, por via da apresentação da petição inicial deduzida contra CC, S.A., no âmbito da qual o sinistrado pediu a condenação da R. a pagar-lhe: - O capital de remição calculado com base na pensão anual no montante de € 1.258,80, com início em 11/02/2015, dia imediato ao da alta; - A quantia de € 60,00, a título de despesas de transporte; - Juros de mora sobre as quantias em atraso, calculados à taxa legal.

Alegou, em resumo, que sofreu um acidente de trabalho, em 26/09/2014, que a seguradora demandada, para a qual estava transferida a responsabilidade emergente de acidente de trabalho, não aceita reparar por entender que houve violação das regras de segurança por parte da entidade empregadora. Mais refere que a seguradora também não aceitou as lesões e as sequelas sofridas em consequência do acidente.

O sinistrado requereu a realização de exame por junta médica, tendo apresentado os seus quesitos.

Contestou a seguradora, invocando, no essencial, que o acidente em causa nos autos, ocorreu ou por violação das regras de segurança por parte da entidade patronal ou por negligência grosseira do sinistrado, o que conduz à descaracterização do acidente. Impugnou a incapacidade permanente parcial (IPP) fixada pelo perito singular que observou o sinistrado na fase conciliatória do processo, requerendo a realização de exame por junta médica, apresentando para o efeito os respetivos quesitos.

Mais requereu a intervenção provocada acessória da entidade empregadora, a sociedade DD, Lda..

Na sequência da defesa oferecida, o sinistrado veio requerer a citação da entidade patronal, nos termos do artigo 129.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo do Trabalho.

Citada a empregadora, veio a mesma apresentar a sua contestação, impugnando que o acidente tenha sido causado por violação de quaisquer regras de segurança pela sua parte ou por negligência grosseira do sinistrado, afirmando que a seguradora deve ser exclusivamente condenada pela reparação do acidente.

Foi proferido despacho saneador tabelar e identificado o objeto do litígio.

Selecionaram-se os factos assentes e elencaram-se ordenadamente as questões factuais controvertidas, mediante o título “Temas da prova”.

A fixação da incapacidade para o trabalho correu por apenso.

No processo principal, após a realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença com o dispositivo que se transcreve: «4.1. Pelo exposto, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência, condeno: 4.1.1. A Ré CC, S.A., a pagar ao autor BB: a) O capital de remição de uma pensão anual de € 1.185,04, correspondente a uma IPP de 20,51 %, devida desde 11/2/2015; b) O montante de € 60 de despesas de transportes; e, c) O pagamento de juros de mora até ao integral pagamento à taxa legal que estiver em vigor.

4.1.2. Absolvo as rés do demais que foi peticionado.

4.3. As custas são a suportar ré seguradora (considerando que o seu decaimento é praticamente total).

4.4. Fixo o valor da ação pelo montante das reservas matemáticas, isto é € 14.808,26 – art.º 120.º, do Código de Processo do Trabalho.

4.5. Notifique.» Não se conformando com esta decisão, veio a seguradora interpor recurso da mesma, rematando as suas alegações com as conclusões que seguidamente se transcrevem: «I. Com o devido respeito por diferente opinião, entende a Recorrente que a sentença fez incorreta interpretação e aplicação do direito aos factos em discussão nos presentes autos relativamente a duas questões essenciais, a saber, a descaracterização do acidente e a violação das regras de segurança pela entidade empregadora.

  1. Perante o factualismo provado nos autos, para o qual se remete e aqui se dá por reproduzido, dúvidas não restam de que o acidente dos autos ocorreu ou por violação de regras de segurança por parte da entidade empregadora, ou por negligência grosseira por parte do sinistrado; III. Da factualidade provada, resulta que o sinistrado, no dia 26-9-2014, às 14 horas, em …, estava a operar uma máquina retestadeira, quando meteu a mão direita no seu interior para retirar uma tábua e foi atingido por uma peça dessa máquina; Na data do acidente, o autor encontrava-se a proceder à recolha de réguas que estavam a ser produzidas pela retestadeira e à colocação destas em paletes que seriam depois transportadas por um empilhador; A dado momento, uma das réguas ficou presa no interior da retestadeira, impedindo que as demais réguas que estavam a ser produzidas no interior da retestadeira fossem expelidas para o exterior, para cima da mesa de recolha; O autor apercebendo-se de que a régua se encontrava presa no interior da máquina, e do encravamento da retestadeira, deslocou-se até à parte de trás da máquina (que é o lugar oposto à saída da madeira); Aí chegado, o autor baixou-se e alcançou uma pequena abertura que se encontra por baixo da porta da retestadeira; E, introduziu a mão direita na abertura, com a intenção de retirar a régua que se encontrava presa na retestadeira, e por esse modo, desencravar a retestadeira, Sem ter desligado a máquina, mantendo a retestadeira em funcionamento enquanto procedia nos termos indicados supra; esta máquina retestadeira tem no seu interior um mecanismo automatizado que faz deslocar os troncos de madeira à medida que vão sendo retestados, até à saída, sendo projetados para o exterior; esse mecanismo automatizado é composto por “palas” isto é, peças móveis no interior da retestadeira, as quais são acionadas por um sensor para expelir as réguas para o exterior; A ré empregadora não possuía qualquer manual de instruções da máquina retestadeira, nem esta possuía declaração de conformidade “CE”; Na referida máquina, as portas de encapsulamento são fechadas apenas por um trinco; Não possui mecanismos de bloqueio, nomeadamente através de células fotovoltaicas ou sensores que desliguem automaticamente os motores aquando do encravamento da máquina ou da abertura das portas pelos trabalhadores; Não possuía a máquina quaisquer proteções laterais das portas ou das zonas de acesso à zona superior da máquina, à zona de acerto das medidas das paralelas e à zona oposta do lado de saída da madeira [ressalvando o mencionado trinco]; IV. As fotografias da máquina retestadeira e a descrição do seu modo de trabalhar constam a fls. 46 e ss do processo de inquérito elaborado pelo ACT, pela testemunha interveniente nos autos, o Senhor Inspetor ….

  2. Desde logo foi alegado pela Ré/ora Recorrente que a máquina retestadeira não possuía células fotoelétricas, ou sensores equiparados, que bloqueiem todos os motores do equipamento de trabalho quando ocorre uma anomalia ou o trabalhador / operador abre uma das portas.

  3. A Ré /Recorrente, ao contrário do que conclui o Tribunal “a quo” na sentença recorrida, teve a preocupação de enumerar, de forma exaustiva, quais as normas e regras de segurança que não foram devidamente observadas pela entidade empregadora.- cfr artigos 43.º a 67.º da sua contestação VII. Da análise do articulado da Ré, conclui-se que foram indicadas várias normas e regras de segurança, que não foram, no entender da Ré, respeitadas pela entidade patronal, e que determinam a sua responsabilização.

  4. Essas regras, resumidamente, referem-se a:- deficientes /inexistentes proteções da máquina retestadeira - deficientes /inexistentes sensores de desligamento da máquina retestadeira- não verificação periódica da máquina retestadeira;- falta de formação dos trabalhadores- inexistência de manual de instruções da máquina IX. A violação de tais regras resulta, assim, explicitamente invocada pela Ré na sua contestação, e foi demonstrada em sede de audiência e julgamento, nomeadamente pela prova documental junta aos autos – máxime o inquérito realizado pelo ACT e corroborado em sede de audiência pelo seu autor, o Senhor Inspetor ….

  5. A fls 51 do referido relatório, consta expressamente a menção ao DL 50/2005 de 25 de fevereiro, acerca das prescrições mínimas de segurança para a utilização pelos trabalhadores dos instrumentos de trabalho.

  6. Acerca das causas para o acidente, ali concluiu o Senhor Inspetor do ACT que “concorreram para o acidente: 1) falta de células fotoelétricas, ou sensores equipados, que bloqueiem todos os motores do equipamento de trabalho quando ocorre uma anomalia ou o operador abre uma das portas(…); 2 – falta de informação adequada sobre o equipamento de trabalho; 3 – falta de formação adequada no domínio da segurança e saúde no trabalho” XII. Não se entende, também, a tese do Tribunal “ a quo” , de que o acidente não se deveu inexistência de portas ou sensores, mas sim à circunstância de ter por outra forma de aceder ao seu interior.

  7. Caso existissem as portas e sensores que impedissem, uns, o acesso a locais potencialmente perigosos, e outros, que determinassem a paragem imediata dos mecanismos, o acidente não teria ocorrido.

  8. A inexistência de sensores e de portas, em inobservância das normas supra indicadas e ainda das regras gerais sobre higiene e segurança dos trabalhadores determinou, nesta perspetiva de “descaracterização” do acidente de trabalho (em rigor não se trata de descaracterização de acidente de trabalho como invoca o Tribunal “ a quo” mas um agravamento da responsabilidade da entidade empregadora), que o acidente tenha ocorrido.

  9. Dito de outro modo, tem-se por demonstrado, por raciocínio lógico, que se fossem adotadas as medidas de proteção acima identificadas, o acidente não teria ocorrido.

  10. O mesmo se diga quanto à falta de formação a ministrar pela Ré “DD” ao sinistrado: se a entidade empregadora tivesse ministrado ao trabalhador a formação sobre segurança e saúde no trabalho consideradas adequadas, o trabalhador estaria certamente mais apto a avaliar os...

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